J. R. Guzzo
Trata-se de ataque travestido na ideia de ‘aprimorar’ o sistema de liberdades individuais e públicas
A liberdade está ameaçada neste momento no Brasil – mais do que em qualquer outra época da sua história moderna. O aspecto mais maligno desta ameaça é que seus autores não são mais “os militares”, ou os defensores de regimes totalitários. Trata-se de um ataque oculto, travestido na ideia geral de que é preciso “aprimorar” o sistema de liberdades individuais e públicas – e que é conduzido, justamente, por aqueles que se apresentam como os maiores defensores da democracia neste país.
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O que se tem aqui é um esforço para desmontar o conjunto das liberdades. Não é uma demolição; é um desmanche. É, também, um movimento mundial. Seus genes estão nas áreas de “ciências humanas” da universidade do primeiro mundo, sobretudo a americana. O Brasil, aí, não tem capacidade instalada para criar algum pensamento original; traduz e repete o que ouve. A perversão, porém, continua a mesma.
O coração dessa guerra silenciosa está numa proposição supostamente virtuosa: a de que é preciso melhorar a liberdade, como ela é entendida hoje, para que os seus benefícios se tornem mais “justos”, “igualitários e “universais”. Basicamente, acredita-se que muita gente está excluída, por exemplo, da liberdade de expressão, por não dispor de meios, de recursos financeiros ou de oportunidades para se expressar. Seria preciso, então, modificar o conceito de liberdade, para que um número maior de pessoas possa desfrutar dela.
O problema, para começar, está num fato essencial da vida como ela é: todas as vezes que se tenta melhorar a liberdade, principalmente através de leis, a liberdade diminui de tamanho. Não há registro de nenhum caso em contrário. Pior que isso é o veneno embutido na ideia de que a liberdade é um valor que interessa a alguns, não a todos.
As questões-chave dos promotores dessa visão do mundo são aquelas que aparecem todas as vezes em que se pretende reduzir os efeitos positivos de algum direito. “A quem interessa a liberdade de expressão?”, perguntam. “Quem está tirando proveito dela?” Ou então, mais agressivamente: “Para o que ela serve?” Conclusão: o exercício da liberdade, para interessar “a todos”, tem de ser controlado. Por quem? Pelo Estado, é claro – e aí se encontra a razão final de toda essa conversa. É a ideia que continua a encantar as classes intelectuais: vamos melhorar o mundo chamando o governo, sobretudo se o governo somos nós. É melhor entregar essas coisas a repartições públicas chefiadas por pessoas inteligentes, imparciais e bondosas, que vão cuidar da população muito melhor do que ela seria capaz de cuidar de si própria. Nós pensamos melhor que você. Nós pensamos por todos.
J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo