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domingo, 12 de novembro de 2023

Cristão e comunista? - Percival Puggina

         Imagine um círculo quadrado. Não conseguiu? Tente uma mistura homogênea de água e azeite. Nada? 
Quem sabe, então, o velho Karl Marx desfiando o terço, piedosamente, numa procissão de Corpus Christi? Difícil, não é mesmo? 
 
Existem, de fato, coisas inconcebíveis. Uma delas é ser cristão e comunista.  
É perfeitamente possível ser cristão, é perfeitamente possível ser marxista ou comunista, mas resulta impraticável assumir, ao mesmo tempo, as duas condições. 
Cristãos-comunistas são um sincretismo tentado por Teilhard de Chardin, que dizia adorar “em espírito e verdade o Deus para cima dos cristãos e o Deus para frente dos marxistas”, como se os Evangelhos fossem uma espécie de minuta do Manifesto Comunista, transformado em Pentecostes tardio. 
E o Espírito Santo foi pegar logo um ateu para completar a Revelação... Querer o comunismo e não dar esse nome ao que querem – tipo utopia ou socialismo – tampouco resolve essa encrenca.
 
Não deixa de ser sintomático que tal mancebia espiritual acabe sendo assumida, sempre, por alguns cristãos e jamais pelos marxistas. 
Em vez de estes encontrarem Cristo, são aqueles que se deixam seduzir por Marx, numa espécie de perversão da conversão, ou, para dizer como os psicólogos, padecendo de uma síndrome de personalidade dissociativa (dupla personalidade)
Roger Garaudy, marxista, foi muito claro e honesto quanto a isso ao proclamar “Non possumus”, ou seja, “não podemos” conciliar nossas esperanças.
Ademais, não faz sentido aos cristãos se enfeitarem com o adjetivo marxista ou abraçarem o comunismo quando o próprio Cristo e seus seguidores são rejeitados como ópio do povo pelos discípulos do velho Karl. 
Se não por coerência, ao menos por dignidade e respeito a tantos mártires, essa conjugação absurda deveria ser refugada pelos cristãos.
 
A obra de Marx é um conjunto unitário que engloba uma política, uma economia, uma antropologia e uma sociologia, num encarte filosófico totalmente divergente do Cristianismo e que hoje domina o pensamento acadêmico. 
Assim, por exemplo, o materialismo dialético, que leva ao materialismo científico, é a base dogmática irrecusável do marxismo. Pode o cristão, à luz de sua fé, aceitar o materialismo dialético: “tudo é matéria, a matéria é eterna e não criada, a consciência é o grau superior da matéria”? 
 
Pode um cristão inteligente aceitar o materialismo histórico, dito científico, que na verdade é apenas ideológico, antimetafísico e enganoso, quando resultaram em equívoco todas as previsões feitas a partir dele?
 
A mística marxista afronta o cristão. Assim, a “salvação” é a construção da sociedade sem classes; o “pecado original” é a propriedade; a “Igreja” é o partido. 
Parece-lhe pouco? Pois existem outras diferenças radicais entre a caridade cristã e a praxis marxista, entre a ética cristã e a justificação dos meios pelos fins (defendida por Lênin em Les taches des unions de la jeunesse), sem esquecer o abismo que separa os respectivos conceitos sobre trabalho, propriedade, luta de classes, liberdade e justiça. Basta?

Apequenam sua fé os cristãos que se socorrem de Marx. Ou vestiram pele de cordeiro.

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.


segunda-feira, 5 de outubro de 2020

A corrupção cria um novo genocídio no Brasil - Juan Arias

EL PAÍS

Os abutres estão se aproveitando da dor da pandemia para engordar suas barrigas. Quantas vidas poderiam ter sido salvas com esse dinheiro?

Não é só o coronavírus que está criando um genocídio no Brasil, pecado do qual o próprio chefe de Estado, Jair Bolsonaro, é acusado por seu comportamento negacionista diante da epidemia. Outro genocídio não menos importante é o da corrupção que infestou todas as instituições do Estado, da política à Justiça, começando pelas próprias igrejas. Os abutres estão se aproveitando da dor da pandemia para engordar suas barrigas. Quantas vidas poderiam ter sido salvas com esse dinheiro? A corrupção cria morte e dor como um vírus da alma. Quem se apropria do dinheiro público dedicado a criar vida é um genocida.


Instalação da ONG Rio de Paz na praia de Copacabana em memória aos mortos por coronavírus no Brasil, agosto de 2020.RICARDO MORAES / REUTERS

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Dias atrás vi se encherem de lágrimas os olhos de uma mãe de duas meninas, desempregada, ao receber uma cesta básica. E veio aos meus olhos, como um pesadelo dantesco, a fila de políticos, empresários, juízes e até religiosos em uma dança de morte de milhões roubados dos pobres. Ao mesmo tempo, com dor, vejo aflorarem os pecados dos maiores responsáveis pela Lava Jato chamados a exigir justiça. Vejo a dança de alegria dos corruptos diante do colapso da cruzada contra a corrupção e não sei qual crime é pior.

A verdade é que os pecados daqueles que foram aclamados por terem tido a coragem de desafiar os corruptos poderosos não podem servir de detergente para limpar a sujeira dos corruptos. É preciso dizê-lo em voz alta: a corrupção que move milhões e até bilhões em um país onde correm rios de dor de milhões de pobres que sofrem porque não podem alimentar seus filhos deve ser punida como assassinato e genocídio. [Lembrete: a pobreza e a fome dela decorrente, e outras penúrias, não seguem o regime do cotas - atingem os pobres, os desassistidos sem exceção.

Para estes a igualdade prevista na Carta Magna é igual, ignora supremas decisões, interpretações criativas, etc...]. E são sempre os mesmos, na pandemia e na corrupção, os que mais sofrem e morrem: os negros e afrodescendentes herdeiros da escravidão; os que cresceram sem uma educação que os preparasse para a vida, os indígenas cada vez mais massacrados, os idosos e os doentes incapazes de sobreviver por conta própria.

Durante a pandemia, dois demônios se juntaram no Brasil para criar morte e dor, o do vírus e o da corrupção nascida no próprio coração da tragédia. Um trabalhador que recebe salário mínimo me perguntou: como podem ter alma aqueles que roubam até o dinheiro destinado a salvar vidas? Fiquei me perguntando como podem dormir tranquilos. E não apenas não parecem ter remorso, mas dançam felizes vendo desabar alguns dos pilares da luta contra a corrupção. Na verdade, observar hoje o regozijo de alguns políticos sobre os quais recai até uma dúzia de processos de corrupção e que continuam em liberdade por sua cumplicidade com magistrados e procuradores ou por suas chantagens a eles é algo que não deixa de causar indignação e repulsa.

Este Brasil que a corrupção está corroendo não é aquele com que os brasileiros sonharam e pelo qual se empenharam e lutaram —um país onde ninguém passasse necessidade, pois é atravessado por rios de riquezas naturais. E que, além disso, tem um povo criativo e capaz, se o deixarem, de produzir riquezas para que todos possam ter o que precisam sem ter de ver a fome aflorar nos olhos de seus filhos.

Sou exagerado? Não. Ainda fico aquém porque nem eu nem a maioria dos meus leitores conhecemos por dentro as entranhas dos dramas da pobreza e até da miséria de milhões de pessoas expostas ao mesmo tempo à violência cruzada do crime organizado e da ausência do Estado.

E enquanto isso, onde estão as vozes dos justos que não ouvimos seus gritos de condenação a tanto genocídio? Onde está aquele punhado de políticos e líderes decentes e não corruptos que não levantam a voz? Onde estão aqueles que foram escolhidos para fazer justiça e defender os mais fracos e que vivem de mãos dadas com os outros poderosos, defendendo mutuamente seus privilégios?

Às vezes me vêm à memória as vozes do Deus da Bíblia quando, na cidade corrupta de Sodoma e Gomorra, não encontrava um único justo capaz de salvar os demais. Ou me lembra o lamento daquele profeta dos descartados e abandonados à própria sorte quando dizia: “Tenho compaixão por eles porque são como ovelhas sem pastor”. Onde estão no Brasil os pastores, os governantes, os políticos, os juízes e até os religiosos capazes de proteger os mais expostos sempre à patada dos lobos?

Se os pecados da Lava Jato não redimem os corruptos, tampouco uma vitória nas urnas autoriza a tirania e a perseguição aos diferentes e mais expostos a serem escravizados. A classe brasileira que está em boa situação, a que nunca passou necessidades e pôde até dar caprichos aos seus filhos, os políticos e juízes corruptos, nunca compreenderá a imensidão da dor acumulada no coração dos que trabalham e não conseguem nem uma vida digna.

É triste para o Brasil, como país, se distinguir por ser um dos países mais corruptos do mundo ao mesmo tempo em que é um dos povos mais religiosos do planeta.

Os evangelhos cristãos dizem que o demônio, para tentar Jesus, o levou ao alto da cidade e, mostrando-lhe todos os reinos a seus pés, lhe disse: “Tudo isso te darei se, prostrando-te, me adorares”; o Brasil aparece hoje rendido à tentação dos demônios da corrupção diante dos quais todas as instituições parecem de joelhos. E o pior e o mais sarcástico é que este é um país que chegou a ser invejado de fora porque se dizia que “Deus era brasileiro”. Será que voltará a ser algum dia? Recursos não faltam. O que falta é decência aos responsáveis pelo seu destino.

Transcrito do jornal El País

Juan Arias - EL PAÍS



domingo, 19 de agosto de 2018

Terror do três

Rezam os Evangelhos que Jesus ressuscitou ao terceiro dia, em complicada operação que me deu muita dor de cabeça nas aulas do Catecismo da Doutrina Cristã

Nas redes sociais, rolam narrativas lendárias. Uma delas dá conta de que o Legislativo só faz o que o Executivo quer, e outra diz que o Executivo, por medo do Judiciário, não faz nada.   O novo presidente da República terá problemas com o número três em 2019. Que farão o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, os três poderes? Faz tempo que também os três poderes exibem suas notórias e complexas sutilezas.

Mas por que o três dá tantos problemas, alguns dos quais insolúveis, a começar pele Santíssima Trindade? Os mais antigos registros dão conta de que a Humanidade sempre teve a preocupação de designar e quantificar o mundo em que vive com uma obsessão por alguns números: o fascínio do três, a magia do sete, o infinito do oito e o surgimento tardio do zero, que levou muitos séculos para chegar da Índia ao Ocidente, eis alguns números referenciais. Sem contar aquele dois que a professora desenhava no quadro para que dele o aluno fizesse um pato, como ocorreu à minha geração.

Os homens sempre deram um ar mágico às contas, como fazem os governos nos orçamentos, talvez inspirados pela matemática, que fala em quadrado mágico, e, quem sabe, também em Roberto Carlos e em Chico Buarque, algozes dos biógrafos. Roberto garante que “dois e dois são cinco”. Chico assegura que “ele era mil/ tu és nenhum”. E nossa mãe sempre reiterou: “já te disse mil vezes que não pode”.

Voltemos, porém, ao três, que está na Santíssima Trindade, em terra, mar e ar, nos três lados do triângulo e, por falar nisso, em diversas relações amorosas refletidas na novela das oito, que é apresentada depois das nove, aliás, um múltiplo de três.  O número três, repleto de símbolos e magias, foi um avanço considerável na arte de contar. Até o surgimento do três, a Humanidade só expressava o singular, o par e o plural, sem esmiuçá-los.  E também não abstraía nada, ainda quando os conjuntos tivessem mais do que o par. Assim, as quatro patas de um animal, os cinco dedos da mão, os dez dedos que as duas formam, os vinte dedos do corpo humano, contados no total, todos esses conjuntos só valiam para o que designavam: as patas e os dedos.

O conceito não migrava dali para designar dez pássaros, vinte peixes, cinco porcos-do-mato etc. Três veio do latim tres, de uma raiz indo-europea que forneceu o mesmo étimo para numerosas outras línguas, de que são exemplos tres, em espanhol; tre, em Italiano; trois, em Francês; three, em Inglês; drei, em Alemão.  A etimologia do três esclarece complexas sutilezas desses números em todas as línguas e ajuda-nos a entender o conceito que está na base dessa evolução, que começou com o um, o par e o plural, e, a partir do três, chegou ao googol, nome que o matemático Edward Kasner deu, em 1938, ao maior número que ele inventou, acolhendo sugestão de seu sobrinho Milton Sirotta, então um menino de oito anos.

O pessoal do Google, o mais conhecido sistema de buscas na internet, inspirou-se nesse número para criar a empresa. Mas o número três vai mais além e está no Francês très, designando intensidade máxima: très riche, para o ricaço; très mauvais, para o muito mau. Este très francês quer dizer muito, mas na origem muito era apenas uma quantia superior a dois… Ligada ao três está também a raiz latina trans, muito presente em palavras do Português: trânsito, transação, transexual, transgredir, transgênico, transmissor, tresler etc. O Francês troupeau (tropa, rebanho) também tem a mesma raiz etimológica do três, como é também o caso do Italiano troppo (excessivo).

Rezam os Evangelhos que Jesus ressuscitou ao terceiro dia, em complicada operação que me deu muita dor de cabeça nas aulas do Catecismo da Doutrina Cristã. Afinal, se o Mestre morreu na sexta, foi sepultado naquele entardecer e ressuscitou no Sábado de Aleluia, como é que esta conta dá três dias?  Esta é, porém, uma questão bem menos complicada do que a do déficit orçamentário de 2019. Quem ressuscitar das urnas em outubro verá ainda este ano, bem antes de tomar posse.