Avanço da judicialização e do ativismo dos juízes decorre da omissão dos outros Poderes
São recorrentes as críticas dos políticos à judicialização e ao ativismo
judicial. Há razões objetivas, mas, primeiro, é preciso ponderar que o
arranjo institucional contempla amplas possibilidades para socorro em
juízo, como também permite um modo expansivo, proativo, dos juízes
interpretarem a Constituição. São fenômenos recentes, no debate político nacional, as conotações
negativas da judicialização e do ativismo, ou a falta de exercício de
autocontenção do Judiciário. A censura tem permeado dois em cada três
discursos feitos na Câmara e no Senado.
É salutar a crítica parlamentar a iniciativas como a do Supremo Tribunal
Federal quando legitimou a multiplicação de partidos — hoje são 35 com
registro oficial, embora não se conheçam 35 ideologias. Da mesma forma,
há coerência nos protestos contra a judicialização da saúde. O óbvio, ululante, evita-se reconhecer: o avanço da judicialização e do
ativismo dos juízes decorre da omissão dos outros Poderes.
Caso exemplar é o da controvérsia sobre a prisão em segunda instância. O
Judiciário por muito tempo adotou o princípio como válido. Na década
passada, mudou o entendimento. Em outubro de 2016, voltou a legitimar a
prisão de réus condenados após julgamento em colegiados. Desde o início deste ano há uma pressão relevante para que o Supremo
julgue a questão pela quarta vez. Agora a motivação é o nome na capa do
processo: Luiz Inácio Lula da Silva, líder do PT, condenado a 12 anos e
um mês de prisão por corrupção. [o Poder Legislativo não pode ser responsabilizado pelo Supremo Tribunal Federal não valorizar suas próprias decisões - até um analfabeto sabe que o vai e vem, a mudança constante de opinião é indecisão e esta quando praticada pela instância máxima do Poder Judiciário estabelece a INsegurança Jurídica.]
Na semana passada, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, anunciou uma
intervenção do novo Congresso, via emenda constitucional, para resolver a
questão da prisão em segunda instância. Cabe perguntar: por que o
Legislativo já não o fez?
[resposta óbvia: por medo do Poder Judiciário = pavor, temor, etc - como ficaria o Congresso se decidisse de uma forma que não agradasse aos supremos ministros e, estes ofendidos, decidissem de forma monocrática ou coletiva desautorizar o Congresso, revogando a qualquer pretexto a Lei promulgada?
Não é uma divagação absurda;
há algum tempo um ministro do STF decidiu retirar um parlamentar em pleno exercício do mandato, regularmente eleito presidente da Câmara dos Deputados, da função de presidente da Câmara.
Por faltar amparo legal para executar sua decisão ele criou um: criou a inexistente figura da punição SUSPENSÃO do mandato.
Deputado com MANDATO SUSPENSO não pode exercer função privativa de parlamentar - FIM DE PAPO.
Disse 'fiat lux' o mandato foi considerado suspenso, o parlamentar expulso da função de presidente e acabou-se.
Ninguém, ousou contestar a suprema decisão.]
Cabe, ainda, arguir as razões pelas quais os partidos se tornaram
plantonistas nos protocolos do Judiciário, usando-os em conflitos de
toda natureza, inclusive em temas naturais, peculiares, regimentais e da
prerrogativa da Câmara e do Senado.
Como não existe vácuo em política, o espaço aberto pelo Legislativo
acaba sendo ocupado pelos demais Poderes. Veja-se o caso do Orçamento da
União. Elaborá-lo e fiscalizá-lo é razão da existência, o que define o
papel republicano do Legislativo — como exemplifica, com extremo zelo, o
Congresso dos Estados Unidos.
No caso brasileiro, os parlamentares se restringem ao carimbo na
proposta do governo ou do Judiciário, com inserções episódicas, em geral
patrimonialistas. Há pelo menos vinte anos debate se o tópico dos supersalários na Justiça
e no Ministério Público. Até hoje não houve uma decisão legislativa. Em boa medida, as críticas dos políticos à judicialização e ao ativismo
judicial servem de biombo aos interesses de políticos e de partidos, que
transferem o ônus das decisões a juízes dispostos ao protagonismo.
Editorial - O Globo