A privataria com o Sírio no Canecão
É deboche ceder terreno da UFRJ para Sírio-Libanês - Conceder terreno da UFRJ é debochar da História
Cozinha-se no andar de cima do Rio de Janeiro a possibilidade de
concessão do terreno da Universidade Federal (UFRJ), onde funcionou a
casa de shows Canecão, na boca do túnel que leva a Copacabana, para a
instalação de uma filial carioca do Hospital Sírio-Libanês. Seria a privataria debochando da história. No século passado, quando o Rio tinha a elite médica do país, a
Faculdade de Medicina da Universidade do Brasil funcionava ali perto e
grandes doutores como Oswaldo Cruz, Paulo Niemeyer e Ivo Pitanguy
associavam sua fama à medicina pública.
A essa época a Faculdade de Medicina de São Paulo começava a crescer,
associada ao seu Hospital das Clínicas (público). Do HC irradiou-se uma
competência que ajudou a produzir hospitais como o Sírio, o Albert
Einstein e a Beneficência Portuguesa (BP). No Rio, o Hospital da
Clínicas claudica há mais de 50 anos e a grande medicina privada ficou
para trás, junto com a pública. Conceder o terreno da Canecão ao Sírio, ou a qualquer hospital de
endinheirados, é debochar da história. Se o Sírio entrar no negócio e
quiser fazer um hospital para atender sobretudo a pacientes do SUS,
parabéns.
Se a universidade precisa de dinheiro, deve conceder o terreno a quem
pagar melhor. Se um hospital abonado precisa de espaço, pode comprá-lo,
onde bem entender. Fora disso, é pura privataria, lustrando a medicina
de quem pode pagar, à custa do patrimônio da Viúva. O andar de cima do Rio ressente-se da falta de um bom hospital, mas deve
resolver esse problema no mercado. A plutocracia de São Paulo, como a
de Nova York, tem bons hospitais porque patrocinou-os.
O Sírio nasceu na casa de Adma Jafet, o Einstein teve o amparo da
comunidade judaica e de Joseph Safra. A Beneficência foi a menina dos
olhos do bilionário Antônio Ermírio de Moraes. Quando o Memorial
Sloan-Kettering de Nova York precisou de mais terreno, John D.
Rockefeller Jr. doou-o. Quando precisou de mais dinheiro, ele veio de Alfred Sloan e Charles Kettering. Eram dois magnatas da General Motors.Qundo a GM acabar, eles serão lembrados pelo hospital.
Eremildo, o idiota
Eremildo é um idiota e durante dez anos foi filiado ao sindicato dos
garçons, sem nunca ter entrado num restaurante. O cretino exultou com
uma recente decisão do Tribunal de Contas da União. Os doutores decidiram que se um cidadão formou-se em direito e durante
dez anos pagou suas anuidades para a Ordem dos Advogados do Brasil sem
jamais ter contribuído para a Previdência, esses dez anos contam como
tempo de serviço, caso ele tenha se tornado um magistrado e queira se
aposentar.
Eremildo tem certeza de que os doutores do Tribunal de Contas não
quiseram criar uma gambiarra para favorecer juízes e acredita que eles
poderão estender o benefício aos garçons e aos sapateiros. Afinal, o
dinheiro da contribuição de garçons e sapateiros ajuda a pagar a
aposentadoria dos juízes.
Recordar é viver
Em 1976, no regresso da comitiva de uma viagem do presidente Ernesto
Geisel à Inglaterra, os militares de um avião de apoio não queriam que a
Alfândega inspecionasse as bagagens dos passageiros e, por isso, os
agentes da Polícia Federal não queriam carimbar seus passaportes. Um oficial deu voz de prisão a três agentes e o avião taxiou para a área da Base Aérea do Galeão, onde se deu o desembarque.
Elio Gaspari, jornalista - Folha de S. Paulo e O Globo