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sábado, 11 de novembro de 2023

A doutrinação do Enem - Carlos Alberto Sardenberg

O Globo

O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) tem prova de interpretação de texto. Em tese, não importa o conteúdo do texto apresentado aos alunos, pois eles não são chamados a concordar ou discordar. 
Apenas a entender o que o autor quis dizer.

A prova seria neutra, portanto. Mas, sendo assim, parece razoável que os testes, principalmente quando tratam de política, sociologia, economia ou História, tragam diferentes visões teóricas. Dupla neutralidade. Não é o que se viu no último Enem. Todos os textos revelam clara orientação de esquerda, não raro de uma esquerda velha.

A questão 61 da prova branca apresenta um texto de Michel Foucault, filósofo francês, sofisticado pensador de sucesso nos anos 1970 e 1980. Difícil leitura, mesmo para universitários. Mas a frase do Enem não é das mais complicadas. Afirma que o capitalismo introduz ilegalidades em todas as camadas da sociedade. Mas as classes privilegiadas desfrutam ilegalidades mais proveitosas, digamos assim. De qualquer modo, capitalismo é igual a ilegalidade.

Seguem-se questões com base em textos de outros dois filósofos franceses do século passado, Sartre e Merleau-Ponty. Foram pensadores de esquerda, mas na prova do Enem as frases não têm contexto político direto. A questão 46, do filósofo marxista alemão Theodor Adorno, também do século passado, não deixa dúvidas sobre a orientação. Sustenta que, no capitalismo, a diversão é o prolongamento do trabalho. E, se o trabalho é explorado pelo capital, como entender a diversão?

A questão 60 traz um texto que ataca a “mágica do Google Assistant” e sua inteligência artificial. 
Diz que seus trabalhadores são obrigados a tarefas repetitivas, sem poder expressar criatividade, forçados a horas extras sem remuneração e que ganham muito mal
Escravos dos algoritmos. O Google, gente? 
Quem já frequentou alguma das sedes da empresa vê exatamente o contrário: pessoas criativas, gerando programas e aplicações num ambiente de conhecimento e cultura. E ganham bem. Mais do que os trabalhadores das indústrias antigas, como uma montadora de carros. O futuro está nessa tecnologia, na inteligência artificial.

De novo, sei que não se pede ao aluno que concorde com o texto. Mas certamente deixa o estudante embaraçado topar com algo tão distante da realidade. Dificulta responder se conhece o ambiente da tecnologia ou se pretende trabalhar nele.

A campeã de esquerdismo velho é a questão 89, cujo texto sustenta que o agronegócio no Cerrado comete vários pecados, como a introdução da mecanização. 
É sério — a mecanização, base de ganhos de produtividade, é um mal. Tem mais: o agronegócio privatizou a “a água, as sementes, os minerais e as terras”. E levou à “pragatização dos seres humanos e não humanos”. E tudo isso para acabar com a vida dos camponeses.

A menção a camponeses chamou a atenção. Mesmo no pensamento de esquerda, não se usa mais esse conceito. Fala-se de trabalhador rural, pequeno produtor familiar. A fonte é um ensaio publicado na Revista de Geografia da UEG, que começa pela discussão do conceito de camponês. Baseado em teorias de Marx e Lênin!

Para entender o agronegócio do século XXI.

O aluno não é obrigado a concordar. Mas imaginem o desconforto de um jovem que more numa das tantas áreas do Brasil onde o agronegócio gera riquezas e intensa atividade econômica. Ele lê aquele texto e vai procurar onde está a pegadinha. Imagine o desconforto de um aluno que pretende frequentar alguma escola de agronomia, pois vê no noticiário que o Brasil sabe produzir alimentos para o mundo.

Há também questões que comentam positivamente a agricultura urbana no Rio. As hortas de apartamento no lugar da enorme produção do agro? A orientação da prova se mostra também pelo que não traz. Nada sobre democracia, liberdade de imprensa, direito de voto, valores individuais.

 Programa de governo? Bobagem 
 
Trata-se de um sutil truque de doutrinação. As questões estão num banco de dados do Inep, alimentado constantemente. Há de vários tipos. A escolha revela a orientação da prova. E essa orientação determina o que as escolas ensinarão. Trágico.


sábado, 22 de maio de 2021

AINDA É TEMPO DE SALVAÇÃO! - Percival Puggina

No último dia 15, vi esse bom povo rezar, cantar, valorizar em cartazes, gestos e aplausos, palavras que traziam calor à alma na tarde fria de Porto Alegre. Havia, na manifestação pela Família, alguns amigos pessoais, claro. Mas eu conhecia aquela gente toda pelo muito que temos em comum no pequeno e imenso repertório de afetos morais e espirituais que trazemos no coração.

Estávamos unidos por algo valioso e, sim, também contra perigos assustadores. Quando lhes falei, encerrando o evento, disse que no campo político, no lado oposto, cada palavra proferida ali no Parcão era objeto de escárnio e combate. Era execrado cada cartaz, bem espiritual, valor moral, anseio expresso, oração pronunciada. Difícil, no mundo moderno, imaginar antagonismo maior e conciliação tão impossível.

Engana-se quem pensa que as bandeiras vermelhas expressam mera opção política. Não! Trata-se de algo muito mais profundo, que envolve a destruição de toda uma cultura. E não é para substituir por outra superior, que seus filósofos, psicólogos, linguistas, juristas estão longe de esboçar, mesmo os mais eminentes. Pensam tão distantes do homem real que negam a própria Razão.

Por acaso, poucas horas antes de sentar-me para escrever este artigo, recebi da editora Avis Rara, o livro “Guerra Cultural” de Stephen Hicks. Nas primeiras páginas, engasgo a leitura diante da composição de duas frases. Numa, diz Michel Foucault: “A Razão é a derradeira linguagem da loucura”. Na outra, Jean-François Lyotard completa o abismo: “A Razão e o Poder são uma coisa só”.

Perceberam, queridos leitores, as consequências disso? De um golpe só todas as bibliotecas são derrubadas.  É a filosofia que nega a filosofia! Segundo ela, observar a realidade, buscar sentido, aplicar a inteligência ao objeto, ter razão, por fim, é opressão. Que dizer, então da Fé, da verdade, do bem, do justo, do belo?

Sigamos adiante com os semideuses das prateleiras universitárias. Eles nos levam pela mão àquilo de que nos querem afastar. Pense nas nossas salas de aula que motivam o desamor à pátria, no “pluralismo” excludente das universidades, no que aconteceu com a arte ao longo do último século. Pense nas notícias que chegam de toda parte sobre a total rendição dos educandários católicos, pense na acomodação e reacomodação da doutrina à falta de juízo da hora. Pense na fragmentação da sociedade, no modo como o poder é disputado, no que o Congresso vota, ou não vota, e no que STF decide, ou não. Pense na erotização das crianças, na ânsia pela liberação da maconha, nas prisões abertas, na culpa das vítimas e na inocência dos culpados. E vamos, assim, virando o mundo pelo avesso, usando a difamada Razão para estabelecer relações de causa e efeito.

Durante dezenove séculos, minha amada Igreja Católica foi a grande depositária e sustentáculo da cultura do Ocidente. Sua missão educadora e cultural andava lado a lado com a espiritual. Ao ceder aquelas, fragilizou esta. Ao exorcizar seus conservadores, foi à dança com os lobos. Por isso, o Brasil, com um governo que coloca Deus acima de todos, está no olho de um furacão de intolerância a evidenciar que não há lugar para Ele na destruição empreendida por seus adversários. Há dois anos, o Brasil mostrou não estar perdido. Não há uma carta de rendição sobre a mesa. Ainda é tempo de salvação.

Percival Puggina (76), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.