O Globo
Negociação da cessão onerosa teve bastidores tensos, com
influência de disputas locais nos estados e briga entre governos do Sul e
do Nordeste
O acordo fechado entre o governo, a Câmara e o Senado para aprovar a
Previdência embute não apenas recursos que serão distribuídos através de
emendas de parlamentares nos royalties futuros do pré-sal, mas também
uma trava no dinheiro que vai agora para os governadores. Os estados
ficarão com 15% do dinheiro que for arrecadado pelo leilão da cessão
onerosa, mas terão que usar os valores para financiar seu rombo
previdenciário.
Essa foi a equação política para resolver o conflito que vem desde o
começo da tramitação da reforma da Previdência, que é a falta de
disposição dos parlamentares de favorecer os governadores. Muitos
deputados e senadores são de grupos políticos diferentes dos atuais
administradores estaduais e, alguns deles, potenciais adversários nas
próximas eleições. Tanto na aprovação da reforma, quanto na distribuição
dos royalties do petróleo, bateu-se nesse mesmo impasse: como favorecer
governadores que podem neste momento estar em posição oposta à do
parlamentar que tem o voto no Congresso?
No caso da cessão onerosa a solução foi travar os recursos para
financiar a previdência dos estados, uma solução negociada entre as
lideranças do Congresso e que agradou à equipe econômica, embora não
resolva nada. Impede que os administradores expandam o gasto, mas ao
mesmo tempo o que os estados precisam é de fazer sua própria reforma
previdenciária. Os parlamentares foram atendidos porque terão direito a
participar nos futuros leilões do pré-sal da distribuição dos royalties. impressão no governo é que o acordo já está sacramentado, as arestas
estão aparadas e por isso será aprovada a reforma da Previdência sem
maiores sustos e desidratações. No mercado financeiro, contudo, a demora
da votação está repercutindo no câmbio. No Congresso, as negociações
continuam para aprovar a cessão onerosa, a divisão dos royalties e a
Previdência.
A área econômica do governo nega que isso seja a velha política. O
argumento é que é a política propriamente dita, porque se parlamentares
são representantes de suas regiões é natural que as defendam e queiram
fazer parte da escolha dos investimentos através das emendas. Por outro
lado, a disputa eleitoral divide os grupos de um mesmo estado. — Eles dizem para nós: por que vamos aprovar uma coisa que é para dar
mais dinheiro para os governadores que votam contra a reforma? —
explicou um integrante do governo. A mesma questão acabou levando a que os estados e municípios fossem
retirados da reforma logo na tramitação na Câmara. Alguns governadores
eram contra publicamente, mas torciam pela reforma para que a mudança
ajudasse a resolver o rombo previdenciário sem que eles tivessem que
pagar o preço político de brigar por ela. A solução de retirar os
estados foi ruim, mas o assunto foi parcialmente resolvido com a criação
da PEC Paralela que voltou a incluí-los. Mas essa PEC terá um longo
tempo de tramitação e está carregada de outras questões polêmicas.
Sobre as emendas parlamentares, a avaliação feita na equipe econômica é
que elas acabam fortalecendo os investimentos públicos que estão no
ponto mais baixo da história. Portanto, esse acordo para os futuros
leilões é considerado benéfico. Da mesma forma é visto como natural que
os estados produtores como o Rio tenham uma parcela maior do dinheiro e
que essa fatia saia dos recursos que iriam para a União.
O bastidor dessa negociação foi intenso, com os governadores defensores
da reforma brigando para que não fossem recursos para os que sempre se
colocaram contra. Uma espécie de Sul contra o Nordeste. Por fim,
prevaleceu o bom senso. Mas essa obrigação de que o dinheiro vá para a
previdência estadual não resolve o problema. Eles precisam fazer as suas
reformas para tornar seus sistemas de aposentadorias e pensões
sustentáveis. Houve também muitas disputas entre Senado e Câmara. O
momento mais difícil foi quando o Ministério da Economia deu o sinal de
que se eles aprovassem novas desidratações na reforma o governo federal
poderia reduzir o dinheiro a ser distribuído a estados e municípios.
Isso foi visto como ameaça de retaliação. A situação ficou tensa. Foi
preciso voltar todo mundo para a mesa de negociação para o acordo que
envolve petróleo e Previdência.
Blog da Míriam Leitão - O Globo - Com Alvaro Gribel, São Paulo