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terça-feira, 13 de março de 2018

A perda de prestígio da PGR no Supremo



Chegada da Lava-Jato mudou dinâmica entre os dois órgãos


Ao longo dos últimos anos, a Procuradoria-Geral da República (PGR) foi perdendo força no Supremo Tribunal Federal (STF). Cinco anos atrás, até a gestão de Roberto Gurgel, a mais alta Corte do país tinha o hábito de, no campo das investigações criminais, seguir as recomendações do chefe do Ministério Público Federal (MPF). Se chegava um pedido de abertura de inquérito, o ministro relator, ato contínuo, logo autorizava a investigação. Se havia parecer contra uma ação em plenário, a opinião do procurador-geral tinha peso de ouro.

Mas ventos de mudança sacudiram o STF recentemente – em especial a partir de 2013, quando Rodrigo Janot assumiu o comando da PGR e os processos da Lava-Jato passaram a chegar ao protocolo da Corte feito enxurrada. Os ministros passaram a questionar até pedidos de abertura de inquérito.  Em vez de atender de olhos fechados ao pedido da PGR, alguns pedem antes o depoimento do suspeito para saber se há elementos mínimos para sustentar a investigação. Já agiram dessa forma os ministros Gilmar Mendes e Luiz Fux. Para eles, o simples fato de responder a inquérito já implica em prejuízo para o investigado. O ministro Alexandre de Moraes, por sua vez, tem restringido os prazos extras que a PGR pede para concluir investigações que já estão abertas há anos.

Hoje, já com Raquel Dodge à frente do órgão, o STF continua dando menos privilégio à PGR. O episódio mais recente foi a quebra de sigilo bancário do presidente Michel Temer na semana passada. Em um documento enviado ao relator do inquérito, o ministro Luís Roberto Barroso, a Polícia Federal pediu a quebra das informações sigilosas. Barroso pediu a opinião da PGR. Uma atitude pró-forma, já que ele não seguiria o parecer e já estava convicto da necessidade de tomar a providência. Dodge foi contra a medida, mas Barroso não titubeou: com uma canetada, pediu acesso aos dados bancários de Temer de 2013 a 2017.

Note-se que não há mal algum na decisão. Se o juiz do processo considera a medida importante, é da atribuição dele decidir se quebra ou não o sigilo – seja do presidente da República, seja do cidadão comum. No entanto, a atitude é rara na história recente do STF. A praxe é a PGR pedir a quebra do sigilo e, com base nisso, o ministro autorizar a medida. Se não tem pedido da PGR, não tem quebra de sigilo.  Fazendo um corte no tempo, em 2006 o então procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, apresentou a denúncia do mensalão ao STF. À época, a Polícia Federal não tinha sequer terminado o relatório completo das investigações. A PF reclamou, mas isso não impediu o Supremo de receber a denúncia e transformar o inquérito em ação penal.

Naquele ano ainda vigorava a máxima de que a PGR era “a dona da bola” - ou seja, conduzia as investigações de forma absoluta. Se pedia a abertura de um inquérito, era atendida. Se pedia o arquivamento, também. A PF era tratada como mera polícia judiciária, aquela que coloca as diligências pedidas pela PGR em prática. Ultimamente, tem sido uma reclamação unânime no STF o tempo que a PGR e também a PF levam para concluir investigações. Sem as apurações concluídas, não é possível julgar ações penais. Sem julgar, não se pode punir. E, sem punir, os ministros ouvem da opinião pública a crítica de serem coniventes com os crimes do colarinho branco. Na semana passada, dos mais de cem processos da Lava-Jato no STF, 22 estavam com a PGR e 15 com a PF. A tarefa da PGR é indicar as diligências necessárias, ou apresentar denúncia, ou pedir o arquivamento por falta de provas mínimas. A PF precisa executar as diligências. Se nenhum dos dois atua, o STF fica de mãos atadas.

Essa exigência maior dos ministros do STF tem acirrado ainda mais as disputas entre PGR e PF – que foram levadas ao ápice na Operação Lava-Jato. Se na primeira instância as entidades trabalham em equipe, na cúpula do Judiciário não é bem assim. A diferença de procedimentos das duas instituições são gritantes e vieram à tona no episódio das informações secretas sobre as finanças de Temer.

Fato é que as funções definidas para as duas instituições são subjetivas – e, por isso mesmo, sujeitas a interpretações diferentes. A Constituição Federal diz que o procurador-geral da República “deverá ser previamente ouvido nas ações de inconstitucionalidade e em todos os processos de competência do Supremo Tribunal Federal”. Ouvido não significa atendido. A Constituição também diz que a PF tem o papel de “exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União”. O que não significa que seja somente isso.

O Globo
 

sexta-feira, 26 de maio de 2017

Como procuradores e juízes militantes, os tenentes não gostavam de políticos

REINALDO AZEVEDO - Folha de S. Paulo

O Brasil se tornou refém do "Tenentismo da Destruição". O país caminha para o abismo político, legal e institucional. Aparecerá alguém com um lume ao menos, a nos dar uma esperança, ainda que bruxuleante? Esse portador de alguma luz contra as trevas, creiam, era Michel Temer. Torço para que chegue ao fim do mandato. Mas não será fácil.

E o futuro? Até agora, o que vejo são pré-candidatos a cronistas das nossas angústias, com suas ligeirezas à direita ou à esquerda. Pergunta rápida, com resposta idem, dois dias depois dos atos terroristas protagonizados pelas esquerdas na Esplanada dos Ministérios: se não se fizer a reforma da Previdência agora, quem terá coragem de levar essa pauta para o palanque?

Salvo engano, foi Luiz Werneck Vianna, da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Rio, o primeiro cientista político a caracterizar essa era de procuradores e juízes militantes como um "novo tenentismo". Em vez do uniforme militar, a toga. O movimento de jovens oficiais de baixa e média patentes, na década de 20, teve importância capital na história do país. Dali saíram tanto o líder comunista Luiz Carlos Prestes como boa parte da elite fardada de 1964. A Revolução de 30 foi o primeiro golpe bem-sucedido da turma.

Também os tenentes, a exemplo dos procuradores e juízes militantes de hoje em dia, não gostavam de políticos, considerando-os meros agentes da corrupção. Também eles queriam refundar a República –tanto é assim que a ascensão de Getúlio Vargas marca o fim da dita "República Velha" e o início da "Nova". Também eles carregavam uma ânsia moralista autoritária. Para registro: três presidentes do ciclo militar tinham sido tenentes "revolucionários": Castello Branco, Emilio Garrastazu Médici e Ernesto Geisel.

Os tenentes de uniforme, no entanto, observou Werneck Vianna, tinham ao menos um ideário, uma pauta, como o voto secreto, o fim das fraudes nas eleições, reforma da educação pública etc. Havia até os que defendiam a liberdade de imprensa. Os tenentes de toga nada têm além do combate à corrupção. É evidente que é necessário. A questão é saber quantos crimes serão cometidos sob tal pretexto.

A tramoia contra Temer e o esforço para o STF decretar a prisão preventiva do senador Aécio Neves (PSDB-MG) são o epílogo da primeira etapa dessa destruição que consideram saneadora. Na segunda, prometem mais higienismo político. Afinal, como já sugeriu Deltan Dallagnol, a única reforma que realmente interessa é a do... combate à corrupção.

Fui vítima de uma violência, de um crime, que, por enquanto, segue sem criminosos. Conversas minhas, ao telefone, com Andrea Neves foram pinçadas em meio a milhares de gravações. Nada traziam, obviamente, de comprometedor. A PGR diz não ter nada com isso. A PF diz não ter nada com isso. A presidente do STF lembrou a agressão a um direito constitucional: o sigilo da fonte. Também nada com isso!

Então quem tem? Vai ver o culpado sou eu! O ministro Edson Fachin liberou os grampos sem nem saber o que lá iam. Jogou no lixo o Artigo 9º da Lei 9.296, que manda destruir o material que não interessar à investigação. Depois de uma reação de indignação como raramente se viu, pôs de novo parte dos grampos sob sigilo.

Os tenentes de toga acham que as leis brasileiras são garantistas demais e que, como é mesmo?, o "interesse público" deve estar acima de alguns fundamentos do Estado de Direito. Tudo, claro!, para combater a corrupção! É por isso que eles protestam com tanta veemência quando Eike Batista obtém habeas corpus no Supremo.

Afinal, esses paladinos da moral têm como exemplo de rigor um outro Batista, o Joesley!