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sábado, 23 de novembro de 2019

STF pode ajudar na inteligência financeira – Editorial - O Globo




Há chance de veredicto sobre sigilo reduzir insegurança jurídica no enfrentamento da corrupção

Embora seja formalmente um julgamento em que o Supremo avaliará o recurso extraordinário contra a quebra de sigilo fiscal, pela Receita, de um posto de combustíveis no interior de São Paulo, o processo ganhou ampla dimensão. A partir do voto do relator do recurso, ministro Dias Toffoli. 

Estão em foco, no voto de Toffoli, o Ministério Público; o ex-Conselho de Controle de Atividades Financeiras, rebatizado de Unidade de Inteligência Financeira (UIF); o Banco Central, em cuja jurisdição está a UIF, além da própria Receita. O peso deste julgamento aumentou quando Toffoli aceitou em julho pedido de liminar de advogados do senador Flávio Bolsonaro (PSL) contra o compartilhamento de dados de movimentações financeiras atípicas do filho do presidente da República, feito pelo Coaf, de quando ele ainda era deputado estadual fluminense. E estendeu a medida a todos os inquéritos semelhantes. Mais de 900. 

O posto paulista serve de mote para o Supremo tratar dos limites do avanço do Estado sobre a privacidade financeira da sociedade, questão vital na democracia. O julgamento se converte em balizador dos organismos de investigação, um aspecto estratégico no combate à corrupção. Além do mais, o caso terá “repercussão geral”, ou seja, definirá referenciais para os tribunais de todo o país. Ao começar a leitura do seu longo voto, na quarta, e que se estendeu ao início da sessão de quinta, Toffoli ressaltou que o processo nada tinha a ver com Flávio Bolsonaro. Inútil, até porque, sendo um caso de repercussão geral, atingirá todos os recursos desse tipo.

A pouca clareza do voto de Toffoli funcionou como estímulo a prognósticos negativos para o julgamento, do ponto de vista do crucial enfrentamento da corrupção. A sessão de quinta, porém, começou a afastar temores, mesmo que apenas só mais um dos nove ministros restantes tenha votado — Alexandre de Moraes. Há sinais de que não haverá um perigoso tolhimento dos organismos de fiscalização, mas a clarificação de regras para ordenar melhor o fluxo de informações entre eles, sem risco de ferir o preceito constitucional da privacidade.

Mesmo que o ministro Alexandre de Moraes possa ter parecido pouco rígido na graduação da remessa de informações (UIF/Receita) ao MP, há convergências entre sua posição e a do relator Toffoli em aspectos do rito a ser seguido neste circuito de remessa e recebimento de dados. Ainda é necessário definir se, além da Receita, objeto da reclamação, também serão incluídos no julgamento os demais entes que atuam no âmbito da inteligência financeira. Mas os votos do relator e de Moraes, junto a tendências conhecidas de outros ministros, indicam haver grande possibilidade de o combate à corrupção ser preservado, e com mais segurança jurídica. Sem que o Brasil se torne um pária por romper tratados de que participa para o combate à lavagem de dinheiro, instrumento usado pelo crime organizado dentro e fora do país.



Editorial - O Globo