Uma
troca de mensagens encontrada pela Polícia Federal sugere que
procuradores orientaram executivos da JBS a gravar por conta própria –ou
seja, sem autorização judicial– o momento da entrega de dinheiro a
pessoas que seriam delatadas pelo grupo comandado pelo empresário
Joesley Batista. Os diálogos ocorreram em um grupo de WhatsApp de
nome Formosa, provável referência à cidade natal dos irmãos Joesley e
Wesley Batista, em Goiás.
As conversas ocorreram em 4 de abril,
data em que os advogados da empresa participaram de uma reunião na sede
da PGR (Procuradoria-Geral da República) com Eduardo Pelella, chefe de
gabinete do então procurador-geral, Rodrigo Janot, e Sérgio Bruno, do
grupo da Lava Jato. Na ocasião, os sete executivos da JBS não
tinham se tornado oficialmente colaboradores da Justiça. O pré acordo de
colaboração premiada foi assinado em 7 de abril e a homologação saiu em
maio. No dia seguinte à troca de mensagens, em 5 de abril, o
executivo Ricardo Saud gravou, por conta própria, a entrega de R$ 500
mil para Frederico Pacheco, primo do senador Aécio Neves (PSDB-MG). A
gravação foi feita na sede da JBS, em São Paulo.
Esse foi o
primeiro de um total de quatro pagamentos combinados entre Joesley e
Aécio, completando R$ 2 milhões. Os repasses das outras parcelas foram
filmados pela Polícia Federal com autorização judicial. Participavam
do grupo de WhatsApp o ex-procurador Marcello Miller, a advogada
Fernanda Tórtima, Joesley, Wesley, Saud e Francisco de Assis e Silva,
advogado e delator. Os diálogos indicam pressa da PGR para fechar a
delação.
A sugestão de gravação por conta própria se dá por uma
avaliação de que a espera de autorização do STF poderia levar muito
tempo, principalmente porque a semana seguinte era de recesso (Semana
Santa). Além disso, uma mudança de datas para efetuar pagamentos poderia
causar estranheza a quem já sabia que receberia dinheiro.
AÇÃO CONTROLADA
As mais de 200 mensagens, às quais a Folha teve acesso, estavam no celular de Wesley, apreendido em maio. "Eles
acham que podem desconfiar se adiarem [os pagamentos pendentes].
[Procuradores] Acham que vcs podem fazer uma vez sozinhos gravando e
deixariam a controlada para a seguinte", escreveu Tórtima no grupo. Antes
dessas mensagens, a advogada, que estava em reunião na PGR, informou
sobre a vontade do órgão em fazer a ação controlada, que não seria para
"flagrante" e, sim, para produção de prova.
Assis e Silva então se
manifesta: "Tem que ver se o Ricardinho [Saud] topa com o Fred. Se
topar avisa". Em seguida, Saud responde: "Depois do que o chefe fez!!
Quem tem coragem de recusar qualquer ação! [Joesley gravou o presidente
Michel Temer] Tô pronto!!! Pode marcar amanhã às 11:30".
No dia da
conversa, Joesley estava nos EUA. A PGR precisava de um depoimento do
empresário, para formalizar um pedido de investigação ao STF. Joesley
voltou a Brasília no dia 6 de abril. No dia 7, a PGR deu entrada no
Supremo com pedido da ação controlada, antes portanto do recesso do
Judiciário. No dia 10, o ministro Edson Fachin autorizou as
investigações.
No dia 12, na primeira ação filmada com autorização
do Supremo, o primo de Aécio vai para mais um encontro com Saud, em São
Paulo. De lá, saiu com uma mala preta com R$ 500 mil. Em um relatório
da PF, há menção sobre a gravação do dia 5 de abril. "Não é demais
reiterar que o mencionado registro de áudio é fruto da utilização de
meios próprios pelos executivos da empresa, ou seja, sem qualquer
participação ou orientação da Polícia Federal, que até então desconhecia
absolutamente o caso", escreveu o delegado Thiago Delabary.