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quarta-feira, 12 de outubro de 2022

STF desrespeita as leis na hora que bem entende - O Estado de S. Paulo

 J. R. Guzzo

Quem ameaça a democracia, mais que qualquer outra força, é justamente quem passa o tempo todo falando em defender o regime democrático nacional 

O Brasil tem visto e ouvido quase todos os dias, nesta reta final das eleições de 2022, alertas abundantes e sucessivos sobre a importância de se cuidar da democracia; por mais relevantes que sejam as questões de governo que se colocam para os próximos anos, a manutenção do estado democrático de direito deveria ser a prioridade máxima do momento na vida política brasileira.  

De fato, o que está em jogo é a democracia – ou, para falar de maneira mais precisa, o sistema de direitos individuais, liberdades públicas e obrigação de se respeitar a lei que a Constituição Federal determina para a sociedade brasileira.  
Só que as advertências estão sendo feitas na direção errada. 
Quem ameaça a democracia, mais que qualquer outra força, é justamente quem passa o tempo todo falando em defender o regime democrático – o Supremo Tribunal Federal e o restante do alto judiciário nacional.
 
Não se trata aqui, absolutamente, de discordância com as sentenças que saem dos galhos de cima da justiça brasileira a reclamação de quem acha que as coisas devem ser de um jeito e fica frustrado porque o juiz decide que são de outro, como num jogo de futebol sem possibilidade de recurso ao VAR. O problema com o STF está nos fatos. 
 A leitura objetiva das suas decisões, estritamente isso, deixa patente que a Constituição e as leis do País estão sendo violadas em público e de forma permanente pelos ministros.  
Desrespeitar a lei ou colocar-se acima dela, usando para tal a força do cargo público, é o que se pode fazer de pior contra a democracia e é isso, desrespeitar a lei, que o STF está fazendo na frente de todo mundo e na hora que bem entende.
 
Por acaso seria legal censurar órgãos de imprensa, como o STF tem feito – diretamente ou através do seu TSE – sem qualquer tentativa de disfarçar o que faz?  
Qual a lei em vigor neste País que permite um juiz censurar um veículo de comunicação e suprimir a liberdade de expressão estabelecida na Constituição? 
Não há nenhuma possibilidade honesta de se achar que o STF tem o direito, ou a simples razão, a seu lado. Não tem. O resultado é essa aberração em estado integral que os ministros, e os interesses que os apoiam, colocaram em circulação na política brasileira: 
- dizem que corremos o risco de uma ditadura, e são eles que agem como ditadores na vida real. 
Desde quando, em qualquer país do mundo, alguém defende a democracia censurando a imprensa? 
Ou, então, mandando a polícia invadir às 6 horas da manhã as residências de cidadãos que um ministro acusa de estarem tramando ou golpe de Estado, por que leu alguma coisa a respeito no jornal?  
Ou mantendo preso sem culpa formada, e sem data para julgamento, um chefe político que é seu inimigo?
 
O STF mantém aberto um inquérito criminal perpétuo e flagrantemente ilegal
Ignora as prerrogativas do Ministério Público no processo acusatório; não respeita nem mesmo os seus pedidos de arquivamento das denúncias, por falta de provas. 
 
Exige que o governo responda a grotescos pedidos de “explicações” feitos por partidos políticos de esquerda, ou por meros oportunistas; 
não se sabe, aí, se são os oportunistas que manipulam a suprema corte do Brasil, ou se é suprema corte que utiliza os oportunistas para atacar o governo.  
É ruim num caso e no outro – e pior se forem as duas coisas ao mesmo tempo.
 
O STF se coloca na posição de vítima das “forças antidemocráticas”; reclama dos “ataques” que recebe (qualquer crítica ao tribunal e aos seus ministros é considerada como um atentado à democracia), e acusa os desafetos de estarem querendo criar uma ditadura no Brasil.  
Mas até agora é justamente o STF, no mundo dos fatos e das realidades, quem está agredindo objetivamente a democracia brasileira
 
Faz isso ao violar a lei, intrometer-se na campanha eleitoral e dizer que não aceita nenhuma contestação a qualquer das suas decisões eleitorais – não aceita de jeito nenhum, antes mesmo que a contestação tenha sido feita. Ou seja: segundo o STF, o sujeito perde a causa sem nunca ter tido a oportunidade de abrir a boca para explicar o que está pedindo
Defender a democracia, sem dúvida nenhuma, é algo muito importante neste momento. 
 
J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S.Paulo
 

sexta-feira, 9 de agosto de 2019

Um tostão furado de fumo podre - José Nêumanne

 O Estado de S. Paulo

O que Bolsonaro diz nada vale no minuto seguinte, seja por ignorância ou esperteza

[dificil entender como funcionam as cabeças dos supremos magistrados;
uma decisão contra uma autoridade que tenha foro especial, dependendo do nível, pode ir direto ao STF;
 mas, decisão contra um criminoso condenado, cumprindo pena e com outra condenação aguardando confirmação em segunda instância e mais uma dezena de processos penais, deve seguir o caminho normal - caso tenha fundamento, não tendo, arquivo;

Lula ia ser transferido devido uma decisão de primeira instância, sobre ela teria que se manifestar o TRF-4, que seria contestada no STJ e continuando a contestação iria ao STF.
Em teoria, réu preso tem prioridade. Qual o motivo do 'em teoria'? Simples, são tantas as ações travadas nas diversas instâncias, que qualquer bandido condenado teria que esperar uns dois anos até a matéria chegar ao Supremo.

No caso de Lula, o STF, 'em menos de 12 horas, a defesa do Presodentro Luiz Inácio Lula da Silva consiga o milagre de que o Supremo Tribunal Federal receba um recurso, [recurso enviado ilegalmente ao Supremo e, ilegalmente, recebido por aquela Corte Suprema] -  coloque em pauta e faça o julgamento?'
Lula atropela tudo e ainda endereça a petição para ministro de sua escolha - no caso Gilmar Mendes.]


Palavra de rei não volta atrás. Esse brocardo do velho regime monárquico sobrevive na boca do povo na República, mas nunca foi exigido dos ocupantes dos cargos mais altos do governo o compromisso inamovível da estabilidade que antes era um dever real.  No caso do Brasil contemporâneo, a instabilidade resulta da completa desmoralização do conceito de divisão dos Poderes cunhado pelo barão de Montesquieu ainda na vigência do Velho Regime, que antecedeu a Revolução Francesa, no século 18. O Legislativo se fortalece na situação de poder real sem a devida autorização constitucional para substituir o Executivo e este se dá ao desplante de violar a Constituição. O Judiciário exime os seus próprios mandatários do mais alto escalão de prestarem conta de seus deveres, jogando no lixo o mais pétreo de todos os conceitos da democracia: o da igualdade de todos os cidadãos perante o talante da lei.


No impeachment de Dilma Rousseff, um acordo entre os então presidentes do Senado, Renan Calheiros, e do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, mandou às favas o princípio constitucional da obrigação do chefe de Estado deposto de passar oito anos sem cargo público. Em nome do direito sagrado da petista a ser “merendeira da escola”, a ex-“presidenta” foi dispensada da obrigação constitucional, candidatou-se ao Senado por Minas e foi punida pelo eleitor com o último lugar na contagem dos votos.  O atual presidente do STF, Dias Toffoli, extrapolou muito suas funções ao decretar punição rigorosa da lei a qualquer cidadão que criticar publicamente os membros de sua grei. Do alto de sua delirante onipotência, ele indicou o colega Alexandre de Moraes para relatar o inquérito punitivo, sem sorteio nem consulta aos pares do plenário. No Brasil de hoje, decreto de presidente do STF não se discute, cumpre-se, como diziam os políticos de antanho em relação aos juízes em geral. O relator censurou a revista Crusoé por ter publicado notícia oficial considerada ofensiva à honra de el-rey.


O mundo desabou sobre Moraes e a censura caiu. Mas a decisão abusiva, monocrática e totalitária, com data de extinção prevista durante o infame “recesso branco” dos supremos magistrados, foi prorrogada até novembro. Em 1.º de agosto, agora mês de nosso maior desgosto, o inquérito 4.781 do STF ganhou novas e mais graves consequências. Decretou a condenação de qualquer cidadão que ouse insultar os supremos no velho e sagrado sigilo telefônico. E mais: suspenderá do cargo e do serviço público o servidor de Banco Central, Coaf e Receita Federal que fiscalizar movimentações financeiras da cúpula dos três Poderes. Nem do registro dos abusos de Nero consta ignomínia de tal jaez.


No Brasil, assim como a plebe assistiu ao golpe militar que gerou a República insana, só resta penar “bestializada” (apud José Murilo de Carvalho) sob arroubos tirânicos do advogado reprovado duas vezes em concursos para juiz de primeira instância. No Congresso, paralisado por seus próprios “malfeitos” (apud Dilma Rousseff), ninguém se arrisca a perturbar os deuses imperfeitos do raso Olimpo. Na Câmara, Rodrigo Maia, o Botafogo do propinoduto da Odebrecht, tem a autoridade moral de uma lesma para evitar esta assustadora, mas não surpreendente, tomada de poder pelos togados. No Senado, outra eminência do baixo clero, Davi Alcolumbre, não é besta de chamar a atenção para um Poder que acaba de perdoá-lo por eventuais traquinagens contábeis em eleição, depois do perdão majestático da rainha Rosa Weber.


Um bando de néscios da extrema direita, que se acham no poder porque têm acesso ao regente Carlos, por copiarem suas diatribes no Twitter, ainda acredita na iniciativa do chanceler Eduardo de fechar o STF com um jipe, um cabo e dois soldados. E na inocência do mano Flávio, coveiro da CPI da Lava Toga no Senado. É de matar de rir. Ou de chorar. Nesta entrada de oitavo mês de governo, o pai deles, Jair, já abusou da própria incapacidade de usar palavras no sentido certo. Não se sabe se é por ignorância ou se é por esperteza. Com o aval de Donald Trump, insiste na ideia de nomear o caçula Eduardo, embaixador em Washington. Não é nepotismo, pontificou. 

E Trump, em pessoa, ecoou. Rasguem os dicionários, queimem-nos em praça pública, a palavra que denuncia a prática incompatível na República (beneficiar parente com dinheiro público) virou hipocrisia. Assim como qualquer pessoa que considere alguém do STF passível de fiscalização tributária, o cristão que discordar do capitão e seus filhotes foi, é e será sempre hipócrita. Será insultado de hipócrita, por exemplo, quem não acha certo o clã ter nomeado 102 garrotes mamões das tetas da loba que nutriu Rômulo e Remo, fundadores de Roma. Trata-se de um recorde de não se orgulhar. Mas se o fato destoa, pior para ele. A “nova política” mata a “velha” de vergonha.


Jair assombrou a Nação dizendo que sente falta de um ministro “terrivelmente evangélico” no STF. Seu advogado-geral, André Mendonça, é o nome que cabe nesse susto. Pastor evangélico e fâmulo de Toffoli. Que importa que tenha dito que a vaga do decano Celso de Mello, a ser aberta em 11 meses, seria de Sergio Moro? Inspira-se em Michel Temer. Verba volant, este escreveu. As de Jair comem alpiste na gaiola.  Ele disse a senadores que queriam manter o Coaf na Justiça que na Economia as diretrizes de Moro seriam mantidas por Paulo Guedes. Mas agora pressiona o ministro da Economia para defenestrar Roberto Leone, presidente do Coaf escolhido pelo ex-juiz. O motivo da demissão seria sua crítica à decisão de Toffoli que, ao proibir o compartilhamento de dados da inteligência financeira, da Receita Federal e do Banco Central, com o Ministério Público e a Polícia Federal, beneficiou o primogênito Flávio.

Como dizia meu avô, a palavra do presidente não vale um tostão furado de fumo podre.

Blog do Nêumanne -  José  Nêumanne, Jornalista, poeta e escritor - Publicado na pág. A02 de  O Estado de S. Paulo


quinta-feira, 2 de agosto de 2018

A vergonha do cargo público



Nenhum cargo público deveria ser contaminado por qualquer mau exemplo dado por aquele que temporariamente o ocupa

Cargos públicos no Brasil, antes motivo de orgulho e prestígio, passaram recentemente a serem vistos por muitos com reserva e desconfiança. Se esse tipo de percepção se alastra e se consolida, a sociedade perde muito da sua capacidade de se organizar produtiva e socialmente. Os indivíduos mais qualificados tendem a evitar o serviço público.

A má reputação de alguns cargos públicos decorre, evidentemente, do mau exemplo no exercício da função, e não do cargo em si. A princípio, não deveria haver contaminação do cargo pelo seu eventual exercício. A menos que o cargo seja tão mal desenhado, do ponto de vista institucional, que apenas o seu exercício em dissonância com o interesse público seja possível. Nesse caso limite, cabe ao ocupante do cargo vir de imediato a público e explicitar tal fato. 

A ideia de dissociação entre o cargo e seu titular momentâneo pode ser melhor estabelecida após a resposta à seguinte indagação: de quem ou de onde decorre, em última instância, a autoridade para o exercício das funções associadas a determinada posição? Essa indagação foi usada por Santo Agostinho, por exemplo, para dirimir uma importante controvérsia na comunidade cristã iniciada no século IV. 

Em 312, Ceciliano foi eleito para o cargo de bispo de Cartago. A nomeação não foi aceita por aqueles que viriam a ser posteriormente denominados “donatistas”, que acabaram por eleger o seu próprio bispo, estabelecendo um cisma na Igreja Católica. Para os donatistas, sacramentos conduzidos por um clérigo pecador não teriam validade. E o ordenamento de Ceciliano se enquadraria nesse caso. 

Mais de 50 anos após a eleição de Ceciliano, Santo Agostinho foi confrontado com a questão donatista. Percebeu de imediato que aquiescer com tal tese traria grandes dificuldades, tendo em vista que todos os sacramentos conduzidos por Ceciliano e por aqueles a partir dele ordenados perderiam a sua validade.

Com sua enorme capacidade de prover racionalizações pragmáticas e de cunho cristão para fatos observáveis na prática, Santo Agostinho rebateu as ideias donatistas indagando publicamente sobre a origem do poder que emanava do bispado. Lembrou que o exercício da função eclesiástica derivava de uma concessão de Deus, e não dos homens. Logo, na sua visão o ordenamento de Ceciliano era válido, mesmo que tivesse sido conduzido, segundo os donatistas, por um suposto traidor da causa cristã. 

Estabelecia Santo Agostinho, com esse recurso à fonte original, uma clara independência entre cargos eclesiásticos e seus ocupantes.  Raciocínio congênere pode ser usado para dirimir controvérsias no caso de funções públicas. A questão nessa seara não apela ao raciocínio protoescolástico de Santo Agostinho, mas sim a uma tradição de pensamento ocidental que se inicia por Thomas Hobbes e John Locke e se consolida no conceito de democracia liberal.

Segundo essa visão, o poder para exercício de cada cargo público deriva, em última instância, da sociedade como um todo. A outorga popular, contanto que sujeita às normas sociais e às leis estabelecidas, confere legitimidade ao cargo e validade ao exercício dos atos a ele inerentes. Uma vez mais, estabelece-se, agora no contexto não teológico, mas sim da filosofia política, a independência entre o cargo e o seu eventual titular. Transplantada para o Brasil atual, essa visão implica que nenhum cargo público deveria ser contaminado por qualquer mau exemplo dado por aquele que temporariamente o ocupa. O cargo público é uma instituição que aporta, a seu ocupante, a honrosa possibilidade de servir à comunidade que o acolhe. Como tal, deve (o cargo) ser valorizado e respeitado.

Nomeações políticas sem contrapartida técnica sobrepõem de forma egoísta interesses de grupo sobre o interesse do todo. Desvios ou corporativismo no cumprimento da função, de forma ainda mais incisiva, têm o poder de afetar negativamente a imagem do cargo público. São fatos que minam fortemente a lógica construtiva aqui estabelecida e que, em função disso, devem ser fortemente coibidos.

N. da R.: Carlos Alberto Sardenberg, excepcionalmente, não escreve hoje
Rubens Penha Cysne é professor da FGV EPGE