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terça-feira, 9 de abril de 2019

Choque de acomodação - Paulo Guedes usa veia política que nega existir

Guedes está convencido de que se forma no país uma compreensão da urgência de mudança da Previdência


O ministro Paulo Guedes considera que as desavenças entre o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, e o presidente Bolsonaro são consequências de um “choque de acomodação” resultante da nova composição de forças políticas vitoriosas nas eleições de outubro, com a centro-direita tomando o lugar da centro-esquerda que governou o país nos últimos 30 anos. O que se viu ontem, no debate promovido pelo GLOBO e “Valor Econômico” dentro do projeto “E agora, Brasil?”, foi um ministro da Economia utilizando-se de uma veia política que ele nega existir, e um presidente da Câmara mostrando-se preocupado com a viabilização de aspectos econômicos dos projetos do governo.

Para Maia, uma visão do conjunto das reformas deve ser a prioridade na análise dos parlamentares, que poderão ser beneficiados com os avanços da economia, mas o governo tem que focar também na discussão do pacto federativo, uma consequência natural da aprovação da Nova Previdência. A campanha pela Nova Previdência, apresentada como combate aos privilégios, “com o guarda da esquina ganhando tanto quanto um general na aposentadoria”, parece estar dando certo, pois o nome do ministro Guedes foi aclamado em passeata neste fim de semana em São Paulo por grupos de apoiadores de Bolsonaro. [comentário: nada contra os garis, não tenho o completo do Boris Casoy, mas, fica dificil de entender quando Paulo Guedes diz que os atuais privilegiados com a reforma pretendida e os garis ficarão na mesma situação (os atuais privilegiados, fora algumas exceções, entre elas os criminosos que se tornaram anistiados políticos,  contribuíram com valores bem mais elevados do que os valores da contribuição dos garis);
 
outra coisa que a brilhante matéria parece esquecer é que no estágio atual não importa muito o que o povo pensa nem do que o país está convencido, agora o que vale é o voto dos parlamentares;
quanto a ideia que o Maia rejeita - parágrafo abaixo - é dificil acreditar em tal rejeição, afinal o Maia será um dos principais 'prejudicados' se o Bolsonaro fizer (o que esperamos que com as bênçãos de Deus ele fará) um bom governo.]

Paulo Guedes está convencido de que se forma no país uma compreensão da urgência de mudança do sistema, e ele não acredita que o Congresso vá decidir contrariamente à posição majoritária da população. O presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, rejeita a ideia de que muitos deputados, mesmo convencidos de que a reforma da Previdência é necessária, não darão tudo o que o governo pede apenas para não fortalecer politicamente o presidente Jair Bolsonaro, que se tornaria um candidato imbatível à reeleição se a economia deslanchar. Seria um contrassenso, argumentou, já que se a reforma trouxer o crescimento econômico, os que a apoiaram tirarão benefícios disso juntamente com o presidente Bolsonaro. Já Paulo Guedes ressaltou em mais de uma ocasião que o Legislativo sairá ganhando com as reformas, que darão ao Congresso o controle do Orçamento.

Ele disse que a aprovação de uma reforma parcial, aquém da redução de despesas de 1 trilhão de reais em dez anos que considera necessária para o equilíbrio do sistema, terá como consequência natural a necessidade de uma nova reforma mais adiante. E o abandono do projeto de capitalização, que considera a grande chance de as novas gerações prepararem um futuro por conta própria. Os que não tiverem condições de, ao final do tempo mínimo exigido para a aposentadoria, obter uma renda igual ao salário mínimo, terão a garantia do governo de complementação. Fazer uma reforma desidratada a esta altura pode dar um fôlego para o governo, mas aumenta a médio prazo a crise fiscal e o risco de uma crise institucional grave, ressaltou.

Guedes admitiu que está sendo difícil para o presidente Bolsonaro abraçar a reforma da Previdência, pois ele sempre votou contra quando era deputado. Mas garante que ele tem uma visão muito clara de que agora, presidente do país, precisa olhar para o conjunto do povo brasileiro, e não a defesa de corporações, como fazia quando as representava como deputado. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, admitiu que as diversas corporações pressionam os deputados e senadores em defesa de seus interesses, mesmo quando eles vão de encontro às necessidades do país. Mas acredita que já existe uma compreensão maior da importância da reforma.

Rodrigo disse que, no entanto, desistiu de ajudar na coordenação política para angariar os votos necessários para a aprovação da emenda constitucional depois que o presidente Bolsonaro decidiu que seu governo não seria um presidencialismo de coalizão, em que o governo atuava em conjunto com o Parlamento. Ele reafirmou que é favorável à reforma, mas não tem mais a responsabilidade de ajudar a formar a maioria. Apesar de dizer que aceita e compreende a escolha do presidente, Maia revelou descontentamento com o que chamou de mal-entendido provocado pela discussão que teve com Bolsonaro recentemente, o que provocou uma reação dos bolsonaristas pelas redes sociais. “Não tenho vocação para mulher de malandro”, afirmou.
 
 
 

terça-feira, 2 de abril de 2019

O governo, visto por Guedes

Acaba de completar três meses no centro do poder em Brasília um sonho de antigo militante do liberalismo. “Eu sou de Marte, cheguei agora, estou olhando”, disse a meia centena de senadores, semana passada. Tentava amenizar as relações com o Congresso — onde o esporte predileto sempre é falar mal do governo.  Paulo Guedes, ministro da Economia, enriqueceu com o Plano Real, e guarda eterna gratidão aos formuladores: “Foi o plano monetarista mais brilhante que já vi: juros na lua... Foi muito generoso comigo. Eu tinha o meu banco... Foi muito generoso.”

Eis o panorama, visto da sua janela: “Lá fora (do país) perguntam: ‘A democracia está em risco?’ Eu: ‘De jeito nenhum, mudou o polo de gravidade, para o outro lado’... Apesar de ser alguém que estava com vocês aí (parlamentares) há 30 anos, era considerado como um antiestablishment.” “Foi uma aliança em torno de valores” —acrescenta —, “e mais uma aliança com liberais. Virou uma espécie de aliança de centro-direita. No combate da eleição, se definiu: ou é esquerda ou é centro-direita, o que é uma simplificação. No fundo, a gente sabe que não é isso. No fundo, a gente sabe que um social-democrata bem centrado está muito próximo de um liberal-democrata. E eles estão muito longe dos extremos. Seja da extrema direita ou da extrema esquerda.”

Acabara de tomar um susto com a aprovação de emenda constitucional na Câmara em dois turnos e em uma hora —, tornando obrigatórias mais despesas orçamentárias. “Foi uma exibição de poder político.” Outro sobressalto ocorreu ao suspeitar que seria tratado como adversário pelos próprios aliados do PSL de Bolsonaro ao explicar-lhes a reforma da Previdência. “É um choque de acomodação”, contemporiza.

Talvez. Batalha maior, permanente, acontece dentro do governo. De um lado está um presidente crédulo nas virtudes da concentração de poder. De outro, há um ministro da Economia empenhado “em tentar formar uma liberal-democracia”. Por ironia das urnas, são prisioneiros das próprias convicções.
 
José Casado, jornalista - O Globo