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terça-feira, 8 de março de 2016

Crise política joga a economia no chão

Aumenta a fragilidade do governo Dilma, de que petistas se afastam e a oposição deseja o fim, enquanto medidas não são tomadas até por falta de base parlamentar

A atual crise econômica, em marcha batida para ser a mais grave da história, tem origem bem conhecida, apesar do discurso oficial que tenta responsabilizar problemas na economia mundial. Mas as causas básicas da atual turbulência são bem conhecidas e internas, originadas em erros crassos do tal “novo marco macroeconômico”, aplicado a partir do segundo mandato de Lula e aprofundado em Dilma 1.

É receita infalível para desarrumar qualquer economia despreocupar-se com as despesas públicas, mascarar a inflação com subsídios, baixar juros à base de canetadas, não perceber o fim de um ciclo de super oferta de crédito, e assim por diante.  As estatísticas liberadas sexta-feira pelo IBGE sobre o PIB no ano passado são dramáticas. E não apenas o índice geral do PIB, de um retrocesso de 3,8%, só superado pelos 4,35% negativos de 1990, reflexo do desvairado sequestro da poupança cometido pelo governo Collor. Há, ainda, a ameaça de a atual crise ser tão ou mais longa que aquela recessão, de quase três anos.

Vários números preocupam. Um deles, o da queda dos investimentos em 14,1%, a maior em cerca de duas décadas. Em relação ao PIB, as inversões chegaram no último trimestre do ano em 16,8%, aproximadamente três pontos percentuais abaixo do resultado em idêntico trimestre de 2014. Isso quando se sabe que para a economia manter-se crescendo, de forma sustentável, a um ritmo de 4%, os investimentos precisam chegar aos 25% do PIB. Assim, a recessão destrói empregos hoje, enquanto também compromete a ampliação do mercado de trabalho no futuro. Com isso, aumenta a possibilidade da volta da maldição da “década perdida", dos anos 1980.

Desta vez, com um fator político mais atuante para manter a economia no atoleiro. Pois a cada momento fica exposta a fragilidade crescente do governo Dilma, de que petistas se afastam e a oposição deseja abreviar o fim.


Petistas abominam a decisão de Dilma de rejeitar a proposta tresloucada de restabelecer o “novo marco”. Ela deve no mínimo intuir que a hiperinflação explodiria, enquanto o câmbio fosse para o espaço. Sequer as reservas de US$ 350 bilhões dariam conta de resistir ao tranco.

Mas, ao mesmo tempo, Dilma não avança, até por falta de base parlamentar, em mudanças essenciais para reverter a queda livre em que se encontram setores-chave: em janeiro, comparado com o mesmo mês de 2014, a indústria de bens de capital encolheu 35,9%, e a de bens duráveis, 28,2%.  Por isso, a Bolsa subiu e o dólar caiu quando circulou a notícia do depoimento coercitivo de Lula, na sexta. Os agentes de mercado deduzem que o lulopetismo no poder impede a aplicação da terapia adequada à crise. Também por isso, os investidores no setor real da economia se retraem. Poucas vezes ficou tão claro como um impasse político pode parar um país.

Fonte: Editorial - O Globo
 

quarta-feira, 4 de novembro de 2015

Um legado do lulopetismo

Não deveria espantar a projeção, publicada pelo Estado, de que 3,3 milhões de famílias que haviam chegado à classe C entre 2006 e 2012 farão o caminho de volta para a base da pirâmide até 2017. Também não deveria causar surpresa a previsão segundo a qual o PIB per capita brasileiro terá em 2020 o mesmo nível de 2010, afetando drasticamente o padrão de vida da festejada “classe média emergente”. Trata-se da confirmação das advertências que há tempos vêm sendo feitas a respeito da fragilidade dessa ascensão social, tratada na última década pelo governo petista como a prova do acerto de sua política econômica.

Em meio a uma recessão que promete ser longa e dolorosa, ficaram claros os erros grosseiros dessa política, em especial aqueles que arrebentaram as contas públicas em nome do assistencialismo travestido de redistribuição de renda e que construíram a tal “nova classe média” com base exclusivamente no aumento do poder de consumo, garantido pelo crédito farto que só existia em razão da conjuntura externa favorável. Na época de ouro do lulopetismo, no entanto, quem quer que ousasse apontar a vulnerabilidade dessa nova classe média era logo classificado de “pessimista” – ou, pior, inimigo do povo.

No décimo aniversário do Bolsa Família, em outubro de 2013, quando a tempestade que se aproximava ainda era confundida com chuva de verão, o ex-presidente Lula caprichou na retórica divisiva, atribuindo as críticas à política petista a uma certa “elite” incomodada pela “ascensão do pobre”. “O cidadão vai para o aeroporto, chega lá e vê a empregada dele com a família no avião, pegando o lugar dele. Eu sei que é duro”, discursou Lula. No mesmo embalo, durante a campanha de 2014, a presidente Dilma Rousseff disse que “33 milhões viajaram de avião em 2002, hoje são 113 milhões e, em 2020, serão 200 milhões” – algo que, segundo ela, “incomoda muita gente”.

Ao final de 2015, o sonho da classe C que viaja de avião se transformou no pesadelo dos pobres que mal conseguem pagar a passagem de ônibus para ir atrás de um emprego. “Estamos vivendo, infelizmente, o advento da ex-nova classe C”, resumiu o economista Adriano Pitoli, responsável pelo estudo da Tendências Consultoria Integrada que mediu o impacto da crise nessa faixa socioeconômica.

A pesquisa levou em conta uma projeção segundo a qual a economia deverá recuar 0,7% ao ano entre 2015 e 2017 e a massa real de rendimentos cairá 1,2% ao ano, ao mesmo tempo que o desemprego deverá chegar a quase 10%. Nesse cenário de dificuldades, emergem os problemas estruturais que tornam difícil para os que chegaram à classe C lá permanecer: baixa escolaridade, que limita a possibilidade de obter empregos de melhor remuneração; acesso a trabalho apenas no mercado informal, com escassa proteção social; e nenhuma poupança, já que, graças ao estímulo oficial ao consumo, a pouca renda acabou sendo comprometida integralmente na aquisição de bens, geralmente por meio de forte endividamento.

A situação calamitosa da economia afeta especialmente a base da pirâmide, mas será sentida em quase todas as outras faixas de renda. “É uma década perdida em termos de padrão de vida”, disse ao jornal Valor o pesquisador Armando Castelar, do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre-FGV).

E a perspectiva é sombria para os próximos anos: segundo o economista Antonio Corrêa de Lacerda, também ouvido na reportagem, o PIB per capita em dólares deve cair de US$ 11.566 em 2014 para US$ 8.490 neste ano e para US$ 7.900 em 2018. Isso significa que a renda dos brasileiros estará cada vez mais distante do padrão de países desenvolvidos – mesmo aqueles que enfrentam brutais dificuldades, como a Grécia, cujo PIB per capita é de US$ 21.682.

Esse é, pois, em resumo, um dos grandes legados do lulopetismo, que será sentido por gerações, e que só poderá ser superado por meio de uma grande mobilização nacional em torno de um projeto de país radicalmente distinto das fantasias irresponsáveis criadas por Lula e companhia bela.


Fonte: Editorial - O Estado de São Paulo