Bolsonaro é um ‘populista
perigoso’, diz professor de Stanford
Cientista político, que criou aula específica em
que aborda o populismo no seu curso sobre democracia, é um defensor
intransigente da Lava-Jato
Francis
Fukuyama está preocupado com o Brasil. [é bom que ele se preocupe; se preocupou com Trump, que ganhou e agora é presidente dos EUA;
tudo que o célebre intelectual defende, não vai em frente;
a esquerda teve sua oportunidade, mas, faltou competência. Agora é a vez da direita que vai mostrar que sabe governar e vai começar sua demonstração recolocando o Brasil nos trilhos da Ordem e Progresso.] O cientista político,
professor da Universidade Stanford, nos Estados Unidos, e um dos mais
célebres intelectuais de sua geração, incluiu o Brasil no rol dos países em que
ele vê o risco da ascensão de um representante do que chama de “Internacional
Populista”: políticos de extrema-direita com pouco ou nenhum apreço pela
democracia e que seduzem o eleitorado com promessas fáceis para problemas
complexos.
O impacto
das descobertas da Lava-Jato sobre a contaminação do sistema político, diz
Fukuyama, pode levar os eleitores brasileiros a optarem por alguém que prometa
ter mão de ferro contra a corrupção. Na semana passada, Jair Bolsonaro,
o intrépido deputado do PSC do Rio de Janeiro, tornou-se um dos personagens
sobre quem Fukuyama discorre na nova aula sobre populismo que, em tempos
de Donald Trump, decidiu incluir em seu tradicional curso sobre
democracia. Um dos expoentes do pensamento conservador, o professor é enfático
sobre Bolsonaro: “Seria um grande desastre se ele fosse eleito. Ele parece ser
um populista genuinamente perigoso”.
Em
entrevista ao GLOBO, em sua sala no Centro de Democracia, Desenvolvimento e
Estado de Direito, que dirige, em Stanford, Fukuyama criticou a proteção do
Congresso a Michel Temer, lamentou a falta de protestos contra a corrupção este
ano no Brasil, nos mesmos moldes dos que ocorreram em 2015 e em 2016, e, aos descrentes
sobre o futuro da democracia, fez um alerta: “As pessoas precisam entender que
a democracia depende delas. Precisam sair às ruas, protestar contra a corrupção
e se insurgir contra o populismo”.
Perto de
se completarem quatro anos de Lava-Jato, qual sua visão sobre a operação?
Eu tenho
sido em geral muito mais positivo sobre a operação do que alguns brasileiros e
mesmo observadores internacionais porque sei que não há muitos países com
Judiciários que consigam fazer a lei valer para todos. Na América Latina, isso
tem sido especialmente problemático. No Brasil, agora parece que todo mundo é
corrupto. Não acredito que isso seja algo novo. Acho que sempre foi desse
jeito. Pelo menos, agora você tem um sistema judiciário que está colocando
alguns deles na cadeia. E você tem a imprensa livre, que está fazendo um
trabalho muito bom, expondo a corrupção e apoiando o sistema judicial.
Eu tenho
conhecimento das acusações que políticos da direita e da esquerda fazem contra
o Judiciário, dizendo que há razões políticas por trás das acusações. E sei que
há críticas por influência política no Judiciário e por terem deixado Michel
Temer (no cargo). [sendo tão sábio, esse especialista deve conhecer a Constituição do Brasil e apesar de criticar a permanência de Temer no cargo, não havia forma de retirá-lo, esceto, rasgando a
Constituição Federal.] Mas tudo é relativo e, em relação ao padrão predominante na
América Latina, é bom o Brasil ter feito o que fez. O que eu considero perigoso
é que foi revelado um nível tão grande de corrupção que todos vão ficando
cínicos e podem pensar que não há como fazer a lei valer para todos e que é
necessária uma solução populista para acabar com o sistema e recomeçar tudo.
Isso é muito perigoso.
‘(Bolsonaro)
parece ser um populista genuinamente perigoso. Seu histórico mostra que ele não
defende a democracia’ Mas o mesmo
país que produziu a Lava-Jato tem uma corte eleitoral que ignorou provas e
absolveu o presidente e sua antecessora da acusação de financiamento ilegal na
eleição de 2014 e um Congresso que protegeu durante duas vezes o presidente de
acusações de corrupção. Esses recuos significam que políticos estão conseguindo
interromper as mudanças?
Esses
fatos constroem a narrativa de que o Judiciário tem uma atuação política, e
isso é perigoso, porque a Justiça só funciona se as pessoas acreditarem que ela
é imparcial. Eu entendo o cálculo de muitas pessoas da direita e de
observadores internacionais de que Michel Temer está fazendo reformas
importantes e que, se ele for para a cadeia, todo o sistema vai parar, nada
mudará e não haverá progresso. Essas pessoas estão dispostas a aceitar,
portanto, a falta de prestação de contas de um governante. Eu não acho que esse
raciocínio seja bom, porque é preciso que o Judiciário seja visto como
imparcial e acredito que absolvê-lo mine essa sensação.
Na
introdução do seu último livro (“Political order and political decay”, ainda
não lançado no Brasil), o senhor descreve os protestos de junho de 2013 como
manifestações anticorrupção e por melhores serviços básicos. De lá para cá,
tivemos protestos de massa em 2015 e em 2016, em parte contra a corrupção, em
parte contra o PT. Entretanto, não houve grandes protestos em 2017, quando os
escândalos atingiram o PSDB e o PMDB. Por quê?
Isso é
muito ruim. Quando os protestos começaram, contra corrupção e por melhores
serviços públicos, ganharam publicidade e passaram a ser vistos como protestos
contra Dilma Rousseff e contra Lula. [não se tornou uma questão ideológica; apenas era público e notório, exceto para alguns especialistas, que os ladrões eram Lula e Dilma e por isso os protestos passaram a ser contra a dupla maldita.] Isso foi muito ruim porque, se o foco
tivesse continuado a ser contra a corrupção, brasileiros de diferentes posições
no espectro ideológico estariam dispostos a apoiar. Uma vez que se tornou uma
questão ideológica de direita e esquerda, você retomou a antiga divisão
ideológica brasileira. Por isso também é ruim você não ter mais políticos de
direita sendo presos, como o atual presidente, ou pelo menos o processo contra
ele prosseguindo, porque teria tornado tudo mais equilibrado e deixado claro
que isso não é contra um partido, mas contra toda a classe política envolvida
em corrupção. [mais uma vez o especialista tenta enganar os incautos ao manifestar interesse que mais políticos de direita sejam presos e sabemos que a maioria dos acusados e denunciados são da esquerda; o especialista acaba de sugerir a criação da prisão para equilibrar vertentes ideológicas;
o que não surpreende já que o Brasil criou a prisão preventiva para substituir a prisão perpétua.]
A última
pesquisa presidencial no Brasil (do Ibope, publicada no último domingo) mostrou
Lula à frente das pesquisas, com 35%, e Jair Bolsonaro em segundo lugar, com
13%. Como o senhor vê essa previsão?
O mais
problemático é o apoio a Bolsonaro. Ele parece ser um populista genuinamente
perigoso. Seu histórico mostra que ele não defende a democracia e que está
usando esta oportunidade para tomar o poder. Seria um grande desastre se ele
fosse eleito. Mas acho que isso reflete um crescente cinismo em todo o espectro
eleitoral de que todos os políticos são ruins e de que você precisa de uma
figura forte que vai consertar todos esses problemas. Isso nunca funciona. Se
você opta por políticas de mão de ferro, você acaba numa ditadura e em
violações de direitos humanos. O Brasil não precisa desse recuo. O país já teve
uma experiência dessas quando os militares comandavam o país, e não acho que
ajude voltar a esse tipo de governo.
‘O Brasil
precisa se tornar capaz de processar uma pessoa (Lula) que, embora tenha
beneficiado os pobres e criado programas sociais, violou as leis’
- Francis
Fukuyama Professor
de Stanford
E Lula,
mesmo condenado por corrupção, em primeiro lugar?
É muito
ruim, porque de novo é a ideologia prevalecendo sobre o combate à corrupção.
Seus eleitores querem protegê-lo porque ele é visto como tendo sido bom para os
pobres. É compreensível. Mas o Brasil precisa se tornar capaz de processar uma
pessoa que, embora tenha beneficiado os pobres e criado programas sociais,
violou as leis.
Por que o
populismo está florescendo especialmente nesta segunda década do século XXI?
É
diferente em diferentes partes do mundo. O populismo na América Latina é
diferente do populismo europeu. Na Europa, é baseado naquela classe média que
sofre com a globalização e com a perda de empregos. Na América Latina, o
populismo é baseado nos pobres, que basicamente querem um governo forte que
possa dar serviços sociais e benefícios. Isso explica (Hugo) Chávez, (Rafael)
Correa e Evo Morales. Bolsonaro é um pouco mais complicado, porque ele vem num
período em que o populismo de esquerda está em declínio na América Latina. Ele
obviamente é um homem da direita. É um novo fenômeno, que remonta aos anos
1960, ao desejo de políticas de um punho de ferro.
Vamos ver se é uma tendência
ou não, porque o fato de ele conseguir 13% nas pesquisas não significa que ele
será eleito.
Em que
medida existe uma ligação entre populistas pelo mundo?
Há
algumas ligações entre o populismo europeu e o entorno de Trump. (Vladimir)
Putin deu um empréstimo para Marine Le Pen (da Frente Nacional, da extrema
direita francesa). Ela conversa com o holandês Geert Wilders (do Partido para a
Liberdade, de extrema direita). Trump gosta de Nigel Farage (ex-líder do
Partido da Independência do Reino Unido, de extrema direita). Steve Bannon
(ex-estrategista de Trump) gosta de todos eles. Eles se falam, compartilham
experiências. Há uma “Populista Internacional” em atuação hoje, o que torna
tudo ainda mais ameaçador, porque um apoia o outro.
O que o
senhor diria para os que estão pessimistas com o futuro da democracia no mundo?
Já
tivemos outros períodos ruins, obviamente os anos 1930 e depois nos anos 1970,
quando havia muito descontentamento com a vida nas sociedades democráticas. Mas
as democracias ajustaram suas políticas e elas conseguiram superar esses
momentos de crise, e eu suspeito que vamos fazer o mesmo agora.
Fonte: O Globo