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segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

“Pessoas que mijam de pé” - Gazeta do Povo

Vozes - Luiz Felipe Pondé

Gênero

Ativistas trans durante protesto na Espanha. - Foto: EFE / Daniel González

A bruxa está solta. Talvez devesse dizer "bruxe", para não ferir suscetibilidades progressistas. A verdade é que os debates de gênero estão atingindo níveis cada vez mais altos na escala do surto.  
Mesmo entres os progressistas, o pau (!!) come
Ou comem-se entre si como feras que se entre devoram dizendo que tudo é um benigno debate democrático.

Há muito que parte das humanidades, principalmente as de matriz americana, não serve para nada além de criar nichos temáticos que dominam os departamentos nas universidades e perseguem quem ousar ser um herege ou ousar dizer, por exemplo, a palavra "mulher" num ensaio.

Especialistas dirão que a expressão "pessoas que mijam de pé" permanece presa à matriz fascista da biologia. Mas, suspeito eu, a expressão "pessoas que menstruam" tampouco se libertou da mesma matriz maldita. Grande parte dos ensaios de humanidades hoje morre na segunda linha quando apresentam alguns desses sintomas, tipo "ilu isso", "ile aquilo" – você não sabe o que isso significa? Melhor para você. Não perca tempo.

O surto acadêmico ganha força porque tomou um espaço gigantesco entre essa categoria de inúteis chamados de "subcelebridades" – que vivem de engajar gente das redes para falar de nada ou mesmo de celebridades, a moçada do mundo artístico que nunca se destacou como gente que entende a realidade para além de seus fãs, suas letras musicais ou peças teatrais. Opinião é a coisa mais fácil de se dar, mesmo sobre nada.

Seguindo o espírito democrático de uma linguagem inclusiva, proponho que, para além de banir a palavra machista "mulher", que trai sua dependência semântica com esse território fascista chamado biologia, passemos a usar a expressão "pessoas que mijam de pé" no lugar do termo patriarcal "homem". Assim, incluímos homens biologicamente homens e mulheres trans que porventura mijem de pé.

Especialistas dirão que a expressão "pessoas que mijam de pé" permanece presa à matriz fascista da biologia. Mas, suspeito eu, a expressão "pessoas que menstruam" tampouco se libertou da mesma matriz maldita. Se avançarmos na investigação dessa herança semântica maldita da influência da matriz biológica reacionária, podemos tropeçar em outros exemplos.

Que tal "pessoas com útero" no lugar de mulher? Ou "pessoas com próstata" no lugar de homem? A diferença é que há um claro aspecto de visibilidade nas expressões "pessoas que menstruam" e "pessoas que mijam de pé" – tanto sangue quanto xixi pingam, aliás, como dizia Nelson Rodrigues (1912-1980) com relação ao desejo: "O desejo pinga".

Útero e próstata são órgãos visíveis apenas com o auxílio de procedimentos de medicina de imagem, o que poderia levar a dúvidas céticas quanto à autodeclaração dos indivíduos em questão. Será que você é mesmo portador de um útero ou de uma próstata?   
Melhor permanecer no âmbito do que pinga. 
Aliás, continuando na esfera de Nelson, dizer que o desejo pinga significa dizer que o desejo não seria uma entidade metafísica, mas sim, líquida e submetida à gravidade, como o sangue menstrual e o xixi.

Enfim, surtos são entidades infinitas nas suas manifestações linguísticas. Não precisa ter formação em Lacan (1901-1981), psicanalista francês que adorava truques de linguagem, assim como o filósofo Heidegger (1889-1976), que também inventava dialetos alemães inexistentes, para perceber que esses excessos identitários são tentativas de criar novos significantes – olhe no Google – para que crianças passem a nascer "faladas" por esses significantes.

Assim sendo, quando você nascer, seus paisou algo similar – já "falarão de você" como "pequena pessoa que menstruará" ou "pequena pessoa que mijará de pé"
Claro que ainda permanecerá a maldição fálica freudiana de que as pessoas que mijam de pé o fazem desde crianças, enquanto que as pessoas que menstruam só o fazem quando entram na puberdade.

Mas esse detalhe temporal, biológico, diferencial e patriarcal, seguramente gerará muito espaço para mestrados, doutorados, bolsas, seminários, concursos com cotas, enfim, todo um novo nicho em que o surto semântico contemporâneo com relação à velha tara humana com o sexo seguirá seu curso histérico.

Nesse terreno, as escolas são as câmaras de tortura das crianças, e os pais, os idiotas que aplaudem.

Luiz Felipe Pondé, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


domingo, 25 de abril de 2021

Nas firulas do processo, todos livres - Carlos Alberto Sardenberg

Sessão de análise, você diz: sonhei com fulano/a, e não foi um sonho erótico.

Danou-se. O/a analista já sabe: foi erótico. É clássico. Vários ministros do STF que votaram pela anulação das condenações de Lula, imediatamente acrescentaram: atenção, não vale para os demais casos.  Ou seja, vale. Ou pode valer, já que aqui o direito parece ser ainda mais subjetivo e fluído do que a análise psicanalítica, freudiana ou não.

Está na cara que todos os condenados com algum ponto de conexão com os casos de Lula – e praticamente todos têm – vão reclamar os mesmos julgamentos. Se a 13ª. Vara de Curitiba é incompetente para Lula, por que não seria para os demais membros da quadrilha denunciada pela Lava Jato e condenada em três instâncias? Pior ainda: pode surgir dessa última decisão do STF uma tremenda confusão, cujos beneficiários serão os réus – e seus advogados, claro.

Digamos que o processo de Lula tivesse começado na Justiça Federal de Brasília, como entendem alguns ministros. A defesa do ex-presidente poderia entrar com HC no Superior Tribunal de Justiça alegando que a competência não estava em Brasília. O STJ poderia, então, mandar o processo para … Curitiba. E por que dizemos isso? 
Porque o STJ entendeu, há anos, que a 13ª. Vara era a competente para os casos de Lula. Ou seja, se tivesse começado em Brasília, o STF teria argumentos para anular tudo e mandar para a capital do Paraná. Ou para São Paulo.

Reparem: crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, do tamanho que se viu, são praticados em diversos lugares ao mesmo tempo. O dinheiro foi roubado em contratos superfaturados com a Petrobras, cuja sede fica no Rio. Esse dinheiro circulou pelo sistema financeiro internacional e viajou pelo país inteiro, financiando desde triplex e sítio, que ficam em São Paulo, até campanhas eleitorais do PT em todos os estados, mas centralizadas em Brasília.

Ou seja, há argumentos para se sustentar a competência em muitos lugares. Tanto é assim que, para alguns ministros, o caso Lula deveria ficar em Curitiba, para outros, em Brasília ou em São Paulo. E tem quem ainda não saiba. Esse é um ambiente propício para os advogados da turma da Lava Jato avançarem no terreno que dominam: o das formalidades, dos detalhes técnicos secundários, das firulas processuais. Falam em devido processo legal. Na verdade, trata-se de evitar a discussão dos fatos objetivos se houve ou não corrupção e lavagem de dinheiro – para arrastar os processos indefinidamente.

Reparem de novo: o STF não disse que triplex e sítio não foram dados a Lula, por empresas corrompidas com a Petrobras. Disse que o caso deveria ser reiniciado em Brasília, talvez em São Paulo, talvez . . .Tudo considerado, é, sim, toda a operação Lava Jato que pode ser desmontada – nas firulas processuais – como o foi a Castelo de Areia. E se, na próxima semana, o STF decidir pela suspeição de Sérgio Moro, o fim é certo.

Claro, os ministros dirão: só vale para Lula. Sim, claro, só para Lula, dirão, às gargalhadas, os advogados dos demais condenados, quando estiverem comemorando no grupo.

Oportuno ler em conjunto com: a culpa é do STF 

Coluna publicada em O Globo - Economia 24 de abril de 2021