A
declaração ocorre após mais uma semana de tensão. Na terça-feira, o
general foi convocado para uma reunião ministerial no Palácio do
Planalto. Ao fim, o primeiro escalão do governo se perfilou no alto da
rampa, junto a Bolsonaro, para acompanhar um desfile de blindados em
frente à Praça dos Três Poderes. Entre eles, estava Nogueira. Militares
quatro estrelas ficaram desconfortáveis em vê-lo no evento. [será que os quatro estrelas, ou algum deles, procurou a jornalista para falar desse desconforto? ou a jornalista perguntou? ] Nem o
próprio comandante parecia à vontade na cena.
Não foi a primeira situação em que Nogueira ficou no meio de
interesses difusos de fardados e de Bolsonaro. Em maio, a cúpula do
Exército defendia a punição do general da ativa Eduardo Pazuello,
ex-ministro da Saúde, que participou de uma manifestação no Rio ao lado
do presidente, o que é proibido a militares em atividade. Bolsonaro, por
sua vez, agiu para blindar o ex-ministro, que acabou ganhando um cargo
Palácio do Planalto. O recado foi entendido, e Pazuello se livrou da
punição. O comando do Exército ainda impôs um sigilo de cem anos sobre o
processo administrativo de Pazuello.
Nogueira enfrentou outra
saia justa. Em julho, o ministro da Defesa, Braga Netto, preparou uma
nota oficial, assinada também pelos comandantes do Exército, da Marinha e
da Aeronáutica, para rebater críticas feitas pelo presidente da CPI da
Covid, Omar Aziz (PSD-AM). O texto oficial diz que as Forças Armadas não
aceitariam “ataque leviano às instituições que defendem a democracia e a
liberdade do povo.” Na ocasião, Nogueira estava em viagem ao Rio Grande
do Sul. O texto, apresentado a à distância, estava pronto para ser
assinado.
Esses
e outros episódios já foram debatidos nas reuniões de integrantes o Alto Comando, que têm se mostrado preocupados com ataques de Bolsonaro
às instituições. Ao final, generais estrelados, diante do momento de
tensão, reafirmaram apoio irrestrito ao comandante do Exército. O
argumento é que Nogueira não pode se opor ao presidente sob risco de
conflagrar uma crise no país.
Nogueira chegou ao topo do Exército quando seu antecessor, o general
Edson Leal Pujol, foi demitido junto com o então ministro da Defesa,
Fernando Azevedo e Silva, e os comandantes da Marinha e da Aeronáutica. O
argumento principal é que Bolsonaro queria uma relação mais próxima com
os chefes das tropas.
Descrito como afável, extrovertido e
sociável, Nogueira adotou a discrição como regra. Em aparições públicas,
calcula o tom das falas para não gerar conflito com o presidente e
tampouco parecer que referenda eventuais posições políticas. Na
estratégia de fugir de polêmicas, Nogueira deixou de usar o Twitter, um
dos canais prediletos dos apoiadores de Bolsonaro. A sua última
publicação ocorreu no dia 2 de abril, dois dias após ser anunciado no
posto mais alto do Exército. Essa postura o diferencia dos comandantes
da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista Junior, e da Marinha, Almir
Garnier dos Santos, que utilizam as redes sociais.
Nos bastidores,
porém, o comandante do Exército faz questão de sinalizar que está
aberto a conversar com todas as autoridades. Já recebeu o presidente do
Superior Tribunal de Justiça (STJ), Humberto Martins, e esteve com os
governadores Ratinho Jr (PSD), do Paraná; Paulo Câmara (PSB), de
Pernambuco; e Eduardo Leite (PSDB), do Rio Grande do Sul. Os dois
últimos são adversários políticos de Bolsonaro. Nogueira também já se
encontrou com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG). Nessas
conversas, segundo o relato de interlocutores, evitou comentários sobre o
presidente ou qualquer crise no país.
A reserva do general à exposição política do Exército já era
percebida por interlocutores do militar desde que ele estava à frente o
Comando Militar do Norte (CMN), em Belém. A divergência se acentuou no 7
de agosto de 2020, um dia antes de o Brasil superar a marca de 100 mil
mortos pela Covid-19, quando Nogueira assumiu o Departamento-Geral de
Pessoal do Exército, a maior autoridade de saúde na Força. Na gestão,
adotou as recomendações da Organização Mundial de Saúde (OMS), incluindo
uso de máscara nos quartéis e distanciamento social. A adoção dessas
medidas era contrária ao posicionamento de Bolsonaro.
Em função
disso, o general não cogitava ser promovido ao comando do Exército. Até
mesmo porque à frente dele estavam os generais José Luiz Freitas e Marco
Antonio Amaro, atual chefe do Estado Maior, que havia sido chefe da
segurança da ex-presidente Dilma Rousseff. Segundo integrantes do
Planalto, Amaro foi preterido pelo passado de serviços à petista, e
Freitas por não ter proximidade com Braga Netto.
Quem conhece o
general mais intimamente diz que o ar reservado nas cerimônias ao lado
do presidente contrasta com o perfil extrovertido que o marca desde os
tempos da Aman, onde se formou em 1980. Natural de Iguatu (CE), PS, como
gosta de ser chamado, é filho de um funcionário do Banco do Brasil e de
uma dona de casa. Católico praticante, tem três filhos: dois majores do
Exército e um engenheiro. Na academia, o jovem de 1,82m e bom preparo
físico praticou atletismo e futebol. É torcedor do Ceará.
Na trajetória militar, o general foi três vezes instrutor na Aman, e
em uma delas como comandante do Curso de Infantaria. Ao menos dez turmas
de cadetes passaram por ele, o que faz com que Nogueira tenha
relacionamento com oficiais espalhados por todo o Brasil. Na prática, é o
comandante que tem as tropas nas mãos.