O Globo
Governo menospreza vacina por sua origem, seja chinesa ou paulista
Essa
birra está dando oportunidade a que Dória amplie o alcance de seu nome a
nível nacional, [ampliação favorável ou desfavorável?até agora ele está se tornando conhecido como "o homem da vacina enrolada".] prometendo vender as vacinas para outros estados, que
lutam para conseguir as doses que o governo central não teve capacidade
de garantir. A incerteza é tamanha que ontem, ao anunciar o calendário
para vacinação na cidade do Rio de Janeiro de pessoas acima dos 80 anos
em fevereiro, o secretário de Saúde Daniel Soranz avisou que as datas
dependem da chegada das doses das vacinas da AstraZeneca da Fiocruz, e
Coronavac do Instituto Butantã.
Nós, que não somos do primeiro
mundo, estamos arriscados a ficarmos sem vacina por um bom tempo, já que
a escassez de produção no mundo está obrigando a que várias mudanças
sejam feitas na entrega das doses, e na utilização das vacinas. [a União Europeia, a maioral do primeiro mundo, está tendo dificuldades com a vacina, imagine aqui. Fica dificil vender, sem pagamento antecipado, para um país cujo presidente não tem autonomia para decidir praticamente nada.*] Já há
países que pretendem dar apenas a primeira dose das vacinas, para
conseguir começar a imunizar mais cidadãos. Aqui no Brasil, esta
possibilidade foi aventada, mas o Instituto Butantan insiste em que as
doses da Coronavac devem ser aplicadas com uma diferença máxima de 15
dias.
A vacina da AstraZeneca pode levar até três meses entre as
doses, o que a torna mais atraente para o momento inicial da produção.
Mas a União Européia pode exigir que a farmacêutica inglesa não exporte
suas vacinas antes de garantir a vacinação nos países europeus. Isso
dificultaria a chegada das vacinas a países periféricos como o Brasil.
Vem da Alemanha também a advertência de que a vacina da AstraZeneca não é
aconselhável para pessoas acima de 65 anos, o que, se confirmado pela
União Européia, pode causar problemas até mesmo por lá, onde já começou a
vacinação em alguns países com ela, justamente entre os idosos.
Além
de toda a trapalhada que o governo fez nas negociações e nas compras,
existe esse problema real, com a União Européia já ameaçando proibir a
AstraZeneca de exportar antes de servir aos países do continente. É uma
situação que não deveria ser assim, mas é. Quem tem mais dinheiro, leva.
Isso já se evidenciou no início da pandemia, quando respiradores e
material médico foram disputados em leilões onde os países mais ricos
levaram vantagens.
Devido à inépcia do governo, estamos nas mãos
de duas farmacêuticas produtoras de vacinas, embora existam várias
outras sendo aplicadas no mundo. A vacina da Pfizer, por exemplo, foi
recusada pelo governo brasileiro sob a alegação de que as condições para
a venda eram inaceitáveis. [*]A vacina está sendo aplicada em diversos
outros países, e possivelmente as condições são as mesmas. Só seria
cabível a decisão de recusar a vacina se tivéssemos certeza de que a
farmacêutica alemã não exigiu de outros países que assumissem os riscos
de efeitos colaterais, livrando-a de processos judiciais. A FIFA também
fez essa exigência para a realização da Copa do Mundo de 2014, e o
governo brasileiro aceitou. [governo? os ladrões do pt?]
A política correta seria comprar
qualquer vacina que estivesse à mão, desde que aprovada por organismos
internacionais de controle reconhecidos no mundo. Tivemos uma negociação
mal feita e pretensiosa, achando que o mercado brasileiro seria
atraente. Ora, o mundo tem 7 bilhões de pessoas e os mercados dos EUA e
da União Européia são muito maiores do que o nosso, sem contar a China e
a Índia. Há mais demanda que oferta, e, portanto, não temos margem de
barganha em compras que custam vidas.
Foram erros de estratégia,
de negociação e de avaliação, porque o governo não teve, nem tem, a
dimensão exata da crise, que vai se aprofundar nos próximos meses,
enquanto continuamos com uma vacinação muito lenta e precária, o que faz
com que o vírus se espalhe mais rapidamente, especialmente a nova
variante encontrada em Manaus.
Merval Pereira, jornalista - O Globo