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sábado, 12 de novembro de 2016

E a despetização do Estado?

Michel Temer completou seis meses à frente da Presidência da República – parte desse tempo foi interino. Nesse semestre presidencial, inicialmente, organizou um ministério para obter a aprovação no Senado do impeachment de Dilma Rousseff. Abrigou diversos partidos. E estabeleceu um amplo arco de alianças chegando até a incluir àqueles que, na Câmara dos Deputados, votaram contra a autorização da abertura do processo, como Leonardo Piccianni, que recebeu o ministério do Esporte.

O espírito conciliador de Temer garantiu o recebimento do processo pelo Senado algo que não seria necessário, segundo o artigo 52 da Constituição, mas que acabou sendo uma exigência do STF. Posteriormente, o processo e julgamento decorreram de forma tranquila, tanto no Senado, como nas ruas. A tensão ficou dentro do limite do aceitável. E a aprovação do afastamento definitivo de Dilma ocorreu sem traumas. Dessa forma, Temer estabeleceu uma eficaz estratégia e desarmou conflitos que poderiam ter ocorrido. O isolamento dos apoiadores do projeto criminoso de poder foi tão grande que o País recebeu com alívio a posse definitiva de Temer na Presidência, no final de agosto.

Contudo, se no período de interinidade poderia ser justificável a conciliação, hoje não é plausível que ainda haja em importantes cargos e funções de governo representantes da herança maldita petista. O trabalho de despetização do Estado mal começou – o que não é um bom sinal. Em empresas e bancos estatais, petistas e seus asseclas continuam mandando – e sabotando o novo governo. Fechar os olhos para esta realidade não resolve o problema. Cabe ao presidente ordenar um levantamento cuidadoso – e são milhares, tanto no Brasil, como no exterior.

Estabelecer uma nova forma de gestão passa necessariamente pela indicação de nomes identificados com os apoiadores do processo de impeachment. Se a formação do ministério teve a sua razão de ser, em maio, hoje é um impedimento para o estabelecimento de um governo republicano. Não foi efetuado um inventário – ainda que breve – do que foi encontrado após 13 anos de petismo. Qual a razão de, ao menos, o BNDES não ter divulgado e aí não cabe sigilo bancário – um empréstimo danoso aos interesses nacionais, como o da reforma do porto de Mariel, em Cuba?

Em empresas e bancos estatais, petistas e seus asseclas
continuam mandando – e sabotando o novo governo


Por: Marco Antonio Villa, historiador
 

quinta-feira, 14 de julho de 2016

Ilusões à toa

A despeito da existência de dois ou três favoritos, o resultado da eleição prevista para hoje na Câmara é imprevisível. Tudo ali é incerto. Exceto duas constatações que, de véspera, já sustentam as análises do dia seguinte. Ambas surradas de tão repetidas e previsíveis.  Uma parte do princípio de que o quase cassado Eduardo Cunha continuará influente caso seja eleito um deputado “ligado” a ele. Como se entre os aspirantes com chance de vitória houvesse algum que possa se dizer inteiramente “desligado” dele. Cunha foi eleito em fevereiro de 2015 com 267 votos, batendo três concorrentes no primeiro turno.

Chegou à presidência da Casa com o apoio explícito dos partidos ao qual são filiados os principais oponentes da disputa atual e a torcida implícita do PSDB, hoje prometendo votos a Rodrigo Maia (DEM-RJ), cujo partido foi entusiasta da eleição de Cunha pelo mesmo motivo dos tucanos: impor derrota ao PT.   Na ocasião, o partido de Rogério Rosso (PSD-DF) ficou com o petista Arlindo Chinaglia, mas logo o deputado hoje tido como um dos favoritos viria a integrar o grupo do novo presidente. Marcelo Castro (PMDB-PI), lançado ontem pelo partido do presidente em exercício antes de ter sido ministro de Dilma, é correligionário de Cunha.

Portanto, no quesito que uns usam para desqualificar os outros, o cenário une os rotos aos esfarrapados, pois o hoje renegado chegou a viver dias de quase unanimidade na Câmara. Sobre o mito da manutenção do poder por trás das cortinas não há muito a dizer além de apontar o vazio de uma tese que parte de premissa errada, transforma um ator no irrecuperável ocaso de carreira em astro digno de Oscar no papel principal. Cunha é rei posto. Será cassado, provavelmente preso, e tal como outros que já mandaram muito mais que ele no País, sentará praça no ostracismo na companhia de seus advogados. O polo de poder em relação ao Legislativo voltará a ser o Palácio do Planalto. Ainda mais nessa situação em que o presidente não será alguém de grande capital político. Basta ver a lista dos candidatos.

Isso quer dizer que o governo dará boas-vindas ao novo rei, seja ele quem for. A recíproca será verdadeira, voltando a vigorar a tradicional relação de dependência (às vezes afetiva e sempre pragmática). Neste ponto chegamos ao segundo tema das análises previsíveis referidas no início. Diz respeito à expectativa de que a saída de Eduardo Cunha de cena possa dar ensejo a modificações dos meios de modos da nossa política tão antiga. É preciso ter claro: Cunha não é causa; antes é consequêncianão a única – daqueles notórios maneirismos. Não inventou a troca de apoio por benesses nem mesmo pode ser apontado como o responsável pela ascensão do baixo clero ao cardinalato. Quem inverteu essa correlação de forças internas foi Luiz Inácio da Silva ao institucionalizar o armazém depois conhecido como mensalão. Ali as nulidades ascenderam à condição de divindades, piorando bem o que já vinha ruim há muito tempo.

Creditar o defeito coletivo a Cunha é alimentar falsas expectativas para depois constatar que não foram atendidas
. Lamentável informar, mas ainda não será agora nesse mandato-tampão. Talvez a partir de 2019 quando, e se, na eleição do ano anterior ao menos a parcela mais consciente da sociedade resolver abandonar a atitude de repúdio à política – primo-irmão da alienação – e fizer a sua parte.  Negócio da China. Convém lembrar: o deputado eleito hoje será, na prática, o vice-presidente a exercitar a interinidade logo após a resolução do impeachment quando Michel Temer, caso efetivado, irá à China em sua primeira viagem internacional.


Fonte: Dora Kramer - O Estadão