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quarta-feira, 17 de julho de 2019

O dinheirinho fácil das palestras - Elio Gaspari



Folha de S. Paulo - O Globo

A empresa concebida por Dallagnol tirou da sombra um promíscuo mercado de mimos do andar de cima 


Deve-se ao procurador Deltan Dallagnol a exposição do próspero mercado de palestras de autoridades. Em 2018, o doutor recebeu cerca de R$ 300 mil como servidor e planejava a criação de uma empresa de palestras e eventos que poderia render R$ 400 mil. Dallagnol cobrava R$ 35 mil por aparição. Como servidor público, recebia mais ou menos isso por um mês de trabalho. Como celebridade, ganhava a mesma coisa num só dia.

Ficou feio para Deltan, mas ele nada fez de novo, apenas decidiu surfar num mercado onde misturam-se fama, favores e fetiches. O ex-presidente Barack Obama cobra US$ 400 mil por uma palestra de 90 minutos. A porca torce o rabo quando o palestrante (horrível palavra) é um servidor do Estado ou é um cidadão cuja relevância deriva da sua exposição pública no trato de assuntos políticos ou econômicos. Jornalistas, por exemplo. Essa circunstância ganha peso quando o valor da palestra equivale ao salário mensal do convidado. Há empresas, sobretudo do mundo do papelório, que oferecem uma bandeirada de R$ 30 mil.

Ninguém pode ser penalizado pela fama que tem, mas quando um magistrado, procurador ou parlamentar é convidado para dar uma palestra por R$ 30 mil, deve desconfiar da benemerência de seu patrocinador. As mensagens de Dallagnol mostram que uma instituição convidava palestrantes (argh!) oferecendo-lhes R$ 3 mil, o que pode ser um valor razoável, mas ele sugeria ao ex-procurador-geral Rodrigo Janot que cobrasse R$ 15 mil, pois estimava que seu cachê estivesse em R$ 30 mil.

Essas quantias são um dinheirinho fácil. Palestras e eventos, sobretudo aqueles que acontecem em aprazíveis balneários, transformaram-se em mecanismos de confraternização do andar de cima. São boas ocasiões para fazer amigos e influenciar pessoas. Dallagnol concebeu uma empresa que pertenceria à sua mulher e à do seu colega Roberson Pozzobon. Óbvio, pois eles não poderiam ser os donos, mas receberiam pelas palestras ou cursos que ministrassem. Nas suas palavras: “Se fizéssemos algo sem fins lucrativos e pagássemos valores altos de palestras pra nós.” Novamente, ele não inventou essa roda.

Há uma curiosa coincidência no plano de Dallagnol. A ideia da empresa ocorreu-lhe em dezembro, dois meses depois da assinatura de um acordo da Petrobras com o governo americano e um mês antes do fechamento de outro acordo da empresa com o Ministério Público do Paraná. O acerto colocava R$ 1,2 bilhão na caixa dos procuradores para que organizassem uma fundação destinada a incentivar “entidades idôneas, educativas ou não, que reforcem a luta da sociedade brasileira contra a corrupção”.

O mimo das palestras leva a um beco que parece não ter saída, pois não se pode impedir que alguém queira pagar para ouvir o que outra pessoa tem a dizer. Também não se pode exigir que alguém fale por uma hora e meia e receba apenas um cafezinho. O nó pode ser desatado. Basta que o convidado coloque na rede todas as palestras que faz, indicando quem pagou e quanto recebeu. Isso poderia ser obrigatório para servidores públicos em atividade e facultativo para os demais bípedes.
[inclusões - talvez algumas nos tornem Eremildo, o idiota, mas, vamos a elas: 
- vez ou outra ser tentado a pensar em fazer algo errado é inerente a qualquer ser humano - bem como comentar com alguém de sua confiança. Não passando do pensamento, do bate papo, não é crime;
- a empresa pensada, conversada, não saiu do pensamento e do papo - não foi fundada;
- o objetivo da ex-futura possível empresa era legal - lei nenhuma proíbe e o CNJ e CNMP, autorizam tais palestras.
IMPORTANTÍSSIMO: mesmo não sendo ilegal, nada garante que o tal diálogo ocorreu - nada garante a autenticidade de todas 'conversas' divulgadas e cuja obtenção foi produto de crime.
 
- finalizando,  com uma de Eremildo: dinheiro recebido por palestras é renda e deve ser declarado ao Fisco - exigir declaração a outra fonte é incabível, apesar de no Brasil tudo ser possível, tanto que se paga IR sobre salário.]

Folha de S. Paulo - O Globo - Elio Gaspari, jornalista

 


 

sábado, 31 de março de 2018

Barroso: ordem de serviço prova palestra e valor astronômico. Constituição proíbe que juiz receba dinheiro de um órgão público

Vejam este documento. Já volto a ele.

[para não perder tanta sabedoria, se espera que o ministro Barroso não adquira o mesmo pavor de ministrar palestras  que o malfeitor Lula  adquiriu.

Lula aceita qualquer negócio, menos exercer o ofício de palestrante.

R$ 46.800,00 por uma única hora/aula de palestra.]

Eu não sei o que levou Roberto Barroso, ministro do Supremo e candidato a Catão do Leblon, a negar que tenha sido contratado pelo Tribunal de Contas do Estado de Rondônia para conferir uma palestra, recebendo, por isso, uma verdadeira bolada nesse ramo: R$ 46.800. A contratação foi feita sem licitação já que ele exibe notória especialização. Nem diga. A cada dia, eu o acho um especialista mais notável.


Quando começou a circular a coisa, o ministro falou com a jornalista Mônica Bergamo, da Folha. E assegurou: “Não tenho a menor ideia de que valor é este. É um valor completamente fora do padrão, fora do que eu cobro.”


É mesmo?demonstrei em post que o anuncio da dispensa de licitação para a contratação da palestra foi publicado no Diário Oficial. Isso só acontece quando tudo já está formalizado, com a devida concordância do palestrante.  Essa simples publicação já bastaria para evidenciar que existe a verdade, e existe a versão de Barroso.


Mas agora aparece a prova dos noves de que a contratação aconteceu, que o valor é mesmo aquele e que, bem, não havia como o ministro não saber. Parece que o doutor tentou levar a jornalista no bico, esquecendo-se de que a contratação por um órgão oficial deixa rastros que não podem ser apagados. E eles não se resumem ao DO.


O documento

Muito bem. Voltemos ao documento lá do alto. Já não é a simples publicação da inexigibilidade de licitação. Trata-se de uma ordem de serviço, que só é feita depois que o contrato está devidamente assinado. No caso, foi com a empresa “Supercia Capacitação e Marketing Ltda”. Não sei como o ministro é em capacitação. De marketing, ele é excelente.  O doutor foi, sim, contratado por um órgão público de Rondônia, que deve estar nadando em dinheiro, para conferir uma palestra sobre direito constitucional do "VIII Fórum de Direito Constitucional e Administrativo Aplicado aos Tribunas de Contas”.


No post anterior sobre o assunto, perguntei quem estava mentindo: o TCE, Barroso ou a empresa Supercia. Bem, os documentos provam que o TCE-RO pode errae na escolha dos palestrantes, mas mentindo não está. Tudo vai especificado, nos mínimos detalhes, na ordem de serviço.

Se Barroso não mentiu, então resta a hipótese de que a Supercia seja a mentirosa? Será? Enfiou a faca no TCE-RO e vai pagar para o palestrante muito menos, uma coisa bem mixuruca. Empresas que fazem intermediação de palestras cobram uma taxa. Será a da Supercia tão abusiva assim? Pode receber?
Com alguma licença poética, juízes acabam dando “palestras” e chamando isso de “magistério”.

O Parágrafo Único do Artigo 95 da Constituição define: Parágrafo único. Aos juízes é vedado:
I – exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de magistério;
II – receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo;
III – dedicar-se à atividade político-partidária.
IV – receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei;  (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)
V – exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração
 
Os R$ 46.800 da palestra do ministro me parecem chamar para o debate o Inciso IV do Parágrafo Único. Salvo melhor juízo, o TCE-RO é uma “entidade pública”, e o pagamento fere a Constituição

Barroso vai dar uma palestra sobre direito constitucional.

É bem verdade que ele é bastante criativo na área.  

Costuma ler o que não está na Constituição e ignorar o que está, a depender de sua vontade.



Mas por que ele disse o que disse a Mônica Bergamo.

Ao lado,  como ilustração, o pedido do TCE-RO para publicar do Diário Oficial o magnífico evento.

Blog do Reinaldo Azevedo 

Barroso foi, sim, contratado por R$ 46,8 mil pelo TCE de Rondônia; ele negou o fato em conversa com jornalista. Quem está mentindo?

...

Ah, sim: o ministro até pode conferir palestra remunerada? Uma horinha a quase R$ 50 mil, com dinheiro saído dos cofres públicos para um homem que se mostra um fanático da probidade?

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