Tenho gasto muito tempo acompanhando a altercação estabelecida entre o
presidente da República e o ministro Barroso. No resumo da pendenga,
Bolsonaro quer que os votos preservem existência material para eventual
recontagem ou auditagem. Barroso, malgrado estarmos quase isolados no
uso desse nosso tipo de urna entre as democracias do planeta, está
convencido de ser o sistema seguro e a impressora supérflua. [a pendenga é simples no supremo entendimento do ministro Barroso = a defesa das 'urnas eletrônicas' é coisa sua e trata o assunto na base do eu quero, eu decido, eu determino (comportamento que mesmo sendo de um ministro da Suprema Corte as vezes pode se tornar constrangedor, para quem o pratica = basta encontrar um presidente Bolsonaro na frente e que adote o NÃO ACEITO, NÃO CUMPRO, NÃO VOU.)]
O Congresso
Nacional já aprovou uma vez e, em outras duas ou três ocasiões, tentou
aprovar a urna com impressora, sempre esbarrando na oposição do STF.
Quem é irracionalmente teimoso nessa história?
O presidente que cobra
transparência ou o ministro que cobra confiança? [Considerando que a Justiça Eleitoral e o TSE são integrantes da administração pública e e a Constituição determina que no trato da coisa pública prevaleça a publicidade, por extensão, a transparência a resposta é óbvia.
Confiança é válida nos assuntos pessoais,assim como a birra, teimosia.etc...]
Em março de
2009, o Tribunal Constitucional Federal da Alemanha declarou
inconstitucional esse sistema de votação. Identificou “como maior
problema no voto eletrônico a falta de transparência e respeito à
natureza pública das eleições, dado que o eleitor estaria obrigado a
confiar de forma quase cega à tecnologia utilizada para a votação e
escrutínio.”(1) - O voto eletrônico é inconstitucional. Na Alemanha.
Como se vê, a questão é antiga e o apelo por maior
transparência não pode ser visto como sintoma de burrice.
Observe a
situação desde outra perspectiva. Você é eleitor de Bolsonaro. Assiste o
modo como seu candidato é antagonizado pelos três ministros do STF que
integram, também, o TSE.
Não se trata de simples desapreço não velado,
mas de antagonismo frontal, mediante emprego de frases e atitudes duras.
Alexandre de Moraes e Roberto Barroso fazem lembrar, por vezes, a dupla
Omar Azis e Renan Calheiros na CPI da Covid.
O ministro
Edsou Fachin, o tertius desse triunvirato, de hábito mais moderado ao
falar, em declaração de 17 de fevereiro, disse que uma das prioridades
da Corte durante o seu mandato como presidente será enfrentar as
“ameaças ruidosas do populismo autoritário” (2). Na sequência, falou em
“distorções factuais” (entenda-se fake news), “teorias conspiratórias” e
“extremismos”. Etiquetas oposicionistas bem conhecidas.[a situação com Fachin e Moraes no comando do TSE, será esquisita e pode complicar muito, por posturas que os dois adotam:
Vale dizer,
os três principais caciques rasgadamente politizados da Corte que
administrará e julgará a polarizada eleição presidencial deste ano põem
foco sobre um candidato e seus eleitores. Ou não? Coincidentemente, o
outro se credenciou, no STF, ao pacote de favores que o “descondenaram” e
o habilitaram a disputar a faixa presidencial.
Pergunto:
não seria medida de mínima sensatez e prudência atender os apelos do
presidente – e, principalmente, de milhões de eleitores – no sentido de
adotar uma nova camada de proteção e transparência, com a inclusão de
uma impressora nas urnas eletrônicas? Se Barroso quer o controle das
mídias sociais, se estas já não guardam senão pálida semelhança com o
espaço de liberdade e democratização que representavam, se as verdades
estatizadas pelas Cortes repercutem altissonantes na outrora grande
imprensa, quais as escarpas e grutas que restam para o pluralismo de
opiniões sem o qual a democracia fenece?
Desconfiança não se supera com arrogância e rotulagem.
Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto,
empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de
dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o
totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do
Brasil. Integrante do grupo Pensar+.