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quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022

ANTAGONISMO FRONTAL DO JULGADOR - Percival Puggina

Tenho gasto muito tempo acompanhando a altercação estabelecida entre o presidente da República e o ministro Barroso. No resumo da pendenga, Bolsonaro quer que os votos preservem existência material para eventual recontagem ou auditagem. Barroso, malgrado estarmos quase isolados no uso desse nosso tipo de urna entre as democracias do planeta, está convencido de ser o sistema seguro e a impressora supérflua. [a pendenga é simples no supremo entendimento do ministro Barroso = a defesa das 'urnas eletrônicas' é coisa sua e trata o assunto na base do eu quero, eu decido, eu determino (comportamento que mesmo sendo de um ministro da Suprema Corte as vezes pode se tornar constrangedor, para quem o pratica = basta encontrar um presidente Bolsonaro  na frente e que adote o NÃO ACEITO, NÃO CUMPRO, NÃO VOU.)]
 
O Congresso Nacional já aprovou uma vez e, em outras duas ou três ocasiões, tentou aprovar a urna com impressora, sempre esbarrando na oposição do STF. 
Quem é irracionalmente teimoso nessa história? 
O presidente que cobra transparência ou o ministro que cobra confiança? [Considerando que a Justiça Eleitoral e o TSE são integrantes da administração pública e  e a Constituição determina que no trato da coisa pública prevaleça a publicidade, por extensão, a transparência a resposta é óbvia.
Confiança é válida nos assuntos pessoais,assim como a birra, teimosia.etc...]

Em março de 2009, o Tribunal Constitucional Federal da Alemanha declarou inconstitucional esse sistema de votação. Identificou “como maior problema no voto eletrônico a falta de transparência e respeito à natureza pública das eleições, dado que o eleitor estaria obrigado a confiar de forma quase cega à tecnologia utilizada para a votação e escrutínio.”(1) - O voto eletrônico é inconstitucional. Na Alemanha.

Como se vê, a questão é antiga e o apelo por maior transparência não pode ser visto como sintoma de burrice.

Observe a situação desde outra perspectiva. Você é eleitor de Bolsonaro. Assiste o modo como seu candidato é antagonizado pelos três ministros do STF que integram, também, o TSE.  
Não se trata de simples desapreço não velado, mas de antagonismo frontal, mediante emprego de frases e atitudes duras. Alexandre de Moraes e Roberto Barroso fazem lembrar, por vezes, a dupla Omar Azis e Renan Calheiros na CPI da Covid. 
 
O ministro Edsou Fachin, o tertius desse triunvirato, de hábito mais moderado ao falar, em declaração de 17 de fevereiro, disse que uma das prioridades da Corte durante o seu mandato como presidente será enfrentar as “ameaças ruidosas do populismo autoritário” (2). Na sequência, falou em “distorções factuais” (entenda-se fake news), “teorias conspiratórias” e “extremismos”. Etiquetas oposicionistas bem conhecidas.[a situação com Fachin e Moraes no comando do TSE, será esquisita e pode complicar muito, por posturas que os dois adotam: 
- o ministro Fachin criou 'zona de exclusão' nas favelas cariocas = áreas em que a polícia não entra, seus helicópteros não podem sobrevoar; exceções que sejam autorizadas terão que ser autorizadas previamente - o que elimina o fator surpresa =condição essencial para o sucesso de operações policiais;
- o ministro Moraes é adepto de prender, até mesmo por supostas práticas que não são tipificadas como crimes - apoia suas determinações em interpretações criativas das leis e/ou crianção de figuras jurídicas inexistentes tais operações  = (com destaque para o delito continuado, o flagrante continuado. [ou flagrante perenemente possível, incompatível com mandato de prisão em flagrante.)]

Vale dizer, os três principais caciques rasgadamente politizados da Corte que administrará e julgará a polarizada eleição presidencial deste ano põem foco sobre um candidato e seus eleitores. Ou não? Coincidentemente, o outro se credenciou, no STF, ao pacote de favores que o “descondenaram” e o habilitaram a disputar a faixa presidencial.

Pergunto: não seria medida de mínima sensatez e prudência atender os apelos do presidente – e, principalmente, de milhões de eleitores – no sentido de adotar uma nova camada de proteção e transparência, com a inclusão de uma impressora nas urnas eletrônicas?                                  Se Barroso quer o controle das mídias sociais, se estas já não guardam senão pálida semelhança com o espaço de liberdade e democratização que representavam, se as verdades estatizadas pelas Cortes repercutem altissonantes na outrora grande imprensa, quais as escarpas e grutas que restam para o pluralismo de opiniões sem o qual a democracia fenece?

Desconfiança não se supera com arrogância e rotulagem.

Percival Puggina (77), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.