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sábado, 13 de janeiro de 2024

Justiça - Agora não se pode nem mais criticar a blasfêmia alheia - Thiago Rafael Vieira

Vozes - Gazeta do Povo


Crônicas de um Estado laico


A perseguição religiosa não para no Brasil, e parece que grande parte da mídia vibra quando um religioso é calado, como no caso que vamos comentar a seguir.

Em maio do ano passado, o IBDR emitiu um longo parecer sobre a sentença proferida nos autos da Ação Civil Pública 1068617-64.2015.8.26.0100, que tramitava no Tribunal de Justiça de São Paulo, e que opunha a ONG Abcds Ação Brotar Pela Cidadania e Diversidade Sexual e o deputado federal Marco Feliciano
A ação tratava da repercussão de um controverso evento ocorrido durante a Parada Gay de São Paulo de 2015, protagonizado pela ONG citada. Durante o desfile, a atriz Viviany Beleboni desfilou crucificada como Jesus Cristo, em um protesto contra a homofobia. 
Posteriormente, Feliciano usou seus perfis nas mídias sociais para expressar críticas associando a imagem da atriz a eventos anteriores, gerando polêmicas e ofensas. A ONG, sentindo-se difamada, buscou reparação por danos morais coletivos, requerendo uma indenização de R$ 1 milhão. Após uma reviravolta no parecer do Ministério Público, que inicialmente se posicionava contra a ação, o deputado foi condenado a pagar R$ 100 mil.

O caso prosseguiu com o recurso de apelação do deputado, resultando na transferência do processo para a Justiça Federal (no caso, o TRF3) e na apresentação de uma Reclamação Constitucional ao Supremo Tribunal Federal (STF). Nessa reclamação, Feliciano argumentou pela anulação da condenação com base em decisões vinculantes que protegem a liberdade religiosa, especificamente citando a ADO 26. A Procuradoria-Geral da República emitiu um parecer apontando deficiências processuais, mas o mérito ainda aguarda decisão do STF.

A parte dispositiva da ADO 26, da qual foi relator o ministro Celso de Mello, garantiu:
“A repressão penal à prática da homotransfobia não alcança nem restringe ou limita o exercício da liberdade religiosa, qualquer que seja a denominação confessional professada, a cujos fiéis e ministros (sacerdotes, pastores, rabinos, mulás ou clérigos muçulmanos e líderes ou celebrantes das religiões afro-brasileiras, entre outros) é assegurado o direito de pregar e de divulgar, livremente, pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, o seu pensamento e de externar suas convicções de acordo com o que se contiver em seus livros e códigos sagrados, bem assim o de ensinar segundo sua orientação doutrinária e/ou teológica, podendo buscar e conquistar prosélitos e praticar os atos de culto e respectiva liturgia, independentemente do espaço, público ou privado, de sua atuação individual ou coletiva, desde que tais manifestações não configurem discurso de ódio, assim entendidas aquelas exteriorizações que incitem a discriminação, a hostilidade ou a violência contra pessoas em razão de sua orientação sexual ou de sua identidade de gênero.”

    As liberdades religiosa e de consciência, fundamentais e vinculadas à dignidade humana, são reconhecidas internacionalmente e no ordenamento jurídico brasileiro

O direito fundamental à liberdade religiosa, conforme definido pela ADO 26, abrange, para as religiões abraâmicas, a repreensão de práticas consideradas heréticas, sacrílegas e blasfemas, tanto de forma privada quanto pública. A proteção constitucional à comunidade LGBTQIA+ não exclui a expressão pública da liberdade religiosa, abrangendo diferentes orientações, desde progressistas até fundamentalistas. Contudo, o paradigma estabelece um limite claro: o discurso de ódio, caracterizado por discriminação, hostilidade ou violência, sujeito ao critério trifásico de Norberto Bobbio, como sedimentado na jurisprudência brasileira, inclusive no STF – no caso, o RHC 134682, julgado na Primeira Turma em 2016, com relatoria de Edson Fachin:

“O discurso discriminatório criminoso somente se materializa após ultrapassadas três etapas indispensáveis. Uma de caráter cognitivo, em que atestada a desigualdade entre grupos e/ou indivíduos; outra de viés valorativo, em que se assenta suposta relação de superioridade entre eles e, por fim; uma terceira, em que o agente, a partir das fases anteriores, supõe legítima a dominação, exploração, escravização, eliminação, supressão ou redução de direitos fundamentais do diferente que compreende inferior.”

Contrariando relatos midiáticos, a Procuradoria-Geral da República não emitiu parecer contrário ao processo em si. O parecer abordou questões processuais, como a necessidade de uma “aderência material estrita” entre a demanda e o paradigma invocado. O mérito ainda será decidido pelo STF, mas, mesmo se o parecer for acolhido, o processo seguirá no Tribunal Regional da 3.ª Região para julgamento, podendo retornar ao STF. 
Quanto ao cerne do caso, surgem alegações de perseguição, levando a uma análise mais aprofundada sobre os motivos por trás desse episódio.
 
Liberdade religiosa e liberdade de consciência
As liberdades religiosa e de consciência, fundamentais e vinculadas à dignidade humana, são reconhecidas internacionalmente e no ordenamento jurídico brasileiro. 
Estas convicções profundas moldam a compreensão da vida e guiam as ações conforme os preceitos da fé e da consciência de todos. 
A Declaração Universal dos Direitos Humanos respalda essas liberdades nos artigos 2.º e 18, assegurando ao cidadão a capacidade de confessar sua fé e expressar suas crenças, proibindo a intervenção estatal que restrinja essa manifestação, princípio reafirmado pela Constituição brasileira. 
Esses valores, pilares duradouros nas nações civilizadas, não se limitam à adoração em locais sagrados, sendo a liberdade religiosa considerada a “Primeira Liberdade” de importância inquestionável. 
Sobre essa liberdade, Rui Barbosa disserta, em Secularização dos Cemitérios, que “de todas as liberdades sociais, nenhuma é tão congenial ao homem, e tão nobre, e tão frutificativa, e tão civilizadora, e tão pacífica, e tão filha do Evangelho, como a liberdade religiosa”.

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O direito à liberdade religiosa encontra-se expresso no artigo 5.º, incisos VI e VIII, da Constituição Federal. Nesse sentido, escrevemos em nosso livro Direito Religioso: Questões Práticas e Teóricas: “A dignidade da pessoa humana deve ser o norte da aplicação do Direito em nossa nação, sendo ele um dos fundamentos do Estado Democrático e da República Brasileira (art. 1.º, III, da CRFB/1988). Assim, todos os princípios constitucionais devem se confrontar com a dignidade da pessoa humana, para, então, conformarem-se com ela”.

A liberdade de consciência abrange as convicções mais profundas do ser humano, incluindo aspectos religiosos, morais, ideológicos, filosóficos e políticos, situando-se em uma esfera íntima inacessível a intervenções de entidades públicas ou privadas. Essa fortaleza é o cenário do encontro singular e decisivo do indivíduo consigo mesmo. Embora conectadas, a liberdade de consciência e a liberdade religiosa são distintas, sendo a primeira a expressão interna e a última, a externalização desse foro íntimo. Consciência e religião, inseparáveis, compartilham conteúdos interligados e convergentes.

A liberdade religiosa, vital para preservar a dignidade humana, reflete a identidade e perspectiva de vida, morte e além, fundamentando-se na escolha e adesão às crenças religiosas. Esta liberdade abrange todas as dimensões individuais, incorporando deveres para com dogmas religiosos. A verdadeira liberdade religiosa vai além da proteção à crença interna, incluindo a liberdade de expressar e praticar essas crenças, isto é, o exercício da crença, o action to belief. Restringir condutas religiosas expõe a liberdade religiosa a ameaças, comprometendo a autêntica expressão da religiosidade na sociedade e limitando a liberdade do indivíduo em agir conforme suas convicções religiosas.

A intolerância religiosa
Desrespeitar ou distorcer os valores e crenças de uma religião
, ou pior, silenciar sobre esses princípios é uma afronta à dignidade da pessoa humana e à liberdade religiosa. A fé, sendo intrínseca e fundamental para a identidade humana, naturalmente suscita sentimentos de ofensa quando desconsiderada. É crucial manter um equilíbrio respeitoso entre direitos quando um invade a esfera do outro, especialmente quando se trata do direito de crer, garantindo a preservação dos direitos fundamentais e a ordem democrática.

    Restringir condutas religiosas expõe a liberdade religiosa a ameaças, comprometendo a autêntica expressão da religiosidade na sociedade e limitando a liberdade do indivíduo em agir conforme suas convicções religiosas

No caso em questão, a expressão artística, ligada aos protestos contra a homofobia, desviou indevidamente um símbolo sagrado para a fé cristã, a imagem de Cristo crucificado
Isso evidencia uma violação substancial do direito à liberdade religiosa e de fé, pois o protesto, ao modificar o significado da Paixão de Jesus Cristo, não envolvia questões religiosas, mas apropriação indevida de um símbolo sagrado cristão, e em razão disso o deputado se manifestou e fez sua crítica.
 
Para o cristão católico, por exemplo, toda a santidade e perfeição de alma consiste em amar a Cristo, “que veio salvar o seu povo dos pecados e santificar todos os homens”.  
A meditação do amor a Cristo, o qual veio à Terra, fez-se homem e “acendeu o fogo do santo amor nos corações dos homens”, é, para a tradição cristã, vivenciada através da Paixão de Jesus Cristo. 
Como muito bem disse o IBDR em seu parecer citado no início: “O caminho sagrado percorrido por Cristo desde o pretório de Pilatos, onde foi condenado à morte, até o Calvário, onde foi crucificado, é o período em que o fiel avança no amor divino, que sofre e derrama as lágrimas pelo amor de Jesus Cristo na Cruz. Assim, evidente que a utilização da crucificação de Cristo, a qual foi interpretada por uma mulher, para atos diversos dos religiosos, modificando a simbologia e os detalhes inseridos na cruz, é, além de intolerância religiosa, blasfêmia. Atitude que desrespeitou a imagem e os objetos considerados sagrados para a fé cristã e sacramentais para o catolicismo.”
 
Uma sociedade pluralista e inclusiva, além de democrática, depende do respeito às posições divergentes, especialmente no que diz respeito à fé e à crença. Utilizar símbolos religiosos para chocar, desvirtuando seu verdadeiro significado, é desrespeitar a fé, atacar o âmago do ser humano e violar o princípio da dignidade da pessoa
A encenação da Paixão de Cristo, conforme os preceitos religiosos, das mais variadas formas, não constitui intolerância religiosa, mas a apropriação do símbolo de Cristo crucificado para protestar contra a fé cristã configura clara afronta à fé e à tolerância religiosa, e desrespeita publicamente atos cristãos.

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A tolerância religiosa é crucial para garantir os direitos fundamentais, notadamente a liberdade de crença e religião, promovendo uma coexistência plural e inclusiva no espaço público. Mesmo que a tolerância religiosa não exija a aceitação das crenças de uma religião específica, é essencial respeitar esses valores para evitar ofensas à liberdade religiosa e prevenir a intolerância religiosa, que contradiz os princípios democráticos e agride a dignidade da pessoa humana.

A encenação da crucificação de Cristo pela atriz Viviany Beleboni, como forma de protesto contra a homofobia e outras discriminações, é considerada, em tese e sob o ponto de vista jurídico, um ato intolerante e vilipendioso. Essa ação ofende a fé cristã, distorcendo o verdadeiro significado da crucificação de Cristo e caracterizando-se como blasfêmia, um ato que insulta e desrespeita a divindade ou elementos sagrados. 
Vale ressaltar que o termo “blasfêmia” tem origem religiosa, e em um Estado verdadeiramente laico o Judiciário não deveria intervir nessa esfera, uma vez que a definição de blasfêmia é uma questão religiosa e o Estado laico não deve se envolver em interpretações teológicas. Essa é toda a irresignação do deputado Marco Feliciano.


A ofensa ao sagrado é agressão ao foro íntimo do indivíduo, é desrespeito à sua identidade, é “atacar a sua fé no sagrado é solapar a sua dignidade de ser humano”,
como ensinamos em nossa obra Direito Religioso: questões práticas e teóricas.

A imunidade parlamentar
Por fim, mas não menos importante em uma democracia, não podemos esquecer da imunidade parlamentar. 
A imunidade parlamentar, assegurada pela Constituição de 1988, garante aos parlamentares inviolabilidade por suas opiniões, palavras e votos, preservando a liberdade de expressão no exercício de suas funções. 
Essa prerrogativa, tanto processual quanto material, é fundamental para o Estado Democrático de Direito, permitindo que os parlamentares representem as vozes da população que os elegeu.

    O parlamentar expressou sua defesa do sentimento religioso, alegando a violação dos fundamentos de sua fé e de milhões de brasileiros diante do vilipêndio a símbolos religiosos

Todo o caso envolve manifestações do parlamentar Marco Feliciano em meio digital e no Congresso Nacional sobre o aviltamento de símbolos religiosos por grupos LGBTQIA+ em eventos de protesto. 
O parlamentar expressa consternação diante da profanação pública de símbolos cristãos, sem proferir ofensas individualizadas. 
Ele destaca a intenção crítica em relação a eventos públicos que ultrapassam a liberdade de expressão ao desrespeitarem a fé cristã.
 
Em um Estado Democrático de Direito e uma sociedade pluralista e inclusiva, com ampla proteção constitucional às liturgias religiosas e com um ordenamento jurídico que criminaliza o vilipêndio a atos ou objetos de culto religioso, qual deveria ser a posição do parlamentar?  
As suas manifestações são parte do exercício legítimo de suas funções, especialmente ao representar eleitores de vertente religiosa.

Ademais, as críticas do parlamentar, embora contundentes, não configuram animus injuriandi ou caluniandi (nestes casos, sim, deveria haver punição), sendo direcionadas à defesa dos direitos da sociedade, principalmente daqueles que compartilham valores cristãos. Destaca-se que a inviolabilidade parlamentar impede a responsabilização penal ou civil, e a ausência de animus injuriandi ou caluniandi afasta a necessidade de reparação civil por danos morais, mesmo diante de comentários ofensivos associados à postagem do parlamentar.


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Conclusão

O fato é que o parlamentar expressou sua defesa do sentimento religioso, alegando a violação dos fundamentos de sua fé e de milhões de brasileiros (80% deles, talvez?) diante do vilipêndio a símbolos religiosos. Contrariamente ao parlamentar, a manifestação artística supostamente ultrapassou os limites, resultando em episódio de intolerância religiosa, possivelmente e, em tese, configurando o crime de vilipêndio público, conforme o artigo 208 do Código Penal.

A decisão do juiz de primeiro grau é questionada por punir a vítima do ocorrido, desconsiderando os princípios da liberdade religiosa, de crença, de expressão e da imunidade parlamentar
Tal atitude não apenas cerceia a principal atividade pela qual um cidadão é eleito, mas também representa uma clara violação à manifestação da liberdade religiosa.


Quando o Estado sanciona alguém que exerce sua atuação baseada em crenças pessoais, e mais ainda quando esse indivíduo é investido do poder da palavra por mandato constitucional, o desrespeito torna-se ainda mais evidente. 

Isso reflete a preocupante expansão da perseguição religiosa, atingindo até mesmo membros do Legislativo, o que levanta questionamentos sobre o espaço restante para a expressão do povo em geral.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Thiago Rafael Vieira, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


sábado, 9 de setembro de 2023

A perseguição religiosa chegou de vez ao Brasil - Gazeta do Povo

Vozes - Crônicas de um Estado laico
 

Intolerância

Casal que não gostou de música com teor religioso insultou e depois agrediu motorista de aplicativo em Minas Gerais.| Foto: Melonemond/Pixabay

Já falamos aqui que o laicismo não tem nada a ver com o Estado laico e se caracteriza por um movimento de expurgo da religião do espaço público, limitando-a à residência dos fiéis e a suas igrejas. 
 Por outro lado, o Estado laico se caracteriza pela separação entre o Estado e o fenômeno religioso, garantindo liberdade de atuação de cada um, em suas respectivas esferas de competência, permitindo que os fiéis vivam sua vida, no público e no privado, de acordo com as suas crenças. 
A laicidade possui variações, desde a norte-americana, que se caracteriza pelo wall of separation between church and State, até a colaborativa, na qual este “muro” não existe, possibilitando a colaboração do Estado com a igreja e vice-versa, um reflexo da ideia tomista e escolástica de que a fé e a razão devem andar juntas.
 
No Estado laico as pessoas não são laicas; a maioria delas tem uma fé e a exerce em casa, na igreja e no espaço público, ou seja, onde quer que elas estejam. O Estado tem uma postura neutra de não interferir e nem se relacionar com a religião, como nos EUA. 
Em outras situações, o Estado tem uma conduta cooperativa, de auxiliar a igreja, sobretudo a principal, como acontece na laicidade italiana por meio do Acordo de Villa Madama, com a Igreja Católica.  
Temos, ainda, o Estado que é colaborativo com o fenômeno religioso e possui uma atitude benevolente e positiva com todas as fés, colaborando com elas em prol do interesse público – é o caso brasileiro, como diz o artigo 19, I da Constituição.
 
Em nenhum desses exemplos há uma conduta negativa do Estado para com a religião. Essa conduta é típica de países laicistas, que bebem da fonte francesa, onde religiosos perdiam suas cabeças e freiras eram estupradas por não concordarem com o regime da fraternidade francesa do século 18 e a imposição de sua religião positivista. 
O Brasil, como já dito, não é laicista; basta olhar para sua bandeira e ver nela a Cruz de Cristo; temos os feriados religiosos, nomes de estados e cidades em homenagens a santos, referências religiosas na heráldica das maiores cidades brasileiras e por aí vai. 
 Entretanto, existe um movimento cada vez maior de pessoas laicistas no Brasil. Pensam elas: “Já que a história do Brasil, os símbolos nacionais, a Constituição, o ordenamento jurídico e tudo o mais têm uma atitude simpática com a religião, especialmente o cristianismo, e já que infelizmente existem liberdade religiosa e Estado laico colaborativo por aqui, serei eu o laicista; vamos censurar algum padre ou pastor, fechar alguma igreja, e processá-los todos nem sei pelo quê!”

    No Estado laico as pessoas não são laicas; a maioria delas tem uma fé e a exerce em casa, na igreja e no espaço público, ou seja, onde quer que elas estejam

Esse pensamento se popularizou não só entre indivíduos, mas também entre grupos ativistas. O caso mais recente é de uma motorista de aplicativo de caronas, de 27 anos, que foi vítima de agressão verbal e física durante uma viagem entre um bairro de Belo Horizonte e Contagem (MG), de acordo com informações divulgadas pelo portal R7. 
Os agressores, um jovem de 25 anos e uma mulher de 22 anos, teriam iniciado o ataque após questionar a religião da motorista e proferir xingamentos devido à música que tocava no rádio do veículo. A motorista solicitou que o casal desembarcasse do carro em frente à Unidade de Pronto-Atendimento JK, na cidade de Contagem, mas os passageiros, em vez de seguir a solicitação da motorista, teriam iniciado a agressão física. 
Um espectador tentou intervir para proteger a vítima e impedir a continuação da agressão. 
A Guarda Civil Municipal de Contagem, que estava posicionada nas proximidades da unidade de saúde, foi alertada pelos gritos de socorro e testemunhou o crime, corroborando a versão apresentada pela motorista.

Eis uma aplicação do pensamento laicista francês: “você não pode escutar essas músicas religiosas em um transporte público, mesmo que o carro seja seu; e, já que você insiste, vou descer-lhe a porrada”.

Uma reflexão sobre o caso
A agressão, em qualquer uma de suas formas, seja ela física, psicológica ou verbal, é algo profundamente lamentável e merece ser condenada veementemente. 
O caso envolvendo a motorista de aplicativo em Minas Gerais, insultada devido à música religiosa que estava ouvindo e, depois, agredida fisicamente, lança um alerta preocupante sobre os crescentes casos de intolerância na sociedade. Intolerância que se manifesta pelo pensamento segundo o qual, “já que o Estado tem uma postura positiva com a religião, vamos nós persegui-la”.
 
A intolerância, antes restrita a xingamentos e manifestações nas redes sociais, parece estar ganhando espaço na forma de violência física no cotidiano das pessoas. 
O fato de um casal de passageiros ter insultado a motorista por sua escolha musical é inaceitável, ainda mais quando a música está ligada à crença de quem a está ouvindo e que, ainda por cima, é o proprietário do carro. 
O desdobramento dessa situação, que culminou na necessidade de a motorista pedir que os agressores deixassem o veículo, seguido de agressão física, torna o caso ainda mais grave.

    Quando a intolerância atinge o ponto de agressão física devido a diferenças religiosas ou à escolha de uma religião específica, temos um claro ataque aos valores democráticos e à coexistência pacífica na sociedade

Este incidente ressalta a importância da liberdade religiosa e da tolerância em uma sociedade pluralista. A liberdade religiosa é um princípio fundamental em sociedades democráticas, que garante a todos o direito de praticarem sua religião ou crença, no público ou no privado; não se limita apenas à liberdade de culto, mas também engloba a liberdade de expressão e manifestação de suas crenças.
Portanto, é crucial que todos os cidadãos compreendam e respeitem a diversidade religiosa e cultural que enriquece nossas comunidades, podendo evidentemente discordar com relação a dogmas, práticas e liturgias, mas sem suprimir o direito do outro, muito menos agredi-lo. A disseminação do que é conhecido como “marxismo cultural”, que expande a luta de classes a diversas outras formas de divisão, está começando a mostrar seus efeitos mais alarmantes, minando a coesão social e prejudicando a convivência harmoniosa entre os indivíduos, fragmentando totalmente a sociedade.

Expressamos nossa solidariedade à motorista de aplicativo e desejamos sua recuperação emocional e física. Esperamos que as medidas legais adequadas sejam tomadas para responsabilizar civil e criminalmente os agressores, de acordo com as evidências apresentadas no devido processo legal. Mais do que nunca, é essencial que a sociedade reafirme seu compromisso com a liberdade religiosa, garantindo que todos possam viver em paz, independentemente de suas crenças.

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Thiago Rafael Vieira, colunista - Gazeta do Povo -
Crônicas de um Estado laico

 

terça-feira, 9 de maio de 2023

Colômbia quer aprovar lei contra cristãos

O país discute a aprovação de lei que tira do Código Penal os artigos sobre a punição à perseguição religiosa

 Colômbia

Foto de Hugues de BUYER-MIMEURE na Unsplash | Reprodução 

Na Colômbia, as autoridades locais iniciaram a discussão de um projeto de lei que visa isentar a intervenção policial em “assuntos inconstitucionais” no país sul-americano. O objetivo é combater a crise penitenciária que assola a Colômbia, país que tem prisões superlotadas, o que preocupa os defensores dos direitos humanos. A nova lei, no entanto, ameaça a segurança dos cristãos na região.  

Apesar do objetivo aparentemente justo e necessário, o itinerário para alcançá-lo, porém, preocupa a população cristã local — que na Colômbia constitui a maioria. Isso porque existe a possibilidade de que grupos que perseguem os cristãos no país tenham a impunidade garantida pela lei

O projeto de lei prevê a revogação dos artigos 201 a 203 do Código Penal da Colômbia, que incluem a violação da liberdade de religião; impedir ou perturbar cerimônias religiosas e danos ou lesões a pessoas durante os cultos.  

Sede do Poder Judiciário da Colômbia. Imagem | Wikimedia Commons
Escalada de impunidade
Na prática a aprovação da nova lei favorece a perseguição na Colômbia, porque a pequena base legal que os cristãos tinham a fim de se defender quando atacados ou perseguidos será extinta. Assim, crimes que violam a liberdade religiosa poderão ficar impunes. Como justificativa, o governo local afirma que o número de denúncias desses crimes é muito pequeno. 

Mas um pesquisador da ONG Portas Abertas, que analisou a situação, afirmou que “garantir benefícios para perseguidores aumenta o problema da impunidade. Muitos dos crimes relacionados à perseguição religiosa não podem ser denunciados. Pastores e líderes que já enfrentam insultos, calúnias e pressão em silêncio agora estarão desamparados pela Justiça. A decisão é arriscada e pode gerar o aumento de ataques físicos, verbais e emocionais contra cristãos sem nenhum tipo de punição”.  

A proposta de lei segue em análise no Parlamento colombiano.  

Redação - Revista Oeste