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domingo, 4 de fevereiro de 2018

STF de jatinho

Em confronto com governo, Congresso e opinião pública, só de FAB mesmo

Na sexta-feira, dia seguinte à abertura do ano judiciário, o ex-presidente Lula e o ex-governador Sérgio Cabral já sacudiam o Supremo, confirmando que o foco está na Justiça. Enquanto o presidente Michel Temer se esfalfa para melhorar a popularidade e os deputados e senadores põem os pé na estrada e nas suas campanhas, os 11 ministros do Supremo estão atolados de casos cabeludos, com a expectativa de plenário e turmas pegando fogo.

Lula entrou com habeas corpus preventivo para não ser preso e tenta, assim, driblar a decisão da ministra Cármen Lúcia de não por em pauta a revisão do cumprimento de pena após condenação em segunda instância. Ela anunciou que não põe “em pauta”, mas o relator da Lava Jato, Edson Fachin, pode por “em mesa” o HC de Lula e criar um atalho para a revisão, rejeitada por Raquel Dodge e por entidades de juízes, procuradores e advogados. Será um escândalo, mas escândalos andam tão comuns...

Quanto a Cabral: réu pela 21ª vez, um espanto!, ele entrou com habeas corpus para sair do Complexo Penal dos Pinhais, em Curitiba, e voltar à Penitenciária de Bangu, no Rio, onde tem visitas fora de hora, bons colchões, comidinhas bacanas e um home theater de Zona Sul. Quem analisa é o ministro Gilmar Mendes, que cuida de casos correlatos e bem pode devolver Cabral para a Cidade Maravilhosa. Um escândalo a mais, um a menos...

Isso, porém, é só parte da pesada pauta do Supremo neste ano eleitoral. A questão número um é o julgamento dos políticos com mandato e envolvidos na Lava Jato, mas, até lá, muita água e muitas decisões vão rolar, a começar do próprio foro privilegiado para parlamentares. A maioria do Supremo já decidiu pelo fim do privilégio e a favor de enviar os processos deles para outras instâncias, mas o ministro Dias Toffoli pediu vistas e o resultado ficou no limbo. Também não falta tensão com o Executivo e, já no primeiro dia de trabalho, o ministro Luiz Roberto Barroso manteve a suspensão de trechos do indulto de Natal decretado pelo presidente Michel Temer para ampliar, bem, o universo de beneficiários. No segundo dia, o placar voltou ao zero a zero, quando o ministro Alexandre de Moraes derrubou uma decisão de primeira instância contra a privatização da Eletrobrás. [derrubada justa; sem sentido que um juiz de primeira instância decida sobre um ato do presidente da República praticado no exercício de atribuição que a Constituição Federal confere ao chefe do Executivo - no caso da Eletrobrás o absurdo é maior, já que o magistrado além de decidir sobre um ato da competência do presidente da República ainda usurpou atribuição do Poder Legislativo - decidindo sobre urgência de MP.]

E a pergunta que não quer calar, desde o início de janeiro: a deputada Cristiane Brasil, do PTB do Rio, vai ou não tomar posse no Ministério do Trabalho, apesar das multas justamente na Justiça do Trabalho, do vídeo na hora errada, no lugar errado, com as companhias erradas e, agora, essa história de envolvimento com o tráfico?  [até o presente momento, se o STF não jogar para os contra Temer, nada existe que torne a deputada sem condições para ocupar o cargo (conforme  exigências estabelecidas na CF) e que tire do presidente da República a competência que a CF lhe confere de nomear seus ministros.

Agora, se além do texto constitucional que nós brasileiros comuns temos acesso existir um outro, só acessível aos SUPREMOS MINISTROS e aos adversário do Temer, tudo muda de figura.]  A coisa só piora e foi parar no STF, que vai julgar também se mantém o reajuste do funcionalismo, suspenso pelo governo e garantido por liminar.[diante do fato que o reajuste foi concedido por uma lei específica, uma ou duas parcelas semestrais já foram pagas, está mais que caracterizado o 'ato jurídico perfeito' que não pode ser anulado por uma lei - a MP tem força de lei, portanto, legislação infraconstitucional.]

Há também uma questão que não opõe o Judiciário apenas ao Legislativo e ao Executivo, mas à própria opinião pública: o auxílio-moradia indiscriminado, como subterfúgio para aumentar os salários de juízes e magistrados para (muito) além do teto constitucional de R$ 33.700,00. O ministro Luis Fux, agora presidente do TSE, manteve o privilégio em 2014 e nunca mais se falou nisso. [o que é mais constrangedor para o STF, ou deveria ser, é que o privilégio do auxílio-moradia resiste desde 2014 em função de liminar concedida pelo ministro Luiz Fux pai da desembargadora Mariana Fux, que trabalha no TJ do Rio, tem dois apartamentos no Leblon e recebe auxílio-moradia.] Mas o plenário vai ter de falar, até porque nem ícones como Sergio Moro e Marcelo Bretas escapam do constrangimento.

É por essas questões e tensões que Gilmar Mendes reivindica o uso de jatos da FAB e essa reivindicação não é exclusividade dele. Outros ministros também andam temerosos de enfrentar voos de carreira, passageiros irados e até gente descontrolada e sem limites que parte para ataques pessoais.  Expostos nas votações em plenário pela TV Justiça, os Meritíssimos não querem se expor ao vivo. E, cá pra nós, não é nada mal se preservar no escurinho de jatinhos.



Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo