Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador roubaram. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador roubaram. Mostrar todas as postagens

sábado, 26 de março de 2022

Roubaram ou não roubaram? - Carlos Alberto Sardenberg

A Lava Jato, embora tenha sido liquidada por uma manobra jurídica e política, voltará à cena nas próximas eleições. Primeiro porque seus principais nomes, Sérgio Moro e Deltan Dallagnol, vão disputar votos. Segundo, porque políticos condenados e cujos processos foram cancelados, Lula à frente, também estarão nas urnas

E quer saber? Será um bom momento. Haverá, é claro, um debate jurídico sobre o modo de atuação da Lava Jato, mas também dos tribunais que anularam os processos. Isso é importante, mas não parece um tema que desperte as paixões do público.

Desconfio, entretanto, que restará uma questão central, esta sim de fácil entendimento: roubaram ou não roubaram? Houve ou não a construção de um sistema de assalto à Petrobras, em particular, e aos governos, em geral?

O primeiro debate favorece os condenados e ex-condenados. Estes poderão apresentar decisões jurídicas de várias instâncias, inclusive do Supremo, tornando nulas as sentenças emitidas pela Lava Jato. Aqui está o terreno dos chamados garantistas, do grupo de advogados dos réus, o Prerrogativas, derrotados nos primeiros momentos, vitoriosos ao final. E vitoriosos ao velho estilo: adiando, procrastinando, embananando os processos.

Segundo um levantamento do jornal O Estado de S. Paulo, nada menos que “221 anos e 11 meses de condenações ligadas à Lava Jato foram canceladas por irregularidades processuais” (ou supostas irregularidades, acrescentamos nós).

Depois de cinco anos aceitando que os processos de Lula e de outros corressem na vara federal de Curitiba, sede da Lava Jato, o Supremo de repente decidiu que aquele não era o foro adequado. Todos os processos voltaram ao início, em outras varas, abrindo as condições para a prescrição.
Logo, a rigor, não interessa a discussão jurídica sobre o foro adequado. A súbita virada de posição do STF foi determinada pelo ambiente político. Assim como a mudança que cancelou a prisão após condenação em segunda instância.

Vale lembrar: no auge da Lava Jato, em fevereiro de 2016, o STF, por 7 a 4, aceitou a prisão em segunda instância, que não era admitida desde 2009. Depois, em novembro de 2019, por apertadíssimo placar de 6 a 5, voltou a rejeitá-la. Em dez anos, portanto, o STF deu três cavalos de pau – o que não é normal numa corte estritamente jurídica.

As duas viradas abriram caminho para as anulações de processos e recolocaram no páreo centenas de políticos. Não inocentados, mas, digamos, liberados para voltar. De todo modo, poderão dizer: aqui estamos.
O segundo tema da variante Lava Jato coloca,
entretanto, um óbvio embaraço para os ex-condenados: roubaram ou não roubaram? Houve corrupção, dinheiro surrupiado de cofres públicos?

A resposta é simples: houve, de maneira ampla e sistemática. Qual a melhor prova? Não a confissão de réus que fizeram delação premiada que até pode ser contestada – mas o dinheiro devolvido.

Dois casos emblemáticos e bem documentados. Primeiro, até dezembro passado, a Petrobras havia registrado em seus balanços a entrada de R$ 6,17 bilhões, resultado de diversos acordos de leniência e colaboração com empresas e pessoas. Segundo, Odebrecht e Braskem registram em seus documentos os acordos feitos com a Justiça dos EUA, Brasil e Suíça, pelos quais aceitaram pagar US$ 3,5 bilhões como reparações por conduta criminosa. Trata-se simplesmente do maior acordo já feito na história mundial em caso de corrupção.

Diante disso, a reforma feita pelo Odebrecht no sítio de Atibaia é dinheiro de troco. Mas vai para o debate, que afinal poderá ser resumido assim: qual a tolerância dos brasileiros com a corrupção?

Muitos dizem que esse é mais um problema moral, menos relevante para as grandes questões estruturais que envolvem o país. Errado. Já está mais que demonstrado que um sistema de corrupção política destrói a economia, ao eliminar a legítima competição e premiar os amigos do presidente ou do pastor.

A ver o que o eleitor dirá.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista 

 

Coluna publicada em O Globo - Economia 26 de março de 2022