Com
a alta nos preços, até o funk ostentação, quem diria, teve de aderir ao ajuste
fiscal
O
nome é Luan de Melo, mas pode chamá-lo de MC França.
Ele tem 19 anos, é um funkeiro em início de carreira e mora no bairro do Itaim
Paulista, distante do centro de São Paulo. Luan tem gostos parecidos com os da
maioria dos jovens de sua quebrada. Gosta de roupas de marca e frequenta bailes de rua, os “fluxos”. Há três anos, o estilo que dominava
essas festas era o funk
ostentação, com
letras que exaltavam o enriquecimento dos cantores de
funk, os MCs (abreviação de
“mestres de cerimônia”, os animadores do baile).
O ano era 2012, nos últimos suspiros da fase de prosperidade brasileira.
Depois, veio o esfriamento da economia e, agora, a crise. Outra trilha sonora
passou a dominar o fluxo. Vai-se o funk ostentação, que exalta os prazeres
caros da vida, e volta com força o estilo que canta outro prazer, ao alcance de
todos: o
sexo. São
músicas que exaltam o corpo, o gozo e a sensualidade. É o pancadão da crise.
“Não
é que esses jovens não usem mais produtos de marca. Mas eles tiraram o pé do
acelerador”, diz
Renato Barreiros, produtor cultural e estudioso da cena funk. “O poder de consumo deles estagnou. Eles
se deram conta de que não vai passar disso que é agora.” Barreiros é autor
dos documentários Funk
ostentação – O filme e
No fluxo. É testemunha de como a recessão
muda as preferências da classe C, que representa 58% da população
brasileira. Luan, o MC França, sente no dia a dia os efeitos do novo cenário
econômico. “O dinheiro não dá para manter
meus gostos. Antes, gastava R$ 150 na noite. Hoje, isso não dá nem para matar a
vontade”, diz Luan. O que Luan sente, os economistas medem. A
evolução anual da economia passou de expansão de 7,5% em 2010 para encolhimento
neste ano. No mesmo período, a inflação anual passou de 5,8%, já alta, para
7,9%. Os funkeiros deixam de ostentar e refazem as contas.
Luan mora em casa
própria com a mãe e a namorada, grávida de oito meses. Com uma renda familiar
próxima de R$ 2.700, Luan
reclama de serviços essenciais que passaram a custar muito. “Boa parte do que ganho vai para o
transporte. Gasto até R$ 15 por dia nisso”, afirma. Só em São Paulo, a
passagem de ônibus subiu mais de 52% desde 2010 – de R$ 2,30 para R$ 3,50. Melo
gasta mais de um terço do que ganha com deslocamentos diários. Na casa do MC,
os hábitos mudaram. A família gasta mais para comprar menos no supermercado
e vai à feira com menor frequência. O
mesmo ocorre com 41% da classe C, segundo o instituto de pesquisas Data
Popular. Rarearam as compras em shopping centers, pedidos de pizza em casa
e viagens de fim de semana à praia. “A
classe C está refazendo o orçamento. Troca marcas caras por baratas, compra
menos nos shopping centers e procura os fluxos, bailes mais baratos”, diz
Renato Meirelles, presidente do Data Popular. [Luan foi vítima da irresponsabilidade do Lula e da sua
ex-criatura Dilma, que levou jovens desavisados a considerar que uma RENDA
FAMILIAR de R$2.7000,00 é suficiente para os beneficiários se considerarem
classe C.
No máximo, com muita economia, a família que usufrui de tal
renda pode apenas se considerar ARREMEDIADA.]
Em geral, os fluxos são organizados pelas redes sociais e feitos na rua, com carros equipados
com caixas de som potentes e vendedores ambulantes abastecendo os frequentadores com bebida barata. Em São Paulo, esse tipo de festa,
que atormenta a vizinhança, acontece
desde 2005, e há relatos de fluxos que reuniram mais de 10 mil pessoas. “Numa balada fechada, você gasta fácil R$
200. No fluxo, que é de graça, você gasta no máximo R$ 100 e curte do mesmo
jeito”, diz Luan. “Por isso, alguns
organizadores de bailes fechados, onde a gente cantava, estão deixando de fazer
as festas. Não dá o mesmo lucro de antes.” [os tais fluxos deveriam ser
proibidos; a única coisa que propiciam é incomodar tremendamente a vizinhança e
levar muitos a se embriagarem.]
Quem já trabalhava e pagava
contas em crises anteriores se adapta mais facilmente. Entre os adolescentes
que começam a entrar no mercado de trabalho, crise é novidade. Tandara Felício, de 18 anos, é estudante
de estética e precisa administrar as mudanças.
Tandara explica que há dois anos
começou a trabalhar para ajudar nas contas de casa. “Até então, minha mãe me bancava, mas chegou um momento em que ela
não aguentava mais. Conversamos sobre isso”, diz. A jovem frequenta os
fluxos desde os 14 anos e percebeu a mudança de trilha sonora. “A ostentação não faz mais sucesso no
fluxo, porque eles cantavam uma vida de gente rica, que compra o melhor carro,
a melhor moto, a melhor casa, bebida, roupa. Quando acabava a música, a gente
olhava em volta e via que não era aquilo”, diz. “Então outros MCs, que viram que a ostentação estava caindo, chegaram
com uma coisa que é realidade: as letras de sexo. São coisas que as pessoas
fazem, é a realidade. Quando acaba a música, ele ainda tem aquilo ao alcance.”
Como a trilha sonora, o
guarda-roupa de Tandara também vem se adaptando. Ela estava acostumada a
comprar roupas, maquiagem, sapatos e perfumes caros. Tandara reduziu seu
consumo nos últimos anos, pois, segundo ela, ficou impossível manter o padrão
da gastança. “Quando lançavam uma coleção
nova da marca de sandálias que gosto, eu tinha de ter a coleção toda. Hoje, não
tenho dinheiro para isso”, afirma. As mudanças adotadas na casa de Tandara servem
como roteiro de enxugamento
de contas para
famílias de todas as faixas de renda. A mãe de Tandara
trocou os pacotes de internet, telefone fixo e TV a cabo por versões mais
modestas, que custam a metade do preço. Conseguiu economizar R$ 135 por
mês. A estudante passou a se conter no uso do telefone
celular, porque a conta havia passado de R$ 30 para R$ 80. Para se
divertir, deixou de ir a lugares que cobram entrada. Deixou o hábito de ir ao
shopping center duas vezes por mês.
“Antes, a gente comprava muito mais. Agora, mesmo sem comprar tanto, não
conseguimos nem poupar alguma coisa”, afirma.
Na classe C, 55% apostam que 2015 oferecerá menos oportunidades de trabalho. A taxa de desemprego ainda está baixa, mas subiu de 6,4%
para 6,8%, entre janeiro de 2014 e janeiro de 2015. Luan ainda não trabalhou
com registro em carteira. Diz que sente mais dificuldade em sua procura no
mercado de trabalho e, por isso, baixou suas expectativas quanto ao primeiro
emprego. Tandara se queixa do que considera falta de oportunidades. “Hoje, a gente tem mais dificuldade de
crescer. Acho que estão diminuindo as oportunidades e tem muita gente bem
qualificada disputando cada vaga”, diz.
O pessimismo econômico não
abalou a confiança da classe C na vida pessoal. Seis em cada dez
mantêm-se otimistas. Acreditam que o bem-estar de cada um depende mais dele
mesmo do que dos agentes externos, como o governo. É um bom sinal, diante de
tantas mudanças drásticas que afetaram essa classe nos últimos anos. “Espero que as coisas melhorem para que eu
possa dar um futuro melhor ao meu filho. Sei que vai ser mais difícil, mas
continuo otimista”, diz Luan.
Fonte:
Revista Época