Lava Jato vira portal da impunidade para bandido dedo-duro ou criativo
Parem
tudo! Saiam às ruas! Ateiem fogo às vestes. Gilmar Mendes quer acabar com a
Lava Jato!
Ai de
alguém propor que se siga a lei no caso das prisões preventivas. Ou que se puna
abuso de autoridade: "Ah, então você é contra a Lava Jato!" A
operação deveria reivindicar o estatuto legal de "Meca" metafórica de
uma nova religião. Até para tomar um Chicabon no portão depois de enterrar o
marido, a viúva fogosa e gozosa não teria mais de prestar contas ao olhar
severo de Nelson Rodrigues. Antes, ajoelhar-se-ia de frente para a 13ª Vara e a
Força Tarefa.
Mas que
disse Mendes na terça? Isto: "Temos um encontro marcado com as alongadas
prisões que se determinam em Curitiba. Temos de nos posicionar sobre esse tema,
que conflita com a jurisprudência que construímos ao longo desses anos". O que dá
menos dor de cabeça hoje em dia? Ora, não entrar em bola dividida e deixar pra
lá esse negócio de leis.
Vale lembrar o que sempre sustentaram os esquerdistas
do Direito Achado na Rua: "Norma legal é coisa de 'catedráticos' E,
afinal, nós, os fascitóides de esquerda e de direita, gostamos é de uma ação
direta, de uma pena antecipada, de condenar primeiro para julgar depois."
"Tá
com peninha dos presos da Lava-Jato, Reinaldo? Tá com peninha dos petralhas? Tá
com peninha de empreiteiro?" Não! Sendo verdade o que se atribui a eles,
que sejam julgados, condenados e presos. E, sim!,
eu quero saber com base em qual dispositivo do Artigo 312 do Código de Processo
Penal eles estão na cadeia. "Ah, mas o Tribunal Regional Federal
referendou!" E daí? Ignorar o tal artigo não é certamente apanágio de
juízes de primeira instância.
Pode até
ser que os motivos estejam dados. Quais? As razões do processo e da preventiva
no passado são conhecidas. Mas e hoje? Afinal, uma preventiva não pode valer
por uma perpétua caso o detido frustre os desígnios do juiz e do promotor. Que a
cadeia seja o principal elemento de convencimento da Lava Jato, ancorada nas
delações, eis uma evidência que dispensaria a prova fornecida pelo próprio
Deltan Dallagnol na segunda, numa de suas caneladas jurídicas no Facebook.
Escreveu:
"A colaboração é um instrumento que permite a expansão das investigações e
tem sido o motor propulsor da Lava Jato. O criminoso investigado por um crime
'A' entrega os crimes B, C, D, E – um alfabeto inteiro – porque o benefício é
proporcional ao valor da colaboração."
Para quem
não entendeu: o "benefício" é diminuir o tempo de cadeia. Ele trata
acima da execução da pena, não da prisão preventiva (pior ainda). O que está
claro é que a cana é usada para obter a delação. É dispensável provar o que é
óbvio no texto. E Rodrigo
Janot? Parece não ter gostado da indicação do bom Alexandre de Moraes para o
STF. Indagado a respeito, disse: "Não acho nada!" Coisa feia! Deve
ter se esquecido de que também foi indicado por um presidente –no caso, por
Lula.
Aí o
desinformado saliente pensa: "Ah, mas Janot foi o primeiro da lista
tríplice". É verdade! Numa eleição ilegal e discriminatória. Afinal, não
tem prescrição constitucional e é feita entre membros de um sindicato que só
representa os procuradores do Ministério Público Federal. Ocorre
que o Ministério Público da União, de que Janot é chefe, inclui ainda o
Ministério Público Militar, o Ministério Público do Trabalho e o Ministério
Público do DF e Territórios. Os integrantes dessas outras divisões estão
proibidos de votar e de ser votados.
E a minha
memória poderia ter falhado agora, mas não falhou. Assalta-me aquela fala
eloquente de Lula na conversa ao telefone com o advogado Sigmaringa Seixas
sobre a forma como Janot conseguiu ser o primeiro da lista. Reproduzo: "Esse
cara [Janot], se fosse formal, ele não seria procurador-geral da República. Ele
tinha tomado no cu. Tinha ficado em terceiro lugar. Esse é um dado".
Janot se
comporte. A indicação de Moraes obedeceu a critérios bem mais formais. Esse é
um dado.
Fonte: Coluna do Reinaldo Azevedo - Folha de S. Paulo