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segunda-feira, 20 de maio de 2019

O desabafo de Bolsonaro

Se o Brasil realmente não é para principiantes, tampouco é ingovernável sem ceder às corporações

Na manhã de sexta-feira, o presidente Jair Bolsonaro divulgou, em grupos de WhatsApp dos quais faz parte, um texto atribuído a um autor anônimo – depois identificado como Paulo Portinho, analista da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e filiado ao Partido Novo – que descreve as dificuldades que Bolsonaro vem encontrando para governar e para implantar as plataformas de campanha que a população escolheu em outubro de 2018. Um diagnóstico extremamente preocupante, menos pelo quadro deprimente que pinta e mais porque ele mostra uma compreensão bastante equivocada do jogo democrático e do que significa governar – e nos permite perguntar até que ponto o próprio Bolsonaro compartilha desse equívoco, apesar de suas décadas de experiência como parlamentar.

O texto, cuja íntegra também foi publicada pela Gazeta do Povo, tem todo um tom de denúncia contra o que Portinho chama de “corporações com acesso privilegiado ao orçamento público”, e que seriam as verdadeiras donas do país: “não só políticos, mas servidores-sindicalistas, sindicalistas de toga e grupos empresariais bem posicionados nas teias de poder”. A constatação é a de que qualquer presidente teria de se dobrar a esses grupos; sempre foi, é e sempre será assim, parece dizer o autor.

Está aqui o primeiro grande equívoco sobre como funciona uma democracia. Por esta visão, existiria apenas o povo, puro, imaculado, que deseja o melhor para o país, e, do outro lado, grupos de pressão com interesses sempre espúrios, que desejam apenas o melhor para si mesmos. Um erro primário e que desconsidera a própria dinâmica da democracia, que se constrói no embate civilizado entre interesses diversos e, na imensa maioria das vezes, legítimos. Quando um grupo de pessoas se une para defender uma ideia ou pleitear algo junto ao poder público, apresentando seus argumentos e elegendo representantes que deem força a essas ideias e plataformas, nada mais faz que colocar em funcionamento a máquina da democracia. É assim não apenas no Brasil, mas em qualquer país democrático.

Existem interesses e métodos espúrios? Sem dúvida que há. Quando políticos vendem sua consciência e seus votos em troca de cargos e privilégios, quando empresários se unem em esquemas de corrupção, estamos diante do quadro pintado pelo autor anônimo do texto compartilhado por Bolsonaro. Mas, quando servidores públicos se opõem a reformas que julgam prejudiciais, quando setores do empresariado pleiteiam determinada medida que os beneficie, até mesmo quando estudantes invadem uma escola para protestar contra alguma mudança no sistema educacional, as ideias podem estar equivocadas, as medidas que beneficiam alguns podem acabar prejudicando a maioria, os métodos podem ser profundamente condenáveis e antidemocráticos, mas não se pode, de forma alguma, igualar suas motivações às do primeiro grupo, como se todos agissem movidos apenas por razões inconfessáveis.

Ao colocar todos os grupos e interesses em um mesmo balaio,
Bolsonaro desmente a própria trajetória e antagoniza até mesmo aqueles que o ajudaram a fazer dele o presidente do país. Quando buscou o apoio de bancadas temáticas para construir apoio parlamentar, logo depois da eleição, não estava lidando com pessoas unidas por uma plataforma? Quando assina importantes e necessárias medidas que tiram a carga estatal dos ombros do empreendedor, não está também respondendo a um pleito da parte de quem produz? E não são esses interesses totalmente legítimos, e até meritórios?

Mas não é apenas sobre a própria natureza dos interesses que movem a política que o desabafo compartilhado por Bolsonaro se equivoca. O presidente também parece ter subestimado a reação que ele despertaria. Bolsonaro se elegeu com uma série de plataformas necessárias ao país – as reformas econômicas, a redução do tamanho do Estado e de sua interferência sobre a vida do cidadão e do empreendedor, a proteção da vida e da família, o combate à criminalidade. Prometeu também levar esse ideário adiante sem recorrer ao toma-lá-dá-cá que marcou os governos de seus antecessores. A própria campanha eleitoral já havia mostrado que haveria resistências vindas de todos os lados – da imprensa, da intelectualidade, de grupos políticos, ideológicos e identitários – a esse projeto. Uma oposição legítima, baseadas em ideias e reivindicações próprias da democracia, e também a resistência espúria de quem perderia privilégios. Porventura Bolsonaro não imaginava que os setores contrários ao seu programa não usariam todas as armas à disposição? Se agora ele se queixa, como o texto parece fazer, do tamanho do desafio, é porque o subestimou grosseiramente, mesmo quando tudo já indicava que sua tarefa não seria nada simples e apesar de Bolsonaro ter passado boa parte de sua vida no mesmo Congresso que agora lhe impõe dificuldades.

E, diante disso, o que fazer?
Como, então, manter a coerência com o programa assumido nas urnas – algo que o texto de Portinho alega não ser possível, usando exemplos de FHC, Lula e Dilma? Menos mal que o autor rejeite a opção da ruptura institucional, com “o Brasil sendo zerado”. Isso nos levaria a um destino como o de vizinhos falidos, citando a Argentina e a Venezuela. O autor poderia ter citado o próprio caso brasileiro, em que Jânio Quadros quis contornar as instituições confiando nos “braços do povo”, e acabou lançando o país na confusão que resultou no golpe militar de 1964. Mas Portinho também não vê saída. Segundo o texto, se a ruptura não é um caminho possível nem desejável, restaria apenas conformar-se com governar contentando os grupos de pressão de sempre, passando reformas cosméticas que manterão o país respirando por aparelhos, mas sem de fato mudar o Brasil.

Ora, isso é de uma pequenez impressionante. Se o Brasil realmente não é para principiantes, como na famosa frase atribuída a Tom Jobim, tampouco é ingovernável sem ceder às corporações, como defende Portinho. É possível, sim, governar sem recorrer aos conchavos e ao toma-lá-dá-cá. Para isso, o que o Brasil exige de um governante é sabedoria para compreender que uma democracia é movida por interesses legítimos, mesmo que opostos; sagacidade para identificar quais são os interesses e métodos espúrios; coragem para enfrentar os interesseiros e fisiológicos; e liderança para conversar e negociar com todos os demais, aqueles que se movem de boa vontade no tabuleiro político e ideológico. São características que ainda não se manifestaram plenamente em Bolsonaro, que tem se guiado pelo pensamento binário em que as únicas opções são ceder ou buscar o enfrentamento com todas as forças contrárias. Tampouco seus ministros responsáveis pela articulação política e suas lideranças no Congresso parecem capazes de cumprir suas tarefas a contento, suprindo o que falta em seu chefe.

O ideário que elegeu Bolsonaro tem o potencial de mudar o Brasil. E pode ser colocado em prática, desde que o presidente pare de reclamar das dificuldades e resistências – que são grandes, sim, mas nunca foram desconhecidas de ninguéme comece a agir com a liderança que a população espera dele."


Editorial - Gazeta do Povo

 

terça-feira, 4 de dezembro de 2018

"Imoralidade"

O Senado vai aplicar a seus servidores  já neste mês, inclusive para o 13.º salário, o novo teto remuneratório do funcionalismo público, estabelecido após vergonhoso arranjo entre Executivo e Judiciário

Como não há insulto ao qual não se possa adicionar a injúria, o Senado decidiu aplicar a seus servidores já neste mês, inclusive para o 13.º salário, o novo teto remuneratório do funcionalismo público. Estabelecido depois de vergonhoso arranjo entre os Poderes Executivo e Judiciário, o novo teto deveria valer somente a partir do ano que vem, mas a Mesa do Senado resolveu favorecer desde já os servidores que hoje acumulam vencimentos que superam o limite atual, de R$ 33,7 mil, e portanto estão sujeitos ao desconto do chamado “abate teto” – mecanismo que corta do salário tudo o que supera aquele limite.

Com o novo teto, de R$ 39,2 mil, esses servidores receberão agora o que os ministros do Supremo Tribunal Federal, para os quais o aumento salarial se aplicava originalmente, só ganharão em 2019.  
[ATENÇÃO!!! EM NOME DA VERDADE: a Lei nº 13.752, de 26 de novembro de 2018, foi publicada no D.O.U em 27 do mesmo mês e sua vigência começa no dia de sua publicação.

Alguém acha que suas excelências vão aceitar que vigore só a partir de 2019?? CLARO QUE NÃO. O salário dos MEMBROS do Poder Judiciário e de  todos os favorecidos pela lei em questão, o que inclui os do abate teto, foi reajustado a partir de 27 de novembro e eles vão receber os 35 dias deste ano, incluindo a segunda parcela do 13º que costumam receber em novembro - ESTÁ NA LEI. 

O reajuste pode ser imoral, a Lei pode ser imoral, mas, tem que ser cumprida.
O acima exposto vale também para o MP, a situação é exatamente a mesma, exceto o número da Lei que é 13.753, 26 novembro 2018.]   

Nem é o caso de discutir aqui se o impacto disso no Orçamento será grande ou pequeno; o que chama a atenção é que, ao comportamento deplorável dos sindicalistas de toga e à leniência do Executivo, soma-se o oportunismo do Legislativo, cuja ânsia de aumentar os contracheques criou um inusitado “efeito cascata invertido” – em que a consequência do aumento do teto do funcionalismo acontece antes mesmo de seu próprio fator gerador.

Tal desfecho é condizente com todo o processo que resultou no aumento para os ministros do Supremo. O País testemunhou, impotente, a nata do Judiciário desfigurar a Constituição para obter o reajuste salarial que reivindicavam. Primeiro, por meio de uma liminar, o Supremo estendeu a concessão do auxílio-moradia para todos os magistrados e procuradores do País, mesmo para aqueles que possuem imóvel na cidade em que trabalham. Não faltaram ministros que se dispuseram a insultar a inteligência do contribuinte ao tentar justificar tamanha desfaçatez, quando já estava claro que o auxílio-moradia estava sendo de fato incorporado ao salário. A manobra ficou ainda mais explícita quando o Supremo, na negociação com os demais Poderes, ofereceu barganhar o fim do auxílio-moradia pela incorporação desse valor ao salário. Um verdadeiro quid pro quo, expressão latina para o famoso toma lá dá cá. Ou seja, o Supremo criou um problema para vender uma solução.

E nada impede que isso possa voltar a ser feito no futuro, já que, como salientou o ministro Luiz Fux, autor da liminar que havia presenteado todos os magistrados do País com o auxílio-moradia, “a Constituição é um documento vivo, em constante processo de significação e ressignificação”. Ou seja, sempre que houver necessidade, o Supremo encontrará justificativas hermenêuticas para impor seus interesses corporativos, fazendo para isso a leitura constitucional que lhe aprouver.

A decisão do Senado de aplicar desde já um aumento salarial que só deveria ser pago no ano que vem é a consequência lógica do pensamento segundo o qual o interesse do corpo de funcionários públicos estará sempre acima dos interesses dos contribuintes que o sustentam – sempre sob o argumento de que esses servidores estão a desempenhar papel crucial para o bom funcionamento do País e, por isso, merecem tratamento diferenciado em relação ao resto dos trabalhadores. Como a ilustrar esse ponto, o presidente do Supremo, Dias Toffoli, argumentou que o reajuste serviria para “resgatar a dignidade da magistratura” e que, sem o aumento, “a magistratura para”. E o ministro perguntou: “Quem é que vai pôr as pessoas na cadeia? Eles vão se ‘auto-pôr’ na cadeia?”.

Nem é preciso lembrar que os servidores públicos, com destaque para os do Judiciário, [senhores, por favor: SERVIDORES NÃO - MEMBROS.  São cargos distintos, legislação distinta,não misturem.] já são, na média, os trabalhadores mais bem pagos do País; tampouco é preciso recordar que tanto os juízes como os legisladores brasileiros estão entre os mais bem remunerados do mundo, com benefícios que não se encontram em nenhum outro lugar. O mais importante a salientar em tudo isso é a total incapacidade dessas corporações de entender a dura situação do País, com alto desemprego e contas públicas em frangalhos. O fato de que podem, numa canetada, atender a seus interesses trabalhistas não significa que devam fazê-lo.