Branca Nunes
A visão da cordilheira de arranha-céus sempre intimidou, para depois encantar, os que chegam a São Paulo. Mas a muralha de concreto com mais de 1,5 mil quilômetros quadrados, por onde se movem cerca de 12 milhões de habitantes por 17 mil quilômetros de ruas e avenidas, tem chamado a atenção dos visitantes e moradores não apenas por seus restaurantes tão diversificados quanto a gastronomia de Nova Iorque. Ou pela noite movimentada como a de Berlim. Ou pelos cinemas e espetáculos dessa Broadway brasileira.
Moradores de rua no Túnel José Roberto Fanganiello Melhem, no entorno da Avenida Paulista - Foto: Daniela Giorno/Revista Oeste
Além dos buracos no asfalto e nas calçadas, semáforos quebrados já no início de qualquer chuva, imóveis pichados, rios fétidos, lixo transbordando, iluminação pública precária e canteiros abandonados, as regiões nobres e centrais de São Paulo assistiram nos últimos anos à multiplicação de favelas em miniatura. Esses assustadores amontoados de barracas mudaram, por exemplo, a paisagem das ruas que levam à Avenida Paulista, o mais célebre cartão-postal da cidade.
O último Censo da População em Situação de Rua, divulgado em 2020 com dados referentes a 2019, contabilizou quase 25 mil pessoas sem teto na capital paulista. “Estimativas mostram que o contingente de moradores de rua em São Paulo aumentou significativamente durante a pandemia de covid-19 e pode ter dobrado, aproximando-se de 50 mil pessoas”, registra a reportagem de Fábio Matos, que detalha o trabalho do Instituto ARCAH. Os projetos não configuram mero assistencialismo. Apostam na capacitação pessoal e profissional para oferecer uma oportunidade real de trabalho aos esquecidos do asfalto.
Em vez de culpar exclusivamente a pandemia, é recomendável contemplar os verdadeiros responsáveis pelo boom de mendigos, barracos e cracolândias ambulantes. Os governantes não se limitaram a abandonar a metrópole. Também impuseram medidas restritivas que paralisaram a economia e afetaram psicologicamente crianças, jovens, velhos e adultos. “As evidências dos danos causados pelo lockdown estão aumentando”, mostra Joanna Williams, em artigo da revista britânica Spiked, publicado no Brasil com exclusividade por Oeste. “Todo dia surgem novas estatísticas que mostram o preço altíssimo que as restrições impostas pela covid-19 cobraram da vida das pessoas.” O lockdown foi uma política profundamente imoral, resume Joanna.
A paisagem da capital paulista nesta segunda década do século 21 é a prova disso. Pobre São Paulo.
Branca Nunes - Diretora de Redação - Revista Oeste