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terça-feira, 27 de julho de 2021

O português deveria ser um dos idiomas da ONU? - VOZES

No último dia 17 de julho foi celebrado o Jubileu de Prata da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.  
Criada em 1996, a CPLP foi a concretização de uma antiga ideia portuguesa, a de uma organização internacional que unisse a Lusofonia, a comunidade dos falantes de português. Seus objetivos declarados são a promoção e divulgação do idioma português, a cooperação diplomática entre os Estados-membros da CPLP, via o “reforço dos laços de solidariedade e de cooperação que os unem” e também a cooperação em áreas como educação, ciência e tecnologia, “para a promoção do desenvolvimento econômico social dos seus povos.” Outro objetivo, não tão declarado assim, por ser de longo prazo, é a adoção do português como um idioma oficial da ONU.
 

Big Stock

Quando de sua fundação, a CPLP foi formada por Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, e São Tomé e Príncipe. Em 2002, o recém-independente Timor-Leste se juntou e, em 2014, foi a vez da Guiné Equatorial, onde o português é um idioma minoritário, com o castelhano como língua mais falada. A CPLP também possui 32 Estados observadores, habitualmente países com comunidades lusófonas significativas em suas fronteiras ou que sejam fronteiriços aos países lusófonos. Outros desejam apenas usar a presença na CPLP como ferramenta de aproximação com os países lusófonos. Para a organização, mais observadores significa maior representatividade para o idioma.
Países observadores

As relações entre a abertura olímpica em Tóquio e a política internacional

O ex-covarde(mais do que uma homenagem a Nelson Rodrigues)

Na cúpula realizada no último final de semana, em Luanda, capital de Angola, foram admitidos dez novos países como observadores. Dois deles são casos curiosos e interessantes. Um é a Índia, onde Portugal possuiu diversos entrepostos e cidades costeiras entre o século XVI e o século XX. O caso mais notável é o de Goa, que foi retomada pelos indianos apenas em 1961. E sim, a palavra é retomada, com uma anexação usando a força militar, que deixou cinquenta mortos. A Índia sabia que Portugal não possuía os meios militares para interferir, além de não existir clima político mundial pela manutenção de domínios coloniais. Hoje a população indiana que fala português é ínfima, mas o idioma deixou  impacto em expressões idiomáticas regionais, por exemplo.

Outro caso interessante é o da Espanha. O
país ibérico, vizinho de Portugal, sempre viu com certa desconfiança o movimento da lusofonia. Isso é devido sua habitual política de evitar quaisquer sinais que possam ser interpretados de maneira que legitimem os separatismos do país. No caso, o separatismo da Galícia, já que, para alguns linguistas, o idioma galego seria apenas uma variação do idioma português, não um idioma próprio e separado.

Na Bahia, inclusive, há uma grande comunidade histórica de origem galega. Símbolos do legado dessa imigração são a cantora Gal Costa e o Galícia Esporte Clube, de Salvador, cinco vezes campeão estadual de futebol. A pressão pela associação foi da Academia Galega da Língua Portuguesa, sediada em Santiago de Compostela. Um caso curioso de país que se tornou observador nessa cúpula, em que o Brasil foi representado pelo vice-presidente Hamilton Mourão, foi os EUA. Proporcionalmente, apenas 0,3% da população do país é falante de português. Em números absolutos, o um milhão de falantes de português torna a comunidade lusófona dos EUA maior que a de Cabo Verde ou a de São Tomé e Príncipe. O Reino Unido e a França, devido às suas comunidades de origem portuguesa, já eram Estados observadores. O Japão também, desde 2014, por motivos óbvios, com a intensa imigração japonesa para o Brasil, mesmo motivo do status de observador da Itália.
Acordo de vistos

Além da política internacional, algo firmado na última cúpula que pode interessar ao leitor é o acordo de mobilidade, visando facilitar a concessão de visto, circulação e autorizações de residência de cidadãos entre os países do grupo. Ainda assim, os parâmetros objetivos ainda não foram estabelecidos. O acordo precisa ser ratificado pelos parlamentos nacionais dos membros da CPLP, e os governos nacionais definirão suas regras de circulação. Muito provavelmente, dentro de um quadro geral e abrangente de orientações, teremos acordos bilaterais mais específicos. O motivo, obviamente, é o fato de Portugal fazer parte do Espaço Schengen, ou seja, suas fronteiras abertas com a União Europeia implicam em regras mais rígidas para imigração.

Esses acordos provavelmente vão facilitar a vida de três categorias profissionais de brasileiros: jornalistas, acadêmicos e trabalhadores de empresas multinacionais ou que pretendam expandir suas operações no exterior. Profissionais liberais, com políticas mais ágeis de validação de diplomas, também podem ser eventualmente beneficiados. No médio prazo, o fluxo comercial entre esses países pode eventualmente ser intensificado. Os laços econômicos entre Brasil e Angola, inclusive, são historicamente pouco explorados, com apenas alguns momentos de maior intensidade. Isso é um desperdício, dada a proximidade geográfica, o tamanho do mercado angolano e, claro, os laços históricos e culturais.

Independente de vistos e fluxos comerciais, a intenção de Portugal em propor a criação da CPLP está na busca do uso do idioma como uma ferramenta de projeção de política externa, um fator de soft power. Para poder executar essa política, entretanto, não bastaria apenas o país europeu e seus dez milhões de habitantes. Quando Angola, Moçambique e o gigantesco Brasil entram na conta, entretanto, a Lusofonia torna-se o segundo maior território do mundo, se fosse um país, e o quarto maior produtor de petróleo. E a projeção do laço pelo idioma português também facilitaria o reconhecimento da língua como um idioma oficial da ONU.

Nações Unidas
Quando da fundação da Organização das Nações Unidas, ela tinha cinco idiomas oficiais. Inglês, francês, russo e chinês idiomas das cinco potências permanentes do Conselho de Segurança, mais o castelhano, idioma oficial de dezenove países dos cinquenta fundadores da ONU, quase metade. Em 1973, o idioma árabe foi adicionado à lista. O contexto mundial era outro. Com o fim dos impérios coloniais europeus pós-Segunda Guerra Mundial, 23 países tinham o árabe como idioma oficial. Como consequência, desde então, o português é o idioma com maior número de países que o adotam como idioma oficial e que não é uma língua oficial da ONU.

Esse é o principal argumento pela adoção do português como idioma oficial da ONU, a sua representatividade, presente em quatro continentes. O reconhecimento, supostamente, traria maior representatividade diplomática aos países lusófonos, além de maior difusão da língua e da cultura lusófona. Argumentos contrários são, primeiro, o fato de que, em números absolutos, o português não é um dos idiomas mais falados do mundo, atrás do hindi e do bengali, dentre outros, e, segundo, os custos econômicos da burocracia desse reconhecimento. Quando o árabe foi adotado como o sexto idioma oficial da ONU, os países árabes aceitaram custear a adaptação por cinco anos.

Proporcionalmente, esse custo recairia especialmente ao Brasil e a Portugal. No caso brasileiro, infelizmente, o país flertou com o “calote” em organizações internacionais nos últimos anos. [calote? ou economia? 
na real, na sinceridade, qual a importância da ONU? 
se omitir em matanças tipo a da Síria e chancelar o assassinato de civis palestinos por aviões caça, de última geração, da poderosa Força Aérea de Israel.] Algo longe das obrigações de um país que se pretende como candidato a um assento permanente em um eventual Conselho de Segurança expandido. Ou seja, muito provavelmente, o plano de ver o português como idioma oficial da ONU vai continuar como um sonho de longo prazo. Isso não quer dizer que, até lá, outras pautas possam ser elaboradas e acordadas, com uma maior integração da comunidade lusófona internacional. Já escreveu Fernando Pessoa, “A minha pátria é a língua portuguesa”.

Felipe Figueiredo, colunista - Gazeta do Povo - VOZES 


sexta-feira, 18 de outubro de 2019

Choro sobre o óleo derramado - Fernando Gabeira - Fernando Gabeira

Há três semanas ando pelas praias do Nordeste e não consigo chegar a uma conclusão sobre esse desastre. Foi relativamente fácil seguir os efeitos da mancha, no sentido norte-sul, observar seus efeitos na areia e nos seres marinhos. No entanto, é muito complicado seguir a mancha para trás, em busca de suas origens. Satélites americanos foram usados para isso e não encontraram rastros. Parece que a mancha engana satélites.

Baseado em fotos postas à disposição pelos europeus, pesquisadores da Universidade da Bahia chegaram a ver o que poderia ser uma nova mancha de 22 quilômetros quadrados a caminho da costa baiana. Essa possibilidade foi desmentida. O Ibama sobrevoou a região e não a viu. Chegou a supor que os pesquisadores se tivessem enganado, pois havia nuvens dificultando a visibilidade. A técnica usada para calcular a mancha baseia-se na rugosidade da água. A região apontada como problemática era lisa, chata. A suposição era de que o óleo dominasse a superfície. Os americanos, ao afirmarem não ter conseguido rastrear a mancha, confirmam indiretamente a ideia de que o óleo, mais pesado, afunda e navega numa camada inferior.

Minha experiência induz a uma comparação com o desastre na Galícia, que cobri em 2003. Um petroleiro chamado Prestige derramou 770 mil toneladas de óleo na costa da Espanha. A Galícia, região cruzada por petroleiros mal equipados e semiclandestinos, já conhecera outros vazamentos.Pode ser que isso esteja acontecendo com navios que saem da Venezuela, de onde veio o petróleo vazado. Pressionados pelas sanções americanas, fazem de tudo para escoar a produção, que, de modo geral, vai para a Índia e a China. Barris de rejeitos foram encontrados nas praias com inscrições da Shell. Pesquisadores dizem que rejeitos e óleo derramado na praia são a mesma substância. A Marinha discorda. A Shell também desmente.

Tudo isso se passa com relativo desinteresse nacional. Deputados e senadores foram ao Vaticano e deram as costas para as praias manchadas. O próprio Bolsonaro acusou esquerda, ONU e ONGs de ocultarem o desastre por a origem do óleo ser a Venezuela. Além de denunciar a esquerda, Bolsonaro pouco fez. Em Sergipe foi preciso uma determinação judicial para que protegessem a foz dos Rios São Francisco, Sergipe, Vaza Barris e Real, entre outros. [a decisão judicial foi suspensa, visto que o próprio Ibama reconheceu ser o bloqueio por boias, inadequado para a região.]

Embora possa haver um componente político no relativo desinteresse, vejo outras razões para ele. Há muita atenção para certos biomas, como a Amazônia, pois são vistos como decisivos para as mudanças climáticas. Ignoram-se em grande escala o papel dos oceanos e a importância das correntes marinhas no aquecimento do planeta. Num encontro internacional realizado na Inglaterra, alguns cientistas chegaram a dizer que as correntes marinhas e sua dinâmica é que iam determinar a irreversibilidade do aquecimento global.

Uma semana antes do desastre comecei a ler o livro de Rachel Carson sobre o litoral. Além de excelente escritora, Rachel Carson dedicou-se à zoologia marinha. A riqueza biológica do litoral é descrita por ela com detalhes, desde caranguejos do tamanho da unha do polegar a seres maiores, passando por medusas, nereidas, uma paisagem visual e verbalmente encantadora. Na medida em que conseguirmos transmitir a riqueza da vida oceânica, talvez o interesse aumente.  Na Galícia, em 2003, vi muitos voluntários limpando as praias. Neste desastre no Nordeste também houve movimento, crianças em Alagoas, artistas na Bahia, todos empenhados em tirar a sujeira da praia. Discussão política, requerimentos, comissões, enfim, todo o zum-zum em torno de um desastre tem o seu papel. Usar uma pá e sujar os pés é mais eficaz.

Assim como na Galícia, estamos diante de um problema internacional. Como controlar os navios bandalhas que enganam a fiscalização e descumprem normas de segurança? Se o desastre foi mesmo provocado por um petroleiro, o que me parece mais lógico, o Brasil teria de acionar mecanismos internacionais de controle. Não fazer nada implica esperar um novo desastre, que fatalmente virá. Ainda não sabemos o impacto real do óleo derramado. Temos as praias como alvo porque sua limpeza é essencial para o turismo. Mas há os manguezais e o consumo de crustáceos e moluscos tem um grande papel na dieta da população litorânea. Aí se joga também um jogo mais difícil: limpar os mangues demanda técnica e roupa especial. Ainda assim, é difícil.

Fico pensando num peixe-boi que é acompanhado pela Fundação de Mamíferos Aquáticos. Chama-se Astro e nada agora entre a Praia do Coqueiro e Mangue Seco, na Bahia. Astro é tão tranquilo quanto à presença humana que foi atropelado por barcos 13 vezes. Depois de escapar com vida dessas trombadas, enfrenta um novo momento. O equipamento que o monitora está coberto de óleo. Ele parece que segue bem. Mas, sem dúvida, a vida no mar, que é o berço da própria vida, tornou-se uma aventura perigosa. O transporte clandestino de combustível é um tema que merece cuidado especial. Tende a produzir desastres.

Inúmeras vezes, entre Boa Vista e Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, parei para documentar os destroços de carros incendiados. Em geral eram de pequenos contrabandistas fugindo da polícia.  Não adianta apenas criticar a esquerda e as ONGs que cuidam mais dos biomas que estão na moda. Ou culpar a esquerda, que levou anos para descobrir o verde e possivelmente levará séculos para ver o azul. O transporte marítimo de petróleo depende de um controle internacional das embarcações. O Brasil foi vítima. Precisa fazer algo, caso contrário as possibilidades de novo desastre aumentam. O oceano que deixaremos para as novas gerações nunca mais será o que encontramos. Mesmo assim, é preciso resistir.

Artigo publicado no Estadão em 17/10/2019

Blog do Gabeira - Fernando Gabeira, jornalista