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quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

FHC e sua curva de Sartre a Huck



A nova cartada do grão-tucano revela o esgotamento de seu partido, de sua prática
Quando Fernando Henrique Cardoso se referiu à candidatura de Luciano Huck à Presidência da República, louvou “suas boas intenções” e disse que “para o Brasil seria bom, mas não sei o que ele vai fazer”. FHC sabe o que gostaria que ele fizesse, mas não sabe o que Huck fará, nem antes nem depois de uma eventual candidatura. Sabe apenas que tem “boas intenções”.

Faz tempo que FHC flerta com o “novo”. Em 1989, para um pedaço do tucanato, o “novo” era o ator Lima Duarte, de 59 anos, para ser o candidato a vice na chapa de Mário Covas à Presidência da República. O “novo” chamou-se Fernando Collor e foi eleito. Em 2012 pensou-se pela primeira vez em Huck, recrutando-o para uma candidatura ao Senado em 2016. 

Estranho “novo” esse, vem sempre da telinha. Isso num partido que perdeu quatro eleições presidenciais e tem em Geraldo Alckmin seu provável candidato. Assim, o PSDB terá oferecido ao eleitorado dois repetecos, com José Serra e Alckmin, mais um “novo” com Aécio Neves.  FHC buscou o “novo” na telinha por diversos motivos, mas acima de todos está o desejo de ganhar a eleição. Se ele conhece virtudes além das “boas intenções” de Huck, não as revelou. Nem ele nem o “novo”, que, em um ano de breves enunciados, repetiu platitudes capazes de humilhar campeões do óbvio como Michel Temer e Geraldo Alckmin.

Em 1960, aos 29 anos, Fernando Henrique Cardoso fez-se notar na academia paulista coordenando uma palestra do escritor francês Jean-Paul Sartre. Passou-se mais de meio século, ele governou o país por oito anos e recuperou a credibilidade econômica do Brasil. Fez isso com jovens audaciosos como Pedro Malan e Gustavo Franco mas, por artes de Asmodeu, o PSDB nada produziu além de Geraldo Alckmin e Aécio Neves, um “novo” que descarrilhou. (Vai aqui uma hipótese: Malan e Franco nunca se moveram nos trilhos por onde andou Aécio.)

Não se pode responsabilizar FHC pela ruína do PSDB, mas ele foi parte dela. Quando saiu do PMDB, acompanhando Mário Covas e Franco Montoro para livrar-se das práticas que o haviam contaminado, buscava algo novo e foi bem-sucedido. O tucanato envelheceu, em vários sentidos.  Indo buscar o “novo” na telinha, FHC e os articuladores da candidatura de Huck atestam o fracasso de suas práticas políticas. Huck é um profissional bem-sucedido no seu ofício, nada mais que isso. Num sistema em crise, a política francesa produziu Emmanuel Macron, um quadro saído da militância do Partido Socialista e do banco Rothschild. (Macron é seis anos mais novo que Huck.)

Huck é um bom candidato para quem tem medo de perder eleição, e só. De Sartre a Huck, FHC percorreu sua curva. Em 1960, a plateia tinha faixas que diziam “Cuba sim, ianques não”. Naquele ano, uma parte do andar de cima nacional, cansada de perder eleições, embarcou na candidatura de um político telúrico e bom de votos. Chamava-se Jânio Quadros. (É imprópria qualquer comparação de Huck com Jânio, um doido, larápio e dado ao copo.) A ideia central era ganhar a eleição.

Os poderes da telinha produziram dois fenômenos políticos. Primeiro, o italiano Silvio Berlusconi, pela propriedade do meio de comunicação. O segundo, Donald Trump, em parte celebrizado pelo seu programa “The Apprentice”.

Elio Gaspari é jornalista - O Globo


sábado, 23 de julho de 2016

A Hora do Medo

Quando li sobre o ataque a machadadas e facadas feito pelo afegão de 17 anos em um trem que chegava a Würzburg, Alemanha, fiquei muito chocada. Como pode um adolescente ainda tão próximo da infância ser assim cruel, violento, desgraçado?

O que será que o levou a se transformar nesse monstro? Depois, como se alguém puxasse pelos meus cabelos para que meu cérebro acordasse, eu me dei conta de que, para uma carioca, ler esse tipo de notícia não devia ser chocante. Triste, sim, sempre. Mas chocante não já que aqui, nesta linda e outrora aconchegante cidade, crimes cruéis são cometidos a cada 2 horas. Já devia estar habituada a ler sobre o mal, o ódio, a sanha que pode levar o homem a se transformar numa besta-fera.

A VEJA de 13 de julho faz um relato do que aconteceu nas primeiras 48 horas do mês de julho: das 20 horas do dia 1º, uma sexta-feira, às 20 horas do domingo 3, foram vinte e sete mortos,  vinte feridos, dezenove tiroteios, sete arrastões. [clique para ler] 

A descrição de alguns dos crimes cometidos nessas 48 horas é terrível.  Depois de ler a reportagem, podemos avaliar o crime do afegão como brutal, feroz, bestial? E é nesta cidade que teremos no mês de agosto os Jogos Olímpicos. O cenário é perfeito, o carioca já gosta de uma festa, é apaixonado pelo circo.  Ao pão creio mesmo que prefere o circo. Receberemos  milhares de pessoas, boas, más, violentas, pacíficas, cruéis, bondosas, perigosas, gente de todo tipo.

Minha oração a Deus é que não permita que a espoleta que esses visitantes possam trazer chegue perto da pólvora que nossa criminalidade armazena há tanto tempo... O terror que ameaça o mundo de hoje ficará tentado a vir ao Rio? Aqui encontrará guarida entre os traficantes? Morro de medo dessa gente, confesso. E mais insegura fico ao ver as declarações conflitantes de nossas autoridades. O prefeito dá entrevistas divergentes ao The Guardian. Ora o Rio está à beira de muitas tragédias, ora se você quiser desfrutar de um agosto tranquilo, venha para o Rio.

O governo francês pede proteção extra para os liceus que mantém no Brasil e para as sedes de suas escolas de língua francesa em território brasileiro.  Nossa Abin se aconselha com o Mossad, com o FBI, com a CIA...  E querem me fazer crer que não há razão para medo?
O medo é o sentimento mais primitivo do homem. Os recém-nascidos tremem na mão do parteiro que os segura mal saem do ventre de suas mães e é de medo que tremem.  O coração acelera, a respiração fica ofegante,  as pernas e os braços se agitam.  É o corpo se defendendo do medo.  E por toda a nossa vida, em momentos de grande medo, assim ficaremos.
Eu me pergunto como se pode matar o medo? Como dar um tiro no coração de um fantasma, ou cortar sua cabeça fantasmagórica,  ou estrangular sua garganta espectral?”, foi a pergunta que Joseph Conrad fez e que ficou sem resposta.

Já Averróis, Jean-Paul Sartre e Umberto Eco não nos deixaram perguntas sobre o medo; definiram o que pensavam sobre esse sentimento que pode ser devastador:

De Averróis: A ignorância leva ao medo, o medo leva ao ódio e o ódio conduz à violência.  Eis a equação.
De Sartre:  Todos os homens têm medo. Quem não tem medo não é normal; isso nada tem a ver com a coragem.
De Eco: É sempre melhor que quem nos incute medo tenha mais medo do que nós.

Será? Neste Rio onde há uma morte a cada duas horas, onde a vida não vale nada, onde matar um ser humano é o mesmo que pisar numa formiga? Estou com muito medo. Quero afastar esse sentimento negativo, feio, escuro. Mas como?

Na verdade, o mundo está ameaçado. A maldade e o ódio parecem dominar todos os países. Nice, Paris, Bruxelas, Londres, Orlando, Madrid... Não há como fugir da constatação: como é frágil esta nossa nave.

Fonte: Blog do Noblat - Maria Helena Rodrigues Rubinato de Souza