Em vez de brigar com os dados e só ouvir os áulicos, Bolsonaro devia ouvir mais Terezas Cristinas
Quando os jornalistas perguntaram ontem ao presidente Jair Bolsonaro sobre a preocupante erosão de sua popularidade, com aumento bem fora da curva dos índices de rejeição, ele voltou-se para um deles e desdenhou, com seu jeitão “simples e transparente”: “Você acredita em Papai Noel?”. Não, presidente, acreditamos nas pesquisas de opinião, como no IBGE, Inpe, Ibama, Fiocruz, ICMBio, Ancine, na ciência, nas universidades, na educação que vai além do ensino, na diplomacia dos bons modos, nos direitos humanos e, claro, na defesa do meio ambiente.[qual o valor de pesquisas faltando mais de três anos para as próximas eleições presidenciais?
um ponto digno de ser evitado, desde agora, pelo nosso presidente Jair Bolsonaro é insistir em medidas desagradáveis para os eleitores, entre elas a TENTATIVA da volta da CPMF - se voltar Bolsonaro perde as eleições de 2022 - o fim de deduções no IR e outras 'bondades'.
A demissão sumária do Marcos Cintra seria uma forma do presidente mostrar - fazendo, não dizendo - quem manda no governo.]
Todos os presidentes, em diferentes épocas, reagem mal a dados negativos
sobre seu governo e sua popularidade e preferem se trancar nos
palácios, ouvir os áulicos cheios de elogios ou circular em ambientes
francamente favoráveis – como os militares e evangélicos, no caso de
Bolsonaro. É uma fuga da realidade. Quem mais perde é o próprio
presidente, além do seu governo. Melhor do que filhos, generais, assessores e a legião de “amigos” que
frequentam palácios e melhor do que multidões selecionadas, seria o
presidente chamar políticos experientes e de bom senso, com coragem e
independência, para lhe dizer as verdades que ele não gosta de ouvir e
os outros não admitem falar.
Um exemplo é a ministra da Agricultura, Tereza Cristina. Na crise
doméstica e internacional das queimadas, ela jogou um balde de
serenidade para apagar as labaredas reais e de comunicação. Enquanto
outros atiçavam o fogo e as guerras do presidente, ela lembrou os danos
que isso causaria à imagem e aos produtos brasileiros e sugeriu: em vez
de botar mais lenha na fogueira, por que não apresentar soluções
práticas e agir? Bolsonaro mudou de tom, convocou um gabinete de crise, chamou as Forças Armadas e o governo passou a anunciar providências. Lucraram todos,
principalmente ele e a própria Amazônia. E a guerra particular contra
Macron? Bem, é outra história, que foge à alçada de Tereza Cristina. Ela
não pode tudo.
É preciso que mais Terezas Cristinas se aproximem do presidente, fazendo
um contraponto aos que só dizem amém e debatendo os dados do Datafolha
com seriedade e vontade de captar os recados, aprender e corrigir. Pela
pesquisa, a rejeição a Bolsonaro disparou para 38%, um recorde absoluto
para presidentes nessa fase de mandato. Pela primeira vez, a rejeição (ruim e péssimo) ultrapassou o regular e a
aprovação (bom e ótimo), quebrando o equilíbrio anterior entre os três.
Mas o mais importante é que essas conclusões não surpreenderam os
analistas. Logo, não deveriam surpreender o Planalto e muito menos serem
rechaçadas pelo presidente.
É só enumerar os absurdos que Bolsonaro diz, como a história do cocô, ou
faz, como indicar o próprio filho, o “garoto”, para a principal
embaixada do planeta. E o “herói” Brilhante Ustra? E remoer a dor do
presidente da OAB diante da tortura e “desaparecimento” do pai? E as
picuinhas contra a imprensa? E a manipulação, até emocional, de Sérgio
Moro? E o ex-Coaf, a Receita, a PF? A cada uma delas, é natural que as
pessoas se espantem e que a popularidade caia. Só o presidente e seu
entorno poderiam achar que esse conjunto não afetaria sua popularidade.
Bolsonaro não admite que está errando. Ao contrário, dá de ombros, diz
que ele “é assim mesmo” e tenta capitalizar a imagem de “transparência” e
“simplicidade”. Como se vê, não está funcionando, mas o presidente, em
vez de frear, mete o pé no acelerador, sob aplausos de quem parece que
está ajudando, mas só está pensando no seu carguinho e em se manter nas
graças do presidente. Assim como Bolsonaro muitas vezes não ajuda e só
atrapalha seu governo, essa posição cômoda de muitos do governo não
ajuda Bolsonaro, só piora as coisas.
Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo