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sábado, 18 de fevereiro de 2023

Ambiguidade do Artigo 142 da Constituição alimenta imaginário golpista - O Globo

Está na hora de fechar a porta para interpretações golpistas do Artigo 142 da Constituição Federal. Desde a Assembleia Constituinte de 1987-1988, o Artigo 142 contém uma ambiguidade que, embora flagrantemente incompatível com o espírito democrático da Constituição, alimenta o imaginário golpista de setores ligados aos militares. Não dá mais para deixar essa porta entreaberta.

O Artigo 142 diz que as Forças Armadas se destinam “à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.

Na proposta original do artigo que tratava das Forças Armadas, o deputado Bernardo Cabral propunha que as Forças Armadas se destinam “a assegurar a independência e a soberania do País, a integridade do seu Território, os poderes constitucionais e, por iniciativa expressa destes, nos casos estritos da lei, a ordem constitucional.” [o próprio articulista reconhece que "... o deputado  Bernardo Cabral propunha ..."- portanto, exercia o direito de propor. 
Os militares,  exercendo o direito de ter opinião, introduziram, via constituintes aliados, versão promulgada = aprovada pela maioria  dos constituintes = " ...e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem."
Assim, prevaleceu a vontade da maioria dos constituintes. 
Não há sentido de se falar em ambiguidade, já que além da clareza do texto promulgado, no § 1º, do artigo em questão, foi estabelecido: " Lei complementar estabelecerá as normas gerais a serem adotadas na organização, no preparo e no emprego das Forças Armadas".
Exigência que foi atendida pela LCP 97, 09 junho 1999 - governo democrático de FHC.
Só que a LCP citada, apesar de criada atendendo mandamento constitucional, parece que 'não pegou', visto ser,  em nossa opinião de leigos, bastante clara, e se encontrar em plena vigência, tem sido ignorada.] 

Forças ligadas aos militares lutaram para introduzir no artigo a expressão “garantia da lei e da ordem” que aludia ao papel moderador das Forças Armadas presente em Constituições passadas, desde 1891. Isso lhes asseguraria poder de tutela quando a ordem interna fosse ameaçada. O ponto intermediário foi proposto pelo então senador Fernando Henrique Cardoso, que introduziu a redação que falava em garantia da lei e da ordem, mas a condicionava ao chamado de um dos Poderes constituídos.

Essa ambiguidade que parecia enterrada pela História começou a ser reavivada por setores autoritários da nova direita. Virou lugar-comum nas manifestações bolsonaristas o pedido de uma “intervenção militar constitucional”, “autorizada” pelo Artigo 142.

Tal visão se apoia na extrapolação da interpretação do Artigo 142 feita pelo jurista conservador Ives Gandra Martins. Num artigo jurídico, ele diz que “se um Poder sentir-se atropelado por outro, poderá solicitar às Forças Armadas que ajam como Poder Moderador para repor, naquele ponto, a lei e a ordem”. Segundo essa interpretação, se Executivo e Judiciário entrarem em conflito, o Executivo poderia acionar a mediação pontual das Forças Armadas. O que os bolsonaristas têm pedido, porém, é uma intervenção desse tipo, mas que vá além de uma arbitragem pontual: seria uma intervenção duradoura pretensamente respaldada pela Constituição.

O artigo de Ives Gandra foi publicado logo depois da decisão do Supremo que suspendeu a indicação de Alexandre Ramagem para a direção da Polícia Federal, em 2020. Vários bolsonaristas viram na publicação um sinal de que as Forças Armadas poderiam ser acionadas pelo presidente para resolver a disputa entre Executivo e Judiciário.

A polêmica foi tamanha que a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados produziu na ocasião um parecer esclarecendo que “jamais caberá ao presidente da República, nos marcos da Constituição vigente, convocar as Forças Armadas para que indiquem ao Supremo Tribunal Federal a interpretação correta do texto constitucional diante de uma eventual 

Duas saídas têm sido pensadas para pôr fim às perigosas ambiguidades envolvendo o Artigo 142: uma por meio do Congresso, outra por meio do STF.

Na segunda-feira, o PSOL pediu ao STF a declaração de inconstitucionalidade de interpretações golpistas do Artigo 142 que concebam as Forças Armadas como Poder Moderador e permitam uma ruptura do regime democrático ou a instauração de um regime de exceção. O partido pede a responsabilização criminal, cível, política e administrativa de todos os que incentivem essa interpretação.

A solicitação do PSOL dá sequência ao pedido feito pelo PDT em 2020 para que a Corte esclarecesse o alcance do Artigo 142. Na resposta, o ministro Luiz Fux foi enfático ao dizer que a missão institucional das Forças Armadas “não acomoda o exercício de Poder Moderador entre os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário”. Fux também será o relator da nova ação movida pelo PSOL.

Os deputados petistas Carlos Zarattini e Alencar Santana começaram a circular nesta semana a minuta de uma proposta de emenda constitucional para alterar o Artigo 142. A ideia é retirar o trecho controverso e dizer que as Forças Armadas “destinam-se a assegurar a independência e a soberania do país e a integridade do seu território”.[a tal proposta não está sendo bem acolhida. Confira: PT abre debate para alterar artigo 142 da Constituição. - O GLOBO]

Opinião - O Globo

 

terça-feira, 28 de maio de 2019

O limite entre as ruas e o governo

As ruas são livres para gritarem o que quiserem, mas o governo não pode ecoar ou estimular os discursos extremos e antidemocráticos

A lucidez de não ecoar discursos antidemocráticos

Quem foi para a rua, mesmo para criticar as instituições democráticas, tinha o direito de estar lá. Na democracia, essa liberdade é consagrada. A questão a discutir não é o ato em si, mas toda a ambiguidade que está presente em alguns atos e palavras das autoridades. O presidente Jair Bolsonaro que considerou legítimas as manifestações de domingo chamou de “idiotas” os que fizeram os protestos do dia 15. São dois pesos, duas medidas. Ele não foi, mas deu um mote enviesado quando divulgou, dias antes, texto em que sugere que está sendo impedido de governar, e ontem ao falar que o movimento fora “um recado contra aqueles que teimam nas velhas práticas”. [querem criminalizar Bolsonaro por considerar, acertadamente, que paus mandados da turma do 'quanto pior, melhor', idiotas úteis. Da mesma forma, criticam Bolsonaro por quando faz política, utilize o que é mais comum no politiquês: falas com ambiguidade e espaço para serem subentendidas é o mais comum naquela linguagem.]

Bolsonaro deixa subentendidos demais quando fala sobre a relação com o Congresso. Dá a entender que seus problemas são derivados de os políticos o estarem pressionando para usar a moeda da corrupção nas negociações para formar uma coalizão. E essa mensagem esteve presente nos atos de domingo, personificada no ataque direto ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia.  Já as críticas ao Supremo Tribunal Federal (STF) estiveram presentes até na boca de parlamentares do partido. O deputado estadual Filippe Poubel (PSL-RJ) repetiu a frase do terceiro filho do presidente, deputado Eduardo Bolsonaro: “Para fechar o Supremo só precisa de um soldado e um cabo.” O senador Major Olímpio (PSL-SP) ameaçou: “Nos aguarde STF.”

Isso não quer dizer que a maioria dos que foram às ruas tinha esse objetivo, mas o fato de ser dito em alto e bom som por parlamentares do partido do presidente não pode ser subestimado. A democracia aceita protestos contra as instituições que a sustentam, mas essas falas, entre tantas outras, mostraram que o governo Bolsonaro flerta frequentemente com a ameaça à democracia.  O país está diante de uma situação difícil. A economia não deslancha, a confiança dos empresários e operadores de mercado está em queda livre, as contas públicas estão com forte déficit. Além disso, é necessário passar pelo Congresso matérias complexas, como a reforma da Previdência, o crédito suplementar de R$ 248 bilhões, a mudança na lei de teto de gastos para permitir o acordo com a Petrobras e a distribuição dos recursos. Se não tiver um bom diálogo com o Parlamento, o Executivo pode enfrentar derrotas e alterações indesejáveis nos projetos.

A manifestação não foi tão grande que tivesse dado a Bolsonaro o capital político extra com o qual ele sonhava. Mas foi relevante. E poderia até fortalecer as reformas, se Bolsonaro demonstrasse empenho em construir uma maioria para aprová-las. Ele estimulou a ida às ruas para dar uma resposta aos protestos contra os cortes na educação. Não foi por entusiasmo com a mudança da Previdência. Como ele já disse várias vezes, se pudesse, não faria a reforma.

O grande problema tem sido a dificuldade de o presidente Bolsonaro entender que quem é eleito governa, quem não tem maioria tem que negociá-las, quem comanda o Executivo precisa defender seu projeto diariamente. Que as redes sociais sempre serão uma forma subsidiária de comunicação e que o tempo de suas declarações irresponsáveis quando era apenas um parlamentar de desempenho pífio encerrou-se quando foi escolhido para liderar o país nas últimas eleições.
Nas manifestações de domingo havia pessoas defendendo suas convicções. Excelente. Foi para isso que o país lutou contra o período ditatorial que por tanto tempo reprimia, muitas vezes com violência, qualquer passeata, e que editou um Ato Institucional que proibia reuniões políticas. A democracia aceita até que se manifestem os saudosistas do tempo em que a liberdade foi cerceada. Mas cabe às lideranças do país tomarem precauções para não incentivar um tipo de ataque às instituições como algumas que foram vistas nas ruas de domingo. Pedir o fechamento do Supremo, demonizar qualquer negociação política como sendo pressão pela “volta das velhas práticas”, afirmar, como fez Bolsonaro, que é preciso “libertar” o país é atravessar uma linha que não deve ser transposta numa República que teve duas ditaduras nos últimos 90 anos. Que as ruas falem sempre o que quiserem, mas que os governantes tenham a lucidez de não ecoarem os extremos.


Coluna da Miriam Leitão - O Globo