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terça-feira, 12 de janeiro de 2021

Bolsonaro, soldados e policiais - O Estado de S. Paulo

Opinião

Jair Bolsonaro é o comandante supremo das Forças Armadas. Deve atuar como tal.

A presença de militares e ex-militares no governo federal é uma característica da administração de Jair Bolsonaro. Desde a redemocratização do País, nunca houve, por exemplo, tantos ministros de Estado com histórico profissional vinculado às Forças Armadas. Logicamente, essa característica do governo Bolsonaro desperta uma natural apreensão, seja pelos possíveis efeitos que essa participação pode provocar na imagem e no comportamento das Forças Armadas, seja porque, em um Estado Democrático de Direito, os militares têm uma função institucional muito clara – bem distante da política. [certíssimo - em um Estado Democrático de Direito, só que no Brasil o 'estado democrático de direito' deixa a impressão de ser flexível, ter lado e muitas vezes medidas tomadas sob a invocação do mesmo, contrariam a Constituição Federal, violam direitos, em que pese nos parecer existir a necessidade do EDD e da CF se complementarem.] 

É preciso, no entanto, destacar outra característica do governo de Jair Bolsonaro em relação aos militares que, sem muitas vezes receber a devida atenção, pode ter efeitos especialmente desastrosos. Trata-se da tentativa constante do presidente Bolsonaro de estabelecer uma relação direta, de natureza político-ideológica, com soldados e policiais, desrespeitando os limites do cargo e as respectivas esferas dessas categorias.

Essa atitude do presidente Bolsonaro pode ser observada, por exemplo, em sua frequente participação em solenidades de formatura de militares ou de policiais. Segundo levantamento do jornal O Globo, de janeiro de 2019 a dezembro de 2020, Bolsonaro participou de 24 formaturas de membros do Exército, da Marinha, da Aeronáutica e das Polícias Militar, Federal e Rodoviária Federal. Na primeira metade do seu governo, esteve presente em 16 solenidades de formatura das Forças Armadas e em 8 de Polícias.

Não é demais lembrar que a presença do presidente da República numa solenidade das Forças Armadas não tem, por si só, nada de reprovável. Como dispõe a Constituição, o presidente da República é o comandante supremo das Forças Armadas. O que desperta preocupação no comportamento de Jair Bolsonaro são dois pontos: a alta frequência de sua participação nesses eventos – a revelar que não é algo circunstancial, mas tática política, com objetivo e método – e, principalmente, a mensagem que vem transmitindo às novas gerações de formandos de militares e policiais.

Estivesse apenas a exercer o papel de comandante supremo das Forças Armadas, o presidente Bolsonaro certamente aproveitaria esses eventos para recordar os deveres e princípios constitucionais relativos aos militares e às forças de segurança. No entanto, ele tem usado essas solenidades como palanque político-ideológico, difundindo ideias estranhas ao Estado Democrático de Direito.

No mês passado, por exemplo, o presidente Bolsonaro utilizou a cerimônia de formatura de soldados da Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro para atacar a imprensa. “Não se esqueçam disso, essa imprensa jamais estará do lado da verdade, da honra e da lei. Sempre estará contra vocês. Pensem dessa forma para poderem agir”, disse Jair Bolsonaro. [não podemos esquecer que nos discursos costumeiros em formaturas é praxe que o orador expresse elogios aos formandos, seus instrutores e também suas opiniões, incluindo eventuais desabafos;

lamentavelmente, o cerco implacável, realizado por grande parte da imprensa sobre o presidente Bolsonaro - até seus pensamentos seriam, se possível fosse, controlados - o leva a se  expressar com alguma veemência e mesmo aversão.

Temos certeza que a maioria concorda que a postura de grande parte da imprensa, em relação as autoridades policiais, especialmente a nossa valorosa POLÍCIA MILITAR, apresenta certa parcialidade condenatória aos policiais militares.]

A imprecação contra a imprensa parece ter sido retirada de algum discurso de Hugo Chávez. Sua fala não é condizente com o cargo de presidente da República, e menos ainda é adequada a uma formatura de policiais militares ou mesmo de estudantes. É tão fora de prumo o comportamento do presidente Jair Bolsonaro nas formaturas de militares e de policiais que sua constante presença nesses eventos, mais do que manifestação de prestígio para as respectivas carreiras, vem causando apreensão nas altas patentes. Não é para menos. Conhecem quão árduo é formar as tropas dentro do genuíno espírito militar e quão fácil é contaminar a soldadesca com questões político-ideológicas.

Desde o início, a trajetória política de Jair Bolsonaro foi marcada pela proximidade com policiais e militares de baixa patente. Suas campanhas eleitorais para o Legislativo sempre foram voltadas para essas categorias. Isso, no entanto, não lhe dá o direito de usar o cargo de presidente da República para fazer agremiação política com soldados e policiais. Como gosta de lembrar, Jair Bolsonaro é o comandante supremo das Forças Armadas. [se percebe que os inimigos do Brasil = inimigos do presidente, dedicam uma certa aversão ao dispositivo constitucional que atribui tão elevada honra ao chefe do Poder Executivo. Não entendem que um oficial intermediário do Exército Brasileiro exerça o elevado cargo de Presidente da República Federativa do Brasil e, como consequência, de COMANDANTE SUPREMO DAS FORÇAS ARMADAS.

Tanto que tais pessoas - adeptas do quanto pior, melhor -  já tentaram forçar a realização de um terceiro turno, pediram o impeachment do capitão, tentaram e continuam tentando  desmoralizá-lo, sugeriram que se suicidasse e a popularidade do presidente Bolsonaro só aumenta.]

Bolsonaro,Deve atuar, portanto, como tal. Essa competência constitucional traz graves deveres. Descumpri-los é abrir caminho para o desastre.

 Opinião - O Estado de S. Paulo

 

segunda-feira, 3 de junho de 2019

Tensão na fronteira

O dia em que um incidente banal por pouco não provocou um conflito militar entre o Brasil e a Venezuela


Era início da tarde de 24 de fevereiro, um domingo, quando a cúpula do Ministério da Defesa interrompeu o descanso para uma reunião emergencial. Militares de alta patente foram convocados pelo ministro Fernando Azevedo e Silva para discutir o fracasso da operação de envio de alimentos, remédios e material de higiene à Venezuela, país devastado pelo regime do ditador Nicolás Maduro. Naquele dia, quase 20 toneladas da ajuda humanitária doada pelos Estados Unidos, que seria entregue através da fronteira brasileira, não puderam entrar no território vizinho. Com medo de que o carregamento desestabilizasse ainda mais a sua gestão, exatamente o que pretendiam os governos brasileiro e americano, Maduro determinou o fechamento da fronteira. Houve confrontos entre venezuelanos favoráveis e contrários ao ditador, com direito a lançamento de coquetéis molotov e bombas de gás que respingaram em solo brasileiro. Na cidade de Santa Elena, a 15 quilômetros do Brasil, três pessoas morreram e dezenas ficaram feridas.

O nível de tensão já estava alto quando dois carros de combate do Exército venezuelano foram posicionados próximo a Pacaraima, cidade fronteiriça da Venezuela, localizada a 200 quilômetros de Boa Vista, a capital de Roraima. Seria o prenúncio de um ataque ao Brasil? Expoente da ala mais radical do governo, o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, considerou o ato uma agressão e uma ameaça à soberania nacional e pressionou para que o governo brasileiro respondesse à altura. O chanceler queria uma resposta militar. O ministro da Defesa, então, convocou a reunião emergencial, que durou cinco horas e da qual participaram, entre outros, o chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, e o porta-voz da Presidência da República, general Otávio Rêgo Barros. Foram analisadas diversas possibilidades de resposta ao governo venezuelano da negociação diplomática, como queria a ala ligada às Forças Armadas, ao confronto, como defendia o chanceler. Os militares, que se tornaram a reserva de moderação do governo Bolsonaro, concluíram que a ideia de Araújo era uma sandice e a descartaram. Por dois motivos.

Primeiro: os militares brasileiros que atuam na fronteira negociaram com os militares venezuelanos, que cederam e fizeram recuar os carros de combate. Honraram, assim, a tradição diplomática nacional de não atuar como interventores, mas mediadores de conflitos. Segundo: os militares brasileiros concluíram que o Brasil não teria condição — nem financeira nem logística de iniciar uma batalha. Mobilizar a estrutura de combate poderia implicar gastos de até 400 bilhões de reais, conforme cálculos preliminares de técnicos do Ministério da Defesa. Além disso, seria impossível organizar as tropas e direcionar o aparato necessário (munições, combustíveis, automóveis e suprimentos de manutenção) em tempo hábil. O Exército precisaria de pelo menos seis meses para se fazer presente na Região Norte em condições de guerrear com a Venezuela. Na reunião, também se descartou a possibilidade de um ataque aéreo, diante da informação de que as forças do país vizinho possuem mísseis russos que poderiam abater facilmente as aeronaves. Até surgiram dúvidas se tais mísseis estariam em boas condições ou se haveria militares capacitados para manejá-los, mas os brasileiros preferiram não pagar para ver. Também pesou o entendimento de que a própria população brasileira não apoiaria o conflito.

“Quanto custa à mãe receber um filho dentro de um saco preto? A população brasileira está interessada nisso?”, questionou um dos participantes da reunião. Após o encontro, o Ministério da Defesa emitiu nota em que ressaltou a negociação direta entre militares brasileiros e venezuelanos para a solução do problema. “A fronteira do Brasil continua aberta para acolher os refugiados”, dizia o texto. A posição de Ernesto Araújo, que também seduzia o deputado Eduardo Bolsonaro, o filho Zero Três do presidente da República, havia sido descartada. A VEJA, o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva, disse que a linha de conduta do Brasil já está traçada: é seguir a Constituição, que determina a não intervenção em outros países (veja a entrevista). Por enquanto, a guerra é outra.

Por dia, uma média de 500 venezuelanos entram no Brasil pelo município de Pacaraima. São pessoas interessadas em comprar alimentos, gasolina e material de higiene, mas há também fugitivos da ditadura de Maduro. VEJA acompanhou dois dias da operação militar na fronteira e em Boa Vista. As cidades mais parecem redutos venezuelanos. Nas rádios, nas ruas e em cartazes é fácil encontrar o espanhol como idioma corrente. A área externa da rodoviária de Boa Vista foi transformada em um grande acampamento improvisado para receber quem não consegue vaga nos abrigos específicos, que estão lotados. No galpão também improvisado ao lado do embarque e desembarque dos ônibus, dormem cerca de         1 000 venezuelanos em barracas emprestadas pelo Exército. Eles recebem três refeições diárias e têm direito a banheiro e chuveiro, um luxo para quem, em momentos de maior desespero, chegou a se alimentar de lixo . “Meus filhos estavam passando fome. Viver nesta situação hoje é melhor do que a que vivíamos lá”, conta a venezuelana Aracelis Arteaga, de 30 anos.

O acolhimento aos venezuelanos já encorajou 101 militares a abandonar o regime de Maduro e vir para o Brasil. A maioria dos desertores é de baixa patente. VEJA apurou, porém, que pela primeira vez um militar mais graduado decidiu buscar refúgio no país. Comandante do Esquadrão de Cavalaria Motorizada, o quartel venezuelano mais próximo do Brasil, o major José Gregorio Basante fugiu para Pacaraima na noite de 11 de maio. Às autoridades brasileiras, ele informou estar sendo acusado injustamente de crimes como tortura e roubo de combustível por discordar das práticas impostas pelo regime venezuelano. Segundo a sua versão, exigiam que ele cobrasse propina de garimpeiros e pagasse 100 gramas de ouro todos os meses para se manter no posto, o que teria se negado a fazer. O major entrou no Brasil após o governo venezuelano mandar prendê-lo. Sua mulher também escapou com a filha de 1 mês no colo. Basante tinha certeza de que, se ficasse na Venezuela, seria morto.

A chegada de militares é vista como um trunfo pela inteligência do Exército brasileiro. Ninguém melhor do que os desertores para detalhar as estratégias de Maduro e as reais condições das forças venezuelanas. Os brasileiros souberam, por exemplo, que na véspera da tentativa de entrega da ajuda humanitária foram deslocadas dez viaturas blindadas para o quartel de Santa Elena. A ordem era acioná-las caso a entrada dos mantimentos se confirmasse. A inteligência brasileira também foi alertada da possibilidade de Maduro estar infiltrando seus agentes em campos de refugiados. Um dado colhido serviu para tranquilizar os militares: as forças venezuelanas estariam mais sucateadas do que as brasileiras. O salário de um oficial intermediário das Forças Armadas venezuelanas equivale a cerca de 80 reais.

Publicado em VEJA de 5 de junho de 2019, edição nº 2637
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