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segunda-feira, 3 de fevereiro de 2020

Chuvas de verão - Fernando Gabeira

03.02.2020 Em Blog

Desde menino vejo as chuvas de verão. Para dizer a verdade, nasci numa delas e, segundo meu pai, era preciso se deslocar de canoa nas ruas do bairro. Talvez seja por isso minha ligação com essas chuvas. Cobri inúmeras, algumas delas dolorosas, como a da Serra Fluminense, em janeiro de 2011. Até hoje as fotos me emocionam, algumas delas nem tive coragem de publicar. Às vezes o acaso me aproxima das grandes tormentas. Estava em Florianópolis quando passou o furacão Catarina. Houve uma rápida discussão sobre o nome, ciclone ou furacão? A verdade é que a partir de certa velocidade dos ventos, o nome não importa; é preciso agir.

Ali aprendi que não estávamos assim tão indefesos diante do furacão. Bastava olhar para o Caribe, onde a experiência acumulada daria uma ajuda. Foi possível produzir uma cartilha baseada na experiência caribenha, orientar a população. Esta semana vi uma cena fantástica filmada em Belo Horizonte. Pessoas jantando num restaurante e vendo carros arrastados pela correnteza. Grandes chuvas e eventos extremos podem ter acontecido antes. O problema é que são mais frequentes. Ao longo desse tempo, não posso dizer que o Brasil está totalmente desprevenido. Novos instrumentos como a internet aumentam nosso poder. Numa grande chuva em 2009, experimentei trabalhar toda a noite no Twitter tentando articular as informações. Dentro dos limites, deu certo, foi possível transmitir informação aos bombeiros sobre pedidos de ajuda, divulgar informações úteis. Não podemos deter as grandes chuvas. Mas o preparo das comunidades é essencial. Há situações que precisam ser planejadas com antecedência.

Lembro-me de uma inundação em Santo Ant
ônio de Pádua. O hospital ficou impraticável. Inclusive a máquina de hemodiálise. E agora? Quem precisa, quem não precisa de hemodiálise? Como tirá-los daqui? A retirada para o Espírito Santo foi por helicóptero.  Daí a necessidade nesses novos tempos das comunidades se conhecerem, terem lugar fixo para os barcos, a lista das pessoas com dificuldade de locomoção, os pontos de fuga e abrigo. A preparação é apenas um dado. Você pode convencer mesmo a pessoa que não acredita no aquecimento global, numa terra redonda, em Darwin ou até na vacina. O mais difícil é a discussão sobre o tipo de desenvolvimento que pode atenuar mais ainda os efeitos das mudanças climáticas. Belo Horizonte foi uma cidade planejada para domar a natureza, canalizando os rios e estendendo sobre eles seu tapete de asfalto.

As chuvas mostraram que esse não é o caminho. A ideia de domar a natureza, submetê-la aos nossos planos intelectuais, acaba nos levando a um destino trágico. Só agora grande parte das pessoas compreende que é preciso se adaptar à natureza, crescer sem violentá-la. Mas agora o tempo é muito curto. A ideia de adaptação ganha contornos urgentes. É uma pena que essa preparação para os novos tempos não ocupe a agenda dos políticos.  Certamente falarão disso nas eleições, mas como explicar sua ausência junto às comunidades orientando para a autodefesa?

Não será certamente por eles. É a própria sociedade que aos poucos vai assumindo seu papel. Tenho modesta esperança também num jornalismo preventivo. Estou esperando passar um pouco a emergência e visitar algumas cidades atingidas, como Cachoeiro do Itapemirim, Espírito Santo, com uma pergunta: qual o nível de preparação da cidade quando caíram as chuvas? Dessas respostas podem surgir algumas indicações válidas para um universo mais amplo.  Nasci e possivelmente morrerei em tempos de grandes chuvas. Gostaria muito de introduzir na agenda essa preparação do Brasil para os eventos extremos. É o modo de seguir a lição paterna na tempestade: usar a canoa para conviver com as inundações.

A relativa indiferença diante da chuva está no fato de que sempre cai, como as estações do ano se repetem. Mas as chuvas mudam não só de intensidade. Elas caem num mundo cada vez mais alterado pela ação humana, cheio de armadilhas como os rios canalizados em BH.

Blog do Gabeira - Fernando Gabeira, jornalista

Artigo publicado no jornal O Globo em 03/02/2020


quarta-feira, 4 de fevereiro de 2015

Rui Falcão, o chefe dos reacionários, fala bobagem sobre a Petrobras e sobre golpe

Ai, Ai…  As forças da reação se organizam. Como diria Karl Marx, já citado hoje neste blog, “a tradição de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos”. De quem estou falando?  Ora, de Rui Falcão, presidente do PT, que hoje comanda a tropa dos reacionários do país. E o que é um reacionário? À diferença do conservador, que defende a preservação de instituições para que se possam fazer as mudanças, o reaça quer forçar a história andar para trás, ele quer restaurar um passado que já passou, ele quer recuperar privilégios perdidos. Faço uma pequena digressão. A imagem é de Chesterton, um conservador iluminado, sem trocadilho: os postes de luz devem ser permanentemente pintados para que continuem funcionais. Eles mudam para que, sobrevivendo, suportem a luz. Alguém poderia brincar: “Ah, mas não seria o caso de enterrar os fios, tornando obsoletos os postes?” Se e quando isso for necessário, sim. Mas que se preserve lá, de pé, a história, como parte de um passado que fez o presente e anuncia e o futuro. A civilização se faz do acúmulo de conhecimento e de experiência, não da eliminação do passado. Num caso, temos democracia; noutro, Estado Islâmico. Mas volto ao ponto.

Rui Falcão, o presidente do PT, estava com a macaca nesta quarta. Logo depois de uma reunião com a bancada federal do partido, deu a seguinte declaração: “O mais importante é fortalecer a Petrobras, mostrar que é uma empresa que tem recursos para o futuro do país, há uma tentativa muito grande de desmerecer a Petrobras como empresa pública”. Como é que é? Sob o comando do PT, a estatal chega perto da insolvência, palco do maior escândalo de que se tem notícia deve haver outros, cujo conteúdo desconhecemos — na história do país. Na gestão do petista José Sérgio Gabrielli, uma quadrilha se apoderou da empresa. Mas Rui Falcão acha que a diretriz tem de continuar a mesma.

Ele especificou o seu desejo de mesmice: “Nós temos que manter as políticas de conteúdo nacional da Petrobras, que garantem emprego e recursos para o país. Não concordamos com analistas que defendem privatizar a Petrobras, tirar dela a condição de operadora única do pré-sal e mudar o regime de partilha para o regime de concessão”.

Vamos ver. Infelizmente, são poucas as vozes que defendem a privatização da Petrobras — entre os homens públicos, ninguém até agora A chamada política de conteúdo nacional gerou uma empresa à beira da insolvência, a Sete, onde Dilma quer enfiar R$ 10 bilhões, e só serve para elevar os custos da Petrobras. O regime de partilha, da forma como imposto à estatal, exige da empresa o desembolso de um dinheiro que ela não tem.

Falcão estava animado e resolveu se pronunciar também sobre um parecer do advogado Ives Gandra Martins, segundo quem Dilma pode ser alvo de um processo de impeachment, ainda que por ações culposas. Afirmou: “Não vejo nem base jurídica nem base política para isso. A presidente Dilma foi eleita e está conduzindo o país conforme o programa vitorioso nas urnas. Essas tentativas que são aqui ou ali ensaiadas, de flerte com o golpismo, não levo a sério porque a população brasileira está muito firme com a ideia da democracia. São chuvas de verão”.

Flerte golpista uma ova! Eu nem defendo exatamente o ponto de vista de Ives Gandra, mas o que está numa lei democraticamente votada ou acolhida, golpe não é.  Golpe é organizar uma quadrilha para assaltar a Petrobras e o Estado brasileiro. O reacionário Falcão acha que o futuro do Brasil está no passado, no tempo em que os petistas davas as cartas. Levaram o país à bancarrota.

Fonte: Blog do Reinaldo Azevedo