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quarta-feira, 27 de junho de 2018

O grito ganha mais uma

Não há dúvida de que as excessivas concessões a um movimento grevista que colocou o governo e o Congresso de joelhos ainda causarão muitos prejuízos ao País

O mais grave da aprovação pela Câmara dos Deputados, na quarta-feira passada, de um generoso pacote de benefícios a transportadoras não é o fato de o relator do projeto ser ele mesmo, dono de uma transportadora. O deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP), o relator, jura que não há conflito de interesses, já que, diz ele, a tal empresa, que distribui bebidas, agora pertence aos filhos. Mas isso é apenas um detalhe pitoresco diante da monstruosidade ─ mais uma ─ destinada a favorecer um setor da economia em detrimento de todo o resto, como parte do pagamento de resgate aos caminhoneiros e às empresas transportadoras que sequestraram o País com a greve de maio passado.

O pacote aprovado, que agora segue para o Senado, cria um plano nacional de renovação de frota de caminhões, que concederá aos felizardos compradores juros camaradas e prazos longos para pagamento. Além disso, as empresas que a ele aderirem terão redução das alíquotas de PIS/Cofins e de IPI sobre os caminhões novos. O custo da renúncia fiscal com mais esse benefício para o setor de transporte rodoviário ainda não foi calculado.  Há mais. O projeto isenta de tributação o vale-pedágio, que as transportadoras, e não os caminhoneiros, usam para pagar os pedágios. As empresas poderão abater do pagamento do PIS suas despesas com pedágio. E o transportador poderá abater do Imposto de Renda o custo do pedágio.

Além disso, o projeto converte em advertência as multas emitidas pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) contra caminhoneiros que fugiram de fiscalização até a data da publicação da lei ─ o que pode dar margem a que os caminhoneiros multados exijam o ressarcimento do que já pagaram. E os caminhoneiros só perderão a carteira de motorista se alcançarem 40 pontos em infrações de trânsito, em vez dos 20 pontos previstos no código de trânsito.  Apesar desse notável esforço para agradar aos caminhoneiros e às empresas de transporte, nada garante que o País esteja livre do tremendo poder de chantagem desse setor, demonstrado no movimento paredista de maio. Ao contrário: ao verem atendidas quase todas as suas exigências, mesmo depois de terem transformado a vida dos brasileiros em um inferno sem sofrerem qualquer punição efetiva, os caminhoneiros e as transportadoras dificilmente se sentirão dissuadidos de, por qualquer razão, voltar à carga no futuro.

O País parece estar totalmente à mercê deles, a ponto de admitir a violação da Constituição a favor desse grupo, nos capítulos que garantem a livre concorrência e proíbem a formação de cartel. Pois será esse o resultado da negociação para estabelecer uma tabela de fretes, que acaba por criar um cartel privado sob patrocínio estatal. O tabelamento era uma das principais reivindicações dos caminhoneiros, mas seus efeitos deletérios sobre a economia ─ sem falar de sua flagrante inconstitucionalidade ─ deveriam ser suficientes para desestimular essa concessão. Não foi, contudo, o que aconteceu, e neste momento caminhoneiros e empresas estão negociando a tabela, com mediação do Supremo Tribunal Federal. Sejam quais forem os valores acertados, o resultado inevitável será o repasse do aumento de custos para os preços, especialmente os de alimentos, que têm forte impacto no orçamento das famílias mais pobres.

A essa conta, rateada pelo conjunto da sociedade, é preciso acrescentar os custos resultantes dos subsídios concedidos para baixar os preços do diesel, outra exigência dos caminhoneiros. Como não há espaço orçamentário para bancar mais esse benefício, o governo terá de tirar verbas de áreas essenciais, como saúde e educação, e cancelar outros subsídios, causando natural reação dos setores afetados.  Parece não haver dúvida de que as excessivas concessões a um movimento grevista que colocou o governo e o Congresso de joelhos ainda causarão muitos prejuízos ao País ─ especialmente porque o poder público já se provou incapaz de desestimular a ousadia dos que querem ganhar tudo no grito.

Editorial - O Estado de S. Paulo 
 

sábado, 9 de junho de 2018

STF eleva de R$ 339 mi para R$ 846 mi cobrança de multas às transportadoras

O ministro Alexandre de Moraes autorizou nesta sexta-feira a cobrança de um novo lote de multas impostas a transportadoras que bloquearam rodovias e acostamentos durante a paralisação dos caminhoneiros, encerrada na semana passada. São 46 empresas. Juntas, amargaram 506,5 milhões em multas.

[perguntas? 
- essas multas serão cobradas?
- se cobradas, serão pagas?

O que mais se vê é  aplicação de multas a sindicatos, que não são pagas, ou sequer cobradas.
O sindicato dos baderneiros, epa... rodoviários do DF, toda vez que faz greve a Justiça determina a volta ao trabalho ou manutenção de um percentual mínima da frota de ônibus rodando e a determinação é ignorada.
E nunca o sindicato pagou multa.

O motivo de tanta certeza que a multa não foi paga é que o valor seria mais que suficiente para quebrar a entidade multada.
E a entidade continua funcionando.]

Na semana passada, Moraes já havia autorizado a cobrança de R$ 339,5 milhões de 96 transportadoras multadas pela mesma razão. Com isso, a conta do locaute (greve de patrões) já soma R$ 846 milhões.   As decisões do ministro decorrem de pedidos feitos pela Advocacia-Geral da União. Nos dois casos, Moraes deu prazo de 15 dias para que os multados paguem voluntariamente pelas infrações. Do contrário, arriscam-se a sofrer bloqueio de contas bancárias e penhora de bens.

Nos subterrâneos, as transportadoras pressionam o Congresso para aprovar uma anistia das multas. Relator de um projeto de lei que regulamenta o transporte de cargas, o deputado Nelson Marquezelli (PTB- SP) planejava incluir o perdão no texto. A pedido do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, ele deu meia-volta. Mas esclareceu que a ideia não morreu.  “Isso vai ser substituído por uma medida provisória mais explicativa atendendo a caminhoneiros, empresas e segmentos de cargas”, disse Marquezelli há dois dias. “O presidente da Casa acha que não é o momento agora, vamos deixar criar o problema dentro de 60, 90 dias para fazer uma medida provisória mais abrangente.” Ou seja: aguarda-se pela conversão das multas em incêndio para providenciar uma saída de emergência. [diante de um incêndio, fica mais fácil as transportadoras aumentarem o valor da 'recompensa' pela anistia. Afinal, o perdão de R$ 846 milhões vale uma boa recompensa.]
 
Ao farejar o odor de fumaça, a Advocacia-Geral da União apressou-se em avisar que as multas têm um caráter judicial. Foram aplicadas por decisão do ministro do Supremo, que estipulou o castigo em R$ 100 mil por hora de desrespeito à ordem de desobstruir vias e acostamentos. Nessa versão, o Congresso estaria invadindo as atribuições do Poder Judiciário se aprovasse o perdão das multas. 

Blog do Josias de Souza