Como se separa a reforma da Previdência das gravíssimas
investidas deste governo contra a imprensa, contra o Congresso, contra
as instituições de nossa democracia?
O que fazer quando um governo parece estar conduzindo bem a economia
ou tratando de fazer algumas reformas importantes ou mantendo o
crescimento econômico em ritmo saudável enquanto ataca instituições
democráticas, ou direitos humanos fundamentais, ou ambos? Tenta-se
separar a política econômica do resto, implicitamente indicando que o
resto é menos importante do que a economia? Tenta-se manter o silêncio
sobre a política econômica enquanto se apontam os perigos de atacar a
democracia, os direitos humanos? Tenta-se reconhecer os esforços na área
econômica e apontar os demais perigos ao mesmo tempo, correndo-se o
risco de colocar economia e defesa de valores fundamentais no mesmo
patamar? Não sei ao certo responder a nenhuma dessas perguntas. Ou
melhor, sei que separar a economia do resto é não apenas impossível, mas
intelectualmente desonesto, já que a economia opera dentro das
fronteiras políticas e geográficas do país cujo governo pode estar
violando valores fundamentais.
Na Hungria, o governo autoritário de Viktor Orbán tem tido estrondoso
sucesso econômico. Desde sua ascensão ao poder, ficaram para trás os
problemas fiscais que ameaçavam o país, retomaram-se os investimentos e o
crescimento econômico. [Na Hungria, Orbán não tem um Congresso trabalhando contra o governo, atrapalhando e com o presidente da Câmara dos Deputados querendo ser 'primeiro-ministro', tentando implantar o 'parlamentarismo branco'.] A Hungria foi, por muito tempo, uma das maiores
decepções entre os países que transitaram dos regimes centralizados para
as economias de mercado ao longo dos anos 90. Desde a chegada de Orbán,
o quadro se inverteu e o país passou a ter um dos melhores desempenhos
da região. Enquanto colocava a economia para funcionar, Orbán censurava a
imprensa, perseguia inimigos políticos e transformava a democracia de
seu país em caricatura.
Aqui nos Estados Unidos, a economia continua a crescer com desemprego
em baixa a despeito das guerras comerciais de Trump e de suas
investidas contra o Fed, o Banco Central americano. É bastante provável
que a economia forte seja um de seus grandes trunfos nas eleições do ano
que vem. Contudo, sua política migratória está há tempos enjaulando
crianças na fronteira com o México, em condições absolutamente
desumanas. Há bebês presos sem receber os cuidados de adultos, mas sim
de crianças um pouco mais velhas, elas próprias desnutridas e sem
qualquer acesso a higiene básica. Segundo relatos de membros do
Congresso, de pediatras e de jornalistas que visitaram centros de
detenção de Trump, há crianças doentes sem tratamento, crianças com
problemas psicológicos devido ao encarceramento e à separação de seus
pais, crianças amontoadas em celas em que não há leitos suficientes, em
que as luzes ficam acesas a noite toda. Como se separa a economia disso?
“Por falar em crianças, como se separa a reforma da previdência da defesa do trabalho infantil recém-tuitada por Bolsonaro?” [Bolsonaro fez um comentário de forma açodada, permitindo uma interpretação dúbia e a imprensa optou por maximizar a interpretação negativa.]
Em outras
circunstâncias, talvez fosse fácil apontar os acertos e os erros da
principal reforma desse governo, talvez fosse fácil dizer que ela contém
mais acertos do que erros, ainda que cristalize muitos dos privilégios
que se pretendia eliminar. Em outras circunstâncias, talvez não fosse
difícil afirmar que as economias previstas pela reforma darão ao país o
alívio de que tanto necessita nas contas públicas, ainda que os estados e
municípios tenham sido excluídos — francamente, parecia ingênua a
crença de que esses entes federativos fossem realmente incluídos ante
seu peso político. Contudo, diante da perda de valores fundamentais que o
governo Jair Bolsonaro representa, diante da caricatura que fazem seus
seguidores de temas tão graves quanto o trabalho infantil, é muito
complicado discutir friamente a reforma da Previdência e respaldá-la sem
ressalvas, sem o pé atrás de que talvez isso acabe dando ao governo a
licença para pôr mais retrocessos em marcha.
O dilema moral, com o qual poucos parecem se preocupar, não é
brasileiro. Ele é global. Isso não o torna mais palatável, mas sim
profundamente desorientador.
Revista Época - Monica de Bolle - diretora de estudos latino-americanos e mercados
emergentes da Johns Hopkins University e pesquisadora sênior do Peterson
Institute for International Economics
Este espaço é primeiramente dedicado à DEUS, à PÁTRIA, à FAMÍLIA e à LIBERDADE. Vamos contar VERDADES e impedir que a esquerda, pela repetição exaustiva de uma mentira, transforme mentiras em VERDADES. Escrevemos para dois leitores: “Ninguém” e “Todo Mundo” * BRASIL Acima de todos! DEUS Acima de tudo!
Mostrando postagens com marcador dilema moral. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador dilema moral. Mostrar todas as postagens
sábado, 13 de julho de 2019
Dilema moral
Marcadores:
DEMOCRACIA,
dilema moral,
Fed,
Hungria,
Johns Hopkins University,
México,
Viktor Orbán
terça-feira, 9 de julho de 2019
O Supremo lavajatista
A Polícia Federal ainda não esclareceu: Glenn Greenwald, do site
Intercept, está sob investigação? A resposta é importante porque dirá a
quanto estamos do estado policial. A explicação dada até aqui — cuja
ambiguidade compõe um método intimidador — é alarmante: “A PF não
confirma tal solicitação e não se manifesta sobre eventuais
investigações em andamento”. Se circula a notícia de que o órgão do Estado responsável por apurar
crimes federais teria instaurado um procedimento contra um jornalista, e
se tal consiste em afronta a um direito fundamental, aquele expresso no
artigo 5º da Constituição, a única manifestação aceitável seria uma que
negasse — com energia —a existência da inquirição. [salvo improvável engano os jornalistas não estão isentos de serem investigados em processos movidos por qualquer autoridade policial.
Qualquer cidadão, o que inclui jornalista está sujeito a ser investigada pela prática de diversos crimes, excluindo processo que agrida o direito fundamental do jornalista de exercer sua profissão; tirando o que tolha, iniba, o jornalista de exercer sua profissão, nos demais ele está sujeito a ser investigado e mesmo processado.
Se no exercício de sua profissão o jornalista atropela uma pessoa que morre em virtude das lesões sofridas, o jornalista responde pelo homícidio.
Assim, interpelar a PF por instaurar processo contra jornalista, é um excesso de zelo em garantir o direito do jornalista de exercer sua profissão e a PF, corretamente, não prestou as informações que poderiam atrapalhar eventuais investigações em curso.]
Não aprecio o jornalismo de Greenwald, limitado por sua militância, nem a
forma como o Intercept oferta o conteúdo sob seu controle, a
conta-gotas, como num folhetim, e reativamente, algo que é apanágio do
discurso político-partidário. Mas: não há crime na prática —e só isso
ora interessa. [receber informações sabidamente produto de crime?: é, no mínimo, crime de receptação.]
Os abusos sobre as liberdades individuais costumam ter a história
facilmente identificável, daí por que pergunte: como medir o pulso do
ambiente intimidatório que contaminou o país sem se lembrar do inquérito
autoritário, estabelecido de ofício e sem objeto definido, por meio do
qual Dias Toffoli, presidente do Supremo, formalizou estarmos todos sob
suspeita, o que, objetivamente, logo resultaria em censura à revista
“Crusoé”? A repercussão do imbróglio Intercept mapeia o drama brasileiro —qual
seja: se um togado pode extrapolar, se um procurador pode, todo mundo
pode. Roberto Barroso — aquele que autorizou uma investigação permanente
contra um presidente da República, e por crimes supostamente havidos
antes de seu mandato — está indignado com o que considera “uma clara
violação de comunicação privada”. No caso, entre procuradores e,
particularmente, entre um deles, Deltan Dallagnol, e Sergio Moro. O
ministro — aquele que autorizou a quebra de sigilo bancário de um
presidente [ex-presidente e já a época respondendo a oito processos.] não porque houvesse elementos para tanto, mas porque era
preciso encontrar alguma coisa —tem razão em se incomodar com o que
parece mesmo ser obtenção ilegal de conteúdo particular.
Mui preocupada com essa ocorrência, e zelando pela segurança de Moro e
dos procuradores, a PF — aqui, sem qualquer dubiedade —investiga a
invasão e o vazamento de dados privados; mas, atenção, sem se deter na
análise das conversas em si, sobre se ali haveria o cometimento de algum
ilícito por autoridades. Gostaria de questionar Barroso sobre se a PF
pode cuidar da provável ação criminosa de roubo de mensagens, no entanto
negligenciando a perícia acerca da autenticidade do conjunto e o exame
de seu teor? A PF não incorreria em disfunção ao não solicitar os
celulares dos procuradores que supostamente participaram dos diálogos? [a PF não tem condições de se deter na análise das conversas em si, pelo simples fato de além de ser produto de roubo, crime, as supostas conversas estão em poder do pessoal da intercePTação = intercePT + recePTação = , que alegando o direito ao sigilo da fonte não as fornece.
Além do mais, o fato do material furtado não ter sido entregue a um cadeia de custódia, tira qualquer garantia até mesmo de ser o material porventura entregue o mesmo recebido.]
Gostaria, aliás, de perguntar a Barroso, o mais afiado entre os
justiceiros do STF, sobre se vê alguma impropriedade no conteúdo das
conversas até aqui reveladas. Teria curiosidade em saber como o ministro
avalia a conduta de Moro conforme apresentada nos diálogos. Teria
Barroso, cuja vocação para advogar é espantosa, uma opinião sobre se o
ex-juiz tomou lado no processo relativo a Lula. [o ministro Barroso não é obrigado a responder nenhuma pergunta sobre assunto que possa vir a ser julgado por ele.] As mesmas questões caberiam a Edson Fachin, aquele que, de acordo com
Dallagnol em mensagem a procuradores, “aha uhu!”, seria deles. Rodrigo
Janot talvez tenha pensado o mesmo sobre o ministro quando, por ocasião
do acordo de delação dos irmãos Batista, teve no juiz um despachante.
Pergunto a Fachin, mestre em homologações exóticas: quantas vezes, no
período de negociação dos termos de um acordo, um delator pode reformar
sua delação? Quantas vezes poderá ser impreciso, omisso ou mentiroso,
até que ofereça a verdade aceita pelo Ministério Público? Sem qualquer
restrição, o sujeito, um criminoso confesso em busca de se aliviar, pode
ajustar a entrega —numa espécie de obra em permanente construção —até
alcançar o que será a verdade segundo procuradores, só a partir de
então, à espera da canetada que homologa (e liberta), tendo compromisso
com a própria palavra? É isso?
Estamos frente ao dilema moral de uma sociedade enfeitiçada pelo
lavajatismo: vale tudo em nome da missão prendedora de corruptos?
Barroso, por exemplo, é da escola Bolsonaro de estado de direito, aquela
que, diante de controvérsias legítimas sobre atos que põem em xeque o
devido processo legal, resolve qualquer dúvida entrando no gramado do
Maracanã para ouvir a voz das ruas. Ou não será o ministro o formulador
da tese — alicerce da cultura plebiscitária em que aposta o bolsonarismo
e síntese do espírito do tempo jacobinista que ergue mitos e heróis
—segundo a qual o Supremo se deslegitimará se repetidamente frustrar o
sentimento social?
É o STF que chama o cabo e soldado.
Carlos Andreazza - O Globo
Marcadores:
dilema moral,
justiceiros,
sentimento social,
STF,
Supremo lavajatista
domingo, 25 de junho de 2017
Crime e castigo implodem partidos
O desfecho de nossa história depende em grande parte da sociedade civil. Precisamos renovar
Não é preciso ler Dostoiévski para saber que o crime e o medo do castigo podem acabar com a vida de alguém que se desviou do rumo e se bandeou para o outro lado, sem volta. Crime e castigo é uma obra-prima de 1866, que discute os limites da moralidade. Para se livrar da punição a um homicídio, o assassino se envolve em outro e tenta se justificar para si e para Deus. Essa parte do enredo lembra nossos políticos “serial-robbers”, viciados em roubar do povo. Não param nunca, nem presos. De obras de infraestrutura a obras de arte, imóveis ou joias, tudo vale para enriquecer a “famiglia” e afundar o país.
Numa semana em que o presidente brasileiro Michel Temer, acossado pela Justiça e por 9% de popularidade, mas sem nenhum sinal de arrependimento, visita a Rússia, é oportuno revisitar – ao menos na memória – esse clássico de 600 páginas. A angústia e o remorso atormentam a consciência do jovem criminoso Raskólnikov, estudante endividado que mata a agiota e, depois, a irmã dela. Os interrogatórios do juiz o perseguem. Ele confessa e é condenado a oito anos de prisão na Sibéria.
O problema é que, no Brasil, escrevemos há anos uma história bem diferente, a do “Crime Sem Castigo”, sem culpa, sem remorso, sem punição. Temos uma chance de acabar com a impunidade, mas, se todo mundo acabar em mansão com tornozeleira, spa e bicicleta ergométrica, vai ficar complicado educar a juventude. Nossos anti-heróis não parecem ter dilema moral algum. Aliam-se a deus e ao diabo para salvar a pele.
Nem PMDB, nem PT, nem PSDB têm propostas que consigam unir suas bases ou ganhar a confiança do eleitorado. A pauta-bomba que implode os partidos políticos não é a delação – ou colaboração – premiada. A delação é apenas a ferramenta mais valiosa para revelar os assaltos bilionários ao cofre-forte público. Um instrumento para recuperar as fortunas roubadas para beneficiar a população e resgatar a credibilidade do país, interna e externamente. Isso, se a Justiça não falhar.
Foi um alívio – após o vergonhoso julgamento da chapa Dilma-Temer no TSE – ver o Supremo Tribunal Federal avalizando, por uma goleada inicial de 7 a 0, a delação dos donos da JBS. Não adiantou ninguém fazer beicinho. Faltam apenas alguns votos. Tanto o Ministério Público quanto a Procuradoria-Geral da República tiveram reforçada sua autoridade. Vida longa ao relator Edson Fachin e ao procurador Rodrigo Janot. Há quase um consenso de que o acordo com Joesley Batista foi excessivamente benéfico para o delator, mas ele começa a ser punido aqui e lá fora no lugar que mais mexe com a consciência desse tipo de bandido: no bolso.
Todos os partidos com culpa no cartório tentam melar a Lava Jato. Vem daí a implosão nas trincheiras. Michel Temer dá cambalhotas de circo para aprovar fiapos de reformas e escapar ao cerco da Justiça, mas divide profundamente o PMDB a cada pesada denúncia que surge contra ele. Fernando Henrique Cardoso apoia publicamente a renúncia de Temer e discorda dos tucanos que tentam sustentar a pinguela do presidente em troca de mais tempo para o PSDB na televisão em 2018 – e também em troca de salvo-conduto para Aécio Neves, que só não foi cassado graças ao rabo preso de seus pares. Lula, indiciado, como Temer, em vários inquéritos por corrupção na Presidência e fora dela, se irrita com a articulação de petistas e do PSOL para discutir uma frente de esquerda e um programa de governo. A reunião aconteceu no domingo. Lula não foi convidado nem informado. Foi o último a saber.
O desfecho de nossa história depende em grande parte da sociedade civil. Depende de nós. Há uma apatia inacreditável no país. Não parece o mesmo Brasil que foi às ruas em 2013, numa indignação apartidária contra o aumento de 20 centavos nas passagens de ônibus. Era um bom pretexto para protestar. A polarização nacional hoje divide torcidas entre uma suposta esquerda e uma suposta direita, que não são nada disso. É um erro santificar ídolos com pés de barro ou apostar num salvador da pátria que seja “dos males o menor”. Se não existir uma mobilização consciente e pacífica, sem bandeiras de partidos e sem black blocs, contra governantes e políticos que se comportaram como bandidos, será muito difícil refundar nossa República sobre princípios éticos. Não podemos transigir. Precisamos renovar.
Se há crime, é preciso haver castigo, já dizia Dostoiévski. Mas parece ser só na ficção. Na vida real, o que os russos têm hoje é o duro Vladimir Putin, no poder há 18 anos. Putin reprime investigações e manifestações com mão forte. O envolvimento em corrupção é apenas uma das acusações contra ele. Putin tem mais de 80% de popularidade. É o pior dos mundos. Um autocrata popular.
Fonte: Ruth de Aquino - Revista ÉPOCA
Marcadores:
autocrata popular,
crime e castigo,
crime sem castigo,
dilema moral,
Dostoiévski,
Raskólnikov,
russos,
Sibéria,
tornozeleira,
Vladimir Putin
Assinar:
Postagens (Atom)