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domingo, 7 de janeiro de 2024

Ditadura indisfarçável, Parte 1: relatos sobre o Brasil pós-8 de janeiro - Marcel van Hattem

Gazeta do Povo - VOZES

8/1
Manifestantes na Praça dos Três Poderes, em Brasília, em 8/1/2023| Foto: EFE
 
Às vésperas da “comemoração” proposta pelo petismo de um ano dos atos de 8 de janeiro de 2023, visitei novamente os presídios da Papuda e da Colmeia, em Brasília (DF). 
Seguem ali 18 brasileiros presos, ao menos cinco dos quais com pedido de soltura do Ministério Público há semanas e ainda não analisados pelo ministro do STF, Alexandre de Moraes
Enquanto Lula, Moraes e convidados estarão no Congresso na próxima segunda-feira celebrando uma suposta "democracia inabalada”, centenas de brasileiros seguirão com tornozeleiras eletrônicas em suas casas sem o devido processo legal, e dezenas deles seguirão encarcerados no Distrito Federal e nos estados, vítimas de uma perseguição política somente comparável àquelas ocorridas em Estados de exceção. 
 
Em ditaduras.
Na próxima segunda-feira, em Brasília, petistas e seus aliados aduladores de "democracias relativas" como a Venezuela de Nicolás Maduro, tentarão continuar a difundir a falsa narrativa de que o Brasil ainda é um país democrático e que aqui a Constituição está sendo respeitada.
No entanto, doze senadores continuam aguardando autorização do ministro Alexandre de Moraes para realizarem seu trabalho de fiscalização nos complexos penitenciários da Papuda e da Colmeia, que abrigam os presos do 8 de janeiro de 2023.

A festa que pretendem promover na segunda-feira é a festa da tirania; é a ode ao reino do abuso e da vilania.

É isso mesmo que você leu: o direito constitucional de congressistas fiscalizarem órgãos e espaços da administração pública, que independem de qualquer decisão judicial, agora está sujeito a uma autorização concedida por Alexandre de Moraes a si mesmo. 
No caso do documento protocolado por Eduardo Girão e outros onze senadores, incluindo o líder da oposição no Senado, Rogério Marinho, desde o dia 6 de dezembro aguardam os senhores senadores pelo beneplácito de Sua Excelência, ministro Alexandre de Moraes, para que tenham acesso aos presídios.

No meu caso, no entanto, pude fazer a visita aos presídios neste período de recesso parlamentar graças a uma autorização concedida pelo ministro ainda em março do ano passado. Adentrei os complexos penitenciários nas últimas quarta, 3 e quinta, 4 de janeiro, e vi coisas que nada têm a ver com o que se deveria ver em democracias e que nada têm a ver com o cumprimento da Constituição.

As atrocidades que estão sendo cometidas contra milhares de cidadãos trabalhadores são dignas do mais profundo repúdio e desprezo.

Os presos que encontrei seguem sem seus direitos garantidos, não sabem por que estão sendo processados, seus advogados seguem tendo prerrogativas cerceadas e seus processos continuam sem a devida individualização das condutas
Relembro aos leitores: praticamente 100% dos réus foram processados com denúncias genéricas, sem provas de envolvimento individual, um legítimo copia e cola das iniciais oferecidas pelo Ministério Público. 
Para piorar ainda mais: após a morte de Cleriston Pereira da Cunha, o Clezão, durante o banho de sol no final de novembro e com a notícia da condenação de vários presos a penas que chegam a 17 anos de reclusão, dois internos já tentaram colocar fim à própria vida, um dos quais foi transferido do presídio da Papuda à ala psiquiátrica da Colmeia.
 
Um terceiro interno, preso mais recentemente na Operação Lesa Pátria, tinha esperança de sair da cadeia durante o período de Natal e Ano Novo para acompanhar o parto de sua esposa
Ao perceber que permaneceria encarcerado, desabafou com o médico do IML que, caso acontecesse algo a sua esposa e ele não estivesse junto, ele certamente viria a fazer alguma “besteira”.  
Este também acabou transferido à ala psiquiátrica. 
Felizmente, sua filhinha nasceu com saúde no dia de Natal, mas o pai não pode acompanhar o parto enquanto traficantes e homicidas eram beneficiados Brasil afora com saidinhas à cadeia. Saidinhas sem retornadinhas em muitos casos, como noticia a imprensa nos últimos dias.

Em vez de inabalada, nossa democracia está sendo vilipendiada, abusada. Violentada.

“Não vamos chegar numa ditadura, já é!”, disse-me um dos presos. Outro, o único dos réus cujo processo já transitou em julgado e foi condenado pelo STF a 17 anos de cadeia, divide hoje cela com três homicidas na ala de criminosos comuns da Papuda, implorou-me: “se puder assinar agora para ir embora, sem indenização, sem nada, assino na hora. Na hora! Só quero a minha liberdade, o resto corro atrás!”
Aos 24 anos, casado há cinco, tem uma filha de seis meses que conheceu na visita da mãe à cadeia. 
Se cumprida a pena inteira, estará quite com a injustiça brasileira apenas em 2039, após completar 40 anos de idade
Na mesma prisão em que se encontra, há condenados a 8 anos por estupro e a 15 por homicídio. 
Ele pegou 17 por enviar um áudio infeliz à esposa e por ter adentrado o Congresso Nacional no 8 de janeiro. 
Não há provas em seu processo de que tenha vandalizado ou efetivamente quebrado qualquer bem público.
 
Esta é a “democracia inabalada” de Lula e de Moraes? 
É este o país em que supostamente se respeita a Constituição e a lei é igual para todos? 
Não, certamente a festa que pretendem promover na segunda-feira é a festa da tirania; é a ode ao reino do abuso e da vilania. As atrocidades que estão sendo cometidas contra milhares de cidadãos trabalhadores, cuja esmagadora maioria nunca teve passagem alguma pela polícia, são dignas do mais profundo repúdio e desprezo, jamais da horrenda pompa e circunstância que se pretende dar no Congresso Nacional no próximo dia 8 de janeiro.

Aliás: o governo Lula, se decente fosse, deveria admitir que não apenas nada fez para impedir os atos de vandalismo como contribuiu para sua execução, conforme se viu pelos vídeos internos vazados do Palácio do Planalto ainda quando o GSI era comandado pelo General do Lula, Gonçalves Dias. Já as imagens das câmeras de segurança do Ministério da Justiça nunca apareceram e, como prêmio, o responsável pelo prédio, Flávio Dino, foi indicado e aprovado para ser o novo ministro do Supremo Tribunal Federal. Em vez de inabalada, nossa democracia está sendo vilipendiada, abusada. Violentada.

A fim de deixar muito claro e expor ao Brasil e ao mundo o que vi na Papuda e na Colmeia nas minhas visitas aos presídios, bem como os excessos e abusos que estão sendo cometidos contra brasileiros presos ou com restrições de liberdade na esteira da depredação e vandalismo ocorridos na sede dos Três Poderes no dia 8 de Janeiro do ano passado, publicarei no meu espaço na Gazeta do Povo uma série de artigos intitulados “Ditadura indisfarçável”
Contarei aqui histórias individuais de presos do dia 8 de janeiro que se somam em uma tragédia coletiva: a violentação da nossa democracia e a consolidação de uma tirania que abusa dela, inclusive hipocritamente alegando defendê-la.
 
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos

terça-feira, 5 de dezembro de 2023

Vamos bien, é o que dizem também aqui, enquanto perseguem quem diverge. - Percival Puggina

         A vida me permitiu que um dia, no ano de 2001, eu fosse a Cuba ver de perto aquilo que era vendido no mercado brasileiro como evidência do sucesso social, político e econômico do comunismo. 
Antes de viajar, devorei vários livros proporcionados pelo amigo Flávio Del Mese, publicados nos primeiros anos da ditadura Castro, e pesquisei imagens, entre as quais essa clássica em que Fidel declara aos miseráveis cubanos: “Vamos bien!”.  
Ao voltar e relatar o que observei, as pessoas me pediam que reproduzisse em livro aquelas observações. 
 
Para fazê-lo, retornei à ilha em 2002. Minha inexperiência em lidar com as restrições impostas por uma ditadura comunista fizeram com que ficasse exposto à observação do sistema de inteligência do estado cubano. 
Eu fizera contato telefônico com líderes dissidentes que estavam grampeados e, depois, os contatara pessoalmente. Eu conto tudo isso no livro “A tragédia da Utopia”. 
O ponto a que quero chegar é o seguinte: nessas viagens e na que fiz em 2011, quando entrava no avião para retornar ao Brasil, experimentava gratificante sentimento de alívio: “Felizmente, volto a meu país, onde as coisas não são assim!”.
 
Pois agora, também aqui, as coisas são assim!  
Já temos um presidente que se diz comunista e é parceiro de seus ditadores. 
No Congresso Nacional, uma centena de bravos enfrenta quinhentos deputados e senadores que querem viver de “bolsa governista”.  
Uma Suprema Corte política, onde ministros usam amplamente o vocabulário de um dos lados em antagonismo e se comprazem em relatar seus sucessos nesse campo. 
Já temos todo o ambiente cultural tomado e expelindo o contraditório. 
A cadeia produtiva da educação está aparelhada, o jornalismo foi amestrado e quem se recusou, expurgado.  
As instituições religiosas estão infiltradas.  
Há censura, repressão, exílio e até poucos dias tínhamos mais presos políticos do que Cuba.  
Se incluir os de tornozeleira, há muito mais desses infelizes aqui do que lá. As plataformas de redes sociais estão garroteadas por monocrática determinação do ministro da Justiça que disse:

Esse tempo da autorregulação, da ausência da regulação, da liberdade de expressão como valor absoluto, que é uma fraude, que é uma falcatrua, esse tempo acabou no Brasil, tenham clareza definitiva disso. (...) Os senhores e as senhoras viveram o processo eleitoral de 2022 no Brasil. Adotem isso como referência. É o que nós faremos com os senhores.”

A palavra ídiche “pogrom”, nascida na perseguição aos judeus russos no final do século XIX e estendida ao acossamento de grupos sociais inteiros, é agora perfeitamente aplicável ao que acontece com a direita no Brasil! Ela é acusada de todos os males por defender a liberdade e os valores de grande estima na cultura ocidental. 
Quem a ataca, estranhamente diz combater o discurso de ódio mostrando os dentes, se declara contramajoritário dependendo de quem ganha a eleição, é imoderado e cobra moderação, ouve Lula falar e não percebe as fissuras se abrindo rancorosas na sociedade.
 
As liberdades são malvistas, o direito à propriedade privada é relativizado; o direito de herança é exorcizado; o Estado cresce e encarece; a dívida pública é culpa de quem empresta e não de quem gasta mais do que arrecada, pede emprestado e não pode pagar; a sociedade empobrece, a economia patina e a indústria perde competitividade.
Enquanto isso, o governo itinerante, vagando de um para outro entre os mais luxuosos hotéis internacionais, quer financiar os camaradas de sua pátria grande. Comunismo é assim, testemunho de vida... Me poupem!

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

segunda-feira, 10 de julho de 2023

O realismo do absurdo - Percival Puggina

 

        Na nossa história recente, o criminoso que aflige a sociedade é amplamente protegido por um certo garantismo penal que se generalizou no Judiciário. Estranhamente, porém, o mesmo garantismo não se aplica ao cidadão que se manifesta, pacificamente, de um modo que desagrada o Estado.      

No Brasil, nada é mais realista do que o completo absurdo, caro leitor. Nesta terra de bandido solto, com mandato, decidindo sobre nossas vidas e acesso aos recursos públicos, disparate é a sensatez! Mais dia, menos dia, vamos colocar tornozeleira na Polícia, algemar os promotores e estabelecer quota máxima de sentenças condenatórias por magistrado. Excedo-me na ironia?

Toda vez que passo na rua por um desses pobres catadores de papel que, como se fossem animais de tração, puxam as próprias cargas para os locais de reciclagem, me vem à mente a questão da criminalidade
A mesa do catador é escassa, o agasalho pouco, a habitação precária, a vila não é salubre e o trabalho duríssimo. 
Ao lado, bem perto, operam traficantes e suas redes. Têm do bom e do melhor. Mas ele segue puxando seus fardos e contando centavos porque prefere ganhar a vida trabalhando. 
Combater a criminalidade, agilizar os processos, eliminar a impunidade e endurecer as penas é sinal de respeito a essa referência moral emergente no país! É por ele, pelo catador de papel, que escrevo este artigo. E também porque sou portador de uma anomalia que me faz ser a favor da sociedade, desconfiar do Estado e me opor à bandidagem.
 
No entanto, a cada dia, aumenta o número daqueles que estendem o dedo duro para nós, o povo, indigitando-nos como principais culpados pelos males que a insegurança nos impõe. 
Nós, você e eu, leitor, seríamos vítimas da nossa própria perversidade e os grandes responsáveis, tanto pela situação do papeleiro quanto pela opção do traficante, do ladrão, do assaltante, do homicida e até dos corruptos porque muitos de nós os elegem, sabendo ou não sabendo.
 
 Por isso, falando em nome de muitos, de poucos ou apenas no meu próprio, gostaria de conhecer a natureza do delito que nos imputam, dado que estamos sendo novamente desarmados pelas exigências que cercam a posse de qualquer arma, encarcerados por grades de proteção e temos as mãos contidas pelas algemas da impotência cívica. Nós só queremos que nos permitam progressão para o semiaberto, puxa vida!

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

sexta-feira, 12 de maio de 2023

A Constituição com tornozeleira eletrônica - Percival Puggina

         Leio na Constituição Cidadã de Ulysses Guimarães que “É livre a expressão do pensamento, vedado o anonimato”, mas sei que o texto constitucional foi capturado e está com tornozeleira eletrônica, custodiado pelo STF.

O ensino cristão – houve um tempo em que ele teve sua relevância – me levou a crer que Deus criou o ser humano para ser livre com Deus, sem Deus, e mesmo contra Deus (estou usando a imagem em sentido retórico, sem evocação a nenhuma Corte). A História me ensinou que peste alguma extinguiu mais vidas humanas do que a luta de indivíduos, povos, nações e alianças entre nações por Liberdade. Milhões foram às guerras e morreram por saber que a alternativa era servidão, ração e olhos no chão.

“Tudo no Estado, nada fora do Estado e nada contra o Estado”, exclamava o jovem Benito, o Mussolini, depois da Marcha sobre Roma. Sua emoção era sentir-se como um ícone, representando e significando a majestade estatal. Deve ser emocionante crer-se fonte de Direito e ter ao alcance da mão uma caneta com serventia para negar direitos. E “viva” Giovanni Gentile, filósofo do fascismo!

Lembro até hoje do que senti, lá pelos anos 50 quando o filme que iria assistir foi precedido, no cinema, por um documentário já antigo sobre os primeiros campos de concentração achados pelos Aliados ao entrarem na Alemanha derrotada. Covas rasas e farrapos humanos culpados de coisa alguma. E “viva” Carl Schmitt, o filósofo do nazismo!

Emoção muito forte me levou às lágrimas no dia 9 de novembro de 1989, vendo jovens alemães orientais dançando sobre o Muro de Berlim! Imagine a deles, depois de 28 anos ao longo dos quais a travessia dentro da própria cidade lhes foi interditada por um tipo de Direito que se deu o direito de confiná-los atrás de um muro.    

Em 1891, o papa Leão XIII, na encíclica Rerum Novarum, profetizou, referindo-se ao comunismo:

“Mas, além da injustiça do seu sistema, veem-se bem todas as suas funestas consequências, a perturbação em todas as classes da sociedade, uma odiosa e insuportável servidão para todos os cidadãos, porta aberta a todas as invejas, a todos os descontentamentos, a todas as discórdias; o talento e a habilidade privados dos seus estímulos, e, como consequência necessária, as riquezas estancadas na sua fonte; enfim, em lugar dessa igualdade tão sonhada, a igualdade na nudez, da indigência e na miséria” (RN nº 9).

Note bem: Leão XIII escreveu “veem-se bem as funestas consequências”, embora a encíclica fosse publicada 26 anos antes de o comunismo se tornar realidade e servidão impostas ao povo russo. Cem anos mais tarde, o Kremlin teve que mobilizar-se para que Mikhail Gorbachev fosse recebido entre 17 e 19 de julho de 1991, na reunião do Grupo dos Sete (EUA, Reino Unido, Canadá, Japão, Alemanha, França e Itália) realizada em Londres e, ali, formulasse um apelo à ajuda internacional a seu país, ameaçado pelo inverno e pela fome. E "viva" Karl Marx (com quem, “vivas" a todo um inesgotável catálogo de filósofos do comunismo!).

Só posso lamentar que nossos dias nos remetam às páginas mais tristes do século passado, por decisiva influência, também, dos que, em outubro, resolveram não decidir. Trinta e sete milhões de brasileiros lavaram as mãos como se o fizessem numa torneira do cais em vez de embarcados com todos no convés do navio que se perdia.

São verdades sofridas. Prometo escrever alegremente quando, com a graça de Deus, tiver motivo para isso. Por enquanto, sou testemunha da longa noite da estupidez.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

segunda-feira, 24 de abril de 2023

Imagens de um País sem lei - O Estado de S. Paulo

 J. R. Guzzo

General G. Dias tinha de estar preso enquanto Torres e mais 200 acusados estiverem detidos

Não existe mais um sistema de Justiça no Brasil. Em seu lugar há uma espécie de Comitê Central que tem poderes absolutos, extinguiu as leis em vigor e governa o País em favor de uma facção política – a do presidente Lula e do consórcio de interesses que opera à sua volta. 
A comprovação mais recente disso é o assombroso episódio das imagens, publicadas num furo da CNN Brasil, que mostram o general Gonçalves Dias, chefe supremo da “segurança institucional” de Lula, em atitude de convívio pacífico com os invasores do Palácio do Planalto em 8 de janeiro
Seus subordinados fazem a cortesia de oferecer garrafas de água a eles; eram, de qualquer forma, em número inexplicavelmente reduzido para proteger seja lá o que fosse, embora o general e o governo já soubessem desde a véspera que o ataque iria acontecer. 
Suspeitou-se desde o começo que havia colaboração do Sistema Lula nos “atentados terroristas” – uma farsa para ele se fazer de vítima e para o STF radicalizar ainda mais a sua caçada ilegal à “extrema direita”.

A verdade começou enfim a aparecer e fica explicado por que Lula e o PT vinham lutando tão histericamente contra a CPMI que quer apurar os fatos, e que agora tornou-se inevitável.

O STF, diante desse desastre, age mais uma vez em benefício do governo. O ministro Alexandre de Moraes acaba de decidir que o ex-secretário de Segurança de Brasília, que estava nos Estados Unidos no dia dos ataques, [em gozo de férias e com  substituto legalmente designado.para exercer na plenitude todas atividades exigidas para o perfeito desempenho no cargo.] tem de continuar na cadeia, onde está há mais de três meses. 
O general, que estava dentro do palácio, está solto – demitido, mas solto. 
Ele não deveria estar “depondo na PF”, com tratamento de “Xá da Pérsia”. Tinha de estar preso enquanto estiverem presos o secretário e mais 200 acusados, ou com tornozeleira eletrônica, e sem passaporte.
 
Por conta do 8 de janeiro cerca de 1.500 pessoas foram presas, mais de mil indiciadas, centenas submetidas à tortura da tornozeleira, após meses de prisão ilegal.  
Muitos nem sequer estavam no local do crime, mas apenas na frente dos quartéis; foram enganados por oficiais do Exército, enfiados em ônibus e entregues à polícia. 
O STF faz, agora, julgamentos por “lotes” de cem ou 200 pessoas – aberração que não existe em nenhuma lei deste País.
 
Pior, talvez, do que tudo: mais de mil pessoas estão indiciadas por incitação ao crime e unicamente por isso, segundo o próprio STF.  
A pena máxima que o artigo 286 do Código Penal fixa para esse delito são seis meses de detenção. Todos já cumpriram mais da metade disso, antes de serem julgados e muito menos condenados – e são réus primários, com direito à liberdade após cumprirem um sexto da pena. Justiça? [vale lembrar que a pena de detenção, a cominada pelo artigo 286, CP,  é bem mais leve e cumprida em regime aberto ou semiaberto.]
J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo

sexta-feira, 31 de março de 2023

Sherloques de picadeiro - Augusto Nunes

Revista Oeste

Todo detetive de agência de checagem quer ser, quando crescer, mais um Jornalista Investigativo que nada apura 
Ilustração: Shutterstock
 
Ilustração: Shutterstock
 
Na tarde deste 29 de março, um recado por e-mail desembarcou na redação da Revista Oeste. A primeira linha tem uma palavra só: Prezados. Assim mesmo: Prezados, no plural e sem o acompanhante obrigatório. O plural sugere que o texto foi endereçado a mais de um vivente, mas a ausência de nomes impossibilita a identificação dos destinatários. 
Também o remetente refugiou-se no anonimato. Depois de um entediado “Att” na penúltima linha, aparecem três palavras — Equipe Aos Fatose o logotipo dessa obscenidade parida pelos discípulos de Lula: a agência de checagem.

O palavrório se divide em três parágrafos, reproduzidos abaixo em negrito, com apartes do colunista entre uma e outra sopa de letras.

“Estamos fazendo um especial investigativo que reuniu mais de 690 conteúdos desinformativos ou golpistas virais que circularam desde o segundo turno das eleições e até a invasão dos prédios dos Três Poderes no dia 08/01. Entre os conteúdos estão trechos de vídeos da Revista Oeste em que seus comentaristas disseminam desinformação ou defendem pautas golpistas.”

Vamos lá. O que é um “especial investigativo” Um trabalho escolar? 
Uma composição à vista de uma gravura? 
Um teste eliminatório para o ingresso num curso de formação de detetives? E por que o “virais” depois do “golpistas”?  
Querer derrubar o governo já é uma enormidade. Espalhar tamanho ato antidemocrático pela internet é coisa para 20 anos de prisão preventiva e 30 de domiciliar (com tornozeleira e sem passaporte), além da multa de US$ 15 milhões (por semana). 
O “e” entre eleições e até só existe em discurso de lulas e dilmas. 
O zero antes e 8 e do 1 é tão dispensável quanto revelador: quando se trata de datas, o zero à esquerda é apreciado apenas por gente que vale menos que um zero à esquerda.
Por que o deserto de vírgulas? O poeta Ferreira Gullar ensinou que a crase não foi feita para humilhar ninguém. Nem a vírgula, parece desconfiar o autor do recado. 
Quando não se sabe onde colocar os sinaizinhos, melhor assassiná-los. Mas uma dupla de vírgulas sobreviventes geme nos curtos parágrafos seguintes:

“Dessa forma, gostaríamos de abrir espaço para a revista se posicionar sobre o assunto”.

Posicionar, posicionamento e outros palavrões do gênero só servem para revelar a posição do orador: está de cócoras para Lula e no meio do bando que voltou à cena do crime.

“Nosso prazo para publicação é hoje (29/03) até as 19h. Caso não consigam responder dentro do prazo, podemos incluir o posicionamento posteriormente sem prejuízo.”

O prazo concedido pelos sherloques de picadeiro já se esgotara quando o e-mail foi repassado à direção de Oeste
Nenhum problema, consola a agência, que se dispõe a examinar “o posicionamento posteriormente sem prejuízo”. 
Sem prejuízo do quê?, perguntaria qualquer professor de português convidado a avaliar o palavrório insolente — antes de castigá-lo com o merecidíssimo zero com louvor.

A cópia em papel do recado já decolava rumo à lata de lixo quando bati os olhos num aviso no rodapé: “Viu algum conteúdo suspeito nas redes? Fale com a Fátima”. Acabara de ver um conteúdo mais que suspeito: a mensagem é uma sequência de agressões à Constituição, à democracia, à liberdade, ao idioma, à moral e aos bons costumes. Estava pensando na conversa com a Fátima quando notei que também é sigiloso o paradeiro dessa misteriosa padroeira dos caçadores de fake news.

Fórum Econômico Mundial
Oeste e a constante batalha contra a censura disfarçada de 
agência de checagem | Foto: Shutterstock
Pausa para a viagem no tempo. Aos 14 anos, estreei como redator da seção de nascimentos e óbitos do Nosso Jornal, semanário em que meu irmão mais velho mantinha uma coluna política. Ocorrida a primeira morte, Flávio me passou instruções. 
Cumpria-me investigar informações indispensáveis: o nome do defunto, a grafia correta, a idade e quantos parentes próximos deixara (além de avaliar pessoalmente o tamanho do enterro). No dia seguinte, a chegada ao mundo de mais um taquaritinguense expandiu o manual de regras. Além dos nomes dos pais e do dia do parto, era preciso investigar o peso do bebê e, com especial rigor, o prenome dos recém-nascidos. 
Já começara a praga dos Wellyngttons, das Myrellas e outras misturas de duplas consoantes com rabiscos com som de vogal ausentes do abecedário oficial.
 
Poucos meses num semanário do interior paulista bastaram-me para compreender que todo jornalismo é investigativo. Notícia sem apuração é como texto sem palavra: não existe. 
Por muitas décadas, pareceu-me claríssimo que não se pode separar os profissionais da imprensa entre os que investigam e os que nada apuram. Sempre houve bons e maus perseguidores da verdade. Mas todos os que exercem a profissão são jornalistas investigativos, certo?  
Não no Brasil, decidiram em 2002 os fundadores da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, a Abraji. 
É um clube reservado a Jornalistas Investigativos, com o J e o I em maiúsculas truculentas como nas manchetes de tabloides sensacionalistas europeus.

O silêncio cúmplice da Abraji, o fanatismo dos sindicatos lulistas e a covardia dos que se ajoelham diante de patrulhas ideológicas geraram o filhote repugnante autodenominado agência de checagem

De lá para cá, a entidade promoveu cursos de aperfeiçoamento, seminários e premiações, engordou abaixo-assinados ou manifestos, divulgou notas oficiais para comunicar à nação quem dizia a verdade e deu palpite em tudo, fora o resto. Só ficaram faltando descobertas históricas resultantes de investigações feitas por associados decididos a justificar a presunçosa denominação da entidade. 
Nos últimos 20 anos, assunto é que não faltou: Mensalão, Petrolão, revelações da Lava Jato, roubalheira institucionalizada, impeachment de presidente, prisão de intocáveis — pela primeira vez na história da imprensa brasileira, o dia começava com dois ou três fatos disputando a ponta da fila das notícias relevantes. 
Incapazes de enxergar as bandalheiras no lado esquerdo da estrada principal, os Jornalistas Investigativos se juntaram no consórcio que vigiava apenas a pista esquerda. Fecharam os olhos à ofensiva contra a liberdade de expressão.
Ignoraram as ilegalidades fabricadas por ministros do Supremo Tribunal Federal. 
Aceitaram a censura à imprensa. E se tornaram porta-vozes da verdade oficial.
Site da Abraji | Foto; Reprodução
O silêncio cúmplice da Abraji, o fanatismo dos sindicatos lulistas e a covardia dos que se ajoelham diante de patrulhas ideológicas geraram o filhote repugnante autodenominado agência de checagem. Conheço boa parte dos que chefiam esses aleijões.  
O fracasso nas redações os reduziu a carrascos da informação. 
Não admitem a existência de jornalistas que veem as coisas como as coisas são e contam o caso como o caso foi. Acusam de golpistas os genuínos democratas.

Às vezes o lado escuro parece perto da eternização no poder, mas acaba perdendo. Os farsantes perdem por ignorar que os fatos, embora frequentemente pareçam agonizantes, sempre prevalecem. A verdade não morre.

Nesta quinta-feira, foi enfim divulgado o “especial investigativo”. Trata-se de uma intragável salada de disparates. Entrei no grupo de desinformantes golpistas a bordo de trechos de vídeo confusos, inaudíveis e sequestrados do contexto. Segue um conselho para a misteriosa Fátima: caia fora do estranho mundo das agências. Vão todas morrer de safadeza investigatória.

Leia também “Lula e o PCC sonham juntos”

Augusto Nunes,  colunista  - Revista Oeste


segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

STF e PGR procuram soluções para julgamento de centenas de ações contra golpistas - Folha de S. Paulo

 Há preocupação para que processos não travem trabalhos dos órgãos; casos podem ser enviados à 1ª instância

 Mais de um mês após a depredação das sedes dos três Poderes, o STF (Supremo Tribunal Federal) e a PGR (Procuradoria-Geral da República) ainda procuram soluções para que as centenas de ações penais contra os suspeitos de participarem e incentivarem os ataques golpistas de 8 de janeiro não travem os trabalhos dos órgãos.

É consenso que, em qualquer cenário, haverá sobrecarga de serviços e uma provável necessidade de convocar reforços. Até agora, a PGR enviou ao Supremo denúncias contra mais de 650 pessoas. De acordo com o órgão, 49 dessas denúncias têm como alvo pessoas classificadas como executores, uma é contra um agente público e 602 contra incitadores dos atos.

As ações são assinadas pelo subprocurador-geral da República Carlos Frederico Santos, que coordena o grupo da PGR que atua nos casos relacionados aos atos golpistas. Informalmente, ele já tem consultado procuradores para reforçarem a equipe que atuará nas ações penais dos casos.No Supremo, interlocutores do ministro Alexandre de Moraes, responsável pelos inquéritos, afirmam que a sua intenção inicial era manter os processos sob a tutela do tribunal, o que evita que eles fiquem parados e sem julgamento —ou que haja decisões divergentes entre os juízes caso sejam enviados para a primeira instância.

Porém, não há uma equipe no Supremo que tenha condição de tocar a fase de instrução das ações, após o recebimento das denúncias. Nessa parte dos processos, são apresentadas as provas materiais, como documentos, e ouvidas as testemunhas. A partir daí, o juiz forma a convicção se irá condenar ou absolver o réu. Uma possibilidade que tem sido cogitada é a criação de uma força-tarefa, com convocação de juízes, para tocar essa fase dos processos.

Para as audiências de custódia —etapa mais simples, na qual magistrados fazem avaliação inicial das prisões—, já foi necessário criar um mutirão na Justiça. Moraes delegou a tarefa a juízes federais e distritais.Há ainda outro problema. Segundo o regimento interno do Supremo, as ações penais que tramitam na corte devem ser julgadas em plenário pelos 11 ministros.Isso, porém, pode ser feito de forma virtual, em um sistema no qual os integrantes da corte depositam os seus votos eletronicamente.

De 2014 a 2020, a competência para julgar as ações tinha sido deslocada para as turmas de cinco ministros. O retorno ao plenário desses julgamentos, como foi no mensalão, aconteceu em 2020, na gestão do ministro Luiz Fux, sob a justificativa de que as restrições no foro especial diminuíram a quantidade de ações penais no Supremo. À época, isso foi considerado um movimento de Fux em benefício da Lava Jato, já que os processos deixariam de ser julgados pela Segunda Turma, que vinha impondo sucessivas derrotas à operação.

Se a maioria dos processos não ficar no Supremo, é possível que o ministro Alexandre de Moraes envie os casos para a primeira instância após as denúncias serem aceitas pelo tribunal. No STF permaneceriam apenas as ações relacionadas a pessoas com prerrogativa de foro, como deputados federais. Como as suspeitas envolvem crimes federais ocorridos em Brasília, o caminho esperado é que eles sejam enviados para uma das varas criminais da Justiça Federal do Distrito Federal.

Mas isso também provocaria um problema: há apenas três varas criminais federais no DF, que ficariam superlotadas com os processos relacionados aos atos golpistas do dia 8 de janeiro. Embora haja divergências entre os próprios ministros a respeito do que deve ser feito, o entendimento comum é o de que a solução final deverá ser apresentada pelo próprio Alexandre de Moraes, que tem um perfil centralizador e controlador com as suas ações.

Atualmente, sete inquéritos estão abertos no Supremo para apurar responsáveis pelos atos antidemocráticos que culminaram em depredação na praça dos Três Poderes, a pedido da PGR.

Três desses inquéritos investigam a participação de deputados federais sob suspeita de terem instigado os atos: André Fernandes (PL-CE), Clarissa Tércio (PP-PE) e Silvia Waiãpi (PL-AP). Em suas decisões, Moraes tem indicado que pretende atuar de forma rigorosa contra autoridades que tiveram relações com os atos. Ele já disse, por exemplo, que "os agentes públicos (atuais e anteriores) que continuarem a se portar dolosamente dessa maneira, pactuando covardemente com a quebra da democracia e a instalação de um estado de exceção, serão responsabilizados".

"Absolutamente todos serão responsabilizados civil, política e criminalmente pelos atos atentatórios à democracia, ao Estado de Direito e às instituições, inclusive pela dolosa conivência —por ação ou omissão motivada pela ideologia, dinheiro, fraqueza, covardia, ignorância, má-fé ou mau-caratismo", afirmou.

Outros dois inquéritos tentam identificar quem foram os executores e quem foram os financiadores e pessoas que auxiliaram materialmente os atos. Há, ainda, um que apura os autores intelectuais e instigadores dos atos. Nesse inquérito, Jair Bolsonaro (PL) é investigado. O ex-presidente é suspeito de ter cometido incitação pública à prática de crime após ter postado no Facebook, dois dias após os ataques, um vídeo questionando a regularidade das eleições e apagado depois.

Além disso, o sétimo inquérito aberto investiga suspeitas de ações e omissões do governador afastado do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MDB), e do ex-ministro da Justiça e ex-secretário de Segurança Pública do DF Anderson Torres.[o ideal é que Ibaneis seja condenado e afastado definitivamente do governo do DF - ainda que não tenha atuado dolosamente, a permanência do Ibaneis a frente do governo do DF é PREJUDICIAL, dada sua NOTÓRIA INCOMPETÊNCIA e INEFICIÊNCIA que está prejudicando e muito o Distrito Federal.]

Desde 8 de janeiro, ao menos 1.420 pessoas foram presas em flagrante ou durante operações deflagradas pela Polícia Federal. Daqueles presos em flagrante, até a semana passada 916 tiveram a prisão convertida em preventiva (sem prazo determinado) e 464 obtiveram liberdade provisória, mediante medidas cautelares. 

Política - Folha de S. Paulo

 

sábado, 28 de janeiro de 2023

Juíza pede que presos por atos terroristas [?] voltem aos estados de origem

De acordo com a magistrada da VEP-DF, grande parte dos custodiados não mora na capital do país e a permanência deles pode causar "efeitos negativos" na Seape-DF

Juíza da Vara de Execuções Penais do Distrito Federal (VEP-DF), Leila Cury pediu ao presidente do Tribunal de Justiça (TJDFT), desembargador José Cruz Macedo, que presos pelos atos golpistas do dia 8 de janeiro sejam transferidos, definitivamente, aos respectivos estados de origem.

O ofício foi encaminhado nessa quinta-feira (26/1). No documento, a magistrada destaca que o sistema prisional do DF, após a realização das audiências de custódia, recebeu 925 pessoas — entre homens e mulheres. Leila Cury lembra ainda que, dos 457 presos que foram submetidos à monitoração eletrônica, por meio da tornozeleira, somente 14 moram na capital do país.
 “Todas as demais são oriundas de outros Estados da Federação e foram autorizadas por Sua Excelência a retornarem aos seus respectivos domicílios, nos quais deverão se apresentar perante o Poder Judiciário local”, ressaltou a juíza, afirmando que, na mesma proporção, a maior parte das mais de 900 pessoas presas não são do DF.

A magistrada destaca que, para acomodar aqueles que estão no sistema prisional, a Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seape-DF) precisou “suspender algumas atividades administrativas consideradas de menor essencialidade, a fim de viabilizar a estrutura de pessoal necessária à utilização de blocos do Centro de Detenção Provisória (CDP) II, que se encontravam desativados por falta de servidor”.

“Ocorre, porém, que, caso essas medidas permaneçam suspensas por mais tempo, tal circunstância certamente trará efeitos negativos não apenas para a Seape-DF, como para a VEP-DF, porque a presença dessas pessoas no sistema prisional local impacta sobremaneira a gestão das unidades prisionais e, igualmente, traz efeitos sobre o funcionamento deste Juízo, considerando o expressivo aumento das demandas relacionadas à apreciação de pedidos afetos à sua competência legal, como por exemplo a implementação dos direitos carcerários previstos na Lei de Execuções Penais”, alertou Leila Cury.

Desta forma, a juíza pediu que o presidente do TJDFT solicite ao ministro Alexandre de Moraes a transferência definitiva dos presos que não residem no Distrito Federal, “a fim de que possam retornar aos seus estados de origem, para amenizar os impactos causados pelo incremento repentino dessa quantidade de pessoas na população carcerária local”.
 
Cidades - Correio Braziliense
 

quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

O que os homens de azul não toleram - Percival Puggina

Meninos, eu vi. Eu vi deputados furiosos com a intromissão do Supremo em assunto que estava sendo objeto de negociação na Câmara dos Deputados. Vale dizer, no dinheiro das emendas.

Se ministro do Supremo prender deputado, eles dizem: “Dane-se, não gosto dele!”. Se aplicarem tornozeleira, tudo bem. Se desarmarem deputado, eles assistem. Se cortarem o acesso de parlamentares às redes sociais, ninguém se importa. 
Façam os “supremos” o que fizerem contra a governabilidade do país ou contra as liberdades de expressão e o direito de ir e vir dos cidadãos – a Casa do Povo a tudo assiste com cara de paisagem. 
Rodrigo Maia, depois que largou a presidência da Câmara, foi ser secretário de Estado em São Paulo e abandonou a política. 
Seu sucessor, Arthur Lira, também largou a política. 
O que ele faz é outra coisa, parecida, mas não é política, na perspectiva da sociedade. Tudo isso a Casa tolera, com as raras, notórias e brilhantes exceções (que por poucas, todos conhecem).
 
Vou usar a palavra tolerância, mas não no sentido que o leitor está pensando. Direi que a tolerância do Congresso tem um limite e esse limite atende pelo nome vulgar de “grana”.  
Mexeu na grana das emendas e até quem está em casa de cuecas, veste as calças e se manda para Brasília expressar indignação. E pasmem: imediatamente começaram a falar em excessos do Judiciário, em ativismo judicial, em desprestígio do parlamento e até na indignação dos cidadãos...
 
Sim, sim, sei. Não precisa explicar. Eu só queria, mesmo, entender. Como aluno atento do mestre Alexandre de Moraes, aprendi dele algumas “categorias criminais” novas, de criação própria, desenhadas à perfeição para aplicar restrição de direitos conforme seu gosto.  
São categorias fluidas, gasosas, tais como, entre outras, atos antidemocráticos, fake news, militância digital, desordem informacional.

Na mesma batida, eu alinho algumas condutas igualmente etéreas, aplicáveis ao descomunal protagonismo do STF agora percebido pelo Poder Legislativo brasileiro. Ele pode começar a reagir usando as seguintes “categorias criminais”: ativismo judicial, militância cartorial, desordem hierárquica, agilidade punitiva em contradição com a morosidade processual.

Se precisarem de outras, eu arrumo aqui.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 

segunda-feira, 4 de abril de 2022

Defesa de Daniel Silveira diz que tornozeleira tem "vida própria"

Advogado do deputado pede a substituição do equipamento e afastamento do ministro Alexandre de Moraes do caso

A defesa do deputado federal Daniel Silveira (União-SP) entrou com um pedido ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmando que a tornozeleira eletrônica colocada no parlamentar está "com vida própria", "vibrações" e "ruídos estranhos".

“Esta defesa, na pessoa do advogado que ao final assina, em razão de anormalidades e comportamentos estranhos vislumbradas na tornozeleira eletrônica instalada no último dia 31/03/2022, 15h, na sede da Polícia Federal, em Brasília/DF, por questões de segurança institucional de seu cliente, e diante das suspeitas de manipulação do equipamento”, diz pedido.

A defesa pede mudança imediata substituição do equipamento de monitoramento. “Há a indubitável desconfiança de que o equipamento tenha adquirido vida própria em razão de relatos do parlamentar de ruídos estranhos e contínuos, além de esporádicas vibrações sem qualquer nexo ou causa, comparando-se com o equipamento devidamente anteriormente utilizado, entre 14/03/2021 a 10/08/2021”

As circunstâncias de sua implementação, instalação, com local e horários pré-determinados pelo senhor Relator, aliados aos eventos estranhos ocorridos desde a sua instalação, provocou desconfianças incontroláveis a este advogado de Defesa, elevando o sinal de alerta, ante a persecução penal em face do monitorado e meios nada ortodoxos, ilegais e inconstitucionais para aplicação da lei penal e processual penal”, diz trecho do documento.

No mesmo pedido, a defesa também requereu que Alexandre de Moraes seja impedido de atuar no processo. “Este Relator é, simultaneamente, vítima, juiz e acusador, e que viola o sistema penal acusatório vigente no Brasil, caso desconheça”, diz.

Entenda
Depois de dias resistindo, o deputado Daniel Silveira finalmente acatou a ordem do ministro Alexandre de Moraes, do STF, e colocou tornozeleira eletrônica, na última quinta-feira (31/3).

  parlamentar chegou a passar a noite na Câmara dos Deputados para evitar o cumprimento da ordem judicial. O ministro determinou multa diária de R$ 15 mil a Silveira e bloqueio de suas contas pelo Banco Central, pelo descumprimento da ordem judicial. Depois dessa ordem, o parlamentar decidiu se apresentar para colocar o equipamento.

Na saída da PF, Daniel Silveira aproveitou os holofotes para atacar o STF e ainda debochou da tornozeleira. "Eu coloquei nessa perna porque tudo de ruim é na esquerda", disse aos jornalistas. "Pode filmar, tirar foto, pra ele não dizer que violei nada. Anota o número de série", afirmou. "Não existe defesa, existe acusação. Não cabe recurso ao ministro Alexandre de Moraes. Ele simplesmente ignora. Vocês não viram o processo?", disse. 

Política - Correio Braziliense 

 

sexta-feira, 1 de abril de 2022

Sonhos e pesadelos supremos - Gazeta do Povo


    Luís Ernesto Lacombe

Tivessem meus sonhos poderes mágicos, e haveria um Supremo Tribunal Federal ocupado realmente em guardar a nossa Constituição. 
Um STF que respeitasse a independência e harmonia entres os três poderes, que não rasgasse ou inventasse leis, que não fizesse política. Um tribunal que habitasse exclusivamente os autos, que não fosse ativista, viciado em tirania, em perseguições insanas. 


O deputado federal Daniel Silveira (União-RJ), alvo de determinação do ministro Alexandre de Moraes para que coloque uma tornozeleira eletrônica. -  Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados.

Meu STF dos sonhos poderia ter Thaméa Danelon, Ludmila Lins Grilo, Flávia Ferronato, Marcelo Rocha Monteiro, Marcelo Buhatem, Ailton Benedito, Erival da Silva Oliveira, Ives Gandra Martins Filho, Janaína Paschoal, Ivan Sartori e Nuria Peris. É só um sonho, nada além disso... As regras para a indicação dos ministros são claras. Dentro delas, chegamos à escalação real, essa que está aí para o jogo. Invariavelmente, um jogo sujo.

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Alexandre de Moraes dá mais uma entrada dura no deputado federal Daniel Silveira. Vai na canela, lançando com violência contra o parlamentar uma tornozeleira eletrônica. O ministro quer encurralar Silveira, ordena que ele restrinja suas movimentações a Brasília e Petrópolis, na região serrana do Rio. Já tem tempo essa perseguição ao deputado, é levada adiante por meio de usurpação de poder, agressão ao instituto da imunidade parlamentar, à Constituição e ao ordenamento jurídico
Mandado de prisão em flagrante, flagrante perpétuo, uma coleção de absurdos referendada pela Câmara dos Deputados, em fevereiro do ano passado. Chegou a 364 o total de parlamentares que votaram pela manutenção da prisão de Daniel Silveira, por causa da divulgação de um vídeo... Alguns andam por aí, se dizendo arrependidos.


 As ordens de Alexandre de Moraes são ilegais, inconstitucionais, afrontam as liberdades e garantias individuais

Agora, devem se pronunciar de novo os deputados. E prontos a dar um basta na tirania de toga. Ou eles vão permitir que se apliquem medidas cautelares contra um parlamentar, sem que isso passe pelo crivo da Câmara? As ordens de Moraes são ilegais, inconstitucionais, afrontam as liberdades e garantias individuais. 
E Silveira, sozinho, coloca em xeque o Judiciário e o Legislativo. 
A Câmara precisa defender as prerrogativas dos deputados, não pode se apequenar diante de um Judiciário que se imagina um Olimpo. 
Não pode haver espaço para covardes, omissos e coniventes. Arrependidos, arrependam-se de verdade! Nunca haverá democracia, se a Constituição Federal não for cumprida.
Virar as costas para Daniel Silveira agora é virar as costas para o parlamento e os eleitores brasileiros. Não dá mais para permitir abusos, que o STF se esparrame por tudo. O Congresso precisa se mexer, aprender com os erros... Sim, estaríamos melhores se os deputados tivessem derrubado a prisão de Daniel Silveira há pouco mais de um ano. Estaríamos melhores se, antes disso, em abril de 2020, Bolsonaro tivesse recusado a ordem para não nomear Alexandre Ramagem para a Polícia Federal, sendo a indicação uma prerrogativa do presidente da República. 
Estaríamos melhores se o Supremo não estivesse apostando na censura, no banimento, na prisão. É hora de entender, deputados, senadores (principalmente eles) e eleitores, que o STF dos sonhos depende apenas do cumprimento das leis. Vamos vigiar o vigia!

Ernesto Luis Lacombe, colunista - Gazeta do Povo - VOZES

quarta-feira, 30 de março de 2022

O inquérito de Moraes que mira Daniel Silveira nasceu errado. Vai estar errado para sempre - O Estado de S. Paulo

 J. R. Guzzo

Põe a tornozeleira, diz o ministro do STF. Não ponho, diz o deputado; deputado; situações absurdas, em geral, só levam a outras situações absurdas   

Situações absurdas, em geral, só levam a outras situações absurdas; a demência puxa a demência. É assim que temos, agora, esse prodigioso debate sobre a tornozeleira do deputado Daniel Silveira – trata-se do grande tema da política brasileira de hoje, para se ter uma ideia do ponto a que chegou a qualidade do debate neste País. Põe a tornozeleira, diz o ministro Alexandre de Moraes, do STF. Não ponho, diz o deputado

Dá para entender que dois homens adultos, um deles tido como importantíssimo para a sobrevivência da nação, nas suas atuais funções de Defensor Perpétuo da Democracia, se metam numa discussão desse tipo? É patético, mas eis aí o resultado inevitável da decisão, tomada pelo ministro, de prender um deputado federal em pleno exercício do seu mandato. Foi uma decisão insana. Só poderia gerar insanidade. 

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Eis aí um caso em que tudo está errado, desde o primeiro momento, e não melhorou em nada desde então. A Constituição Federal determina, com uma clareza de cartilha escolar, que nenhum deputado federal pode ser punido por expressar em público o que tem na cabeça – seja lá o que for, sem nenhuma exceção e sem qualquer ressalva. 
Está escrito, também, que só pode ser preso em flagrante e se cometer um crime inafiançável.
O deputado Silveira não foi preso em flagrante, não cometeu nenhum crime inafiançável e expressou o que tinha na cabeça – no caso, um monte de insultos aos ministros do STF. 
Apesar disso tudo, foi preso por ordem de Moraes, que há três anos conduz, com total apoio do tribunal supremo, um inquérito para investigar “atos antidemocráticos” e a circulação de “notícias falsas”. [Em nossa opinião as coisas vão se ajustar; 
logo ficará claro que o substantivo Supremo usado para identificar a instituição  Supremo Tribunal Federal,  define ser o órgão máximo do poder judiciário brasileiro que está acima de todos os outros tribunais - condição que não confere a nenhum dos seus membros a condição expressa pelo adjetivo SUPREMO, que define O QUE ESTÁ ACIMA DE TUDO E DE TODOS = o SER SUPREMO = DEUS.
O ministro Moraes só em 2022 já teve algumas contrariedades:
-  uma delas a de determinar ao presidente Bolsonaro que comparecesse a uma delegacia da Polícia Federal para depor, o presidente ignorou a determinação e ficou tudo como estava;
- outra por ter determinado a prisão e extradição do blogueiro Allan dos Santos, atualmente residindo nos Estados Unidos e a ordem foi ignorada pelas autoridades daquele país e pela Interpol - o blogueiro continua nos "States" e solto;
- determinou que o deputado Daniel Silveira usasse tornozeleira, autorizando a PF ou o pessoal da Secretaria de Administração Penitenciário que, se necessário fosse, entrassem na Câmara dos Deputados para  colocar o acessório de controle - o deputado permanece na Câmara sem tornozeleira e tudo indica que assim vai ficar.
A ministra Rosa Weber, tentou bloquear, abrir - não recordamos o procedimento exato - o chamado orçamento secreto, nada ocorreu.
O ajuste é questão de tempo e coisa da democracia.]

O ministro, para tanto, criou uma nova figura no direito universal: o flagrante perpétuo. Como o deputado foi preso dias depois de ter dito o que disse, Moraes inventou que a palavra “flagrante”, nesse caso, tem um significado diferente do que consta no dicionário: pode se aplicar a qualquer momento, independente do que marca o relógio ou a folhinha, pois o crime de Silveira não acaba depois de cometido; dura para sempre, e seu autor estará para sempre em situação de flagrante. Não tem pé nem cabeça – mas é o que valeu na hora. Junto com os outros delírios da prisão, o “flagrante perpétuo” gerou a aberração cinco estrelas que veio desembocar enfim, no atual bate-boca sobre a tornozeleira. 

A polícia pode entrar no recinto da Câmara dos Deputados, onde Silveira se refugiou, para cumprir a ordem de colocar a tornozeleira, dada por Moraes? 
O deputado está no exercício normal do seu mandato, pois não foi cassado; ele poderia ser impedido, como quer o ministro, de sair da comarca onde mora, salvo para ir à Câmara em Brasília? 
Para exercer o seu mandato ele tem, obrigatoriamente, de ir a outros lugares. Como é que fica? Mais que tudo, como se resolve, à essa altura, o pecado original da história toda a punição de um deputado que é protegido por imunidades parlamentares escritas na Constituição Federal do Brasil? 
 
Não há como resolver, eis aí o problema. Da mesma forma, por sinal, que não há como resolver a charada que se formou entre a punição imposta ao deputado e os atos que ele efetivamente praticou. 
Silveira disse o diabo do STF mas isso, caso ele fosse julgado e condenado, só poderia configurar os crimes de calúnia, injúria ou difamação. Nenhum deles é inafiançável. 
Nenhum deles permite a prisão do autor, mesmo depois da condenação: a pena é multa ou detenção, e réu primário não pode ir para a cadeia em caso de detenção. 
E a “Lei de Segurança Nacional”, de 1983 – o deputado não poderia ser preso por alguma infração a ela? A lei não existe mais – foi revogada em agosto do ano passado. Na verdade, e esse é o real problema, não há como resolver nenhuma questão que deriva de um inquérito ilegal como esse que está sendo levado adiante por Moraes.  

Da mesma forma como absurdo leva a absurdo, o que é ilegal na origem leva à ilegalidade o tempo todo. O inquérito de Moraes nasceu errado. Vai estar errado para sempre. 

J. R. Guzzo, colunista - O Estado de S. Paulo