É dos bons parlamentares que vamos precisar, sempre, para apoiar os bons governos e obstar os maus.
Um mau sistema político adoece suas instituições e perturba a
sociedade a que elas deveriam servir. Para compreender isso talvez nos
sirva uma analogia. Responda: você acha que de uns anos para cá nascem
mais bandidos no Brasil?
O aumento da criminalidade nas últimas décadas
decorre de algum bug genético que se infiltrou na sociedade brasileira?
Claro que não. A criminalidade aumenta, estimulada por outros fatores,
principalmente em virtude da impunidade.
Do mesmo modo, então:
você crê que foi espontâneo o processo de degradação da política
brasileira percebido de uns anos para cá? Claro que não. Há uma causa
estrutural para isso, relacionada às características do modelo político
vigente no país. Realmente espontânea, nessa realidade, é a tendência ao
agravamento, pois o modelo estimula seus agentes a legislar, agir e
julgar em favor da própria má conduta e de suas perversas motivações.
Certamente sem ter isto em conta, escreveu-me uma leitora discorrendo
sobre a inutilidade de se pedir ao eleitor que vote bem, visto que ele
só pode escolher entre aqueles que os partidos indicam e na cidade dela,
os dois candidatos a prefeito etc. etc.. Pois essa mensagem expressa
talvez o núcleo da dificuldade que se enfrenta para resolver gravíssimo
problema estrutural da política em nosso país, dando causa aos
malefícios que tanto nos atingem. Numa eleição, em qualquer eleição,
seja municipal (como a recente), estadual, ou federal, toda a atenção e a
esperança nacional converge para a escolha daquele que irá governar. E
quase nenhuma preocupação com a qualidade da composição do respectivo
parlamento, órgão mais importante do poder político em qualquer
democracia.
Observe quanta frustração causou às expectativas
nacionais a reação negativa do Congresso ao presidente eleito em 2018.
As razões do voto presidencial vencedor não foram as mesmas dos votos
parlamentares vitoriosos, e foi a partir daí que as raposas retomaram o
comando do galinheiro.
As medidas provisórias passaram a falecer nas
gavetas, os projetos do governo começaram a ser desfigurados, não raro,
transformados no seu inverso, a pressão pelo aumento do gasto público
disparou e os partidos robusteceram seu caixa. A grave enfermidade
institucional do Estado brasileiro tende a se acentuar e não serão os
homens de governo que o irão sarar com a varinha de condão da “vontade
política”, quer sejam prefeitos, governadores ou presidentes. Os que o
conseguirem, nos seus âmbitos de gestão, só o farão se e quando suas
virtudes pessoais encontrarem ecos majoritários igualmente virtuosos nos
respectivos parlamentos. Ou seja, é dos bons parlamentares que vamos
precisar para apoiar os bons governos e para obstar os maus governos.
Fácil de entender.
Mas difícil de fazer, não? Claro. Quem disse
que a democracia é fácil? Ela ficaria menos enrolada mediante um
conjunto de reformas que incluam pelo menos, no caso brasileiro, voto
impresso, distrital e facultativo e separação entre as funções de
estado, governo e administração. Enquanto isso não ganhar urgência na
pauta do eleitor, continuaremos a soprar contra o vento e a comemorar
vitórias de Pirro.
Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras e
Cidadão de Porto Alegre, é arquiteto, empresário, escritor e titular do
site Conservadores e Liberais (Puggina.org); colunista de dezenas de
jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba,
a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil pelos maus
brasileiros. Membro da ADCE. Integrante do grupo Pensar+.