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quinta-feira, 4 de maio de 2023

A hora do chá - Revista Oeste

No Brasil, essa aventura começou em 1808, com a vinda da Família Real portuguesa e a criação do Jardim Botânico do Rio de Janeiro

Filhas de Boston, 
Dai preferência ao nosso chá Souchong. 
Comprai grande quantidade. 
Pois se assim não fizerdes, encantadoras meninas, 
Degolaremos vós todas, e incendiaremos a cidade.” 

Propaganda inglesa de chá aos súditos rebeldes − Século 18 

O chá disputa com o café a fama de ser a bebida mais consumida no mundo, depois da água. Dada a população da China, Índia e Ásia, o chá deve liderar. O Viaduto do Chá, em São Paulo, o Casarão do Chá, em Mogi das Cruzes, o KKKK (Kaigai Kogyo Kabushiki Kaisha), em Registro, e a Vista Chinesa, no Rio de Janeiro, são marcos na história do chá no Brasil. Após a fase de ouro no século passado, o cultivo e o consumo do chá diminuíram. Agora, voltaram a crescer produção, consumo, qualidade e sofisticação dos produtos. A bebida, de várias raízes culturais, oferece diversidade de aromas, sabores, preparos, louças e um objeto cujo nome evoca sua função: a chaleira. O serviço do chá é símbolo de acolhida e partilha. Take your time. Participe desta história, escrita aqui por portugueses, brasileiros, chineses e japoneses. 

O chá ou chá-da-Índia (Camellia sinensis), Theaceae, é nativo das florestas do nordeste da Índia, confins da China, Birmânia e Vietnã. Após hibernar, com a elevação da temperatura na primavera, surgem os brotos. As folhas tenras são colhidas para a produção de chá. Elas contêm enzimas oxidantes. Colhidas, adquirem cor escura. O chá preto resulta desse processo. No chá verde, as folhas são submetidas ao calor (desativa as enzimas, conserva a cor da clorofila e os componentes ativos) por torrefação (forno) ou cozimento (vapor), método peculiar do Japão. 

A origem da palavra chá é chinesa. Seu sinograma é 茶, vocalizado como tza ou tzai. As duas denominações, chá e tê, derivam do mesmo sinograma e existem em várias em línguas. Chá, em português, russo (tchai), grego (tshai), japonês (ochá), árabe (chai), hindu (chai), thai (cha), romeno (cai), ucraniano (chaj), croata (caj), checo (caj), turco (cay), somali (shaah) e, sobretudo, em mandarim (chá) e cantonês (chá). Te, em espanhol, francês (thé), italiano (te), alemão (der tee), holandês (thee), dinamarquês (te), sueco (te), finlandês (tee), norueguês (te), islandês (te), armênio (te), húngaro (tea), hebraico (teh), tamil (tea), indonésio (teh), zulu (itiyé) e, sobretudo, em singalês (thê). Em filipino, as palavras tê e chá se encontram (tsaa) e em polonês, nunca se viram: herbata. Nossa Senhora de Czestochowa! 

Existem três lendas sobre a origem do chá. Na versão chinesa, milhares de anos atrás, o lendário imperador Shennong fervia água sob o abrigo de uma árvore para saciar sua sede. Uma brisa agitou os galhos, soltou algumas folhas. Misturadas à água, deram-lhe cor e fragrância. O imperador provou e aprovou: nasceu o chá, 2737 a.C. Na versão indiana, o monge persa BodhiDharma decidiu pregar os preceitos de Buda na China. Para ser digno da missão, jurou não dormir durante nove anos. Só isso. Três anos sem dormir, ficou sonolento. Ia sucumbir ao sono quando colheu folhas de chá selvagem e as mordeu. As virtudes revigorantes fizeram efeito: Dharma animou-se. Viveu acordado os últimos seis anos da missão. Haja teína! Já na versão japonesa, BodhiDharma, exausto, dormiu durante suas devoções. Furioso com sua fraqueza, cortou suas pálpebras e as jogou no chão. Harakiri de pálpebras. Anos depois, suas pálpebras deram à luz um arbusto desconhecido. Ele provou as folhas e percebeu sua propriedade de manter seus olhos abertos. Daí o hábito de cultivar o chá por onde ele andou.

(...)

Após a Guerra, com a recuperação dos tradicionais fornecedores asiáticos, fazendas foram vendidas e fábricas fechadas. Aí, o chá de saquinho expandiu o consumo (praticidade), mesmo se as folhas quebradas reduzem a qualidade da bebida. A nova forma de infusão ajudou indústria e exportações até a década de 1990. O acúmulo de problemas econômicos e o pareamento do dólar causaram o declínio da produção. As fábricas no Ribeira encerraram atividades, com exceção da Amaya Chás. Uma década passou, e o chá ressurgiu. 

A busca de vida saudável e novos hábitos de consumo contribuíram. Hoje, variedades cultivadas, sistemas de produção, técnicas de colheita e pós-colheita ganharam muita sofisticação. Entre os principais fornecedores de chá estão: Amaya Chás, Sítio Shimada, Sítio Yamamaru e Yamamotoyama. Fundada no Japão, em 1620, a Yamamotoyama trouxe ao Brasil a variedade Yabukita de chá verde (日本), a mais difundida no Japão, e outras como Yutaka Midori e Asatsuyu. Com 200 hectares entre Araucária (PR) e São Miguel Arcanjo (SP), a empresa produz cerca de 800 toneladas (20% orgânicos). A maior parte é exportada ao Japão e aos Estados Unidos. 

Para o Sebrae e a Associação Brasileira do Chá, os chás brasileiros são de qualidade: verde, verde em pó, preto, branco, azul (oolong), vermelho (Pu-erh), semi e pós fermentados e blends (laranja, jasmim, chocolate, berries etc.), de produção orgânica, artesanal e industrial, nas mais diversas apresentações. Produtores e locais de cultivo aumentaram. Existem opções de acessórios (bules, canecas e garrafas com infusor, chaleiras, louças…), cursos (Escola de Chá Embahú), webinars, tea tours e livros. Um caminho é o mercado de produtos premium. O chá dividirá cada vez mais a cena com o café e outras bebidas. Pode anotar. De folha em folha, de xícara em xícara. 

 Jardim Botânico do Rio de Janeiro | Foto: Reproduão/Wikimedia Commons

Leia também “A soja fecha o verão e entra em seu lar”

Evaristo de Miranda, colunista - CONTEÚDO GRATUITO - Revista Oeste

 

terça-feira, 26 de março de 2019

Temer livre; Moreira, também

“A libertação do ex-presidente e seu ex-ministro desanuvia as tensões com o MDB, mas vai acirrar os ânimos no Congresso em relação à CPI do Judiciário, batizada de Lava-Toga”

O desembargador do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) Antonio Ivan Athié revogou a prisão preventiva do ex-presidente Michel Temer (MDB), do ex-ministro Moreira Franco e dos outros seis investigados que estavam presos desde a quinta-feira (21) por decisão do juiz federal Marcelo Bretas, responsável pela Operação Lava-Jato no Rio de Janeiro. Com base em jurisprudencial dos tribunais superiores, alegou que houve violação de garantias constitucionais na decisão de primeira instância. O desembargador marcara para amanhã o julgamento dos pedidos de liberdade, mas antecipou sua decisão.

Athié é presidente da primeira turma especializada em direito penal, previdenciário e da propriedade industrial, à qual o Ministério Público deverá recorrer. A primeira turma é formada também pelos desembargadores federais Paulo Espírito Santo e Abel Gomes. O caso de Temer caiu nas mãos de um gato escaldado: Athié ficou afastado do cargo durante sete anos por ter sido alvo de uma ação do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em 2004, sob acusação de estelionato e formação de quadrilha. O inquérito contra ele foi arquivado em 2008 pelo próprio STJ, a pedido do Ministério Público Federal, que alegou não ter encontrado provas de que Athié teria proferido sentenças em conluio com advogados.

Na sua decisão, Athié elogiou Bretas (“notável juiz, seguro, competente, corretíssimo”), mas discordou do juiz federal em relação aos argumentos utilizados para decretar a prisão preventiva de Temer e dos outros suspeitos, por considerar que não respeitaram o devido processo legal. Bretas recorreu à Convenção da ONU Contra a Corrupção para justificar as restrições de liberdade, o que não foi aceito por Athié: “Não se vá dizer que outro órgão, outra pessoa, ou quem quer que seja, afora o Judiciário em processo regular, possa validamente declarar alguém culpado de algum delito, para fins penais”.

Tensões
A libertação de Temer e Moreira Franco desanuvia as tensões com o MDB, mas vai acirrar os ânimos no Congresso em relação à CPI do Judiciário, batizada de Lava-Toga, que une setores de esquerda e a base mais radical do presidente Bolsonaro. Autor do requerimento, o senador Alessandro Vieira (PPS-SE) minimiza os riscos de uma crise institucional: “O Brasil não vai virar um caos e não vai parar com a Lava-Toga. O Brasil prendeu o presidente da República mais popular da história, denunciou duas vezes um presidente no exercício do mandato, colocou na cadeia ex-governadores, prefeitos, deputados, e não entrou em crise coisa alguma. A democracia brasileira está sólida o suficiente para passar por mais essa etapa”. A cúpula do Senado, porém, não concorda com isso: Davi Alcolumbre (DEM-AP), presidente da Casa, já disse que a CPI dificilmente será instalada, porque os principais partidos não apoiam. [comentando: o presidente do Senado está amarelando, não quer se indispor com o Poder Judiciário; 

mas, nada impede que seja instalada uma CPI para investigar o Poder Judiciário - que não deveria ser contra qualquer investigação, afinal vale o dito popular: ' quem não deve, não teme'.] 
 
Na Câmara, um grupo de parlamentares está em campanha aberta contra o Supremo Tribunal Federal (STF), por razões claramente ideológicas. Na semana passada, a deputada Bia Kicis (PSL-DF) protocolou um pedido de impeachment dos quatro ministros do STF que já votaram a favor da equiparação da homofobia ao racismo nas duas ações que discutem o tema no tribunal: Celso de Mello, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e Luís Roberto Barroso. Do grupo fazem parte, entre outros, Alexandre Frota (PSL), Kim Kataguiri (DEM) e Luiz Philippe Orleans e Bragança (PSL), descendente da família real brasileira.

É nesse ambiente que a turma do deixa disso tenta apagar o incêndio nas relações entre o presidente Jair Bolsonaro e o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que andaram se estranhando no fim de semana. Ontem, Bolsonaro pediu aos ministros “foco na pacificação” e escalou o chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, para negociar a votação da reforma da Previdência com os líderes partidários. Em nenhum momento, porém, admitiu um encontro com Maia, para restabelecer o diálogo. No estado-maior de Bolsonaro, caiu a ficha de que a não aprovação da reforma da Previdência pode levar o governo ao fracasso econômico. Entretanto, a lógica do “meu pirão primeiro” ainda prevalece entre os generais do governo, que querem aprovar a reestruturação da carreira dos militares a qualquer preço, embaralhando as negociações sobre a reforma no Congresso.

 Nas entrelinhas - Luiz Carlos Azedo - CB