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segunda-feira, 23 de março de 2020

O impacto da crise sobre o trabalho - O Estado de S. Paulo

A OIT estima que a pandemia pode deixar mais de 24 milhões de desempregados

Enquanto a crise sanitária no Ocidente entra no seu apogeu e começa a ser contida na Ásia, a crise econômica global está apenas começando. Tudo indica que o PIB mundial encolherá no primeiro semestre e na melhor das hipóteses ficará estagnado no segundo – o pior desempenho desde a crise financeira de 2007-2009 –, mas pode reacelerar em 2021, à medida que as cadeias de produção voltarem à ativa em busca do tempo perdido. Por outro lado, há o risco de que a contenção do vírus se prolongue mais do que o esperado ou sofra retrocessos insuspeitados. Em meio à incerteza, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) emitiu seu primeiro diagnóstico: Covid-19 e o Mundo do Trabalho: Impactos e Respostas.

Partindo dos atuais 188 milhões de desempregados, as estimativas sugerem um crescimento na taxa de desemprego global entre 5,3 milhões, no melhor cenário, e 24,7 milhões, no pior. A título de comparação, a crise financeira aumentou o desemprego em 22 milhões.  O impacto afeta tanto a quantidade como a qualidade dos empregos na indústria e nos serviços. Na China, por exemplo, o valor total agregado da indústria declinou 13,5% nos dois primeiros meses de 2020. O Conselho Mundial do Turismo e Comércio prevê um declínio de até 25% neste ano. Segundo a OIT, as perdas na renda dos trabalhadores podem variar de US$ 860 bilhões a US$ 3,440 trilhões.

Além disso, o impacto atinge desproporcionalmente os segmentos da população. A proporção de trabalhadores pobres deve crescer expressivamente. Jovens e velhos também sofrerão mais perdas de renda e ofertas. Alguns setores particularmente afetados pela pandemia, como serviços, saúde e escolas, têm um contingente massivo de mulheres – muitas delas responsáveis pela renda da família. Mais do que tudo, o choque atingirá os trabalhadores por conta própria, tanto mais na economia gig, [Gig worker = economia compartilhada,  freelancer ou informal.] um dos setores que mais cresceram nos últimos anos.

O primeiro pilar nas reações governamentais deve ser a proteção aos trabalhadores e aos locais de trabalho. Os governos podem auxiliar com condições logísticas para a implementação do teletrabalho e turnos escalonados. As associações de empresas japonesas submeteram a seus associados um questionário sobre medidas no local de trabalho e criaram atendimento telefônico para ajudar na adaptação. Irlanda, Cingapura e Coreia do Sul disponibilizaram licenças remuneradas por doença para trabalhadores por conta própria.

O segundo pilar é o estímulo à economia e à demanda de trabalho. Bancos centrais na Austrália, Canadá, Reino Unido e EUA cortaram as taxas de juros. A Itália introduziu isenções fiscais para contribuições de seguridade social e prorrogou os prazos para quitação de dívidas e financiamentos. O suporte especial a setores específicos precisa ser cuidadosamente dimensionado. Na Coreia do Sul o turismo e outros setores mais impactados receberam maiores subsídios e períodos mais longos de apoio.

O terceiro e último pilar é o apoio ao emprego e à renda. Na China o governo decretou que contratos de trabalhadores imigrantes não serão encerrados em razão de doença ou medidas sanitárias. Benefícios e outras formas de transferência de renda para os desempregados foram expandidos em diversos países, assim como aportes financeiros e isenções fiscais para os empregadores.

A atual crise tem características singulares, mas a experiência de crises financeiras e epidêmicas passadas mostra que a comunicação transparente e tempestiva reduz a incerteza e estimula a confiança. A última crise financeira provou que uma atitude do tipo “custe o que custar” compensa os sacrifícios fiscais dos governos.



Independentemente das circunstâncias nacionais, a OIT insiste num princípio fundamental: “O diálogo social tripartite entre governos, empregados e empregadores é a chave para desenvolver e implementar soluções sustentáveis”. Em escala global, é preciso resistir às tentações nacionalistas. A pandemia, por definição, impacta toda a cadeia de trabalho global. O multilateralismo será mais imprescindível do que nunca.

Editorial - O Estado de S. Paulo


sábado, 6 de outubro de 2018

Por que a polícia mata tanto no Brasil?

Talvez porque uma porção expressiva dos brasileiros aplauda de pé medidas como a pena de morte [resposta certa: para não morrer; os suspeitos reagem e os policiais exercem o direito legal de usar a força necessária para neutralizar a reação - que, quase sempre, está mais para um ataque aos policiais, do que para uma defesa.]

Por que a polícia mata tanto no Brasil? Cada um tem uma resposta. Porque a polícia é o braço armado do Estado, que extermina negros e pobres. Porque os policiais são despreparados. Porque os bandidos e a polícia travam uma guerra surda nas grandes cidades. Longe de negar as demais possibilidades — as refutações peremptórias eu deixo para os especialistas da área —, tenho cá uma sugestão: porque boa parte da população assim o quer.

Entre 2013 e 2017, segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, as mortes decorrentes de intervenções policiais escalaram uma montanha, indo de 2.212 para 5.159. Qualquer coisa que subisse 133% num período tão curto — assassinatos de mulheres, estupros de menores, inflação, IPTU — causaria, com razão, gritos de horror em praça pública. Não me consta que haja manifestantes marchando pelas ruas das capitais do país implorando, aos berros, que os policiais tirem o dedo do gatilho.

Talvez porque uma porção expressiva dos brasileiros aplauda de pé medidas como a pena de morte. Pressupondo-se que pesquisas de opinião retratem a realidade, mandar criminosos para câmara de gás, injeção letal, cadeira elétrica, pelotão de fuzilamento ou qualquer outro meio de extinção da vida é uma preferência nacional.  Pelos dados de uma pesquisa do Datafolha de janeiro deste ano, o apoio da maior parte dos entrevistados à pena de morte (na média, 57%) une homens e mulheres, jovens e idosos, moradores do Sul e do Nordeste, das capitais e do interior, neopentecostais e umbandistas, os menos e os mais escolarizados – embora seja interessante notar que, entre os ateus e as pessoas com renda familiar mais alta, essa maioria não se forme.  Como a pena capital é proibida pela Constituição e a probabilidade de que algum governo consulte o povo a respeito é rarefeita, implantou-se no país, com o apoio de uns e o silêncio de outros, a pena de morte informal.

E, assim, enquanto todas as forças policiais dos Estados Unidos mataram 1.093 pessoas em 2016, segundo levantamento do jornal inglês The Guardian, no ano passado apenas a polícia do estado do Rio de Janeiro(328 milhões de habitantes lá, 16,5 milhões aqui) deixou 1.127 mortos em confronto. E a intervenção federal acelerou o processo: pelos números contabilizados até agosto (1.073 mortes), os antigamente chamados autos de resistência chegarão sem esforço à casa dos 1.400 registros, ficando com folga no topo da série histórica, iniciada em 1998. É, de longe, a polícia que mais mata no país, responsável hoje por uma em cada cinco mortes violentas no estado.

O fato simples é que matar bandidos não reduz os índices de criminalidade. Tomando de novo o exemplo do Rio de Janeiro, em 20 anos foram 17 mil mortos em confronto com a polícia. É mais gente do que há em 60% dos municípios brasileiros. E a cidade não se tornou exatamente o paraíso da segurança pública.  A polícia parece operar numa lógica que chamo de caixinha de bandidos. A criminalidade, por esse raciocínio, é um sistema fechado. Se todos os marginais, os meliantes, os elementos forem mortos, acabam-se os crimes. Só que o caldo de cultura de desesperança, miséria, falta de educação, de exemplos e de perspectiva continua alimentando o mercado à margem da lei. O que reduz os crimes é a certeza de punição e do cumprimento da pena. De preferência, longa.