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quarta-feira, 17 de novembro de 2021

A história da mãe de criança de 5 anos presa há 100 dias por furto de água - BBC News

Após duas negativas de instâncias inferiores, um pedido de habeas corpus chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) na semana passada

Uma diarista de 34 anos está há pouco mais de 100 dias presa em uma penitenciária de Minhas Gerais, sob acusação de ter furtado água. Após duas negativas de instâncias inferiores, um pedido de habeas corpus chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) na semana passada.

Maria (nome fictício*) foi presa na frente do filho de 5 anos, em julho, em uma casa de uma cidade no interior de Minas. Segundo a polícia, ela e o marido violaram o lacre da instalação de água do local onde a família vivia de favor.

A defensora Alessa Veiga soube do caso em outubro ao visitar a ala feminina de um presídio de Minas. "Ela me entregou um bilhete, dizendo que estava presa há três meses por furto de água e que seu filho tinha ficado com a irmã mais nova, que é adolescente e vive em outra cidade. A Justiça prendeu o pai e a mãe e não se preocupou com que aconteceria com o filho", conta.

Para a defensora pública, que entrou com um pedido de habeas corpus no STF, o caso de Maria se enquadra no princípio de insignificância (quando o valor do objeto furtado é tão irrisório que não causa prejuízos à vítima, como no furto de comida, água, sucata e produtos de higiene pessoal). "É um absurdo uma mãe ficar cem dias presa por furto de água, um crime não violento. Ela me disse que queria pagar a conta, mas não tinha dinheiro. É uma família muito pobre, usava a água para cozinhar para o filho, para beber, tomar banho... eles viviam de favor, em uma casa minúscula. Será que a prisão era a melhor solução para esse caso?", diz a defensora.

Já o Tribunal de Justiça de Minas Gerais e o Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), em Brasília, consideraram que Maria deve ser mantida presa por ser reincidente, por supostamente ter desacatado o policial no momento da prisão pelo furto de água, "cuspindo em seu rosto", e porque não conseguiu provar ser a mãe da criança que carregava durante o episódio (leia mais abaixo). "Os fatos já apurados e as circunstâncias dos crimes demonstram tanto a inaplicabilidade das medidas cautelares diversas da prisão, quanto o risco concreto à ordem pública, caso a autuada seja de pronto colocada em liberdade", escreveu o desembargador Olindo Menezes, do TRF-1. [devemos ter presente que o furto de água, da forma que é narrado,  pode ser enquadrado no principio da insignificância,  porém, o crime de desacato deve ser punido na forma da lei. É inaceitável que se use um delito menor para obter impunidade para um crime maior.]

'Reação à prisão'
Segundo o Boletim de Ocorrência, por um mês a família usou a água disponibilizada pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) sem pagar pelo consumo. Questionada pela BBC News Brasil, a Copasa não informou o total do prejuízo sofrido pela empresa nem qual seria o valor da conta que a família teria de pagar pelo mês que utilizou o serviço. O Boletim de Ocorrência também não informa esses dados. Fotos da residência e da "gambiarra", incluídas no processo, mostram que a água era retirada de um cano e redistribuída pela casa. Segundo o IBGE, em média, cada membro de uma família brasileira consome 116 litros de água por dia.

Em junho, dois agentes da Copasa visitaram a casa e constataram que a família tinha violado o hidrômetro da residência. Os funcionários lacraram a instalação novamente, interrompendo o fornecimento de água. Um mês depois, os fiscais retornaram e, segundo eles, o lacre havia sido rompido de novo. Eles contam que chamaram a Polícia Militar depois de terem sido xingados por João (nome fictício), servente de pedreiro e companheiro de Maria.

Em depoimento, Maria disse que voltava com o filho para casa quando encontrou uma viatura no local. Ela tentou fugir com a criança no colo quando soube que seria levada à delegacia por furto de água. No BO, o funcionário da Copasa relatou a reação da diarista: "Exaltou-se, esboçou agressividade, proferiu palavras de baixo calão: 'seus policiais de merda, seus vagabundos, vão procurar bandido'". Ela teria tentado agredir e cuspir em um policial - acabou algemada e "colocada no xadrez" (compartimento traseiro da viatura). O filho assistiu à cena, ao lado.

Depois, na delegacia, Maria negou ter cuspido no policial ou tentado agredi-lo. Também afirmou que foi seu companheiro, João, quem rompeu o lacre no cano de água, porque a família não tinha como pagar a conta no momento. "Usava a água para cozinhar para meu filho", disse.

"Foi uma reação espontânea e justificável de uma mãe muito pobre, que ficou desesperada ao ser presa por furto de água. Presa na frente do filho", diz a defensora Alessa Veiga.

A diarista contou ter parado de estudar na quarta série do ensino fundamental. Ela diz ganhar entre R$ 50 e R$ 70 quando faz uma faxina.  O BO relata a versão dela: "Esclarece que só agiu assim, pois o proprietário da casa, que tinha (anteriormente) deixado eles ficarem no imóvel, mandou cortar a água com eles no local. Além disso, esclarece que não poderiam ficar sem água, visto que têm uma criança de cinco anos".

O servente de pedreiro João também foi preso em flagrante. Em nota, a Copasa afirmou que a prisão do casal "não ocorreu por furto de água, mas sim devido ao comportamento agressivo dos moradores contra os empregados da companhia." "A companhia repudia qualquer ato de violência e orienta seus empregados que acionem a PM se ocorrer algum tipo de agressão, verbal ou física, durante realização de seus serviços", diz a Copasa.

Princípio da insignificância
O Ministério Público de Minas Gerais pediu o relaxamento da prisão de João, alegando que o crime não era violento. Ele foi solto logo depois.
Já para a diarista o MP solicitou "prisão preventiva", citando como agravantes o suposto desacato aos policiais, a "resistência à prisão" e reincidência.

Leandro Machado - Da BBC News Brasil em São Paulo - MATÉRIA COMPLETA