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domingo, 10 de novembro de 2019

Rota de colisão: o navio Rodrigo Maia e o iceberg general Heleno - Blog do Noblat - Vitor Hugo Soares

VEJA

Uns jogam panos quentes para abafar o fogo, outros jogam mais gasolina para aumentar

O deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ) atua, há meses, no papel de um dos mais estranhos e enigmáticos aliados do governo. Isso vem de longe, mas ficou evidente e explosivo depois que, com ajuda decisiva do presidente Jair Bolsonaro, e da tropa então unida na bancada do PSL (hoje em desalinho), emplacou mais um período no comando da Câmara. Ultimamente, Maia avança além de curva (para usar a expressão do sumido ex- presidente do STF, Joaquim Barbosa), ao montar, no começo da semana, um acampamento em Jaboatão dos Guararapes, simbólica área metropolitana de Recife, no coração do Nordeste – de governos estaduais “de esquerda” conflagrados contra o bolsonarismo “de direita” – e de lá atirar contra o general Augusto Heleno, ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), antigo instrutor e atual amigo in pectore do mandatário.

Mal (ou bem?) comparando, o homem de proa no leme de um dos navios pilares da política nacional, se parece, às vezes, com o enfezado personagem da propaganda do sal de frutas ENO, nos Anos 60, que a cada situação de mudança, à sua frente, reagia apelando para a expressão que viralizou na época: “Eu sou do contra”. Tem sido assim desde quando o tempo começou a esquentar entre os poderes, a partir da apresentação dos projetos de reforma da Previdência, do ministro da Economia, Paulo Guedes, e do pacote anticrime, do ministro da Justiça, Sérgio Moro. Maia bateu-se contra estes dois titãs do governo, em seus primeiros testes de força e resistência.

Agora, sempre dando a impressão de ter como foco, de seus disparos retóricos, o presidente, ou um de seus três filhos com mandatos políticos – Eduardo, deputado; Flávio, senador e Carlos, vereador, todos com montanhas de votos no embornal –,[característica que falta ao ex-quase futuro primeiro ministro, que padece de incrível excesso de faltas de votos - foi reeleito deputado em 2018 com pouco-mais de 72 mil votos.] o presidente da Câmara decidiu testar pontaria e poder com um alvo militar de peso, força e prestígio, pessoal e profissional, de largo alcance. Ao lado disso, Augusto Heleno é, reconhecidamente, bom de briga e de combate. Com direito a Capacete Azul, da ONU, por sua relevante e construtiva atuação, em missão de Paz, em tempos temerários no Haiti.

Osso duro de roer, já se vê, em qualquer campo de luta, militar ou política. Ainda assim, futucado com vara curta pelo incomodado aliado do DEM que, talvez cansado de apanhar e receber desaforos da família Bolsonaro, partiu para cima do general, a título de opor-se ao suposto desdém do ministro do CGI , em face das bravatas de Eduardo Bolsonaro na entrevista a Leda Nagle, no tocante ao malsinado AI-5 de amarga memória. Ferida autoritária grave, que segue em carne viva, apesar do tempo e da “anistia ampla, geral e irrestrita”. E parecemos retornar ao ambiente em que o monstro surgiu no ano que não terminou: as bravatas, os estapeamentos, as provocações, os envenenamentos retóricos de parte a parte, como no tempo do AI-5, o original.

No dia 4, o presidente da Câmara amanheceu em Pernambuco, e de lá apontou o bacamarte para o general em Brasília: 
É uma cabeça ideológica. Infelizmente o general Heleno, o ministro Heleno virou um auxiliar do radicalismo do Olavo (de Carvalho). Uma pena que um general da qualidade dele tenha caminhado nesta linha”. Ponto.
Agora, uns jogam panos quentes para abafar o fogo, outros jogam mais gasolina para aumentar o incêndio. Resultado? Responda quem souber.

Vitor Hugo Soares é jornalista, e editor do site blog Bahia em Pauta. E-mail: vitors.h@uol.com.br

 Blog do Noblat - Ricardo Noblat, Jornalista - VEJA

 

terça-feira, 25 de junho de 2019

Não está no mundo

Caso Moro beneficia Bolsonaro 

O general Villas Bôas, ex-comandante do Exército, voltou ao Twitter para fazer defesa enfática de Sergio Moro,  como tinha feito anteriormente, antes do julgamento pelo pleno do STF de um habeas corpus para Lula.

O argumento para o adiamento do julgamento na Segunda Turma do STF do habeas corpus a favor do ex-presidente Lula, baseado na suspeição do então juiz Sergio Moro, não parece plausível. A alegação de que não haveria tempo para o julgamento, pois o processo de Lula estava em último numa fila de mais dez processos, não corresponde ao cotidiano das turmas do Supremo, que analisam às vezes até 30 processos num dia. [muito provavelmente essa celeridade - uma média de 15 minutos para cada processo, isto considerando que os ministros julguem durante 7h30m - é a causa de tantas decisões do Supremo serem reformadas no dia seguinte.]

O fato é que ministros estão incomodados com a ilegalidade das novas provas, diálogos publicados pelo site Intercept Brasil entre Moro e o chefe dos procuradores de Curitiba, Deltan Dallagnol. A questão é tão difícil que nem mesmo a defesa de Lula apensou os diálogos ao pedido anterior, havendo uma interpretação de que provas ilegais podem ser usadas para beneficiar o réu. É possível que, quando retomarem o julgamento, no segundo semestre, algum ministro proponha à Segunda Turma levar o caso para o plenário do STF. O ministro Fachin, como relator, pode decidir monocraticamente, mesmo já tendo votado. [além da incontestável ilegalidade das novas 'provas' - obtidas mediante a prática de crime - há também a questão da autenticidade que não foi comprovada.]

Várias vezes o STF, e também o Superior Tribunal de Justiça (STJ), negaram pedido semelhante, embora por motivos diferentes. Desta vez, a alegação da defesa de Lula é que, ao aceitar ser ministro de Bolsonaro, Moro havia demonstrado sua parcialidade. Os diálogos não estão nos autos. E o que não está nos autos, não está no mundo, como diz um provérbio jurídico com origem no Direito romano.
Antes das revelações do Intercept Brasil, o ministro Edson Fachin considerou que a defesa deveria ter apresentado o pedido ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), ressaltando que o Supremo já havia negado o habeas corpus em outras ocasiões.

A ministra Cármen Lúcia, que hoje preside a Segunda Turma, afirmou que o fato de Moro ter aceitado o convite para o novo governo não pode ser considerado, por si só, prova suficiente de sua parcialidade. O julgamento está cercado de fatores políticos, à revelia dos ministros do STF, que o tornam mais delicado do que normalmente já é, por tratar-se de um ex-presidente da República. [antes de tudo um ladrão, mesmo sendo ex-presidente; como bem lembrou o ministro Barroso, o fato é que houve corrupção.] Embora o ministro Sergio Moro tenha sido atingido pelas suspeitas lançadas pelos supostos diálogos, mesmo que não tenham comprovação de veracidade, a Operação Lava-Jato não perdeu o apoio popular, e Moro é o ministro mais popular do governo.

O presidente Bolsonaro desde o início bancou o apoio a seu ministro, visto como um Super-Homem pelas ruas. Esse é um trunfo político que Moro tem, no momento em que a definição do caso parece ser mais política do que jurídica. Bolsonaro, por sua vez, só tem a ganhar com o apoio à Lava-Jato. Montou-se novamente na sociedade o clima de combate à corrupção contra o petismo. Nesse contexto, a libertação do ex-presidente pode ser interpretada pela maioria da população como leniência com a corrupção.

O general Villas Bôas, ex-comandante do Exército, que indicou dois generais para assessorar o presidente do STF, Dias Toffoli, voltou ao Twitter para fazer defesa enfática de Sergio Moro assim que os primeiros diálogos foram publicados. Como tinha feito anteriormente, antes do julgamento pelo pleno do STF de um habeas corpus para Lula.Momento preocupante o que estamos vivendo, porque dá margem a que a insensatez e o oportunismo tentem esvaziar a Operação Lava-Jato, que é a esperança para que a dinâmica das relações institucionais em nosso país venha a transcorrer no ambiente marcado pela ética e pelo respeito ao interesse público. 
Expresso o respeito e a confiança no ministro Sergio Moro.”

Dias depois, o general Augusto Heleno, chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), deu uma declaração pública contra Lula em um café da manhã que Bolsonaro ofereceu a jornalistas no Palácio do Planalto. Com direito a soco na mesa e à afirmação de que Lula merecia pegar prisão perpétua, pena que não existe no Brasil. [aqui cabe um pequeno comentário: a turma que elaborou a Constituição de 88 - a dos direitos sem a contrapartida dos deveres - foi mais cuidadosa em favorecer a vida dos bandidos, visto que não proíbe prisão perpétua, e sim pena de caráter perpétuo, isto faz com que até uma pena de 30 anos aplicada a um réu que tenha 70 anos, pode ser anulada visto que tem caráter perpétuo, considerando as poucas possibilidade do individuo sair vivo da cadeia.] Toffoli nomeou seu assessor o general Fernando Azevedo e Silva, que depois foi chamado por Bolsonaro para ser ministro da Defesa. Na posse, agradeceu ao presidente do Supremo e à procuradora-geral da República, Raquel Dodge, “a disposição de atuar como catalisadores da estabilidade institucional de que o país tanto precisa”.

O substituto no STF é o general Ajax Porto Pinheiro, um dos ex-comandantes das tropas da missão de paz da Organização das Nações Unidas no Haiti, como tantos outros militares que atuam no governo Bolsonaro. É essa “estabilidade institucional” que está em jogo no julgamento do Supremo.