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sábado, 10 de dezembro de 2022

O General Villas Bôas estreia como colunista de Oeste

O ex-comandante do Exército analisa o Brasil com e sem a Amazônia

Antigo comandante do Exército Brasileiro, o General Eduardo Dias da Costa Villas Bôas estreia nesta semana como o mais novo colunista de Oeste. Conhecido estudioso da cultura e da geopolítica da Amazônia, especializou-se nos assuntos da região que conheceu a fundo como comandante do 1º Batalhão de Infantaria de Selva, chefe do Estado-Maior e comandante militar da Amazônia. 
Diagnosticado em 2016 com esclerose lateral amiotrófica (ELA), permaneceu no comando do Exército, com apoio total da tropa, até passar para a reserva, em 2019. 
É fundador do Instituto General Villas Bôas, cujos pilares incluem a preocupação com grandes temas brasileiros, a soberania e o desenvolvimento nacionais e a qualidade de vida dos portadores de deficiência e doenças raras

Revista Oeste - SAIBA MAIS

quinta-feira, 3 de novembro de 2022

A carta do general Villas Bôas sobre a vitória de Lula

Militar falou em 'destruição do civismo' e 'ridicularização do patriotismo' 

 O então comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, durante audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, do Senado - 22/06/2017 | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

 O então comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, durante audiência pública na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, do Senado -  Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil)

O general Villas Bôas, ex-comandante do Exército brasileiro, publicou nas redes sociais uma carta com suas expectativas sobre a vitória do presidente eleito Lula. O documento foi divulgado um dia antes do resultado da eleição. No texto, “o que podemos esperar de um governo da oposição”, o militar fala em “destruição do civismo, ridicularizarão do patriotismo e dos símbolos nacionais, desrespeito à Constituição e apoio a ditaduras”. Villas Bôas disse ainda que Lula será responsável pelo desemprego e pela destruição do país.

Em outro trecho, o general afirma que o ensino será contaminado ideologicamente pela esquerda, “impondo a aceitação de verdadeiras perversões às crianças”.


Carta do general Villas Bôas

“Desmontagem das estruturas produtivas que tão arduamente foram recuperadas, criando uma base capaz de sustentar-se sem depender de governos; A volta do aumento do desemprego, compensado por programas sociais demagógicos. A submissão ao globalíssimo com a consequente perda da identidade nacional.

A destruição do civismo; a ridicularizarão do patriotismo e dos símbolos nacionais; A contaminação ideológica do ensino, impondo a aceitação de verdadeiras perversões às crianças; O retorno do estelionato nacional que os jovens dar-se ao enfrentar o mercado de trabalho; A perda do valor da palavra e da vida; A substituição da verdade pelas narrativas; A perda de pruridos pelo uso da mentira; A disfunção das instituições; O desrespeito à Constituição; A relativização da soberania da Amazônia; A natureza acima das pessoas; Dos índios como ferramentas de Ongs e Organismos Internacionais; A política externa orientada por simpatias ideológicas; Apoio a ditaduras; O desaparecimento do culto e à honra, à Patria e a liberdade; A desesperança das pessoas que vestem verde — amarelo.”

 Cristyan Costa - Redação - Revista Oeste

 

segunda-feira, 26 de julho de 2021

Meia-volta, volta e meia, os militares no Brasil - Fernando Gabeira

In Blog

Civis que ocuparam o cargo de ministro da Defesa garantem que as Forças Armadas não embarcam numa aventura golpista. Eles sabem mais do que eu. No entanto tenho algumas dúvidas. 

Não são dúvidas turbinadas pelo preconceito ou pelo ressentimento. Como jornalista, sempre destaquei ações positivas dos militares; no Congresso, mantive as melhores relações com assessores parlamentares das Forças Armadas, entre eles o general Villas Bôas. Os fatos abalam qualquer certeza. Desde a não punição do general Pazuello até as recentes notícias sobre ameaças do ministro da Defesa, o curso dos acontecimentos nos leva à desconfiança. É difícil imaginar como uma sucessão de pequenas atitudes autoritárias pode conduzir a uma firme decisão democrática, no dia D e na hora H, como diz Pazuello.
[Nenhum dos civis que ocuparam o cargo de ministro da Defesa, possuem credenciais para opinar sobre ações que se e quando pensadas não se destacam pela publicidade. 
Aliás, o currículo dos ex-ministro da Defesa não os credencia para dissertar sobre o tema = os cinco primeiros e do sexto ao décimo, nem eles nem os presidentes que os nomearam sabem as razões e motivação da nomeação;
o sexto quem o nomeou não possui credencial que justifique a nomeação de uma fusão de jurista, político, para ocupar um cargo que no seu entendimento leigo no assunto, era tão militar, que autorizava ao titular da pasta o uso de uniforme de General de Exército; 
O décimo primeiro, oficial general, foi nomeado por Temer, corrigindo o erro que cometeu ao manter Jungmann; 
O décimo terceiro foi uma nomeação adequada e oportuna do presidente Bolsonaro e o atual outra  de excelente nomeação do capitão.]

Outro dia, um general ficou bravo comigo porque critiquei Pazuello por sua audácia ao assumir um cargo para o qual não tinha a mínima competência. Mencionei sua obediência cega a Bolsonaro, e o general entendeu minha crítica como uma tentativa de minar o conceito de disciplina dos militares. E disse que era capaz de matar ou morrer pela pátria. Na verdade, peço muito menos que matar ou morrer: simplesmente pensar. Bolsonaro não merece uma obediência cega. Ninguém merece. O que está em jogo é uma noção de dignidade dos militares, discussão importante, pois, do seu prestígio, depende parcialmente a consistência da defesa nacional. [o ilustre jornalista, possui um passado, ainda que distante, não muito favorável à democracia = integrou o MR-8, movimento terrorista, que tentou combater o Governo Militar - nem ele, nem o movimento foram exitosos. O ilustre Gabeira sofreu graves ferimentos durante uma fuga, foi preso, foi banido do Brasil em função de uma troca dele e mais 39  pela embaixador alemão covardemente sequestrado; participou do sequestro do embaixador americano e como consequência foi proibido até 2009 de ingressar em território dos Estados Unidos; apesar de ser apresentado como elemento operacional do grupo terrorista, ele não participou das ações  de maior risco. Voltou ao Brasil em 1979 e com a Anistia voltou à condição de brasileiro. Essa longa memória sobre Fernando Gabeira é mais como consequência de em vários de seus escritos deixar, ainda que de forma sutil, sua propensão a incitar uma reação belicosa contra o governo Bolsonaro. Como sempre, a qualidade literária do que produz é excelente e não será este humilde escriba que ousar apresentar reparos à mesma.]

O perigoso esporte de humilhar generais, título do artigo que provocou a ira dos generais, continua a ser praticado. O general Ramos soube de sua saída da chefia da Casa Civil pela imprensa e confessou que se sentiu atropelado por um trem. O general Mourão é enviado numa missão a Angola para defender, em nome do Brasil, a política da Igreja Universal do Reino de Deus. Isso não é política de Estado, e a tarefa não deveria ser aceita por um general. [até que uma interpretação com viés crítico ao presidente Bolsonaro pode deixar a impressão de que um oficial general está sendo 'humilhado' ao receber certas missões; no caso do general Ramos entendemos que não ocorreu humilhação e sim uma troca de função; o general Mourão é o vice-presidente da República e tem o direito de recusar qualquer encargo que lhe seja atribuído pelo presidente da República, por não existir subordinação do vice-presidente ao presidente.]

Tenho muita tranquilidade em discutir o conceito de obediência na política. Não acho que seja uma extensão do conceito de disciplina militar. Nisso, sempre discordarei dos generais da direita, assim como discordei dos generais da esquerda nos longos debates sobre o chamado centralismo democrático. O melhor instrumento que a sociedade tem para tratar da questão militar que aparece volta e meia é precisamente determinar uma meia-volta: aprovar o projeto que impede militares da ativa de ocupar cargos civis no governo. Votar logo essa proposta de voto impresso, decidir democraticamente se o teremos ou não. [parabéns ao articulista poder defender que a proposta seja votada pelo Congresso Nacional - a quem cabe discutir, analisar e votar as leis. Discutir a conveniência das leis, criar ou revogar leis = legislar = é competência exclusiva do Poder Legislativo.]

Isso não basta. Concordo com o ex-ministro da Defesa Raul Jungmann: o Congresso é omisso ao não discutir os grandes temas da defesa nacional. A omissão dos parlamentares passa aos militares uma sensação de irresponsabilidade ou mesmo de ignorância em relação à dimensão do tema. Impede que a variável ambiental tenha a importância estratégica que merece, atrasa uma solução negociada para o futuro da Amazônia.

A fragilidade da representação política contribui também para que os militares tenham uma visão resignada do Congresso. Nos Anos de Chumbo, seus aliados eram da Arena, partido dos coronéis nordestinos; na eleição indireta à Presidência, o candidato dos militares era Paulo Maluf. Não me espanta que o governo atual tenha se transformado numa associação entre militares e o Centrão. A escolha ideológica sempre foi mais importante que uma sempre anunciada recusa à corrupção.

Durante a Guerra Fria, a ideia de se unir com qualquer um para evitar o comunismo tinha um poder maior de atração. De lá para cá, a sociedade brasileira evoluiu, o comunismo fracassou, apesar da sobrevivência autoritária do PC chinês. Resistir aos impulsos autoritários de Bolsonaro dará à sociedade brasileira mais força contra qualquer nova ameaça aos fundamentos da democracia. O argumento ganha um peso maior se for aceito pelos militares. Ele é a base real da conciliação.

Artigo publicado no jornal O Globo em 26/07/2021

 Blog do Gabeira - Fernando Gabeira, jornalista


sexta-feira, 12 de março de 2021

A ameaça do estado de sítio - O Globo

Ouvir a expressão “estado de sítio” da boca de Jair Bolsonaro causa calafrios. Como o presidente parece gostar de causar repulsa nos brasileiros, ele vira e mexe vem com essa de estado de sítio, sempre lembrando, como fez nesta quinta-feira, que é sua prerrogativa decretá-lo. Bolsonaro não fala disso à toa. A nova menção despropositada à medida extrema veio totalmente fora de contexto, como sempre. O presidente a comparou às restrições adotadas pelos governadores para conter o avanço da mortandade desenfreada da pandemia.

Ele pode ter sido expulso cedo do Exército [fake news = crime]  e não ser muito versado na Constituição, mas sabe muito bem que essas medidas não guardam qualquer semelhança com estado de sítio. Ao jogar a expressão ao léu e ainda mencionar o artigo 141 [137] da Constituição, que seus seguidores adoram evocar para pregar intervenção militar, distorcendo seu sentido, o presidente lança uma isca para esses fanáticos na linha “quem manda sou eu”, “eu que tenho a caneta Bic”, o tipo de bravata que adora fazer quando está acuado.

E motivos não faltam para que o capitão esteja acuado. Ele está a cada dia ficando mais encurralado por sua própria obra criminosa no curso de um ano de pandemia.  A redução diária no chute travestido de previsão, feito pelo general Pazuello, para a quantidade de doses de vacinas que estará disponível neste mês de março de carnificina nacional, a insistência do STF em cobrar, de forma cada vez mais dura, que o governo federal aja na compra desses imunizantes [cara articulista: repetindo o que a Senhora sabe desde sempre, o STF não tem sido  atendido pelo governo Bolsonaro em suas determinações no tocante à compra de vacinas, por um motivo  do conhecimento de todos: indisponibilidade dos imunizantes
Mas caso seja do conhecimento da senhora ou de   algum integrante da mídia militante de algum ponto do nosso planeta em que haja vacina contra a covid-19 disponível para fornecer algumas dezenas de milhões de doses é só informar ao MS e os pedidos do STF e de todo o Brasil serão imediatamente atendidos.] e no apoio aos estados para enfrentar o colapso iminente do sistema de saúde e a pressão pela CPI da Covid-19, que envolve diversos partidos, movimentos de direita antes condescendentes com o bolsonarismo, como o Vem pra Rua, e que já desaguou no mesmo Supremo, fazem o sinal de alerta de Bolsonaro pulsar.

Mas o que o atormenta de verdade, e isso está cada vez mais claro, é a volta de Lula ao cenário eleitoral. E aqui é que reside a gravidade da cartada de falar em estado de sítio neste momento. Num governo coalhado de militares, diante da indisposição da cúpula sobretudo do Exército com Lula e o PT, expressada em diversas ocasiões, como no tuíte do general Villas Bôas advertindo o STF em 2018, esse tipo de exortação irresponsável pode resultar numa movimentação da caserna em reação à anulação das condenações do petista.[senhora:  o mundo jurídico está indignado com a anulação das condenações do petista, o STF está sendo acionado e não se furtará a adotar as medidas para rever a decisão monocrática. É um assunto jurídico e será tratado no mundo jurídico.]

Na mesma fala, Bolsonaro ainda incitou seus malucos, da forma como sempre faz, falando como que a título de preocupação, a promover quebra-quebras e saques. O bolsonarismo sempre funciona assim: o “mito” lança a ideia e sempre há malucos para executarem. Foi assim nos atos antidemocráticos e também quando ele, numa live, mandou as pessoas invadirem hospitais de campanha para filmar. Parecia da boca para fora, mas sempre há pessoas dispostas a difundir e executar esse tipo de comando golpista que parte do presidente da República.

Os tais quebra-quebras e saques seriam o pretexto que ele quer para falar de estado de sítio de forma menos “teórica”? Ao falar em greve, o presidente também dá uma senha aos caminhoneiros, que têm sido adulados por ele justamente pelo poder que têm de tornar a população refém de seus motins. Bolsonaro tem de ser levado a sério em seus arroubos, porque sua tendência autoritária não é apenas retórica, ela se manifesta em atos e decisões de governo, e os exemplos são inúmeros.

[Senhora, sua matéria prima pelo desrespeito aos que apoiam o capitão Bolsonaro, presidente da República Federativa do Brasil e com grande chance de ser reeleito em 2022. Essa perspectiva, somada ao ódio expresso  ao presidente e seus apoiadores,  eleitores, não é saudável à saúde. 
O rancor, a frustração, o pavor de perder mais uma vez  são fatores estressantes
Outro absurdo é que a menção do nosso presidente ao 'estado de sítio', uma metáfora em relação ao toque de recolher meia boca implantado por alguns sem noção. 
O dificil  de entender é  considerar a  menção ao estado de sítio, um instrumento previsto na constituição, inclusive para coibir desordens que possam colocar em risco à preservação da democracia,  um tipo de comportamento que exige, no seu rancoroso entendimento, uma "reprimenda imediata, inequívoca e dura por parte dos ministros do STF". 
Não conseguimos entender como pode a repressão rigorosa, ao "crime" de menção a uma possível utilização de um recurso previsto na Lei Maior, possa ser um ato de preservação da democracia???]

Com espaços importantes do Congresso dominados por fanáticos bolsonaristas, como as comissões, esse tipo de menção a desordem e estado de sítio tem de receber reprimenda imediata, inequívoca e dura por parte dos ministros do STF, da OAB e de todos os que têm compromisso com a preservação da democracia.

 

Vera Magalhães, jornalista - O Globo

 

terça-feira, 9 de março de 2021

Fachin pega atalho, bagunça o coreto - Lula desvia o foco na pior hora - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Fachin bagunçou o coreto eleitoral, bem na hora mais dramática; Lula e Bolsonaro agradecem penhoradamente

Tudo já caminhava para a anulação das condenações e o resgate da elegibilidade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para 2022, mas o ministro Edson Fachin arranjou um atalho e chegou direto lá. E justamente no dia em que o presidente Jair Bolsonaro reclamou, enigmático, que “alguns estão se excedendo”. Ganha Lula,[???; sua lenga-lenga não convence a mais ninguém, além do que ele não foi inocentado, apenas será submetido a novo julgamento] de volta ao palanque, ganha Bolsonaro, com o pretexto e o desvio do foco na pandemia, e ganha, enfim, a polarização que tantos prejuízos causa ao País. [perdem: os inimigos do Brasil, os inimigos do presidente, os arautos do pessimismo - as poucas chances que ainda restam de atrapalhar o governo Bolsonaro sofrem mais redução, e terão que optar entre um criminoso condenado e um presidente que insistem em não deixar governar.]

“Eu quero paz, tranquilidade, democracia, respeito às instituições, mas... alguns estão se excedendo”, disse Bolsonaro depois de falar no “meu Exército” e horas antes da decisão monocrática de Fachin. Referia-se a outras questões, como lockdown e toque de recolher na pandemia, e a ameaça velada era a outros atores, como governadores e prefeitos. Mas a decisão de Fachin pode servir de pretexto... 

Indiretamente, isso remete à “advertência” do então comandante do Exército, generaEduardo Villas Bôas, na véspera de uma decisão do mesmo Supremo sobre a prisão do mesmo Lula. Mas com uma diferença: em 2018, Lula era forte e o objetivo era tirá-lo do páreo para a Presidência; para 2022, o Planalto considera Lula o melhor adversário para Bolsonaro. [sempre destacando que quase 30 meses após o alerta do general Villas Bôas, é que o ministro Fachin que na época silenciou, partiu  para críticas, gerando provocações e atiçando o 'deputado Daniel Silveira'. Só não se instalou uma crise entre a Câmara dos Deputados e o Supremo, devido aquela Casa Legislativa ter optado por abrir mãos de sua competência constitucional - imagine se os deputados revogam a prisão do parlamentar.]

Logo, se o Comando do Exército liberou seu comandante e sua conta no Twitter para tentar impedir a soltura e a candidatura de Lula há três anos, hoje, ao contrário, há uma dissimulada comemoração no governo do capitão e dos generais. “O melhor oponente do presidente é o Lula! Sem estresse”, reagiu uma das chamadas “altas fontes” do governo ontem. O processo em curso no Supremo começou com a liberação, para a defesa de Lula, dos diálogos dos procuradores da Lava Jato de Curitiba com o então juiz Sérgio Moro. Foi o start para, depois, declarar a suspeição de Moro e anular as condenações de Lula – primeiro pelo triplex do Guarujá, pelo qual ele foi preso, e depois pelo sítio de Atibaia, pelo qual foi condenado em duas instâncias. O gran finale seria a elegibilidade para 2022. [as condenações foram anuladas, os crimes existiram e as provas continuam válidas. O acusado será julgado e condenado por outro magistrado = mais uma sentença a corroborar as anuladas. Lembrando sempre que uma das duas condenações foi proferida por Moro e a outra pela juíza Gabriela Hardt - sendo que a primeira foi corroborada por todas as instâncias, faltando apenas o Vaticano.]

O preço, porém, sairia caríssimo: a anulação em cascata das condenações e prisões dos demais implicados e até dos R$ 4 bilhões devolvidos por corruptos de diversas estirpes aos cofres públicos. Fachin facilitou as coisas, logo ele que une duas personas aparentemente inconciliáveis: uma tem vínculo de alma com o ex-presidente Lula, outra tem sido voto certo pró-Lava Jato. Assim, sua decisão beneficia Lula, mas tenta preservar a Lava Jato. 

Após anos, Fachin decidiu que, como os processos de Lula não envolviam só a Petrobrás e não tinham a ver com Lava Jato, não eram de competência da 13.ª Vara de Curitiba e, sim, da Justiça Federal no DF. Pronto. Tudo que se refere a Lula volta à estaca zero, mas o STF não precisa, por “perda de objeto”, decretar a suspeição de Moro – que seria a morte da Lava Jato. A dúvida é se Gilmar Mendes vai deixar por isso mesmo. 

Para além das formalidades e atalhos jurídicos – que ainda têm muito chão, já que a decisão de Fachin foi monocrática –, o efeito mais explosivo é político. Com Lula, a eleição de 2022 é uma. Sem ele, é outra. Se Bolsonaro é absurdo e perigoso na pandemia e em tudo, ainda conta com firmes seguidores e com a alta rejeição a Lula para repetir 2018: ruim comigo, pior com ele! Ontem, teve duas vitórias: a pandemia em segundo plano e as Bolsas em queda por ojeriza a Lula. [a pandemia continua presente, está sendo combatida e será vencida. Se o agora condenado é rejeitado pela maioria dos brasileiros  e as Bolsas, sabiamente, o rejeitam - por ser ele a pior opção para o Brasil - a culpa não é do presidente Bolsonaro.]

Resta saber, agora, se o PT e as esquerdas vão finalmente cobrir o inacreditável vácuo de oposição e se o tal centro, tão difuso, desconjuntado, tem como cavar algum espaço entre Lula e Bolsonaro. Fachin bagunçou o coreto eleitoral, bem na hora mais dramática da pandemia e do próprio Bolsonaro. Lula e Bolsonaro agradecem penhoradamente. 

Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo

 

 

domingo, 21 de fevereiro de 2021

Daniel Silveira errou o tiro - Elio Gaspari

Folha de S. Paulo - O Globo
 
Deputado, que se dizia “cagando e andando” para as opiniões do STF, pensou em criar uma crise institucional; deu errado, fosse qual fosse a intenção 

Fosse qual fosse a intenção do deputado no vídeo, deu errado

Deputado, que se dizia “cagando e andando” para as opiniões do STF, pensou em criar uma crise institucional; deu errado, fosse qual fosse a intenção. [em nossa opinião quem buscou criar uma crise institucional foi o ministro Fachin ao comentar uma ocorrência de 2018 - na ocasião optou pelo silêncio coletivo. Daniel Silveira apenas pegou o embalo. Faltou ao parlamentar a tranquilidade e a competência na arte da ironia do general Villas Bôas:“Três anos depois”.  ]   Daniel Silveira é um ex-PM do Rio. Em seis anos na corporação, pagou 26 dias de prisão, com 14 repreensões. Antes de entrar para a polícia, ele se valia de falsos atestados médicos fraudados por um faxineiro para faltar ao serviço. Preso na semana passada, manteve dois celulares na sala da Polícia Federal onde ficou, por decisão do ministro Alexandre de Moraes. 
 
[Citado por Silvio Navarro - Revista  Oeste

 O Parlamento terá de agir ao arbítrio e apontar à Suprema Corte o caminho do devido processo e do respeito à Constituição. Hoje é com um deputado de que talvez você não goste, mas amanhã pode ser contra um de que você gosta”, disse Marcel van Hatten (Novo-RS).

Os deputados são escolhidos pelo voto para o Parlamento justamente para parlar (falar, do latim parolare) o que pensam seus eleitores — goste-se do que digam ou não. É fato que das oratórias da tribuna pouco se aproveita hoje em dia, algo piorado com a extensão dela nas redes sociais. Mas isso não significa que eventuais excessos ou bobagens ditas sejam piores do que guardar dinheiro surrupiado na cueca (como fez o senador Chico Rodrigues) ou mandar matar o marido (como é o caso da deputada Flordelis). Ambos estão soltos e com o mandato à disposição. Daniel Silveira foi preso “em flagrante”.]

Esse personagem, que dias antes se dizia “cagando e andando” para as opiniões de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), pensou em criar uma crise institucional no Brasil. Ele foi o estuário de uma visão nascida em 2018, quando o deputado Eduardo Bolsonaro disse que “basta um cabo e um soldado para fechar o Supremo Tribunal”. Não bastam.
 
[O nosso entendimento nos motiva a discordância com  o regozijo de grande parte da mídia com o insucesso do deputado Daniel Silveira. 
Entendemos que deveriam se assustar, jamais comemorar.
Esquecem que de omissão em omissão, de aplausos em aplausos é a nossa liberdade de expressão que está em risco. 
Concordamos  que o deputado foi extremamente agressivo, desrespeitoso,  ao expressar sua resposta ao comentário do ministro Fachin. 
Usou palavras inadequadas, talvez por supor que o 'quaisquer' do 'caput' do artigo 53 da Constituição Federal tinha o significado amplo que 'quaisquer' costuma ter. Ainda assim, entendemos que a análise do possível delito, ou delitos, é de competência do Conselho de Ética da Câmara.
 
O que fundamenta o nosso modesto entendimento que  os acontecimentos recentes deveriam assustar? Nunca ser motivo de regozijo.
Aos poucos, de forma sutil, até interceptível aos mais distraídos, a nossa liberdade vai acabando - grande parte das vezes por decisões do Supremo Tribunal Federal, especialmente monocráticas de alguns dos seus ministros.
 
 Adiante, citaremos exemplos que motivam cabíveis receios...] 
 
Ao seu estilo, Daniel Silveira usou a repercussão do depoimento do general da reserva Eduardo Villas Bôas para atacar, em nome de sua agenda pessoal, os ministros Edson Fachin, Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes. Os inquéritos sobre mobilizações antidemocráticas propagando mentiras estão na mesa de Moraes. Fosse qual fosse a intenção de Silveira, deu errado.

Na última terça-feira, quando os ataques do deputado chegaram ao conhecimento de ministros do Supremo, vários deles discutiram o caso com Moraes. À noite, ele mandou prendê-lo. Silveira sustenta que o flagrante citado por Moraes não se sustenta. [“flagrante perenemente possível”] O que não se sustenta é sua jurisprudência. Enquanto uma mensagem está postada pelo autor, o delito está em curso. (Depois que Silveira foi em cana, o vídeo foi apagado.) [por determinação do ministro Moraes.]

Pelo andar da carruagem, ainda nesta semana o doutor poderá passar para um regime de tornozeleira, com limitações cautelares. A partir daí, tudo dependerá do seu comportamento. A julgar pela sua conduta respeitosa durante a audiência de custódia de quinta-feira, o que foi combinado ficará de pé. Caso Silveira tenha uma recaída, saindo por aí “cagando e andando” por onde bem entende, cairá de novo na jurisdição de Alexandre de Moraes.

[Alguns exemplos, últimos doze meses e que assustam por ser um processo crescente:
a - final de 2020 um ministro do STF determinou que oficiais-  generais, quatro estrelas, intimados a depor como testemunhas, fossem  conduzidos, se necessário, 'debaixo de vara';  
Felizmente, os generais compareceram ou não ocorreu a audiência, a PF teve o bom senso de não entender necessário à condução na forma autorizada e tudo deu certo.
 
c - de  outra feita, o depoimento do presidente Bolsonaro, na condição de INVESTIGADO, foi exigido em um processo e, nos parece que   o mesmo ministro do STF,  determinou seu  comparecimento à Polícia Federal para depor - cassou as prerrogativas do Presidente da República escolher dia, hora e local, perguntas por escrito,etc . Tudo por entender que o Presidente da República era INVESTIGADO.
Felizmente tudo se ajustou da melhor maneira, achamos que o depoimento ainda não ocorrer.
Dando asas à imaginação, vamos supor que o delegado da PF, expedisse uma intimação ao presidente da República na forma autorizada pelo ministro e no dia, hora e local aprazado, Bolsonaro não comparecesse em função de compromissos inerentes a sua condição de exercer o cargo mais importante do Brasil e o delegado determinasse a condição coercitiva do faltoso.
Óbvio que a PF teria seu acesso ao local de trabalho do 'revel' - Palácio do Planalto, área de segurança e sob a guarda do Exército Brasileiro - e reportasse ao ministro o incidente e este determinasse, no limite,  a prisão da autoridade responsável por 'obstrução de justiça'.  
Situação constrangedora a Polícia Federal adentrando a QRG  - Quadra Residencial de Generais, em pleno SMU - Setor Militar Urbano, para prender o comandante do Exército Brasileiro.
 
Não estamos exagerando.  As situações "a"e "b", expostas,  felizmente não ocorreram.
 
Mas, a prisão do deputado, com base em situação jurídica, “flagrante perenemente possível”, até então inexistente, fundamenta cogitar possível agravamento.
E o Supremo sempre  cultuando, impondo o absolutismo. 
Os exemplos 'a' e 'b' decisões monocráticas e que se esvaíram, tornando desnecessária manifestação do plenário do STF.
O caso do deputado Daniel Silveira, também decisão monocrática, se concretizou e o plenário ratificou em 40 minutos. 
 
A quem recorrer?
 
A propósito: o Brasil tem dois notórios criminosos - um deles multicondenado, sentença ratificada em todas as instâncias, ex-presidente da República e o outro,  Zé Dirceu, condenado a mais de 20 anos - em liberdade, por decisão do Supremo.
 
A quem recorrer?]
 
Villas Bôas também esperou três anos
O general da reserva Eduardo Villas Bôas ironizou o arroubo do ministro Edson Fachin, que considerou “gravíssima” sua revelação dos bastidores da preparação do famoso tuíte de 2018. Nele, o então comandante do Exército prensou o Supremo Tribunal Federal na véspera do julgamento de um habeas corpus impetrado em favor de Lula.
Villas Bôas foi breve: “Três anos depois”.
 
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Folha de S. Paulo - Jornal O Globo - MATÉRIA COMPLETA - Elio Gaspari, jornalista


quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

STF mira defensor radical do governo - Míriam Leitão

O Globo

A força dos eventos em torno da prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ) vai muito além do personagem. O Supremo consagrou duas teses. Primeiro, que a imunidade parlamentar não cobre ataques e ameaças à democracia. Segundo, que a internet alarga o conceito de prisão em flagrante porque nela se pratica crime continuado. [Exceto que prisão em flagrante dispensa mandado de prisão e que o mandado de prisão elimina o flagrante.]  O que era no começo do dia uma decisão do ministro Alexandre de Moraes virou de todo o STF após a aprovação por unanimidade. A cúpula da Câmara tentava encontrar formas de amenizar a punição.

Daniel Silveira é reincidente. É investigado no inquérito das fake news e das manifestações antidemocráticas. [a condição de investigado não caracteriza a reincidência =  essa só se verifica com o cometimento de novo crime, após o trânsito em julgado de sentença condenatória pro crime anterior. Temos a reincidência genérica e a específica = artigo 64 do Código Penal.]  É um defensor da violência como arma política. Em um dos seus vídeos mais conhecidos, ele ameaça de morte manifestantes antifascistas. Mais importante, ele é um bolsonarista raiz, da ala radical. Ao atacar o Supremo ele estava tentando escalar a crise iniciada pela declaração do general Villas Bôas de que o Alto Comando do Exército participou da redação da postagem que fez em 2018 ameaçando o STF. [com o devido respeito ao  excelente colunista, lembramos que o assunto tinha sido sepultado há quase três anos -  com o silêncio coletivo do STF. O ministro Fachin - que estava entre os ministros que silenciaram - é que decidiu após o transcurso de 34 meses, expressar  indignação, o que gerou tumulto no quadro político.] Semana passada,  in dos integrantes do Alto Comando da época são ministros de Bolsonaro, e o então ministro da Defesa é diretor-geral de Itaipu. Era nessa crise que Daniel Silveira tentava surfar.

Ex-policial militar, defensor da disseminação das armas, propagandista da ditadura e do AI-5, o deputado é fruto também do perigoso fenômeno da politização das polícias militares, uma das bases do atual presidente. O ex-ministro da Segurança Raul Jungmann explica melhor.— A hiperpolitização das polícias militares acontece pela permissão de que eles saiam, se candidatem e, se perderem a eleição, possam voltar e retomar o serviço ativo. Ganhando ou perdendo pode-se voltar. A possibilidade de ir e vir da política para a PM tem sido um estímulo a que indivíduos liderem rebeliões e motins para depois se candidatarem. A greve é proibida, mas eles entram em greve e depois são anistiados — diz Raul. [os EX sempre procuram espaço para opinar, sendo que quando não eram EX tiveram oportunidade de sanar muitos dos problemas sobre os quais opinam.]

E pior, não há um período de desincompatibilização. Ele pode sair da corporação direto para a campanha. E se não for eleito, volta direto. Nada a perder, portanto. Um estudo feito pela newsletter Fonte Segura, do Fórum Brasileiro da Segurança Pública e da Analítica Comunicação, mostra que isso não acontece em outros países. Bolsonaro estimulou ao máximo essa politização e continua cultivando as PMs como uma de suas bases. Em 2018, foram eleitos 77 militares ou policiais militares, 43 deles pelo PSL, partido ao qual o presidente era filiado.

Silveira, ao discutir no IML, para não usar máscara, disse que é um policial. Não é mais. Ficou apenas cinco anos, nove meses e dezessete dias. Não pode voltar, portanto, porque não completou 10 anos. No vídeo em que ameaçou manifestantes, ele também falou como se ainda fosse policial e lembrou que eles andavam armados e “em algum momento um de vocês vai achar o de vocês e tomar um no meio da testa e no meio do peito”. No vídeo que o levou à prisão o deputado fez ameaças físicas aos ministros do STF.

A decisão do STF, independentemente da reação da Câmara, esclarece princípios que o governo de Jair Bolsonaro tentou confundir. A liberdade de expressão não serve para encobrir crimes contra a democracia. Nem mesmo de um parlamentar. Bolsonaro quando era deputado fez apologia da ditadura e da tortura, falou em matar adversários políticos e nunca foi punido. Vejam o preço que o país paga pela leniência das instituições.

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Aproveitando o espaço - matéria da colunista Míriam Leitão 

Estados não podem comprar vacinas, diz Pazuello a governadores
Na reunião ontem do Ministério da Saúde alguns governadores falaram em comprar diretamente vacinas usando seus recursos e contatos, mas o ministro Eduardo Pazuello defendeu que toda vacina que entrar no país deve ir para o plano nacional de imunização. Não será permitido que os outros entes federados comprem vacinas. "Me avisem se souberem alguém que queira vender", ironizou o ministro aos governadores. [Pauzuello está certo. se o Plano Nacional de Imunização tem preferência legal sobre todos dos demais entes federados na compra de vacinas, cabe a TODOS - o que inclui governadores e prefeitos - obedecer. 
Assim, críticas ao ministro por cumprir a lei, não procedem.]


Divisor de águas? - William Waack

O Estado de S. Paulo

É tudo muito diferente daquela vez quando a Câmara proibiu que um deputado fosse processado pelo regime militar

A história que se repete para nós não é uma farsa, tragédia, nem sequer uma rima tem. Em 1968, o AI-5 foi decretado para punir uma Câmara dos Deputados que impedira que fosse processado um deputado que defendia liberdades cerceadas pelos militares no poder. A atual Câmara dos Deputados – depois de uma ditadura, uma redemocratização e uma Constituição – vai se ocupar da situação de um deputado que usa das liberdades reconquistadas por gerações de brasileiros para propor acabar com essas liberdades. 
 
Do ponto de vista do estado de direito e do funcionamento de suas instituições era mais fácil então identificar onde estava o “bem” e o “mal”. Não, não é a questão da “liberdade de expressão” consagrada na imunidade parlamentar: essa proteção não é absoluta nem existe para a prática de delitos penais e o incitamento do golpe e destruição da ordem democrática. O pano de fundo muito mais preocupante é o da legitimidade das instituições envolvidas. 
 
[um único comentário: preferimos empregar o termo INVIOLÁVEL do que imunidade - tanto pela fidelidade ao texto constitucional, também para evitar 'imunidade' que lembra  memória imunização, igual a vacina, etc, etc. 
Não pretendemos afazer apologia ao Ato Institucional nº 5 = AI 5, vamos nos limitar a fatos - citá-los ainda não é crime no Brasil.
Não vemos intenção de punir a Câmara dos Deputados no  episódio do deputado Márcio Moreira Alves, que foi apenas a gota d'água  que fez transbordar o cálice com todos os abuso da situação vigente: o Brasil enfrentava o terrorismo, a guerrilha, sequestros de aviões, de pessoas, atentados a bomba contra instalações militares, manifestações de rua, morte de estudantes. 
O ilustre articulista diz: "impedira que fosse processado um deputado que defendia liberdades cerceadas pelos militares." Na verdade o que o deputado Márcio buscava era indispor a população contra os militares, chegando ao ponto de propor as jovens casadoiras não dançarem com militares nas festas de formatura.
A Câmara dos Deputados exercendo sua autonomia negou o pedido para processar o parlamentar - o Governo Militar não foi logo prendendo o acusado solicitou a necessária permissão. Negada, a situação afunilou para ou endurece ou endurece - o Brasil caminhava para a Guerra Civil, deixar impune o deputado seria o fim da nossa Pátria = O pleonástico CAOS CAÓTICO, seria insuficiente para definir.
Nosso  entendimento é que no caso do deputado do PSL, Daniel Silveira, a Câmara dos Deputados vai analisar se ao veicular as lives e outros comentários o deputado estava amparado pela inviolabilidade do seu mandato, estatuída no artigo 53 da Constituição Federal?
Entendendo que o parlamentar não estava abrigado pela inviolabilidade expressa naquele artigo, cabe analisar:
a) se a prisão ocorreu em flagrante delito? (situação que a expedição do  mandado de prisão anula);
 b) o ato praticado pelo deputado é  crime inafiançável? 
A Câmara dos Deputados, com tal procedimento, estará exercendo uma COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL e sua decisão DEVE ser acatada, tanto pelo STF quanto pelo Deputado Daniel Silveira =  não há constrangimento em se curvar ao IMPÉRIO DA LEI.] conferindo ao parlamentar

Começa pelo STF. Uma parte relevante da “insegurança jurídica” que caracteriza as relações na sociedade brasileira se deve à atuação política desse órgão. E do entendimento, entre seus integrantes, de qual seria o melhor efeito político ao tomarem decisões que fizeram da Constituição (que cabe ao STF zelar) uma questão de interpretação dependendo das circunstâncias do momento. Com ministros dando rasteiras em ministros. 

Essa noção (a da instabilidade causada por canetadas de magistrados), mais a situação de caos social com a greve dos caminhoneiros, é o que estava na raiz do “pronunciamento” em 2018 do então comandante do Exército, general Villas Bôas. Na prática, o coletivo do STF aceitou o que dizia o oficial. [nada impedindo que qualquer um dos 'onze' manifestasse individualmente sua posição, ainda que discordante do coletivo.]
Naquele mesmo ano assumiu um novo presidente da Corte e, num entendimento peculiar com o próprio general, aceitou-se como um dos principais assessores do presidente do STF quem até ali fora o chefe de Estado-Maior do Exército (e hoje é o ministro da Defesa). Tudo em nome da pacificação e estabilização da atmosfera política. 

A franja aloprada do bolsonarismo, eleita com expressiva votação na onda disruptiva daquele ano, dedicou-se desde sempre a atacar qualquer instituição ou nome entendido como obstáculo ou adversário do “mito”, em boa parte incentivada por ele mesmo. Para efeitos práticos, foi acompanhada por alguns militares que, de fato, passaram a enxergar no STF um tolhimento inconstitucional dos poderes do chefe do Executivo. Até ele entender-se prazerosamente com o “Centrão”, esse velho conjunto de forças políticas em parte conduzido por gente notória por colidir com a ética, a moral e o Código Penal. 

Legislativo brasileiro, a quem cabe a relevante decisão política sobre o deputado aloprado bolsonarista, vem perdendo qualidade [fosse só o Legislativo a perder qualidade o remédio seria fácil = o recurso das eleições permitiria uma correção em no máximo dois anos.]  e sofre com extraordinária fragmentação. São resultados muito evidentes de décadas de desgaste do sistema político. No topo desse desgaste figura exatamente a questão da representatividade, ou seja, do distanciamento entre quem elege e quem foi eleito – como ocorre com outros fenômenos do populismo moderno (como Trump), há mais do que um grão de verdade na denúncia que esses movimentos fazem “disso tudo que está aí”. 

Em 1968, a decisão da Câmara de proibir que um deputado fosse processado pelo regime militar foi um divisor de águas na nossa história política. Não é o que se prenuncia agora, pois a palavra de ordem em Brasília é “acomodação”. Fora os estridentes aloprados e suas redes sociais, não há forças relevantes dispostas a partir para qualquer coisa remotamente parecida a um tudo ou nada. Os militares se acomodaram no governo, que se acomodou com o Centrão, empenhado desde sempre em acomodar seus interesses às custas dos cofres públicos, por sua vez esticados ao limite para acomodar as visões antagônicas de garantir ajuda emergencial e respeitar o teto de gastos. Todos confortáveis com a ideia de que o próximo embate é só para 2022.

William Waack, colunista -  O Estado de S. Paulo