A semelhança com a crise na campanha que elegeu Lula é só no calendário, porque o lado externo da economia está agora muito mais bem guarnecido
Alta
forte do dólar em ano de eleições não é inédita no Brasil, mas, nem por isso,
todos estes momentos de nervosismo no mercado financeiro, na proximidade das
urnas, são iguais. O fato de o dólar ter se aproximado dos R$ 4 — só
nominalmente igual a 2002, porque, para se equiparar àquele ano, em termos
reais, o câmbio teria de bater nos R$ 7 —, enquanto o Banco Central operava com
firmeza para reduzir a volatilidade, justificou a iniciativa rara de um
presidente da autoridade monetária, no caso Ilan Goldfajn, convocar entrevista
coletiva para ser claro: “não há qualquer preconceito de usar qualquer
instrumento” para conter um movimento mais forte de alta. Assim foi feito e,
ontem, o dólar fechou o pregão cotado a R$ 3,709, numa queda de 5,5%, a maior
em aproximadamente dez anos.
Como quem
faz a ameaça tem à disposição reservas de US$ 380 bilhões, entende-se que ele
pode ir mesmo além de oferecer contratos de swaps, de venda futura de dólar.
Pelo fato de o Brasil acumular reservas externas equivalentes a 20% do PIB, de
cinco a oito pontos percentuais de PIB além do considerado suficiente pelo
próprio FMI, o país tem mesmo munição para enfrentar quem pretenda especular contra
o real. [pensar que foi a irresponsabilidade do enganador-geral da República, Rodrigo Enganot, que neutralizou, como fonte de crescimento economico, este enorme volume de reservas, e a impunidade daquele enganador causa revolta.]
Esta é
uma diferença fundamental em relação a 2002, quando o crescimento da
candidatura de Lula, com todo seu passado de radicalismo, agitou os mercados, a
ponto de forçá-lo a editar a Carta ao Povo Brasileiro, na tentativa, não de
todo bem-sucedida, de conter a fuga de divisas com a promessa de respeitar os
contratos. Lula venceu, assumiu e praticou no primeiro mandato uma gestão
responsável. O dólar voltou a seu leito.
Agora,
também incertezas eleitorais servem de combustível para enfatizar a tendência,
que é mundial, de elevação do dólar. Mas há o enorme volume de reservas e
praticamente inexiste déficit externo nas contas correntes (aquém de 1% do PIB,
contra os mais de 4% nas crises cambiais do passado), rombo devidamente coberto
pela entrada de investimentos diretos.
Neste
sentido, é uma experiência nova para quem viveu todas as crises externas
nacionais, da década de 70 até agora. Não é preciso bater à porta do FMI, como
faz agora a Argentina, atrás de US$ 50 bilhões; nem subir juros às pressas,
para atrair dinheiro de fora. Claro que
elevação do dólar encarece importações e, por isso, tem algum repique na
inflação. Mas como ela está na faixa dos 3% anuais, abaixo da meta de 4,5%, o
BC tem tempo para avaliar o que fazer com os juros básicos de 6,5%, na próxima
reunião do Copom, daqui a mais de uma semana. Os
candidatos a presidente precisam entender que o mais forte motivo das
oscilações é a conjunção de uma economia em grave e crescente déficit fiscal
com alguns pretendentes ao Planalto que não se definem sobre o problema ou
acenam com velhas e equivocadas ideias.
Editorial - O Globo