Coluna publicada em O Globo - Economia 25 de junho de 2020
Só um país vai escapar da recessão neste ano, a China. Pelo último panorama global do FMI, conhecido ontem, a China vai salvar um crescimento de 1% no seu Produto Interno Bruto. É verdade que, para os chineses, crescer 1% é quase como uma recessão. A média do país tem sido de 6% de expansão anual.
De todo modo, estará no positivo. O resto, no vermelho. Para o PIB
global, o FMI prevê uma retração de 4,9%, tudo por conta da Covid-19. Os
piores desempenhos são esperados para três dos mais importantes países
europeus: Espanha, Itália e França, todos com queda esperada do PIB de
mais 12%. Ainda na Europa, o melhor resultado deve ser o da Alemanha,
uma recessão de “apenas” 7,8%. A diferença, de novo, vai por conta do modo como os respectivos
governos lidaram com a pandemia. Quem demorou a perceber a gravidade da
crise vai pagar mais caro. Quem foi rápido e tinha melhores sistemas de
saúde – além de dinheiro em caixa para gastar rapidamente – vai salvar
uma boa parte do ano.
Entre os grandes do mundo rico, o Japão terá o resultado menos ruim, uma queda no produto de 5,8%. Os EUA, cujo governo também se atrasou no reconhecimento da pandemia,
deve registrar uma recessão de 8%. Mas dada a flexibilidade de sua
economia, tem capacidade de reação rápida. E por falar nisso, indicadores referentes a junho indicam que Europa e
Estados Unidos estão se recuperando mais depressa que o esperado. Para o
mundo rico, a expectativa é uma volta ao crescimento já no segundo
semestre de 2020. Não será suficiente para salvar o ano, mas para
garantir uma expansão de 4,8% em 2021.
E os emergentes, grupo no qual se inclui o Brasil? À primeira vista,
parece uma situação melhor: queda do produto de 3,0% neste ano e bom
crescimento de 6% em 2021. Mas é basicamente por causa da China, para a
qual se espera um poderoso crescimento de 8,2% no próximo ano. Melhor, portanto, olhar só para a América Latina, e aí o quadro
piora: recessão de 9,4% neste ano e pequena expansão de 3,7% em 2021,
insuficiente para recuperar o que se terá perdido. E assim chegamos ao Brasil. A recessão é certa para este ano. Os
números variam. Por aqui, os economistas estão prevendo uma queda em
torno de 6%. O FMI acha que será pior: um tombo de 9,1%. Mas as duas
partes coincidem na previsão para 2021: PIB crescendo a 3,5%. O que é pouco, considerando-se que o Brasil vinha crescendo em torno
de 1% ao ano depois de uma recessão que nos havia levado quase 8% da
riqueza nacional.
Há ressalvas importantes para todo o mundo. O vírus continua por aí,
de modo que todos os países estão sujeitos a uma segunda onda, que pode
piorar o desempenho global. Inversamente, tudo pode melhorar, a começar
pelo humor, se os cientistas conseguirem a vacina ou um medicamento
específico para a Covid-19. Há pesquisas promissoras.
Voltando ao Brasil, um dado chama a atenção. Apesar de se prever uma
queda geral, o agronegócio de novo será salvação da lavoura. Segundo
dados do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, o
PIB da agropecuária terá expansão de 2% neste ano, um resultado notável
dada a retração geral.
Olhando estritamente para os dados econômicos, as perspectivas são
boas para este e para os próximos anos. No momento, a demanda externa é
forte, a interna está preservada e o dólar caro aumenta a renda do
setor. Não há sinais de que essa combinação positiva se altere
significativamente nos meses adiante. Na verdade, segundo o estudo do
Bradesco – e de muitas outras instituições, como a FAO – o Brasil já um
grande fornecedor global de alimentos e pode aumentar esse papel.
As
exportações estão batendo recordes.
A maior ameaça está em outro ponto. É cada vez maior em todo o mundo a
consciência ambiental, o que exige produção responsável. Por exemplo:
rastreabilidade e certificação serão cada vez mais exigidos. Ou seja,
será preciso certificar, por exemplo, que soja e carnes, os dois
principais produtos, não vêm de área desmatada.
[Situação fácil de ser resolvida:
Nenhum país compra do Brasil por amor aos brasileiros ou a nossa Pátria Amada.
Precisam de soja, em quantidade e qualidade, mas não aceitam que provenha de área desmatada, comprem dos que produzem soja orgânica e carne 'politicamente correta'.
Vão concluir que é mais vantajoso comprar do Brasil, sem certificação, mas podem comprar mais e de ótima qualidade, e com desmatamento controlado - tendo em conta que só a área de reservas indígenas, sendo reserva não pode ser desmatada, somada às áreas preservadas, por determinação legal, atende as necessidade de preservação do meio ambiente.]
O governo Bolsonaro age na direção contrária, para preocupação do agronegócio responsável.
E para o Brasil crescer além do agro? Muita reforma.
Carlos Alberto Sardenberg, jornalista
Entre os grandes do mundo rico, o Japão terá o resultado menos ruim, uma queda no produto de 5,8%. Os EUA, cujo governo também se atrasou no reconhecimento da pandemia, deve registrar uma recessão de 8%. Mas dada a flexibilidade de sua economia, tem capacidade de reação rápida. E por falar nisso, indicadores referentes a junho indicam que Europa e Estados Unidos estão se recuperando mais depressa que o esperado. Para o mundo rico, a expectativa é uma volta ao crescimento já no segundo semestre de 2020. Não será suficiente para salvar o ano, mas para garantir uma expansão de 4,8% em 2021.
E os emergentes, grupo no qual se inclui o Brasil? À primeira vista, parece uma situação melhor: queda do produto de 3,0% neste ano e bom crescimento de 6% em 2021. Mas é basicamente por causa da China, para a qual se espera um poderoso crescimento de 8,2% no próximo ano. Melhor, portanto, olhar só para a América Latina, e aí o quadro piora: recessão de 9,4% neste ano e pequena expansão de 3,7% em 2021, insuficiente para recuperar o que se terá perdido. E assim chegamos ao Brasil. A recessão é certa para este ano. Os números variam. Por aqui, os economistas estão prevendo uma queda em torno de 6%. O FMI acha que será pior: um tombo de 9,1%. Mas as duas partes coincidem na previsão para 2021: PIB crescendo a 3,5%. O que é pouco, considerando-se que o Brasil vinha crescendo em torno de 1% ao ano depois de uma recessão que nos havia levado quase 8% da riqueza nacional.
Há ressalvas importantes para todo o mundo. O vírus continua por aí, de modo que todos os países estão sujeitos a uma segunda onda, que pode piorar o desempenho global. Inversamente, tudo pode melhorar, a começar pelo humor, se os cientistas conseguirem a vacina ou um medicamento específico para a Covid-19. Há pesquisas promissoras.
Voltando ao Brasil, um dado chama a atenção. Apesar de se prever uma queda geral, o agronegócio de novo será salvação da lavoura. Segundo dados do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco, o PIB da agropecuária terá expansão de 2% neste ano, um resultado notável dada a retração geral.
Olhando estritamente para os dados econômicos, as perspectivas são boas para este e para os próximos anos. No momento, a demanda externa é forte, a interna está preservada e o dólar caro aumenta a renda do setor. Não há sinais de que essa combinação positiva se altere significativamente nos meses adiante. Na verdade, segundo o estudo do Bradesco – e de muitas outras instituições, como a FAO – o Brasil já um grande fornecedor global de alimentos e pode aumentar esse papel.
As exportações estão batendo recordes.
A maior ameaça está em outro ponto. É cada vez maior em todo o mundo a consciência ambiental, o que exige produção responsável. Por exemplo: rastreabilidade e certificação serão cada vez mais exigidos. Ou seja, será preciso certificar, por exemplo, que soja e carnes, os dois principais produtos, não vêm de área desmatada.
[Situação fácil de ser resolvida:
Nenhum país compra do Brasil por amor aos brasileiros ou a nossa Pátria Amada.
Precisam de soja, em quantidade e qualidade, mas não aceitam que provenha de área desmatada, comprem dos que produzem soja orgânica e carne 'politicamente correta'.
Vão concluir que é mais vantajoso comprar do Brasil, sem certificação, mas podem comprar mais e de ótima qualidade, e com desmatamento controlado - tendo em conta que só a área de reservas indígenas, sendo reserva não pode ser desmatada, somada às áreas preservadas, por determinação legal, atende as necessidade de preservação do meio ambiente.]
O governo Bolsonaro age na direção contrária, para preocupação do agronegócio responsável.
E para o Brasil crescer além do agro? Muita reforma.
Carlos Alberto Sardenberg, jornalista