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quarta-feira, 15 de janeiro de 2020

Projeto de lei para energia solar prevê geração distribuídate para quem já tem sistema - Folha de S. Paulo

Arthur Cagliari  

Proposta em análise estabelece cobrança só a partir de 2022 e para novos investidores

O Projeto de Lei que trata de novas regras para a cobrança de tarifas sobre a autoprodução de energia solar, a chamada geração distribuída, estabelece isenção permanente para quem já colocou ou vai adotar placas fotovoltaicas até o fim de 2021. “Para quem já tem [as placas], está instalando ou tem parecer de acesso não muda nada. Para sempre, porque essas pessoas fizeram o contrato quando as regras não previam as tarifas”, afirmou o deputado federal Lafayette de Andrada  (Republicanos-MG).

Na proposta, além da manutenção eterna da isenção para quem já possui o sistema, está prevista uma tarifa mais branda do que a proposta pela Aneel em seu relatório no ano passado. A ideia é cobrar apenas o serviço da distribuição, que equivale a 28% da tarifa cheia e de forma gradativa. O relatório da agência de 2019 propunha, além do pagamento da distribuição, a cobrança da transmissão, bem como de encargos e perdas do sistema elétrico, o que representaria 62% da tarifa cheia.Segundo Andrada, no caso da geração distribuída local (quem tem placa no próprio telhado), a proposta é que o pagamento da tarifa comece a partir de 2022, quando os donos dessas placas pagarão 10% da tarifa da distribuição. De forma escalonada, a cada dois anos, a alíquota crescerá 20 pontos percentuais, chegando a 100% em 2032.
No caso da geração remota (aquela que não é gerada no local do consumo), o deputado afirmou que a proposta é cobrar a tarifa de 100% da distribuição já em 2022. Também haveria uma transição escalonada para a geração compartilhada (local ou remota), hoje com representatividade irrisória. Nesta, a partir de 2022 a alíquota subiria para 50% da distribuição e, em dez anos, chegaria a 100%. Questionado sobre a não cobrança de encargos, como a CDE (Conta de Desenvolvimento Energético, onde estão subsídios a programas do governo), o deputado disse que, como a geração distribuída reduz o consumo de energia de fontes mais caras, como a termelétrica, há um barateamento natural na conta que compensa a isenção.
“Quando gero energia solar e a injeto no sistema, ela é diluída para toda a estrutura [de distribuição]. Todo mundo usa. Se eu faço isso, eu deixo de comprar energia térmica, a carvão, a diesel, que é caríssima, poluidora e suja. Então as pessoas que têm energia solar nas suas casas barateiam a conta de luz para todo mundo.”​
O deputado disse que conversou com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que o aconselhou a esperar algumas semanas para apresentar o PL. Segundo Andrada, Maia estaria estudando o caminho mais rápido para a tramitação, se por comissão especial ou por regime de urgência. Pessoas que acompanham o assunto disseram à Folha, em condição de anonimato, que a expectativa é que o projeto seja apresentado ao Congresso já no início de fevereiro. Um empecilho, porém, pode vir com a substituição de Caio Megale por Esteves Colnago na relação do Ministério da Economia com o Congresso.
Colnago é considerado muito alinhado com a proposta da equipe do ministro Paulo Guedes de trabalhar pela redução de subsídios, mesmo que sejam para energias limpas como a solar. Conforme reportagem publicada na semana passada, a ideia da pasta é reiniciar um trabalho de convencimento com Bolsonaro e líderes do Congresso.
Arthur Cagliari, coluna na Folha de S. Paulo/UOL
 
 
 

sábado, 24 de janeiro de 2015

O APAGÃO da Dilma = o inicio do fim antecipado do segundo mandato

O blecaute de Dilma

Falta de planejamento do governo, baixo investimento e falhas na transmissão provocam um apagão que deixa três milhões de brasileiros no escuro e trazem de volta ao País o fantasma do racionamento energético 

Nos últimos anos, tornou-se comum para os brasileiros conviver com sucessivas quedas de energia elétrica. Bairros, cidades e até regiões do País ficavam no escuro e, em todas as ocasiões, o governo alegava que eram problemas localizados, provocados por defeitos nas redes de distribuição. Essa desculpa deixou de valer no início da tarde da segunda-feira 19. A partir das 14h55, a população de 11 Estados ficou mais de uma hora no breu. Com o blecaute, linhas de metrô deixaram de funcionar, o comércio teve grandes prejuízos e, mais uma vez, o brasileiro perdeu a confiança no sistema energético nacional. Às pressas, o Planalto acionou os órgãos do setor para explicar as razões do apagão. Em entrevistas e notas divulgadas pela imprensa, apesar de alegarem que havia uma “folga de geração no Sistema Interligado Nacional”, as autoridades reconheceram que o fenômeno foi provocado pelo alto consumo de energia, em decorrência do uso em excesso de aparelhos de ar-condicionado, ligados para atenuar o calor sufocante do verão. Atribuíram o problema também a falhas na transmissão de energia das regiões Norte e Nordeste para a Sudeste. Em razão do pico de demanda, as usinas foram desligadas preventivamente para evitar um colapso do sistema.
Dilma, a imagem do fracasso e incomPTência
CAMINHO ERRADO
Dilma apostou no investimento nas termelétricas. Agora, se vê que a aposta
deu errado. Não supriu a demanda e ainda encareceu a energia
O governo não pode alegar que se surpreendeu com o aumento de consumo provocado pelos aparelhos de ar-condicionado neste verão. O consumo nacional de energia havia crescido 3,7% em 2014 e os sinais de que os reservatórios estavam com a capacidade reduzida já apareciam havia três anos em relatórios dos especialistas da consultoria PSR. No final do ano passado, estudos indicavam que os consumidores residenciais e de comércio precisariam reduzir em 6% os gastos de eletricidade, caso não quisessem conviver com eventos como os de segunda-feira 19. Em maio de 2014, o diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) afirmou, no Encontro Nacional dos Agentes do Setor Elétrico (Enase), que se cogitava fazer um racionamento, mas a medida extrema esbarrava em um dilema. “Existem dois riscos. O primeiro, de se precipitar e ter arrependimento. O outro, de não fazer e ter um problema mais sério no futuro”, afirma Hermes Chipp. Mas a decisão de adiar medidas de gestão de consumo obedeceu a uma agenda política. Às vésperas da eleição, o governo não ousou mexer no consumo de energia, porque sempre usou o racionamento de 2001, feito pelo governo de Fernando Henrique Cardoso, como arma eleitoral contra os tucanos. À época, os brasileiros que ultrapassassem o consumo mensal de 320 megawatts tiveram de pagar 50% a mais na tarifa. Atualmente, calcula-se em 1 mil megawatts o gasto mensal por família. O racionamento gerou prejuízo de mais de R$ 40 bilhões à economia.
 VÍTIMA
Em razão do apagão da semana passada, o metrô de São Paulo
chegou a parar. Diversas pessoas tiveram que ser levadas a centros médicos

A baixa dos reservatórios e o atraso nas obras de ampliação do sistema elétrico indicam que, em 2015, uma saída para se evitar novos apagões pode ser a volta do racionamento de energia. As medidas de restrição, seja lá que nome tenham, são inevitáveis. Esta é a previsão de Raimundo de Paula Batista, presidente da Enecel, empresa que comercializa energia. “Se nós tivéssemos no País uma economia aquecida, com mais demanda energética da indústria, o quadro seria mais grave. Como um sistema com capacidade para 120 mil megawatts tem que cortar fornecimento por causa de 2,2 mil megawatts? É preciso orientar a população, dar um choque de realidade, pois o apagão vai acontecer outra vez”, vaticina.

O Ministério de Minas e Energia faz planos decenais de investimentos. Mas entraves burocráticos na cadeia de licenciamento ambiental e na execução de grandes obras de infraestrutura levaram o governo a contar com as chuvas para adiar por mais um ano o fantasma da falta de energia elétrica. O último balanço do eixo de energia do PACo mostra que apenas 53% das obras de ampliação do sistema de geração e transmissão foram entregues no prazo contratado. Oito hidrelétricas em fase de construção poderão aportar 18,8 mil megawatts ao sistema e as usinas eólicas, outros 2,3 mil megawatts. Os projetos, porém, estão emperrados. “A tendência natural dos políticos é culpar a natureza, mas nós técnicos sabemos que a natureza é cíclica, não nos rendemos a essa tentação. Não se trata apenas de uma horinha sem luz, a crise é séria, mas os políticos negam até a última hora”, lamenta Rafael Herzberg, consultor da Interact Energia.

Em fevereiro de 2014, quando uma falha na rede de transmissão em Tocantins provocou um apagão em 18 Estados, a situação dos reservatórios já não era boa. Mas o governo se blindou para evitar que a oposição no Congresso discutisse o problema. O Planalto também errou ao direcionar grandes investimentos para a matriz termelétrica. 

Essa foi a solução encontrada por Dilma Rousseff em 2004, quando ela ainda era ministra de Minas e Energia. As termelétricas funcionam como um sistema de segurança para falhas ou para aporte do sistema hídrico. O modelo, no entanto, não conseguiu suprir a demanda e o alto preço da energia gerada ajudou a elevar a tarifa, impactando também os índices de inflação e equilíbrio do mercado. Em maio de 2013, Dilma desestabilizou o setor de energia. Na ocasião, a presidente editou um decreto que reduziu artificialmente o valor da tarifa elétrica. Como a energia termelétrica é muito mais cara, a medida gerou um rombo nas contas dos governos e nas finanças das empresas. Só nos dois últimos meses de 2014, as companhias do setor tiveram prejuízo de mais de R$ 3 bilhões para manter as tarifas em níveis mais baixos.

Ainda este mês, o governo anunciaria o início de reajustes, que podem chegar a 40% até o final do ano, no custo da energia elétrica. A má notícia para os consumidores foi adiada após o apagão. Titular da Comissão de Minas e Energia da Câmara, o deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG) reclama que o Palácio do Planalto mobilizou sua base aliada para vetar, no ano passado, a convocação do ex-ministro Edison Lobão para falar de possibilidade de apagão em 2015. “Todo setor elétrico dizia que o apagão aconteceria, mas o governo não queria falar disso no período das eleições. Assim como mudaram a meta de superávit na canetada, queriam fazer São Pedro mudar a meta de chuvas”. Pode não ser agora, mas o aumento no preço da energia para os consumidores vai acontecer. Mesmo assim, nada indica que os brasileiros estarão livres de novos apagões.

“Vamos atrair investimentos”
O engenheiro eletricista Eduardo Braga, 54 anos, assumiu o Ministério de Minas e Energia no dia 1º de janeiro e, logo na terceira semana, enfrentou uma crise no sistema energético brasileiro. Nesta entrevista, ele fala sobre os problemas do setor e aposta na modernização das redes de baixa tensão como uma das soluções para o País.

ISTOÉ – Chegamos ao limite do sistema energético?
Eduardo Braga
– Não. Nós estamos trabalhando em situações extremas, com uma reserva de água menor e menos chuva do que nos anos anteriores. O que aconteceu foi consequência de um problema técnico em uma rede de transmissão e foram feitos desligamentos preventivos.
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ISTOÉ – O sistema está preparado para um longo período de estiagem?
Braga –
Nosso sistema é bastante robusto e eficiente. Diferentemente de outros países, o Brasil tem um Operador Nacional do Sistema Elétrico. Temos uma matriz energética diversificada, com um preponderante papel da matriz hidráulica. Isso é bom, mas nos obriga a ter um sistema de térmicas de base para suportar longos períodos de estiagem. Os nossos estudos foram feitos até o ponto de referência mais crítico pelo cenário histórico. Se ultrapassarmos esse cenário, correremos algum risco. 

ISTOÉ – O que deve ser feito para evitar novos problemas?
Braga –
Teremos alguns fatos novos, por exemplo, na matriz eólica, na matriz foto-voltaica e de biomassa, que farão uma grande diferença na geração distribuída na próxima década. Precisamos modernizar a nossa rede de baixa tensão, essa que passa na rua, e a iluminação pública.
ISTOÉ – O sr. afirmou que é necessário construir um ambiente propício aos negócios. O que significa isso?
Braga –
É preciso diálogo com o setor privado, com o setor público e com os diferentes agentes reguladores para que haja um ambiente de confiança. Vamos buscar fontes de financiamento e atrair mais investimentos. Isso vai fazer com que possamos ter os leilões cada vez mais disputados, seja de distribuição de geração, seja de novas tecnologias.

Eumano Silva
Fotos: Adriano Machado/AG. ISTOE; Fernando Nascimento/Folhapress; Wilson Dias/Agência Brasil Shutterstock