Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador |Itália. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador |Itália. Mostrar todas as postagens

domingo, 4 de novembro de 2018

Separação de Poderes

A separação dos poderes não é intrínseca à democracia, mas ao presidencialismo, criada na Constituição americana em 1789


O debate sobre a nomeação do juiz Sergio Moro para o Ministério da Justiça com superpoderes no governo Bolsonaro levantou pontos relevantes sobre a relação entre os Poderes da República e o exercício da política para além do jogo partidário.  Moro sempre declarou que nunca faria carreira política, obviamente se referindo à política partidária. Mesmo porque já era um “agente político” na sua atuação como magistrado, de acordo com a definição da Controladoria-Geral da União (CGU): “agente político é aquele investido em seu cargo por meio de eleição, nomeação ou designação, cuja competência advém da própria Constituição, como os Chefes de Poder Executivo e membros do Poder Legislativo, Judiciário, Ministério Público, Tribunais de Contas, além de cargos de Diplomatas, Ministros de Estado e de Secretários nas Unidades da Federação, os quais não se sujeitam ao processo administrativo disciplinar”.

A separação dos poderes não é intrínseca à democracia, mas ao presidencialismo, criada na Constituição americana em 1789. Já existia na teoria, pela famosa obra de Montesquieu “O espírito das leis” e outras, e incipientemente na Inglaterra, à época uma monarquia constitucional que ainda não separava claramente o Poder Judiciário do Executivo. Os EUA formaram a primeira república constitucional do mundo moderno. O verdadeiro fundo filosófico é que nos EUA quem governa dá os rumos; é o Congresso. Um congressista faz parte de um poder verdadeiro. O Legislativo é um poder que não tem chefe. Um deputado, um senador, não é subordinado a nenhum chefe. Não pode ser demitido por chefe nenhum. Muito menos pode ser subordinado ao simples chefe de outro poder, o Executivo.

A independência legítima de poderes impede que um deputado ou senador americano seja ministro. Se quiser sê-lo, tem de renunciar ao seu mandato de legislador e virar auxiliar do presidente. Nos EUA, a senadora Hillary Clinton teve de renunciar ao mandato para ser Secretária de Estado de Barack Obama.  Norberto Bobbio, um dos maiores filósofos políticos do século XX, escreveu a “Teoria geral da política: a filosofia política e as lições dos clássicos”, em que dá a sua definição. Para ele, falar em política leva ao conceito de poder, que é a capacidade de se obter os meios para fazer prevalecer suas ideias em uma sociedade.

Os poderes políticos são legitimados, dependendo das circunstâncias, pela tradição, pelo despotismo ou pelo consenso, uma característica da democracia. Na Grécia Antiga, Aristóteles, em “A política”, tratava dela como inerente à atividade humana, pelo interesse pelas coisas das cidades (pólis).  “Fazer política” não é, portanto, apenas uma prática partidária e eleitoral, mas refere-se às atividades do Estado e à forma como a sociedade se relaciona com ele. Os políticos que criticam Moro por ter aceitado participar de um ministério o fazem como consequência de uma luta política que só demonstra como estão dissociados das mudanças que o país está vivendo.

Se quiséssemos mesmo exercer um presidencialismo na sua essência, deveríamos seguir o exemplo dos Estados Unidos, e exigir que os membros do Congresso renunciassem a seus mandatos caso desejassem ir para um ministério, assim como é exigido dos membros de outros Poderes, como o Judiciário.  Moro teve que renunciar à carreira para exercer um cargo em outro Poder. Acabaríamos com o toma lá dá cá radicalmente.

Na véspera de seu encontro com o presidente eleito Bolsonaro, Moro releu trechos do livro “Excellent cadavers”, de Alexander Stille, sobre a atuação do juiz Giovanni Falcone, o líder do combate à máfia que gerou a Operação Mãos Limpas da Itália e também foi para o governo. No livro, Moro marcou o seguinte trecho: “Em poucos meses em Roma, Falcone mudou o papel do Executivo na guerra contra a máfia”, segundo Ignazzio De Francisci, membro do grupo antimáfia anterior à chegada de Falcone ao governo italiano.

Moro, num rasgo de uma insuspeitada autoironia, comentou com amigos que espera não repetir totalmente a história de seu ídolo, tão perigoso para a máfia que foi assassinado em 1992.

Merval Pereira - O Globo
 

sexta-feira, 28 de outubro de 2016

No exterior, foro privilegiado é para poucas pessoas - Fim do foro privilegiado

Nos EUA, nem o presidente da República tem foro privilegiado - o ex-presidente Bill Clinton foi processado na primeira instância – e na Europa ele é apenas para pouquíssimas pessoas. 

É uma prática que deveria ser abolida no Brasil.  A Constituinte de 88, que estabeleceu o foro privilegiado para parlamentares, tem alguns exageros em razão de uma resposta ao regime militar e  acabou nessa proteção exagerada. Acho difícil que eles acabem com seus próprios privilégios, mas a PEC que extingue  o foro privilegiado está no Senado. Apenas uma pressão popular muito grande faria com que votassem a favor.

A decisão do ministro Teori Zavascki de suspender a Operação Métis, que prendeu quatro policiais legislativos do Senado sob suspeita de obstruir investigações da Lava Jato, trouxe à tona mais uma vez o debate sobre o foro privilegiado para parlamentares, tema que está sendo debatido na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.

O ministro Teori Zavascki, ao conceder a liminar, destacou a “inafastável participação de parlamentares nos atos investigados”, dando razão, em parte, ao presidente do Senado. A decisão do relator da Operação Lava Jato no STF não anulou a operação, como queria o senador Renan Calheiros, mas fez com que todos os computadores e material recolhido na sede da Polícia Legislativa do Senado fossem enviados ao Supremo até uma decisão final do caso, que será analisado pelo plenário.

Ao considerar que a Polícia Federal usurpou a prerrogativa do Supremo
ao fazer investigações no Senado com autorização de um juiz de primeira instância, o ministro Teori Zavascki na prática ampliou o foro privilegiado a funcionários do Senado, embora tenha acentuado que somente tomou essa decisão porque considerou que desde o início da operação havia conhecimento de que ela abrangeria senadores, acusados de recorrerem à Polícia Legislativa para fazerem varreduras de escutas telefônicas em seus escritórios e residências particulares, fora do prédio do Senado.

O senador Álvaro Dias, autor de proposta de emenda constitucional que acaba com o foro privilegiado, considera que a criação de uma "vara especializada" para tratar do assunto, como sugerem alguns, só é aceitável exclusivamente para "o presidente da República e ministros do STF". Os demais casos deveriam ser tratados na Justiça comum. O relator da proposta, senador Randolfe Rodrigues, concorda com ele, mas pretende que essa “vara especializada” trate de casos envolvendo chefes de Poderes e os ministros do STF, colocando os presidentes da Câmara e do Senado nas exceções da lei, mas retirando esse privilégio dos parlamentares.

Se aprovado no Senado, em duas votações com quorum qualificado
, a PEC precisa ir para a Câmara. No STF, vários ministros já se pronunciaram contra o foro privilegiado, e mesmo os que o consideram necessário são contra a ampliação de sua abrangência, como o ministro Gilmar Mendes. Em recente entrevista ele defendeu que “autoridades encarregadas de determinadas funções devem ter prerrogativa de foro, inclusive ex-ocupantes de postos de comando devido a investigações que ocorrem depois do mandato”.

Ele lembrou que os parlamentares não tinham foro privilegiado antes da Constituição de 1988, e a situação atual é “inadmnistrável”, pois cerca de um terço da Câmara dos Deputados está sob investigação. A ministra Cármen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), também defende mudanças na prerrogativa de foro, medida que, para ela, significa privilégio e “não é compatível com a República”.

Outro ministro do STF que quer o fim do foro privilegiado é Luís Roberto Barroso: "É preciso acabar ou reduzir o foro privilegiado, ou reservá-lo apenas a um número pequeno de autoridades. É uma herança aristocrática", disse Barroso. O ministro Marco Aurélio Mello também é  contra “por ele não ser republicano. Sou de concepção democrata, penso que todo e qualquer cidadão, independentemente de cargo ocupado, deve ser julgado pelo juiz de primeira instância, como ocorre nos Estados Unidos”, disse em entrevista recente.

 O decano do Supremo, ministro Celso de Mello, já se declarou “decididamente contrário à prerrogativa de foro”. Mas admite que ele seja mantido unicamente para os chefes dos Três Poderes, o Procurador-Geral da República e os ministros do Supremo, como órgão de cúpula do Poder Judiciário.   O ministro Celso de Mello lembrou em entrevista à revista Época que nos Estados Unidos não há nenhuma prerrogativa de foro, a única prerrogativa do presidente americano – e, assim mesmo, por força de decisões da Corte Suprema é a imunidade penal temporária. Terminado o mandato, ele pode ser processado na primeira instância. Também na Itália, na França e na Alemanha a prerrogativa é muito limitada.  


Fonte: O Globo - Merval Pereira