Eliane Cantanhêde
As feras estão à solta, mas quem é mais perigoso: hienas ou leões pró-ditaduras?
Assim como o vídeo das hienas, os movimentos do presidente Jair
Bolsonaro e dos seus filhos têm um objetivo: mobilizar os “leões
conservadores e patriotas”, ou seja, os bolsonaristas. Não exatamente
para defender a Pátria, mas para guerrear contra os inimigos, reais ou
imaginários.
Bolsonaro e seu filho Carlos brincaram de empurra-empurra no caso do
vídeo, retirado das redes depois de poucas horas e muitas reações. Na
peça, Bolsonaro é um leão atacado por “hienas”, bichos de péssima
reputação: Supremo, partidos, mídia, OAB, ONGs e até a ONU. No final, o
“leão conservador e patriota”, representando os bolsonaristas de toda
ordem, vem unir-se a ele contra as feras.
Há dúvidas, porém, sobre quem são as feras, principalmente depois que o
líder do PSL na Câmara Eduardo Bolsonaro, ex-quase embaixador em
Washington, dispensou metáforas e filmetes ridículos e ameaçou o País
com a volta do AI-5, o mais demoníaco instrumento formal da ditadura
militar, que permitiu fechar o Congresso, perseguir ministros do STF,
censurar a imprensa, suprimir as garantias individuais. [O AI-5 - ATO INSTITUCIONAL N° 5, foi um instrumento legal forte, enérgico e adequado para combater os inimigos do Brasil da SOBERANIA e da SEGURANÇA NACIONAL.
Só é temido pelo que tem intenções e/ou comportamentos atentatórios contra INDEPENDÊNCIA e SOBERANIA do Brasil.]
Os dois depoimentos nebulosos do tal porteiro do condomínio de Bolsonaro
no Rio serviram de carne aos leões e de munição para a guerra contra as
instituições. A longa reação do presidente, de madrugada, num país
longínquo, saiu da seara da legítima defesa para a do ataque à “hiena”
mídia e ao governador Wilson Witzel. Mais uma vez, soou como chamamento
irado aos “leões conservadores e patrióticos”.
Em sua fala, Bolsonaro referiu-se ao que considera uma perseguição
implacável contra ele, seus filhos, sua mulher, seus irmãos, seu
governo, apontando motivos eleitorais no caso de Witzel e ideológicos no
da mídia. Se o ex-presidente Lula chegou a ver, da prisão, deve ter no
fundo concordado com tudo, já que ele, tirando o nome de Witzel, tinha
exatamente as mesmas reclamações dessa mídia “canalha” que divulga o que
eles não querem.
Nas redes, Carlos juntou “abutres” às “hienas”. Na CPI das Fake News,
Eduardo guerreava com o deputado Alexandre Frota, um ex-“leão
conservador e patriótico” que virou tucano e acaba de ser convertido em
hiena. Um zoológico cômico, não fosse trágico. Tira o foco dos resultados econômicos e comerciais da viagem do
presidente a países asiáticos e árabes. Ninguém mais fala de mudar a
embaixada de Israel para Jerusalém e ele volta para casa com promessas
de investimentos de US$ 10 bilhões só da Arábia Saudita. [o presidente Bolsonaro ao priorizar o comércio com os países árabes, mostra ser um estadista, com visão para os aspectos econômicos das relações entre países - deve sempre fazer a opção mais vantajosa para o Brasil.
Esse comportamento do presidente mostra que tem capacidade política e pode comandar os ministros sérios citados no parágrafo abaixo.] Uma ditadura
brutal, mas isso é outra história.
Enquanto Bolsonaro e os filhos guerreiam contra as instituições, Paulo
Guedes e os ministros sérios se articulam exatamente com as “hienas e
abutres” da Câmara, Senado e STF, para retomar o desenvolvimento,
destravar a economia, reduzir o dirigismo estatal e, em consequência,
como eles esperam, gerar inclusão social. Todo esse otimismo com um círculo virtuoso ocorre apesar dos Bolsonaro,
que parecem aguardar ansiosos os dois próximos capítulos para defender
autoritarismo e convocar os “leões”.
Primeiro, o fim da a prisão em segunda instância no STF, cutucando onças
e leões, conservadores ou não, com vara curta. A leãozada já estará
então a ponto de bala para o capítulo final: o Lula livre. Nada mais
forte e eficaz para desenjaular de vez os “leões conservadores e
patrióticos” do que soltar essa hiena gigante.
Ninguém jamais dirá isso no Planalto, mas para quem adora AI-5, Ustra,
Pinochet e Stroessner é uma festa o STF derrubar a prisão de segunda
instância e livrar Lula, criando o ambiente ideal para os leões. Nesse
script, o porteiro da Barra seria o novo Márcio Moreira Alves: apenas um
pretexto. Ainda bem que tudo não passa de pura ficção.
Eliane Cantanhêde, colunista - O Estado de S. Paulo