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terça-feira, 10 de janeiro de 2023

De mal a pior - Alexandre Garcia

Vozes - Gazeta do Povo

Vandalismo em Brasília     

Protesto Lula Congresso - Manifestação começou pacífica, mas se tornou violenta ao chegar à Esplanada e ao Congresso.| Foto: reprodução/Youtube Didi Red Pill
 
Domingo, 8 de janeiro, é um dia que ainda não terminou. E não parece que vá acabar bem. O que não começa bem em geral não acaba bem
Foi o desbordar de quase 70 dias de emoções contidas, que esquentam cabeças. Em 47 anos de Brasília, vi muitas invasões de prédios públicos, ministérios e Congresso, com fogo e depredações, sempre de esquerda e apelidados de “movimentos sociais”.  
Nunca vi a invasão simultânea das sedes dos três poderes, e pela direita, com depredações. Desatendidos da busca da tutela militar, tomaram a iniciativa como se estivessem realizando um sonho. Talvez tenham acordado quando o estrago já estava feito. 
Assemelharam-se aos extremismos anteriores, com a diferença de que foram chamados de “terroristas”, não de “movimentos sociais”.
 
O ministro Alexandre de Moraes, no despacho que determinou a remoção dos acampamentos, a detenção dos ônibus e o afastamento do governador Ibaneis, comparou a situação com os primórdios da Segunda Guerra, em que Chamberlain cedeu a Hitler em nome da pacificação.
 “A democracia brasileira não irá aceitar mais a ignóbil política de apaziguamento”.  
Foi uma declaração de guerra, como a que já havia anunciado no seu discurso de posse na presidência do TSE. 
A brisa do apaziguamento, que soprava tênue na passagem de governo, com falas contra a revanche e outras bem revanchistas, mais o ânimo de reverter o resultado das eleições, já vinha sendo combustível na fogueira que aquece os ânimos. 
A invasão de domingo foi equivalente à entrada dos alemães na Polônia, pela comparação do ministro Moraes. Parece declarada a guerra, com o mundo brasileiro dividido em duas metades. Ânimos à flor da pele, a ponto de o presidente querer mencionar “nazistas” e pronunciar “stalinistas”, num ato falho. Extremos se assemelham nos métodos.

Veja Também:
 Alexandre de Moraes faz declaração de guerra

Vale tudo para incriminar Bolsonaro

Acirram-se os ânimos dos dois lados, com mais velocidade que em 1930. Aqueles eram tempos de trem, navio, telegrama, jornal impresso. Hoje, o mundo digital torna tudo instantâneo. O que vai ser? Deputados e senadores, o presidente da República, os ministros do Supremo já sabem que não estão seguros em seus prédios. 
Que o povo, seja de que lado for, origem do poder, pode entrar lá e sentar em suas cadeiras. Com um pouco de humildade, que é a mais inteligente das virtudes, podem se convencer de que não são os donos do país nem das pessoas, mas servidores dos brasileiros. 
Defendam a democracia, sobretudo praticando-a, com respeito ao eleitor que os elege e ao contribuinte que os sustenta. E, sobretudo, mantenham olhos e ouvidos bem abertos para entenderem o que seu povo, seus mandantes querem. Liberdade e ordem são essenciais para esse exercício.
 
O domingo mostrou como o controle escapa fácil. Foram feitas 1,2 mil prisões e o auditório da Academia da Polícia Federal foi depositário de presos como foi o Estádio Nacional do Chile, quando Pinochet derrubou Allende. 
O ministro Moraes reagiu tirando o governador de Brasília e enquadrando todo mundo em crimes contra o Estado de Direito, por pedir intervenção das Forças Armadas. Pobre Estado de Direito, já tão combalido pela ausência do devido processo legal e pelo desrespeito a liberdades fundamentais listadas no artigo 5.º da Constituição. 
O domingo, na verdade, começou em março de 2019, quando o presidente do STF Dias Toffoli criou um inquérito que cabe numa ficção de Orwell. Começou mal; será que termina bem?

Conteúdo editado por: Marcio Antonio Campos

Alexandre Garcia, colunista - Gazeta do Povo - VOZES


segunda-feira, 5 de setembro de 2022

Análise: Rejeição da Constituição no Chile é surra que desafia Boric e fortalece direita - O Globo

O presidente do Chile, Gabriel Boric, prestes a colocar na urna o seu voto para aprovar ou rejeitar uma nova Constituição Juan Carlos Avendano/ATON CHILE/AFP [o presidente chileno já foi processado por furto em supermercado.]

A aliança de governo deverá encarar uma provável reforma de Gabinete e uma inevitável negociação com a direita. Tudo isso, num contexto de desgaste da imagem presidencial. O panorama é preocupante para o Palácio de la Moneda, e alguns analistas em Santiago admitem que a violência poderia voltar às ruas do país.

Chilenos rejeitam por ampla margem nova Constituição com viés de esquerda

Chilenos rejeitam por ampla margem nova Constituição com viés de esquerda

Desinformação e erros
Como se chegou até aqui? Erros na comunicação, tanto do governo quanto da agora desativada Convenção Constitucional, desinformação, pouca autocrítica e demora em reconhecer os erros cometidos no processo. Os quatro fatores explicam, nas palavras da advogada Tammy Pustilnick, uma das independentes que integrou a Convenção, a crônica de uma derrota anunciada por todas as pesquisas que circularam nas últimas semanas. Ontem, senadores socialistas lembravam em redes sociais que “nós avisamos, e não nos ouviram”. Está claro que o até agora expressivo poder do poder do Partido Comunista, parte da coalizão de Boric, será questionado.

Numa fala sincera e angustiada, Tammy, mãe de dois filhos pequenos e uma das poucas integrantes da Convenção Constitucional que recebeu elogios da mídia e dos opositores do projeto, admitiu que está exausta e que os chilenos precisam, desesperadamente, de certezas. Ela lamentou que o conteúdo do projeto não tenha sido bem e detalhadamente explicado à sociedade. Até a véspera da votação, pessoas lhe perguntavam se a propriedade privada estava em risco e até mesmo se poderiam continuar indo à igreja. Houve ataques descontrolados e falhas graves.

A campanha de desinformação promovida pelos defensores da rejeição ao projeto foi feroz, na mídia e, principalmente, em redes sociais. Mas os erros dos defensores da aprovação também foram grandes. Isso fez, concluiu Tammy, que muitos chilenos tenham votado com medo e favorecido um resultado que está na contramão do que quase 80% dos que participaram no plebiscito a favor de uma nova Constituição demandaram. Uma consulta popular que foi possível graças à onda de manifestações que sacudiu o país em 2019.

Está claro que o projeto precisa de mudanças. Tanto que o próprio governo do presidente Gabriel Boric instalou o lema "aprovar para reformar". 
Os que pregaram a rejeição pegaram carona na campanha governista e promoveram, numa jogada inteligente, o "rejeitar para reformar".

Mundo - O Globo - MATÉRIA COMPLETA


domingo, 6 de março de 2022

Putin, a Mãe Rússia e o Ocidente - Revista Oeste

Rodrigo Constantino

Os russos permitiram a concentração de poder num só homem, que se despiu de ideologias e adotou um pragmatismo nacionalista cuja meta era tornar a Rússia um país temido novamente 

Vladimir Putin, presidente da Rússia | Foto: Asatur Yesayants/Shutterstock
Vladimir Putin, presidente da Rússia -  Foto: Asatur Yesayants/Shutterstock 
 
Com a invasão da Ucrânia pela Rússia, o mundo se voltou para Vladimir Putin, aquele que comanda com mão de ferro o país desde 1999. Todos querem entender a cabeça daquele que ameaça levar o mundo a uma guerra nuclear. 
Será que ele está blefando? 
Seria Putin capaz de apertar o botão vermelho? 
Como as sanções econômicas impostas pelo Ocidente podem frear as pretensões imperialistas da Rússia? 
Putin é comunista ou nacionalista? E por aí vai.

Naturalmente, a psicologia de alguém como Putin é algo complexo. Sabemos de seu passado, do fato de que seu avô foi cozinheiro de Lenin e também de Stalin, que seu pai, um operário, foi ferido na Segunda Guerra Mundial, que ele foi agente secreto na KGB, e que considerou o debacle da União Soviética uma “catástrofe geopolítica”. Ou seja, seus laços com o imperialismo soviético são evidentes. Mas Putin também é um nacionalista, e em muitos aspectos se parece com um novo czar, lutando para resgatar a grandeza da “Mãe Rússia”. É aqui que atrai, além de comunistas, reacionários.

O Ocidente está em crise de identidade, submetido ao globalismo de elites “progressistas”, materialistas e cosmopolitas
Os conservadores estão absolutamente certos quando apontam para a doença. 
Erra na receita, porém, quem acha que alguém como Putin pode ser parte da resposta. 
Basta conhecer um pouco do perfil do autocrata russo para compreender que ele está longe de ser a solução para as mazelas ocidentais. 
Ao contrário: a civilização ocidental precisa ser defendida justamente por representar valores que alguém como Putin, no fundo, repudia com veemência.

Putin nunca demonstrou qualquer apreço pelas instituições democráticas. Se o império das leis é um dos pilares mais importantes no Ocidente, ainda que em crise pelo abuso de poder arbitrário de hoje sob o pretexto da ciência, Putin simboliza seu oposto, a concentração de poder num só indivíduo, que tudo pode. Ele assumiu o poder quando havia um vácuo deixado pela crise de 1998 e a liderança frágil do bêbado Yeltsin. Oligarcas sem escrúpulos que conquistaram muito dinheiro e poder após a queda do regime soviético ajudaram a criar Putin como político, e logo em seguida o ex-espião destruiu um a um de seus “criadores”.

No livro The Oligarchs, de David Hoffman, essa história é contada em detalhes. É preciso entender que Yeltsin colocou alguns liberais no comando da economia, mas faltavam à Rússia instituições básicas para o funcionamento do livre mercado. O que tivemos em seu lugar foi uma “lei da selva”, um “vale-tudo” em que os tais oligarcas exploraram com maestria à custa do povo. Quando veio a crise, ela foi associada de maneira equivocada ao capitalismo. E foi nesse contexto que Putin chegou ao poder. Sim, ele foi pragmático para não matar a galinha dos ovos de ouro. Mas ele jamais depositou esperança no mecanismo de mercado para levar prosperidade aos russos.

Não se tratava, portanto, de um modelo de meritocracia, e sim um de conexões. Após utilizar os oligarcas para sua ascensão, Putin percebeu que era arriscado demais depender deles, e por isso passou a perseguir cada um deles. O dono da Yukos, Khodorkowsky, então o homem mais rico do mundo emergente, foi preso e esmagado como uma barata em poucas semanas. Os dois barões da mídia tiveram de fugir. O recado era claro: ou se submetia ao conceito de tirania de um homem só ou seria destruído. Putin não se importava com a riqueza desses oligarcas, desde que isso não significasse poder político. Esse seria todo dele, apenas dele.

O capitalismo russo floresceu sem qualquer transparência, por meio de propinas, tudo feito às sombras, com conexões e influência, com golpes escancarados, sem qualquer instituição sólida para proteger a propriedade privada. O liberal Yegor Gaidar, reformista convocado por Yeltsin, temia justamente isso: que os russos fossem se sentir traídos pelo capitalismo. Eu estive num jantar com Gaidar, um admirador de Hayek, e ele parecia alguém sem interesses materiais. Era alguém que realmente acreditava num caminho alternativo para a Rússia, similar ao traçado pelo Ocidente. Na era Putin, figuras como Gaidar não tinham qualquer espaço no governo.

Putin claramente desprezava os oligarcas que só pensavam em enriquecer por meio de esquemas fraudulentos e, eventualmente, mandar o dinheiro para fora do país. Os reformistas liberais tentaram oferecer o máximo de liberdade antes de criar regras claras do jogo, e no vácuo dessas regras vieram forças caóticas do mal, como charlatães, brutamontes, gangues criminosas, políticos corruptos, burocratas espertos, mafiosos etc. Foi nesse ambiente que o ex-espião da KGB concentrou boa parte do poder político. A Rússia nunca desenvolveu qualquer respeito pelo império das leis, pelo estado de direito.

Vale notar que Putin foi catapultado ao papel de líder logo no começo de sua gestão como primeiro-ministro, quando uma série de bombas aterrorizaram Moscou. Os supostos terroristas nunca foram encontrados, o que alimentava a suspeita de se tratar de um trabalho interno do serviço secreto russo, ligado a Putin. O prefeito Luzhkov, seu adversário político, teve sua imagem muito desgastada, enquanto Putin culpou os chechenos e lançou uma ofensiva militar em larga escala, fazendo sua taxa de aprovação disparar.

Ninguém conhecia direito o pensamento político de Putin, ou o que ele fizera na KGB. Os próprios oligarcas ainda o encaravam como uma marionete em suas mãos. Mas, após os anos de fraqueza de Yeltsin, os russos pareciam apreciar o estilo firme de Putin, e muitos compartilhavam de seu ódio pelos chechenos. Mesmo os “liberais”, cansados do caos econômico, pediam que Putin fosse o “Pinochet russo”, acreditando que apenas uma ditadura política poderia viabilizar as reformas econômicas de mercado. Putin soube usar isso a seu favor.

Os russos, sem tradição de liberdade, parecem ter chegado à conclusão de que uma “democracia” controlada de cima é a única alternativa viável no país

Fechado, discreto, sisudo, Putin nunca participara de competições políticas reais, apenas de jogos de bastidores. Ele era extremamente disciplinado, inclusive a ponto de não demonstrar muita ambição no começo e sinalizar lealdade àqueles que o alçaram ao poder. Ele temia a imprensa, em especial a televisão, e por isso seus primeiros alvos foram os oligarcas da mídia. A censura foi imposta durante a guerra, e nunca mais abandonou a Rússia. Putin não queria destruir o sistema, apenas controlá-lo. Ao destruir Gusinsky e Berezovsky, os dois barões da mídia, o caminho ficou livre para o restante do trabalho.

O caso envolvendo Berezovsky, seu principal “criador”, merece maior atenção. Berezovsky passou a discordar de Putin sobre a guerra na Chechênia, e cometeu o erro de externar sua opinião em público. Putin não tolera isso. Berezovsky chegou a enviar uma carta a Putin alertando para seus erros ao escalar o conflito, impor sua vontade aos governadores e tentar controlar a mídia. Mas o magnata não tinha chance nessa batalha, e acabou vendendo seu canal de TV para Roman Abramovich, aliado de Putin, e fugiu do país.

Como coloca Lilia Shevtsova em Putin’s Russia, o desejo avassalador entre a classe política e os russos em geral era que Putin se mostrasse um líder que poderia trazer ordem ao caos de Yeltsin e acabar com a imprevisibilidade do Kremlin. Ao apostar nisso, porém, os russos permitiram a quase absoluta concentração de poder num só homem, que se despiu de ideologias e adotou um pragmatismo nacionalista cuja meta era tornar a Mãe Rússia um país respeitado e temido novamente.

Enquanto o preço do petróleo continuar alto, Putin tem pouco a temer. Não é possível negar que ele conta com apoio popular. Os russos, sem tradição de liberdade, parecem ter chegado à conclusão de que uma “democracia” controlada de cima é a única alternativa viável no país. Muitos são inclusive nostálgicos dos tempos soviéticos, apesar de tudo, apenas por conta do papel geopolítico exercido pela Rússia. Não é uma nova dacha para as férias ou trocar de iPhone todo ano que os move, e sim um sentimento coletivista de pertencer a algo maior.

A economia russa é pequena, quase do tamanho do Estado da Flórida. Mas os russos que apoiam Putin estão preocupados com outras coisas. É um grave equívoco medir Putin pela régua “progressista” ocidental. Trata-se de um autocrata nacionalista obstinado, capaz de tudo para atingir seus fins, e que não vai descansar enquanto a Rússia não for, novamente, um adversário à altura do decadente Ocidente. Aqueles que acreditam que ele pode ser um bom substituto do Ocidente, porém, estão redondamente enganados. Putin é a antítese de tudo que a civilização ocidental representa.

Leia também “A fraqueza ocidental”

Rodrigo Constantino, colunista - Revista Oeste


segunda-feira, 30 de março de 2020

Memórias do grupo de risco - Fernando Gabeira

Em Blog

Bolsonaro tornou-se uma espécie de Jim Jones, o pastor que levou seus seguidores ao suicídio coletivo

Nos últimos tempos, as coisas andam tão rápidas que todo dia escrevo um pouco. No final de semana, o epicentro da pandemia já havia se deslocado para os Estados Unidos, e Boris Johnson, primeiro-ministro inglês, foi contaminado pelo coronavírus.

Temo pelo Brasil. O vírus avança como em outros lugares. Somos mais vulneráveis pelas grandes concentrações urbanas, péssimas condições sanitárias. Os Estados Unidos eram o primeiro na lista de segurança sanitária no mundo: ricos e bem equipados. Ao longo do caminho, não devemos nos concentrar apenas numa variável, o número de casos. Há outra muito importante: o índice de mortalidade. Além de desvantagens historicamente acumuladas, temos outras de peso. O presidente da República, que deveria articular o esforço nacional, não acredita na importância da pandemia.
Bolsonaro se acha incólume porque um dia foi atleta. E estendeu essa blindagem aos brasileiros que, segundo ele, mergulham no esgoto e nada sofrem. No momento em que a Ciência tem um grande papel, Bolsonaro está cercado de terraplanistas, tornou-se uma espécie de Jim Jones, o pastor que levou seus seguidores ao suicídio coletivo.

A segunda desvantagem está no ministro da Economia, Paulo Guedes. Toda a sua história é a de luta para reduzir o papel econômico do Estado. Trabalhou no Chile de Pinochet e escreveu inúmeros artigos sobre o temaO dramático momento, de repente, exige uma intensa intervenção do Estado na economia. Guedes não se preparou para isso. É como se estivéssemos numa partida de futebol e resolvêssemos trocar o centroavante por um jogador de tênis. Vera Magalhães sugeriu que escrevesse algo sobre o ano de 2020, um ano cancelado pela pandemia.

No mesmo dia, tinha conversado aqui em casa sobre uma viagem a Nova York. Quando minha mulher vai até NY, costumo vender minha câmera velha e comprar uma nova na Adorama. Rimos para não chorar: não haverá viagem, muito menos câmera, e Deus permita que haja Nova York no fim dessa estrada. O Flamengo seria campeão de tudo em 2020, mas não haverá campeões nesse tempo sinistro. [apesar da propensão de tudo em 2020 ser negativo - torcemos para que não passe de,  uma tendência que não se efetivará -  vale lembrar que neste 2020,(até agora,  no campo esportivo, um ano com apenas dois meses) o MENGÃO ganhou três títulos:
Um estadual, outro nacional e um internacional.]
Mas vou voltar ao tema sugerido por Vera assim que a pandemia der uma trégua. No momento, tento refletir um pouco sobre ser velho em tempos de coronavírus. Aqui a dimensão transcende ao ano de 2020: o que será do resto de nossas vidas?
Toneladas de papel impresso falam da velhice. Mas a nossa é singular: acontece durante a pandemia, somos classificados como grupo de risco.
Leio notícias de que o velhinhos de comunidades serão levados para hotéis ou navios, que a polícia em São Paulo está detendo os rebeldes que saem às ruas. Tudo para o bem deles. Passada a crise mais aguda, como será a vida dos velhos antes da chegada da vacina? Minhas leituras não estão concentradas na “Peste”, de Camus, ou no “Um diário do Ano da Peste”, de Daniel Defoe.

Nos momentos mais suaves da quarentena, volto-me para livros do tipo “Memórias de Adriano” e detenho-me em frases como esta: “Esta manhã, pela primeira vez ocorreu-me a ideia de que meu corpo, este fiel companheiro, esse amigo mais seguro e mais conhecido que a própria alma, não é senão um monstro derradeiro que acabará por devorar seu próprio dono.”
Isso é verdade para tempos normais. Como se aplica a tempos de coronavírus? Será que nossos corpos envelhecidos serão vistos como um perigo social?

Envelheci depois de muitas lutas contra preconceitos. Só me faltava essa. Quando passar a primeira onda, voltarei a sair por aí, explorando e transfigurando o mundo em imagens.  De novo, Adriano: “A impossibilidade de continuar a exprimir-se, modificar-se pela ação é talvez a única diferença entre os mortos e os vivos.”

Um corpo envelhecido não representa perigo especial. Ele contrai e transmite o coronavírus como uma criança ou um jovem. A grande responsabilidade é evitar adoecer em tempos de grande crise para não ocupar o lugar de um mais jovem nos escassos respiradores.  Infelizmente, temos mais fuzis do que respiradores. Um padre italiano compreendeu isto e cedeu seu lugar para um jovem que tinha chances de uma vida longa e saudável.
Viver é muito perigoso e, de uma certa forma, a própria humanidade é um grupo de risco.

Blog do Gabeira - Fernando Gabeira, jornalista

Artigo publicado no jornal O Globo em 30/03/2020

[Sugerimos ler a coletânea de postagens Diários da Crise de I ao VIII.
Todos são ótimos e o VII excelente]


domingo, 19 de janeiro de 2020

Goebbels na era digital - Eliane Cantanhêde

O Estado de S. Paulo

Alvim sai, mas Bolsonaro fica e Goebbels, Bannon e Olavo continuam pairando no ar

[aceitem,  que dói menos: 

- com as bençãos de DEUS, Bolsonaro fica e em 2022 será reeleito, tendo como vice o ministro Sérgio Moro;

é o inevitável, aceitem, se unam à Cruzada em prol do crescimento do Brasil e ao retorno, engrandecidos, de valores hoje esquecidos, vilipendiados, desvalorizados e que são tão caros ao BRASILEIROS DE BEM.]

Poderia ter sido apenas uma papagaiada chocante, mas o que o secretário nacional de Cultura Roberto Alvim fez foi muito pior: uma performance bem construída e ensaiada. Ator e diretor de teatro, ele encarnou o gênio do mal Joseph Goebbels, plagiando seus textos e usando o mesmo cabelo, o mesmo olhar, o tom solene e, como fundo musical, a ópera preferida de Hitler. [atenção apreciadores de Wagner e óperas: a esquerda estúpida (existe outra?)tenta censurar os grandes mestres e suas épicas produções, mas,não vão conseguir.
O que tem que ser proibido, urgentemente é a 'foice e martelo' - símbolos do comunismo, que assassinou mais de 100.000.000 de pessoas.] censura imposta pela derrotada esquerda não

Poderia também ter sido um surto individual, um fato isolado, um ponto fora da curva, mas o arroubo nazista foi num habitat onde, vire e mexe, um protagonista acena com a volta do tenebroso AI-5 e o presidente Jair Bolsonaro se delicia fazendo loas aos ditadores sanguinários Pinochet e Stroessner. A própria trajetória de Roberto Alvim no governo já diz tudo. Ele foi premiado com o principal cargo da Cultura nacional por ter atacado Fernanda Montenegro como “sórdida” e “mesquinha”, convocado artistas para uma “máquina de guerra cultural” e planejado ceder espaços culturais para teatros evangélicos. Nomeado com carta branca numa secretaria de cultura jogada como estorvo no Ministério do Turismo, ele teve passagem tão rápida quanto devastadora. Na Fundação Palmares, um negro racista. Na Funarte, um terraplanista que identifica rock com drogas e satanismo. [os que discordarem ou tiverem dúvidas, dispam-se das ideias preconcebidas, dos preconceitos e escutem alguns clássicos do rock.] Na Casa de Rui Barbosa, alguém muito distante de ser personalidade e alheio aos meios acadêmicos. Na Biblioteca Nacional, um monarquista. Verdadeiro strike.

Pelos elogios feitos ao secretário, o presidente da República parecia bem satisfeito com esse desmonte macabro da Cultura, que é a alma de uma nação e um dos mais calorosos orgulhos brasileiros, mas acaba de atrair o Brasil para mais uma onda de manchetes vexaminosas pelo mundo afora. O culto ao nazismo foi parar nos principais jornais dos Estados Unidos, da Europa, da América Latina, aprofundando a deterioração da imagem do País no exterior às vésperas de mais um Fórum Econômico Mundial em Davos. Eu não queria estar na pele do ministro Paulo Guedes e dos integrantes da delegação brasileira. Vão ouvir poucas e boas. E o que responder? [acabaram com os que admiram o nazismo nos Estados Unidos? e os neonazistas da Europa, foram eliminados?
o problema no Brasil é que a maior parte dos formadores de opinião entendem que arte é ofender JESUS CRISTO, é espezinhar VALORES CRISTÃOS, desvalorizar a FAMÍLIA, incitar a DESORDEM, cultuar a concessão de direitos SEM  a contrapartida de DEVERES.]

A performance nazista de Roberto Alvim compõe bem um todo em que pululam noções muito particulares (ou falta de noção?) sobre meio ambiente, educação, política externa, direitos humanos e mídia, em que prevalece o culto às armas e o governador de um dos principais Estados defende um peculiar combate à criminalidade: “mirar a cabecinha do bandido e pou!”. [não estamos julgando a conduta do governador do Rio, apenas lembramos que ele e o Presidente Bolsonaro estão rompidos politicamente.] O resultado é que as cabecinhas na mira são outras, dentro de casa, na escola, no parquinho ou passeando com a avó nesse mesmo Estado: as das crianças. Todas negras e pobres.

No caso de Alvim, Bolsonaro, pelo menos, foi rápido no gatilho. Antes das 11h ele já havia decidido a demissão, sob pressão dos presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo, de amplo arco político da esquerda à direita, de toda a opinião pública e até da embaixada da Alemanha. Mas o xeque-mate foi da comunidade judaica. Tal como Donald Trump, ele é daqueles: “Mexeu com Israel, mexeu comigo”. [Bolsonaro esqueceu que quem escolhe e nomeia ministros (é o que consta da Constituição Federal, condição inclusive já reconhecida pelo plenário do Supremo) é o Presidente da República.
Por óbvio,  quem tem competência constitucional para escolher o titular de um ministério, tem para escolher titulares de órgãos subordinados àquele Ministério.
Deveria tomar a decisão pela demissão - mesmo não havendo obrigação legal, o componente político tornava a exoneração aconselhável - mas, recusar e divulgar a recusa, opinião dos presidentes das Casas do Poder Legislativo e de nações estrangeiras.] 

A partir daí, começou outra tortura nacional: quem seria o sucessor ou sucessora? Veio o medo. Alvim sai, mas Goebbels, assim como Steve Bannon e Olavo de Carvalho, continua pairando sobre o governo Bolsonaro. E não apenas na Cultura, mas na área mais eficaz do nazismo: a propaganda. Nem “a guerra ao marxismo cultural” nem máxima de que “uma mentira repetida mil vezes vira verdade” foram demitidos. Continuam vivos, fortes, entranhados na alma do governo. Aliás, desde a campanha, quando o “gênios do mal” modernos conseguiram massificar como verdade a mentira de que só Bolsonaro derrotaria Lula e o PT. [até que provem o contrário, só JAIR BOLSONARO derrotou os citados;
no século passado, o condenado petista, perdeu também para Collor e FHC.]   Uma mentira repetida não mil, mas milhões de vezes. Goebbels reencarna na era digital.
Eliane Cantanhêde, colunista - O Estado de S.Paulo 


terça-feira, 17 de dezembro de 2019

Educadores, tremei! - Eliane Cantanhêde

O Estado de S.Paulo


A TV Escola vai acabar ou virar veículo de propaganda da extrema direita?
O ano vai terminando, mas o presidente Jair Bolsonaro parecer disposto a atrair chuvas e trovoadas e causar marola até o último dia, o último minuto. Xingar o patrono da Educação brasileira de “energúmeno”? Acusar a TV Escola de ser esquerdista e “deseducar”? É, no mínimo, chocante.  Energúmeno significa endemoniado, possuído, mas costuma ser usado para denegrir a imagem de alguém como idiota, louco, bobo, às vezes fanático e exaltado. Quem, em sã consciência, pode achar que Paulo Freire é merecedor de algum desses adjetivos? Um homem que dedicou a vida à educação, sonhou e trabalhou pela igualdade, pelos direitos dos mais desvalidos, pela consciência coletiva de que, sem condições iguais na largada, ou na infância, o Brasil jamais será um país igual para todos.

Fica ainda mais trágico quando quem chama Paulo Freire de endemoniado enaltece demônios como Pinochet, Stroessner, Brilhante Ustra. Freire lutou pela vida, pelo bem. Os ídolos do presidente geraram morte, tortura, desaparecimentos, destroçando vidas e famílias cruelmente. Nada anda na educação, que acaba de perder mais um ano e acumula déficits há décadas (inclusive porque jogaram fora os princípios e métodos de Paulo Freire). Veio o patético Vélez Rodriguez, que demorou, mas caiu. Veio o performático Abraham Weintraub, que está demorando e, segundo Bolsonaro, não vai cair. E a política para o ensino básico, o ensino médio, o ensino superior? Ninguém sabe, ninguém viu. No MEC, o foco está em ideologia.

Só se ouve um ministro mandar professores e alunos decorarem e entoarem o slogan de campanha do presidente da República e o outro acusar as universidades de só servirem para “balbúrdia” e plantação de maconha, enquanto imita Gene Kelly num vídeo, faz palhaçadas em outro, ataca todo mundo e não perdoa nem Paulo Guedes.  E por que o presidente Bolsonaro avisa que não vai demitir ministro nenhum e classifica Weintraub como “excelente”? Provavelmente porque o ministro da Educação participa de um amplo plano político para 2020, quando haverá eleições municipais.

Sem partido, depois de abandonar o PSL e os laranjais, Bolsonaro pode não ter condições para viabilizar o Aliança pelo Brasil a tempo de concorrer a prefeituras e câmaras legislativas. Logo, ele precisa de um plano B para eleger os futuros militantes da nova sigla. A campanha maciça pela internet, tão eficaz na eleição de 2018, tende a ser de novo importante, mas não tão determinante em 2020. Eleição municipal exige presença, cara, voz, líder local. E onde se encontram esses fatores de campanha? No caso de Bolsonaro e de seu futuro partido, nos templos evangélicos e nas escolas. Sempre haverá pastores, pais e professores prontos a acreditar que “ser de direita” é ser isso aí
contra a igualdade, a educação inclusiva, o respeito às diferenças, os direitos das minorias. [igualdade em exagero prejudica - citando regra comum = igualdade para todos, mas, respeitando as desigualdades; 
educação inclusiva é eufemismo para agredir a moral, deseducar nossas crianças, disseminação da imoralidade;
respeito as diferenças, tem que ser limitado e sem contrariar a natureza;
direitos para as minorias, estão se tornando excessivos, cassando os direitos das maiorias.]

Enquanto xinga Paulo Freire e promove quem xinga Fernanda Montenegro, Bolsonaro fecha a TV Escola com um pretexto daqui, outro dali, mas no fundo por um único motivo: ele acha, ou foi convencido de que ali só tinha esquerdista.  A TV Escola, porém, não era de esquerda e era muito importante para divulgação de métodos, técnicas e informações relevantes para um nicho específico: professores e estudantes. Com o perfil institucional, não seria justo exigir que competisse com TVs comerciais, mas tinha boa audiência, maior do que a TV Câmara e a TV Senado.

Agora, não se sabe o que é pior: fechar a TV Escola pura e simplesmente ou transformá-la num instrumento de propagação em massa de ideologias conservadoras e virulentas. Ela não era de esquerda, mas pode vir a ser de extrema direita. [mudanças com tendência ao conservadorismo estão se impondo por todo o mundo e o governo do presidente Bolsonaro tem o DEVER de extirpar a ideologia esquerdista e todos os seus procedimentos malévolos.
Gostem ou não o mundo está se tornando conservador.]

Eliane Cantanhêde, colunista - O Estado de S. Paulo

quarta-feira, 20 de novembro de 2019

E assim (não) vai a AL - Carlos Alberto Sardenberg

Depois de anos na fila, a esquerda ganhou no México com Andrés Manuel Lopez Obrador Amlo, como se apresenta – e que prometeu crescimento anual de 4%, simplesmente o “dobro do período liberal”. Passado um ano de governo, o crescimento do PIB se arrasta perto de zero, com baixa perspectiva de aceleração.

Pode-se dizer que um ano é muito pouco e que o mundo todo está desacelerado. Verdades, mas ocorre que Amlo não apresentou nada de novo, nenhuma virada. Cortou mordomias e salários de funcionários, inclusive dele próprio, cancelou obras que achou muito caras, sem qualquer base em números, e tocou o barco. Cancelou leilões de petróleo, mas a melhor esperança de algum crescimento de base está justamente na maturação dos investimentos em campos leiloados no governo anterior.
Nada na corrupção, e especialmente nada no combate ao narcotráfico, que se tornou ainda maior e mais violento.

Já no Uruguai, pode acontecer o contrário. A Esquerdista Frente Ampla, no governo nos últimos 15 anos, está perto de perder as eleições de 24 próximo. O candidato de centro-direita, Luis Lacalle Pou, lidera as pesquisas de segundo turno.  O problema da Frente é também o baixo crescimento. Como toda América Latina, o Uruguai pegou o boom das commodities, chegou a ter uma expansão de 8% do PIB em 2010. Acabada a festa, desacelerou forte e neste ano está crescendo menos de 1%. Tem um baita déficit nas contas públicas.

Na Argentina, outra inversão. Depois de apenas quatro anos de centro-direita liberal, volta o peronismo, protagonista de um dos maiores desastres econômicos de todos os tempos. Conseguiu empobrecer um país que estava entre os mais ricos do mundo no século passado.
Na Bolívia, também passado o boom das commodities, o país desacelerou, vai devagar, o que retirou a popularidade e a força política de Evo Morales.
No Chile, ao contrário, é um governo de centro-direita que está em apuros. Mas é preciso notar a população contesta uma política econômica que era quase uma unanimidade. Depois de Pinochet, direita e esquerda alternaram-se no poder e o país manteve o mesmo curso – por sinal bem sucedido.

Números: iniciada a década de 90, a Venezuela tinha um Pib per capita, no método de Paridade de Poder de Compra, de US$ 8.500; Brasil, 7.500; e Chile, 7.000. Fechadas as contas de 2018, o Chile apresentava PIB per capita de quase rico, US$ 26 mil, expansão de quase quatro vezes; o Brasil tinha US$ 16,1 mil (dobrando em relação em 90) e a Venezuela mal alcançava os US$ 11 mil. De certo modo, a bronca dos chilenos é de uma classe média que, passado o boom das commodities, sente os efeitos da desaceleração do crescimento e da renda. O país vai melhor que a média latino-americana – expansão anual em torno de 2% – mas não resolveu a questão clássica da região: desigualdade.

O que FHC disse uma vez a respeito do Brasil, se aplica ao Chile de hoje: não é um país pobre, mas tem muitos pobres. Quem visita a AL regularmente percebe que há muitas coisas melhores no Chile: economia mais eficiente, alguma inovação, organização, menos corrupção, democracia eleitoral mais consistente. Mas, tudo considerado, falta o que falta a toda América Latina: um capitalismo dinâmico, com um setor privado gerador de riqueza para a maioria da população, indústrias de ponta, inovadoras, máquinas exportadoras de bens de alto valor agregado, escolas de primeira. E um setor público muito ativo para remover as falhas de mercado e promover distribuição de renda via impostos, ricos pagando mais, todos recebendo mais serviços.

Falta o que um estudo do FMI chamou de Política de Tecnologia e Inovação, que arranca o país e o coloca no grupo de alta renda, de modo permanente. Exemplos ao longo dos séculos: Estados Unidos, Alemanha, Japão, Hong Kong, Cingapura e Coréia do Sul, o campeão mais recente.
A AL continua apresentando níveis de crescimento sempre inferiores ao dos asiáticos, não produziu nenhum verdadeiro milagre econômico. Nem conseguiu se livrar do capitalismo de amigos, aquele dos empresários amigos do governo. A Lava Jato pegou esse pessoal em toda a AL, mas parece que se está perdendo embalo até nisso.

Carlos Alberto Sardenberg, jornalista - Transcrito em 20 novembro 2019 

 

segunda-feira, 18 de novembro de 2019

O primeiro ano do governo Bolsonaro - Valor Econômico

Luiz Carlos Mendonça de Barros

O aumento da arrecadação e o controle estrito do orçamento devem reduzir bastante o déficit e gerar,  mais à frente, o tão esperado superávit

O primeiro ano do governo Bolsonaro se aproxima do fim com sinais de que poderá ser mais exitoso do que muitos previam no início de seu mandato. Depois de 30 anos em que nos acostumamos a um padrão de cooperação entre o Executivo e o Legislativo para levar adiante o plano de governo, a forma de governar de Bolsonaro foi um choque para a grande maioria dos analistas. A relação quase conflituosa do Planalto com o Legislativo foi lida muito cedo como um caminho direto para crises constantes e uma paralisia das ações do governo em um momento de crise econômica grave e da necessidade de reformas importantes. A falta de uma base política estruturada para aprová-las seria o caminho natural para tal situação.

Além disto, o jeito tosco e truculento do presidente ao comunicar para a sociedade alguns de seus valores ideológicos criou um mal-estar na elite do país e na mídia. Citaria ainda como origem deste desconforto inicial, certo radicalismo do todo poderoso ministro Paulo Guedes na defesa de seus planos para a economia. Dizia ele que estava tudo errado e que seria preciso uma verdadeira revolução liberal na busca de um estado mínimo na relação com a sociedade. Alguns símbolos importantes da ação social do Estado brasileiro, como a Zona Franca de Manaus, teriam que ser sacrificados ao longo do caminho de uma reforma fiscal radical.

Mas o que vimos ao longo deste ano foi uma adaptação pragmática progressiva de vários atores a esta nova forma de governar, com o Legislativo ampliando seu espaço de ação política para buscar não um conflito sistêmico com o Executivo, mas um trabalho conjunto para construção de uma agenda comum para o país. O melhor exemplo desta nova forma de governar foi o desenho a quatro mãos da PEC da reforma da Previdência e, posteriormente, sua aprovação, em dois turnos, nos plenários da Câmara dos Deputados e do Senado Federal.

Neste processo despontou Rodrigo Maia como uma liderança política do Legislativo capaz de articular junto a seus pares as ações do Executivo, tornando funcional esta nova forma de governar do presidente Bolsonaro. E com o tempo, e principalmente com os conflitos que viveu, Paulo Guedes aprendeu os limites de seu poder e a necessidade da negociação política com os representantes eleitos pelo povo para viabilizar sua agenda liberal.

Neste choque de realidade, sua própria vontade revolucionária foi domada, como indica sua foto em Manaus declarando enterrado o projeto de acabar com a Zona Franca. A crise social no Chile - e a convocação de uma Assembleia para modificar a Constituição outorgada pela ditadura Pinochet - também veio a tempo para moderar os anseios do ministro da Economia nas suas negociações com o Congresso, facilitando o processo de aprovação das reformas liberais necessárias para o Brasil.

Uma fotografia interessante da avaliação do governo Bolsonaro neste final de primeiro ano pode ser encontrada na pesquisa de opinião mensal do Ipesp e da corretora de valores XP relativa a novembro. Apesar de ser realizada por telefone, a sua repetição mensal nos dá um quadro evolutivo a ser visto com confiança pelo analista. Hoje para 39% dos entrevistados o governo Bolsonaro é ruim ou péssimo. Por outro lado, 32 % o avaliam como ótimo ou bom e 25% como regular, somando 57% dos entrevistados que, segundo o critério europeu de avaliação de mandatários no poder, apoiam o governo do presidente.

A mesma pesquisa mostra que Bolsonaro poderá ter em 2022, no final de seu mandato, 45% de ótimo e bom e 16% de regular, somando 61% de apoio. Os que acreditam que seu governo será ruim ou péssimo chegam a 32% dos entrevistados. Esta é uma medida, ainda que precária, do resultado das eleições de 2022.

No segundo ano de seu governo o presidente Bolsonaro deve encontrar um cenário bem mais favorável na economia, o que poderá facilitar o enfrentamento da questão fiscal. Um grande número de analistas de mercado já trabalha com uma previsão de crescimento do PIB da ordem de 2,5% em 2020. Neste cenário, o aumento da arrecadação de impostos, que acontecerá naturalmente, e um controle estrito do orçamento como vem sendo feito, deve reduzir bastante o déficit primário e gerar, mais à frente, o tão esperado superávit. Por outro lado, a nova estrutura a termo dos juros vai permitir inverter a curva de crescimento da dívida pública federal bruta. 

Se este cenário realmente ocorrer o governo terá um tempo maior para aprovar no Congresso as PECs que devem tratar da questão das despesas obrigatórias estabelecidas na Constituição. Estas medidas são necessárias para permitir que ocorra, com possibilidade de sucesso, a discussão de uma reforma tributária que realmente abra espaço para uma mudança em nossa estrutura de impostos e a tão necessária redução da carga tributária que onera hoje as empresas brasileiras. O cenário descrito mostra uma oportunidade que não pode ser perdida pela sociedade brasileira depois de tantos anos de crise e sofrimentos.
 
Luiz Carlos Mendonça de Barros, engenheiro, ex-presidente do BNDES e ex-ministro das Comunicações - Valor Econômico


domingo, 3 de novembro de 2019

Aos ‘tresloucados e malucos’ - O Estado de S.Paulo

Eliane Cantanhêde

Os militares não embarcam no AI-5 e no ‘Três Oitão’ dos Bolsonaro

Em entrevista ao Estado, em dezembro de 2016, o então comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, me contou que “tresloucados e malucos” batiam às portas das Forças Armadas pedindo a volta dos militares ao poder e que, de pronto, ele advertia que algo assim tinha “chance zero”. Três anos depois, porém, o clã Bolsonaro arrepia o País com sua apologia a ditaduras.

Villas Bôas relatou que respondia com o artigo 142 da Constituição àquela versão atualizada das “vivandeiras alvoroçadas” que, segundo o marechal Castello Branco, primeiro presidente do regime de 1964, exigiam “extravagâncias” do Poder Militar. Por esse artigo, as Forças Armadas “destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem”.

Boa lembrança, já que o capitão da reserva Jair Bolsonaro nem completou um ano de mandato e seu filho Eduardo, deputado federal e quase embaixador (em Washington!), choca o País inteiro ao defender a volta do demoníaco AI-5, enquanto o presidente, como informa o repórter Renato Onofre, costura sua filiação ao ainda em gestação Partido Militar Brasileiro. Assim, o novo partido embolaria perigosamente o presidente da República com militares, policiais, a bancada da bala e “tresloucados e malucos” de diversas espécies. E sob o número 38, em referência ao revólver mais conhecido, principalmente entre os bandidos, no bang-bang nacional. O presidente no “três oitão”...

Eduardo Bolsonaro uniu o País inteiro, da esquerda à direita, do PT de Lula ao PSC do Pastor Everaldo, ao defender a volta do demoníaco AI-5. Para o pai Jair, quem fala uma coisa dessas está “sonhando, sonhando, sonhando”. Há quem sonhe com o paraíso, ganhar na loteria, a casa própria ou um bom prato de comida. Fazer apologia a ditaduras não é sonho, é pesadelo — além de crime. [para evitar muitas prisões, gostaríamos que alguém informasse qual artigo e qual lei tipifica o crime de apologia à ditadura?
 
Lembramos que tipificar não é interpretar determinado dispositivo de uma lei como seria nosso desejo  - aí seria uma tipificação legiferante, por enquanto, restrita aos ministros do Supremo, mesmo assim atividade inconstitucional, visto que o STF ainda não fez uma interpretação criativa do texto constitucional que determina a independência e harmonia dos 3 Poderes o texto vigente deixa claro a regra no popular: 'cada poder no seu quadrado'.]

Só não é novidade no clã Bolsonaro, já que o patriarca saiu pela porta dos fundos do Exército após ser acusado de planejar explodir quartéis, passou três décadas no Congresso defendendo ditadores, torturadores, censura e dedicou seu voto a favor do impeachment de Dilma Rousseff a Brilhante Ustra, a estrela dos livros sobre tortura no Brasil. Já eleito presidente, Bolsonaro chocou o Paraguai ao elogiar Stroessner e irritou o Chile duas vezes: com loas ao igualmente sanguinário Pinochet e depois atacando o pai da ex-presidente Michelle Bachelet, morto sob tortura. Até o atual presidente Sebastián Piñera reagiu.

Foi assim que Bolsonaro criou os filhos. Eduardo já tinha feito a bravata infantil de que, para fechar o Supremo, bastam um cabo e um soldado. Carlos lidera uma guerra insana pela internet contra tudo e todos. Flávio mantém relações complexas com ex-policiais de má fama no Rio. Perguntei a um oficial muito entrosado com as três Forças como militares reagiam à fala sobre o AI-5 e ele: “Rindo. Só rindo de um absurdo desses”. E disse que “nunca” haverá um partido militar, incompatível com a missão constitucional das Forças Armadas e um retrocesso gravíssimo no longo processo de profissionalização e descontaminação dos quartéis. [nada impede que qualquer cidadão funde um Partido Militar - mesmo que venham a impedir que militares da ativa se filiem, militares da reservar e civis podem se filiar e colocar no 'estatuto do partido' a defesa da filosofia militar, do ideário militar.]

A manifestação do oficial está perfeitamente de acordo com o que me disse naquela entrevista o brilhante general Villas Bôas, ao descartar aventuras golpistas e apelos de vivandeiras: “Nós aprendemos a lição. Estamos escaldados”. Só que o presidente e seus filhos talvez não. A Câmara, por corporativismo ou preguiça, apenas advertiu o deputado Jair, que em 1999 queria fechar o Congresso, disse que “o erro do regime militar foi (só) torturar, não matar” e lamentou que o então presidente Fernando Henrique não tivesse sido fuzilado. Parecia só bravata e, impune, Jair acabou presidente. Como a Câmara vai reagir agora ao deputado Eduardo? [nada fazendo, absolutamente nada;
o deputado Eduardo Bolsonaro não cometeu nenhum crime, não pratico nenhum ato antiético e não feriu o decoro parlamentar.]

Eliane Cantanhêde - O Estado de S. Paulo