Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador Abrolhos. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Abrolhos. Mostrar todas as postagens

sexta-feira, 10 de julho de 2020

Missão impossível - Eliane Cantanhêde

O Estado de S.Paulo

Difícil convencer investidores de boas ações e intenções do Brasil no meio ambiente

Com Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Ricardo Salles (Meio Ambiente) sentados à mesa e deitando falação, como os investidores internacionais podem acreditar em boas intenções e ações do Brasil na defesa da Amazônia e das comunidades indígenas? Araújo ironiza a defesa do ambiente como “climatismo”, “coisa da esquerda”. Salles sofre uma repulsa geral por só pensar em “passar a boiada”. E o presidente Jair Bolsonaro acha tudo isso uma bobajada que atravanca o progresso.

[Missão Impossível,  ao que tudo indica, é convencer muitos brasileiros do BEM dos reais objetivos das ONGs, ativistas e investidores (fundos) gafanhotos escondem embaixo do falso interesse pela preservação do Meio Ambiente do Brasil - destruíram o deles e agora querem preservar o do Brasil... e tem muitos de boa fé que acreditam, apesar da maioria buscar apenas o dinheiro fácil em troca da SOBERANIA  do BRASIL = .]

Assim, há dúvidas quanto ao resultado da reunião de ontem do vice Hamilton Mourão, Tereza Cristina (Agricultura), Araújo e Salles com grandes investidores. No mundo de hoje, que governos, empresas e financiadores arriscam suas marcas apostando em países que desmatam, queimam, desrespeitam comunidades ancestrais?  (E cultura, educação, saúde...) É difícil e constrangedor pedir recursos a estrangeiros (ontem) e ao grande capital nacional (hoje) se... os R$ 33 milhões do Fundo da Amazônia estão mofando no BNDES, só 0,7% dos R$ 60 milhões da Operação Verde BR2 foram usados e o ministro do Meio Ambiente é alvo da Justiça, MP, Ibama, ICMBio e da torcida do Flamengo.

É difícil e constrangedor dizer que vai tudo bem, obrigada, se o desmatamento da Amazônia cresce há 13 meses seguidos e isso significa, como todo o mundo, literalmente, sabe, devastação no ato e queimadas depois. Sem falar de Cerrado, Mata Atlântica e das pujantes riquezas naturais brasileiras, ameaçadas por ideologia, ignorância e achismos. É difícil e constrangedor reclamar de “uma visão distorcida” do mundo sobre o meio ambiente no Brasil, como já reclamou Bolsonaro na reunião do Mercosul, já que é o próprio presidente que manda os fiscais do Ibama descumprirem as leis e deixar os desmatadores em paz.

É difícil e constrangedor, também, explicar que Bolsonaro esperou se eleger presidente para punir o fiscal do Ibama que o multou por pescar em área proibida, demitiu o presidente do Inpe porque não aceitava os dados do desmatamento, [o presidente do Inpe foi demitido por indisciplina, total desrespeito ao presidente da República - a exemplo daquele ministro palanqueiro que o presidente Bolsonaro demitir do MS.] tem ideias apavorantes para Abrolhos, Angra dos Reis e Fernando de Noronha e orienta seu governo a “passar a boiada” – como disse Salles na reunião de 22 de abril, referindo-se a leis e regras flexibilizando a proteção ambiental.

É difícil e constrangedor, ainda, jurar de pés juntos para o grande capital nacional e estrangeiro que o governo brasileiro se preocupa realmente com as comunidades indígenas e quilombolas, se o presidente acaba de vetar medidas de preservação da vida e das reservas, como fornecimento de água potável, cestas básicas e itens de higiene durante a pandemia. Argumento: a lei aprovada no Congresso não especificou as fontes de recursos? Ah, bem! Tudo explicado.

Por fim, é difícil e constrangedor explicar a proposta para escancarar as reservas indígenas para todo o tipo de exploração – mineral, agrícola, pecuária, até turística. Tudo isso, porém, pode ser explicado com uma única frase, do então ministro da Educação na histórica reunião ministerial de 22 de abril: “Odeio o termo ‘povos indígenas’, odeio esse termo. Odeio o povo cigano. Quer, quer, não quer, sai de ré”. Deveras educativo.

Só não é difícil, apesar de profundamente constrangedor, ver a imagem do Brasil esturricando pelo mundo afora, alvo de perplexidade de líderes democráticos, sociedades, parlamentos, empresas, mídia, chargistas e organismos internacionais. O “soft power” construído ao longo de décadas vira pó, deixando uma triste pergunta no ar: quanto tempo vai demorar para nosso País recuperar, não apenas investimentos e boa vontade do capital internacional, mas sobretudo a imagem, credibilidade e simpatia de todo o mundo?

Eliane Cantanhêde, jornalista - O Estado de S. Paulo


segunda-feira, 4 de novembro de 2019

A política como um pesadelo - Fernando Gabeira

Será que o porteiro realmente viu um dos assassinos procurando por Bolsonaro, que nesse dia estava em Brasília?

Enquanto a mancha se desloca para o Sul e ameaça Abrolhos, já não sei mais se a espero no Rio ou vou ao seu encontro. De qualquer forma, tento manter o foco no desastre ambiental enquanto as loucuras na política se desdobram num ritmo vertiginoso.
No princípio da semana, pensei em dedicar as horas vagas a pensar na questão da linguagem na política, que me surpreende tanto quanto a mancha de óleo. Os deputados do PSL brigam entre si com memes e se insultam usando personagens de história infantil. Se não parasse com as crianças, de vez em quando, não saberia quem é Peppa. Uma das contendoras na luta interna foi chamada de Peppa pelos adversários. Ainda bem que eu já vi as aventuras da porquinha rechonchuda.
Pensei em refletir sobre a nova geração de políticos e como a linguagem da infância ainda está presente no seu imaginário. 

Mudei de eixo à tarde. Vi imagens do depoimento de Alexandre Frota na CPI das Fake News. Ele exibiu cartazes com frases do guru dos Bolsonaro, Olavo de Carvalho. Era tão escandaloso que fiquei tentado a examinar o avanço da linguagem pornográfica no discurso da extrema direita.
Foi então que vi aquele vídeo da hienas cercando o leão Bolsonaro e pensei em voltar ao universo infantil. Não houve tempo. Eduardo Bolsonaro invocou o AI-5, numa entrevista a Leda Nagle. Voltei aos anos 60 e pensei até em mostrar como as coisas mudaram nesse quase meio século. Desisti desse esforço pedagógico. As pessoas que confundem épocas tão díspares não o fazem por ignorância, mas por necessidade. Constroem um enredo mental para o papel que amariam representar. No caso de Eduardo Bolsonaro, é a vontade de reviver a ditadura, com poder absoluto sobre a vida e a liberdade de expressão dos outros. 

Em certas viagens a Ouro Preto, fantasio uma volta ao século XVIII. Mas só por alguns momentos, quando não há carros nem buzina. Há tempos, quando Ronnie Lessa, acusado de matar Marielle Franco, foi preso, achei explosivo o fato de ser vizinho do homem que se tornou presidente da República. Imaginei como isso não daria um roteiro para uma série de televisão. Li que o filho mais novo do presidente namorava a filha do matador. Imaginei as possibilidades clássicas dessa história. 

Vejo surgir agora um novo personagem dramático: o porteiro do condomínio Vivendas da Barra. Ele é o mais antigo dos funcionários, deve conhecer todos os moradores, seus hábitos e relações superficiais. Sua lembrança do dia da morte de Marielle Franco enriqueceu as fantasias sobre a vizinhança de Bolsonaro com Ronnie Lessa, miliciano, matador e comerciante de armas. [lembrança  que surgiu mais de 500 dias após a suposta pergunta]
Será que o porteiro realmente viu um dos assassinos [sic] procurando por Bolsonaro, que nesse dia estava em Brasília? Por que teria anotado o número da casa buscada pelo cúmplice do matador [sic] como se fosse a casa de Bolsonaro? Como pode ter ouvido a voz de seu Jair, sem estar sintonizado com o canal da Câmara dos Deputados, onde Bolsonaro estava naquele momento?

Não vou especular sobre esse mistério, enquanto não ouvir a versão do próprio porteiro. As procuradoras do MP do Rio dizem que ele provavelmente mentiu.
Mas por que um velho e experiente porteiro confundiu duas casas? Para nós que vemos imagens aéreas, elas são todas iguais. Somos traídos pela superficialidade de nossa percepção, como os esnobes que dizem que a caatinga é monótona porque toda a vegetação é igual. 

Para ele, certamente cada uma delas tem uma história, desde o tipo de visitas aos pequenos cuidados cotidianos, instalação elétrica, vazamentos, no sentido literal.
Não entendo como pode ter confundido. Mentiu e enganou? Foi induzido? Sua memória funciona bem ou já dá sinais cotidianos de pequenas confusões? Para um roteirista, é relativamente fácil cobrir essas lacunas. Para mim, no entanto, os tempos são desconcertantes. Volto a perseguir a mancha. Também é desconcertante. Mas pelo menos vejo pessoas reais, com as luvas negras de óleo, tentando limpar as praias, proteger corais e mangues. Desenhos infantis, frases pornográficas, jovens aspirantes a ditador ou mesmo intrincados enredos policiais — tudo é uma espécie de desastre, mas pede outro tipo de voluntariado, equipamento e paciência.
 
Fernando Gabeira, jornalista - O Globo