Blog Prontidão Total NO TWITTER

Blog Prontidão Total NO  TWITTER
SIGA-NOS NO TWITTER
Mostrando postagens com marcador Arcanjo Gabriel. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador Arcanjo Gabriel. Mostrar todas as postagens

sábado, 11 de março de 2023

É permitido roubar - J.R. Guzzo

J. R. Guzzo

Se o ministro das Comunicações faz o que fez e sai de uma audiência com o presidente rindo e dizendo que eles nunca se entenderam tão bem, o que se pode esperar do conjunto da obra? [o óbvio:  a solidariedade entre pares] 

Posse de Juscelino Filho, ministro das Comunicações | Foto: Ricardo Stuckert/PR

Posse de Juscelino Filho, ministro das Comunicações | Foto: Ricardo Stuckert/PR  
 
O ministro das Comunicações foi pego em flagrante num dos vícios mais infames a que gente como ele costuma se entregar quando ganha um cargo no governo, ou, melhor dizendo, em governos que não têm sistemas mínimos de controle moral: 
- usou um jato da FAB, com o combustível e demais despesas pagas integralmente por você, para ir a uma exposição de cavalos de raça em São Paulo. É um desaforo grosseiro. 
É também um xeque-mate: não há dúvida nenhuma de que ele fez a viagem, e que viajou num avião da Aeronáutica. 
Não importa que tenha, num tempo qualquer que os cavalos lhe deixaram, mantido umas conversas com diretores de empresas de telecomunicação. E daí? Se tinha mesmo alguma questão de trabalho para tratar, por que não tomou um avião de carreira, por uma fração do preço que custou o jato da FAB? 
O Brasil, segundo o presidente Lula, tem “33 milhões” de pessoas “passando fome” (ou “120 milhões”, segundo sua ministra do Meio Ambiente) e precisaria de cada tostão que tem no cofre para salvar essa multidão de pobres-coitados — mesmo porque diz que não tem dinheiro, e está socando imposto em tudo o que lhe passa pela frente para fazer caixa. Como, então, o ministro sai por aí gastando dinheiro dos mortos-de-fome oficiais, e sabe lá Deus de quem mais, para ver cavalos puro-sangue?

Pois bem: e o que aconteceu com o ministro? Não aconteceu nada, e é aí, bem aí, que está o ovo da cobra: o homem teve um encontro “altamente positivo” com o presidente Lula, explicou a ele as “acusações infundadas” e continua belo e formoso no seu emprego

O ministro, para juntar insulto à injúria, ainda recebeu diárias do Erário para ter um dinheirinho no seu passeio. Desculpou-se dizendo que “o sistema gerou as diárias” — ou seja, o dinheiro apareceu no seu bolso, mas a culpa é do computador. 
Sim, ele disse que devolveu as diárias — mas, então, por que recebeu? Quanto ao resto, o ministro simplesmente não tem desculpa nenhuma, pois são fatos em estado puro; nem o Arcanjo Gabriel conseguiria explicar uma delinquência dessas. 
Também não há explicações para o uso de dinheiro público no asfaltamento da estrada que passa na frente de uma das fazendas de sua família no Maranhão. 
 
Nem para a ideia de ter mandado chips para os índios ianomâmis, ora envolvidos numa crise sanitária aguda, lá no meio do mato — algo tão útil como despachar um saco de gelo para o Polo Norte
Nem, enfim, para seu envolvimento com a nomeação de um funcionário fantasma para os Correios — um cidadão chamado Gaspar, acredite se quiser. Pois bem: e o que aconteceu com o ministro? Não aconteceu nada, e é aí, bem aí, que está o ovo da cobra: o homem teve um encontro “altamente positivo” com o presidente Lula, explicou a ele as “acusações infundadas” e continua belo e formoso no seu emprego.  
Se um negócio desses não dá demissão, o que poderia dar? 
Não há nenhuma razão, é claro, para que ele não faça o mesmo, ou pior, daqui a três dias. A coisa promete.

Passa pela cabeça de alguém que a atual justiça brasileira ou o Supremo Tribunal Federal venham a incomodar qualquer figura do governo Lula por prática de corrupção? [incomodar?quem  é louco? ser preso pela prática de ato antidemocrático? a tática de intimidar possíveis acusadores funcionou e todos temem ser presos.]

O recado de Lula ao ministro é muito claro: “Fica frio. Não vai acontecer nada com você; não vai acontecer nada com ninguém, no meu governo. Pode continuar tocando a sua vida, do seu jeito, de boa. Vão ficar saindo umas notícias aí, mas é tudo bobagem. Daqui a pouco esquecem do seu caso e a coisa volta ao normal. Vai em frente”.  

Se o ministro das Comunicações faz o que fez, continua no emprego e sai de uma audiência com o presidente rindo e dizendo que eles nunca se entenderam tão bem, o que se pode esperar do conjunto da obra? 
A experiência sugere que não se pode esperar nada de bom, ou sequer de razoável.  
Daqui a pouco um outro peixe gordo do governo faz a mesma coisa, e o resultado vai ser o mesmo. 
A ministra do Turismo, por exemplo, tem pelo menos cinco milicianos do Rio de Janeiro na sua intimidade e está metida numa história de gráfica fantasma, mas não larga o osso de jeito nenhum — e Lula não diz para largar. 
Na verdade, está acontecendo o exato contrário do que o presidente anunciou na sua primeira reunião com os ministros. 

Ele disse, ali, que o menor erro de conduta seria castigado na hora; o ministro, ou um outro alto comissário qualquer, flagrado em alguma lambança, seria “gentilmente convidado a sair”. Foi apenas uma palhaçada a mais. Qual a moral de Lula para punir alguém — ele que foi condenado pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, ficou 20 meses na cadeia e só está solto porque foi salvo pela maior aberração jurídica já praticada na história do país? Mais que isso, ou muito mais que isso: passa pela cabeça de alguém que a atual justiça brasileira ou o Supremo Tribunal Federal venham a incomodar qualquer figura do governo Lula por prática de corrupção?  

É uma impossibilidade; não vai acontecer, e todo mundo sabe disso. Os donos do governo têm carta branca do STF para fazerem o que bem entendem, sem qualquer risco de serem processados por alguma coisa algum diae, se por acaso forem, o punido vai ser o juiz.

O fato é que está dando certo para Lula, o PT e a esquerda. Eles sabem que o Brasil de hoje tem dois tipos de lei — um para quem está no governo e um para quem está fora.  
Quem está fora não pode se manifestar na rua, é proibido de divulgar fake news e está sujeito a ser indiciado no inquérito criminal perpétuo do STF sobre “atos antidemocráticos”; se invadir o Palácio do Planalto com bandeira do Brasil e vestindo verde-amarelo, é acusado de “terrorismo”. Quem está dentro pode tomar jato da FAB para ver exposição de cavalo, nomear a mulher para Tribunal de Contas ou mentir, como faz todos os dias o presidente da República, até para dizer que horas são; se invadir com arma na mão uma propriedade rural, destruir o que encontra dentro e agredir com selvageria quem se opõe, é chamado a “negociar” com a justiça, em vez de responder por terrorismo. 
É claro que o cardume de piranhas que foi para o governo aproveita ao máximo que pode a vantagem de ter uma lei só para ele — mais a proteção declarada dos tribunais superiores e do STF. 
 
Por que não aproveitaria? É um arrastão como nunca se viu antes na história deste país. 
Alguém já ouviu falar de algum país minimamente sério do mundo que tenha nada menos que 12 ministros (de um total de 37) respondendo ao mesmo tempo a processos na justiça? 
Pense um pouco no número: não dois ou três, mas 12, de uma vez só. Não conseguiram, num país com 215 milhões de habitantes, encontrar 37 pessoas limpas para o Ministério? 
É melhor nem falar do segundo escalão — ali, o céu é o limite. 
Coisa assim só mesmo nessas ditaduras primitivas que tanto fascinam o presidente Lula — da Venezuela à Nicarágua, é amigo íntimo de todas.
Falam e falam, nesta história miserável do ministro das Comunicações e seus cavalos, de não criar briga com a gangue partidária à que ele está filiado e que dá apoio ao governo. 
O problema seria a necessidade de vida e morte, para Lula, de evitar uma CPI, simples ou mista, sobre as depredações do dia 8 de janeiro em Brasília. 
É um mistério mais escuro que a tumba do faraó: por que raios o governo, que se apresenta como a vítima número 1 dos atos de vandalismo, se nega, desse jeito desesperado, a investigar o que aconteceu? 
Seja como for, o ministro está liberado para novas aventuras; e as CPIs, por mais que o governo queira distância delas, não vão mudar o fato central em tudo isso. É um fato bem simples: Lula e o PT fazem parte e estão sob a proteção integral do partido político mais poderoso que o Brasil já teve em seus 523 anos de história — o consórcio nacional cujo objetivo estratégico é eliminar qualquer possibilidade real de se combater a corrupção neste país. 

Viram com a Operação Lava Jato, anos atrás, o que é uma sociedade onde os poderosos têm de responder por seus atos perante a lei; viram, detestaram e decidiram não permitir nunca mais que essa situação se repita. 

São políticos da esquerda, da direita e do centro, empreiteiros de obras públicas, ministros dos tribunais superiores de justiça, a mídia em geral, empresários piratas, assaltantes do Erário, parasitas da máquina estatal, bilionários que dão golpes contábeis na praça e arruínam seus acionistas etc. etc. etc. Lula é o seu herói. Estão a seu favor em tudo — até quando aumenta o preço da gasolina para socar em cima do consumidor impostos que haviam sido cortados. 

É claro que acham o ministro das Comunicações um bom moço. É claro que só batem palma.

Está assim, com dois meses. Onde vai estar mais à frente?

Leia também “Uma proposta safada”

J. R. Guzzo, colunista - Revista Oeste

 

sábado, 14 de janeiro de 2023

O Brasil da obediência - Revista Oeste

 J. R. Guzzo

Governo e Supremo disparam um ataque sem precedentes ao conjunto de leis em vigor no Brasil, aos direitos civis do cidadão e às liberdades públicas

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, governadores e autoridades cruzam a Praça dos Três Poderes para visitar as instalações da sede do Supremo Tribunal Federal (STF) um dia após atos que depredaram a sede do tribunal, o Congresso e o Palácio do Planalto | Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, governadores e autoridades cruzam a Praça dos Três Poderes para visitar as instalações da sede do Supremo Tribunal Federal (STF) um dia após atos que depredaram a sede do tribunal, o Congresso e o Palácio do Planalto - Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/ Agência Brasil 

O Brasil não teve uma mudança de governo no dia 1º de janeiro de 2023está tendo, pelo que mostra a observação dos fatos, uma mudança de regime. Em apenas uma semana, a nova gestão do presidente Lula tinha 1.500 presos num ginásio de esportes em Brasília — nunca houve isso em nenhuma ditadura brasileira do passado, e com cenas que lembram o Estádio Nacional de Santiago do Chile no golpe do general Pinochet. Foi decretada intervenção federal em Brasília. O governador, eleito três meses atrás já no primeiro turno, foi deposto do cargo por três meses. 

Já existe, antes mesmo do novo Congresso entrar em funcionamento, uma CPI pronta para fazer acusações criminais contra adversários do governo. Foi convocada a Brasília a Força Nacional de Segurança, um grupo extraído das polícias militares para atuar em locais onde não há presença policial regular — convocada para Brasília, uma das cidades mais policiadas do país. 

Há um pedido de extradição, sem base legal, contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, que teve de internar-se no hospital dos Estados Unidos para cuidar de efeitos da facada que quase o matou em 2018. 
Apareceram até tanques de guerra nas ruas da capital, depois que tinham acabado a invasão e a depredação do Congresso, do Supremo e do Palácio do Planalto no domingo dia 8 de janeiro.
crimes manifestantes embaixador
Ginásio da PF ficou lotado com manifestantes que estavam em 
acampamento | Foto: Reprodução/Twitter
A eleição de Lula, ao que parece, não foi suficiente; vê-se agora que foi um passo, entre outros, para a formação de um Brasil sem oposição real. Está em execução neste momento um projeto que pretende manter o país sob o controle de uma coligação entre o STF e o Executivo, através do Ministério da Justiça e do restante do aparelho de repressão do Estado. A situação de ilegalidade que tem estado em vigor nos últimos anos por ação do Poder Judiciário, e que levou Lula de volta à presidência da República depois de suas condenações por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, está sendo confirmada — em vez de um retorno à normalidade após as eleições, que terminaram exatamente com o resultado que queriam, o governo e o Supremo disparam agora um ataque sem precedentes ao conjunto de leis em vigor no Brasil, aos direitos civis do cidadão e às liberdades públicas. 
E a “pacificação” do país, que Lula pregou durante toda a sua campanha eleitoral? Não existe, simplesmente.  
O que existe é o contrário da paz: prisões em massa, ameaça de processar penalmente milhares de pessoas, censura nas redes sociais e mais todo um arsenal repressivo de multas, bloqueio de contas bancárias e intimações para depor na Polícia Federal.

A eleição de Lula, ao que parece, não foi suficiente; vê-se agora que foi um passo, entre outros, para a formação de um Brasil sem oposição real

A Lei Maior do Brasil, na prática, não é mais a Constituição Federal de 1988 é o inquérito perpétuo, sem limites e ilegal que o ministro Alexandre Moraes conduz há mais de três anos para punir o que ele, a esquerda e a mídia chamam de “atos antidemocráticos” e “desinformação”, crimes que não existem na legislação brasileira — não, certamente, da forma como são apresentados, e não com a finalidade de fazer perseguição política. Este inquérito, em violação a toda legislação brasileira, não tem data para ser encerrado. É conduzido em sigilo. 
 Não está livremente aberto aos advogados dos indiciados. 
Toma decisões sem o indispensável processo que as leis exigem. 
Acusa, investiga, condena e aplica punições tudo ao mesmo tempo, e segundo a vontade de uma pessoa só, o ministro Moraes. 
Não está sujeito a nenhum recurso, ou a qualquer tipo de apreciação superior. 
Não toma conhecimento da existência do Ministério Público, único órgão do Estado brasileiro autorizado por lei a acusar alguém neste país. 
É o Ato 5 do regime de exceção que está sendo imposto ao país neste momento.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os presidentes da Câmara
dos Deputados, Arthur Lira, e do Senado Federal em exercício,
Veneziano Vital do Rêgo, governadores e governadoras dos 26
estados e do Distrito Federal se reúnem em Brasília (9/1/2023) -
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ - Agência Brasil

Como um presidente que prometia há pouco um “Brasil Feliz”, a “volta” da “democracia” e o “fim da ditadura de direita” pode acabar a sua primeira semana de governo com 1.500 pessoas presas numa espécie de campo de concentração em Brasília?  
A face verdadeira da “nova ordem” é essa que está se vendo aí. 
Sua prioridade não é começar uma administração diferente da anterior, executar um plano de governo, ou cumprir compromissos de campanha é eliminar o outro lado, e trocar o Estado de Direito pela força policial em que se transformou o STF no Brasil de hoje.  
O Sistema Lula, com o apoio ativo do Supremo, não está propondo um confronto político com os adversários, ou uma disputa legítima com a oposição — está numa ação de vingança, ou de profilaxia. 
Desde o dia 1º de janeiro está deixando claro que o seu programa de governo começa com a eliminação dos “inimigos”, ou quem está contra; vai se fazer tudo, digam o que disserem as leis, para garantir que o “outro lado” não volte nunca mais a existir politicamente na vida nacional. 
Não há, por parte do presidente e das forças que o apoiam, nenhum gesto de conciliação. Ao contrário, o recado é: “Vocês vão ser presos, multados, censurados. Suas contas no banco vão ser bloqueadas. Vocês não vão poder exercer livremente suas atividades. Vocês vão perder o emprego”.

Não há terroristas que levam cadeirinhas de praia para cometer atos de terror — terrorista joga bomba, mata gente e explode estação de trem; golpista não dá golpe de estado sem tropa, canhão e comando militar. Mas dois erros, se efetivamente houve dois erros, não fazem um acerto — e se houve mais culpados a única saída é punir a todos por igual

Não se trata de uma suposição. “As prisões não são uma colônia de férias para golpistas”, afirmou o ministro Alexandre de Moraes, do STF, ao comentar as observações de que estaria havendo tratamento desumano para os presos de Brasília. Disse, também, que “não se pode tratar de forma civilizada” os acusados e que “não haverá apaziguamento” com os que ele acusa de serem “golpistas”, ou “terroristas” na linguagem oficial do regime em implantação termo adotado de imediato pelo consórcio da mídia para se referir aos presos ou, mais geralmente, aos manifestantes que vêm se reunindo em frente aos quartéis para contestar o resultado da eleição presidencial.  

“O tempo das prisões em flagrante já passou”, disse o novo ministro da Justiça. “Agora as prisões devem ser preventivas e temporárias.” Ou seja: o governo deu a si próprio autorização para prender cidadãos com base naquilo que julgar como conduta criminosa. É um retrato preciso de um governo que tinha como prioridades, no discurso de campanha, “humanizar as penitenciárias” e “desencarcerar” os criminosos.

O presente surto de repressão vem em seguida à invasão dos edifícios dos Três Poderes, por parte de manifestantes que estavam em Brasília protestando contra o resultado da eleição presidencial e pedindo “intervenção militar”, ou que vieram para a capital no fim de semana com o propósito específico de promover a baderna. Tanto faz se são uma coisa ou outra, ou se havia marginais infiltrados entre eles com objetivos políticos.  
Não importa se as invasões foram feitas pela direita, a esquerda ou o Arcanjo Gabriel o que se fez foi crime, e não há desculpas, atenuantes ou justificativas para os crimes cometidos. 
A lei proíbe a violência e a destruição de patrimônio público; é errado em qualquer circunstância, e não hámas” ou “veja bemque se apliquem ao que houve. O episódio todo, é verdade, está marcado por mistérios que com certeza nunca serão esclarecidos. 
Não se entende por que, sabendo que haveria protestos em Brasília, nenhuma autoridade pública fez absolutamente nada para proteger os prédios invadidos. 
 
Também não há explicação plausível para que, com toda a sua estrutura de segurança, os órgãos do governo tenham permitido que os autores das invasões destruíssem livremente, durante três horas seguidas, os edifícios que foram atacados. 
Não ficou claro como Lula, em suas primeiras palavras sobre o episódio, tinha pronto, já datilografado e ao alcance da mão, o decreto de intervenção no Distrito Federal.  
É incompreensível, também, por que manifestantes que protestam há 70 dias, sem causar o mínimo incidente em qualquer ponto do Brasil, tenham enlouquecido de repente. Não há terroristas que levam cadeirinhas de praia para cometer atos de terror terrorista joga bomba, mata gente e explode estação de trem; golpista não dá golpe de estado sem tropa, canhão e comando militar. Mas dois erros, se efetivamente houve dois erros, não fazem um acerto — e se houve mais culpados a única saída é punir a todos por igual.

O problema está no tipo, na extensão e nas intenções da retaliação lançada pela máquina oficial.  
Está, também, na igualdade de critérios se as violências de Brasília têm de ser tratadas com base na legalidade, a violação permanente da lei por parte do inquérito ilegal do STF e a descida do governo para a repressão também não deveriam ser aceitas e tratadas como “defesa da democracia”. O artigo 359 do Código Penal, que substitui a extinta Lei de Segurança Nacional, pune como crime a tentativa, através de “violência ou grave ameaça”, de abolir o Estado democrático de direito ou depor o governo legitimamente constituído. 
Não é prevista qualquer outra hipótese para a prática desses delitos — e, em qualquer caso, a punição tem de obedecer a devido processo legal, com garantias para os acusados, pleno acesso aos autos por parte dos advogados e procedimentos públicos. 
 
Até as invasões de Brasília não houve violência ou grave ameaça a nada e a ninguém — e, apesar disso, cidadãos têm sido presos, multados ou perseguidos com a acusação de cometerem “atos antidemocráticos”, até por conversarem no WhatsApp. E agora? Vai ficar pior? 
Importa, mais que tudo, o ataque às liberdades — e a montagem de um país sem dissidências, sem o direito de se manifestar em público e sem oposição de verdade. Se qualquer brasileiro pode ser acusado de cometer “atos antidemocráticos”, “desinformação” e outros crimes não previstos na lei, não existe liberdade política efetiva neste país.  
O que o Sistema Lula-STF está dizendo, na prática, é que não será tolerado um país que não preste obediência ao governo — e no qual a oposição, como em estádio de futebol, tem de ficar como a arquibancada que vaia o juiz, mas não influi em nada no resultado.  
José Dirceu, uma das estrelas do PT, já disse que ganhar eleição não tem nada a ver com ganhar o poder. Deve ser isso.

Leia também “Ditadura em construção”

J. R. Guzzo, colunista - Revista Oeste