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sexta-feira, 23 de agosto de 2019

Lei da Anistia, 40 anos: lembrar ou esquecer a ditadura? - Valor Econômico

Por Helena Celestino - Eu & Fim de Semana 

[o Brasil não pode ficar desperdiçando recursos públicos para lembrar maus brasileiros - guerrilheiros, terroristas e traidores - que DEVEM SER ESQUECIDOS.] 

A Anistia ainda é uma obra em construção. Após 40 anos de aprovada a lei que abriu as portas da cadeia para a maioria dos presos políticos e permitiu a volta de exilados ou banidos pela ditadura militar, duas narrativas ainda marcam o debate político sobre a herança dos anos de ditadura. Desde que o então presidente João Figueiredo (1918-1999) enviou o projeto de Lei da Anistia em 1979 para o Congresso, numa tentativa de garantir uma transição segura do regime militar para um governo civil, acirrou nas ruas e nos corredores do poder o enfrentamento entre duas visões de futuro.

Para construir uma sociedade democrática, a Anistia deveria levar ao perdão e ao esquecimento do passado ou teria de estar associada à justiça e à memória? "Esta divisão está relacionada com a maneira que a sociedade brasileira lidou e ainda lida com as feridas da ditadura", diz Carla Simone Rodeghero, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Nada mais atual. Há duas semanas, o embate estava mais uma vez estampado nos jornais. A ministra Damares Alves proibiu a finalização de um dos poucos lugares de memória desse passado, um prédio do Memorial da Anistia, em Belo Horizonte, que começou a ser construído há dez anos, já custou R$ 12 milhões, mas, por decisão do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, terá outro destino. "Não temos dinheiro para isso. Com o acervo e a memória a gente vê depois o que fazer", disse, ao inspecionar a obra.

No dia seguinte, pela primeira vez, um agente da ditadura virou réu por estupro e violências contra a ex-presa política Inês Etienne Romeu: dois desembargadores consideraram que o sargento reformado do Exército Antonio Waneir Pinheiro Lima cometeu crimes contra a humanidade, não abrangidos pela Anistia. [virar 'réu não significa que é culpado, portanto o sargento será absolvido devido a acusação não se sustentar;
aliás, esse negócio de crimes contra a humanidade é uma teoria posterior à Lei de Anistia e que até hoje, apesar das tentativas de familiares e advogados de maus brasileiros, não colou. 
Todos os crimes foram alcançados pela LEI DA ANISTIA.] Inês morreu, aos 72 anos, em 2015. Tão perto e tão longe. No longínquo 1975, ainda no governo de Ernesto Geisel (1907-1996), os círculos do poder começavam a discutir a Anistia, mesmo ano em que um grupo de mães e mulheres dos punidos pela ditadura, liderado por Therezinha Zerbini (1928-2015), levantou a bandeira da "conciliação nacional". Foi o primeiro movimento civil institucionalizado na época do regime militar, logo seguido pelos Comitês Brasileiros de Anistia (CBAs): mais politizados, os CBAs começaram timidamente, mas em 1979 já estavam espalhados por todos os Estados brasileiros e por cidades onde viviam exilados na Europa e nos EUA.

Ao aprovar a Anistia, após 14 anos de ditadura, o regime militar cassara o mandato ou suspendera os direitos políticos de 1.088 cidadãos, incluindo três ex-presidentes da República; afastara do serviço público 3.215 civis, entre eles três ministros do Supremo Tribunal Federal e um do Superior Tribunal Federal. Excluíra do serviço ativo 1.387 militares; condenara 11 mil pessoas - 82 com penas superiores a dez anos por assaltos com motivação política -; pusera na cadeia dezenas de milhares de cidadãos. As contas são do Palácio do Planalto e foram citadas em "A Ditadura Acabada", de Elio Gaspari.

A suspensão em 1969 do habeas corpus, princípio do direito para proteção do cidadão contra as arbitrariedades do Estado, devastou uma geração de brasileiros: deixou 434 mortos ou desaparecidos, 7 mil exilados e 20 mil torturados, relatou a Comissão da [IN] Verdade - [CnINv] em 2014. "Os anos de chumbo foram abafados pelo milagre econômico - crescimento de 11,4% entre 68 e 73 - e pela censura. Já no início do governo Figueiredo, a expectativa da Anistia e da abertura política disfarçaram o desastre econômico", escreveu Gaspari. Em 1979, a discussão era em torno da abrangência do "perdão".

Os chamados terroristas, envolvidos em crimes de sangue ou sequestros, estariam fora. A ação de militares e agentes civis do Estado nos porões da ditadura ficaria coberta pela Anistia. Chamava-se isso de reciprocidade. A sociedade rachou: "Não podemos recusar o bom em nome do ótimo", dizia Therezinha Zerbini, a ala conservadora da igreja, os políticos da Arena e do Partido Comunista Brasileiro. "Anistia, ampla, geral e irrestrita", gritavam exilados, ex-presos políticos, dissidentes da Arena, o MDB e sua área de influência.

No dia 28 de agosto de 1979, Figueiredo sancionou a lei, com validade a partir do dia 1º de setembro. Os aeroportos viraram uma festa permanente, com amigos e militantes recebendo os recém-anistiados. O jornalista Fernando Gabeira foi o primeiro a desembarcar. Nas semanas seguintes chegaram os governadores Leonel Brizola (1922-2004) e Miguel Arraes (1916-2005), o secretário-geral do Partido Comunista Brasileiro, Luís Carlos Prestes (1898-1990), e sucessivamente voltaram os exilados, o sucesso daquele "verão da Anistia".

"Apesar de restrita, a Anistia acabou ampla. Combinada com as reduções de pena da Lei de Segurança Nacional, no fim daquele ano não restavam presos políticos no Brasil, com exceção de Teodomiro dos Santos, condenado à morte", diz o historiador e escritor Daniel Aarão Reis, naquela época um anistiado de volta ao Rio.[hoje esse terrorista que assassinou covardemente - entre outros crimes - o sargento Valdir,  da FAB, é juiz aposentado da Justiça do Trabalho, Pernambuco.
Teve a pena de morte comutada e depois foi favorecido pela Lei da Anistia.]

A euforia tomou conta de parte da sociedade, apesar da ruína econômica. As grandes lideranças da oposição e o governo, num pacto silencioso, embargaram a memória. "Brizola cunhou a frase: 'Não vamos olhar pelo espelho retrovisor. Até Lula, que viria a ser preso depois, dizia: 'A abertura está acelerada, não vamos ficar ruminando'", lembra Aarão Reis. "Quando você tem 30 anos, quer olhar para a frente, a criação do PT animava as pessoas e, mesmo os mais experientes como o crítico de arte Mário Pedrosa e o historiador Sérgio Buarque de Holanda, foram participar da criação do partido. Era o novo", diz Jorge Eduardo Saavedra Durão, pesquisador da Fase e na época vice-presidente do CBA do Rio.

Começou assim a transição para a democracia, com revogação do Ato Institucional nº 5 (fase mais dura da ditadura [dura, porém, necessária.] ), o fim da censura à imprensa, a reforma partidária, com velhos e novos atores integrados no cenário politico. Só que o "grande acordo nacional" e a pacificação não se consolidaram. "As greves do ABC, a campanha pelas Diretas descarrilaram os planos de Geisel, do [general] Golbery [do Couto e Silva] e de Figueiredo, mas a transição foi feita em ordem, e os militares salvaram a pele", afirma Aarão Reis.

A "tigrada", como Gaspari define a turma do porão na época da ditadura, atacou: bombas destruíram cem bancas de jornal, cartas com explosivos mataram Lyda Monteiro da Silva (1920-1980), secretária da OAB. A véspera do 1º de maio de 1981 ficou marcada pelo atentado frustrado do Riocentro, onde se realizava show lotado em homenagem ao Dia do Trabalho e uma das bombas explodiu antecipadamente no colo de um militar, matando-o. O ato terrorista só começou a ser esclarecido 34 anos depois. "O clima era de medo e violência. Havia prisão de líderes sindicais, em 1982 aconteceu a Proconsult [fraude na contagem de votos para tentar impedir a eleição de Brizola a governador do Rio]. Estamos pagando até hoje o preço das insuficiências da transição democrática no Brasil", diz Saavedra Durão.

O encontro com passados traumáticos é difícil, mesmo em sociedades cuja história é celebrada e preservada. A França levou 30 anos para reabrir o capítulo da colaboração de franceses com os nazistas, e nas três décadas só narrou o heroísmo da resistência à ocupação alemã na Segunda Guerra. "Precisou de um historiador americano, Robert Paxton, para falar sobre isso. Foi um choque, mas depois vieram aqueles filmes maravilhosos, 'Chagrin et Pitié' e 'Lacombe Lucien'", diz Aarão Reis. Na Alemanha, o nazismo foi tabu até 1968 e analistas políticos creditam a essa recuperação da memória, contada em centros culturais e numa imensa produção cultural, o emparedamento da extrema-direita em pequenos distritos do lado oriental do país.

No Brasil, a Anistia como justiça e memória criou tensão e polêmica, jamais esteve na agenda política da maioria da sociedade como nos vizinhos latino-americanos. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso contou recentemente que um dos momentos delicados de sua relação com os militares foi ao criar a Comissão da Anistia e a Comissão de Mortos e Desaparecidos, em que o Estado assumia a responsabilidade por violações dos direitos humanos e começava a pagar reparações às vítimas da ditadura.

"Sou da tese de que Anistia é esquecimento, mas só se esquece o que se sabe, a apuração dos fatos deveria ter acontecido logo depois do fim da ditadura, mas a Comissão da Verdade só veio em 2015, sob pressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos. Essa demora fez com que a tortura ainda exista de forma generalizada no sistema de segurança pública e que ainda se exalte a ditadura", diz o jurista e professor Pedro Dallari, coordenador da primeira Comissão da Verdade.

Para o ambientalista Jean Marc von der Weid, presidente do CBA na Europa até setembro de 1979, a esquerda criou grupos para preservar a memória, mas não soube levar à sociedade o significado da luta pela Anistia e ficou só falando dentro da bolha. Tentou-se três vezes tornar Anistia realmente irrestrita: na aprovação da emenda para criar a Assembleia Nacional Constituinte em 1985, durante a elaboração da nova Constituição, e em 2010, quando o Supremo Tribunal Federal julgou uma ação da OAB que pedia a reinterpretação da lei de 1979. Por 7 a 2, foi derrotada a tese de que era inconstitucional anistiar torturadores depois de a lei considerar em 1988 que crimes contra a humanidade não prescrevem nunca. "Nos votos, os ministros argumentaram que a Anistia nos tirou da ditadura, foi a melhor possível nos idos de 79 e não adiantaria olhar o passado com olhos de 2010. Rever esse pacto seria desfazer a maneira como vivemos hoje", afirma a historiadora Carolina Cooper, autora de uma tese sobre o tema. Na época, só os ministros Ricardo Lewandowski e Ayres Britto votaram a favor da revisão da lei, mas todos os nove foram unânimes em defender o direito de conhecer a verdade e a obrigação do Estado de abrir os arquivos. "Lembrar para não esquecer, não esquecer para nunca mais acontecer", disse o relator do processo, Eros Grau.

Os 40 anos da Anistia ocorrem em meio a disputas historiográficas, e a desconstrução da história ganha espaço nos discursos oficiais: há os que negam a existência da ditadura - como o presidente Jair Bolsonaro (PSL) - e reforça-se a narrativa de que o regime salvou o país do comunismo. Para historiadores, o negacionismo está ligado à crise da democracia global, mas há particularidades em cada país. No Brasil as raízes do populismo estão no processo de retomada da democracia, com a cristalização de certos silêncios ou versões romantizadas do passado, dificultando o entendimento do presente. "Depois da redemocratização, as Forças Armadas tiveram uma conduta de acordo com a Constituição, mas ficaram reféns do passado não esclarecido. Há uma geração de jovens oficiais constrangida por esse legado", diz Dallari.

Para o escritor Frei Betto, a dor ninguém apaga e a memória vem sendo reconstituída em livros, filmes e peças de teatro. "Só eu escrevi cinco", diz ele. Uma viagem pela América Latina fez a cineasta Lucia Murat, diretora do clássico "Que Bom Te Ver Viva" (1989), repensar a relação dos países com o passado. Ao rodar um longa que mistura ficção e vida real, visitou na Argentina uma antiga escola da Marinha, usada como centro de tortura e preservado como era nos anos de chumbo, com catres e celas. Os pequenos prédios em volta foram cedidos a movimentos de direitos humanos, como as "abuelas de la Plaza de Mayo".

No Chile, os centros de tortura viraram lugares de memória, e a ex-presidente Michelle Bachelet construiu um museu. O Estádio Nacional, usado como prisão por três meses após o golpe contra o presidente Salvador Allen (1908-1973), está todo pintado de azul e vermelho, mas a galeria cinco manteve-se como no passado: cinza, de madeira, com grades. E uma grande faixa diz "povo sem memória é um povo morto". "Aqui se impediu de revelar a história. Essa juventude chilena que vai ao Estádio Nacional, onde uma mulher explica o que aconteceu e nomeia os responsáveis, é criada de uma maneira diferente do que a juventude brasileira que não tem acesso a essas informações", diz Lucia. [para que sujar a cabeça de nossos jovens informando-os que maus brasileiros, tentaram - usando da covardia, do terrorismo, da traição, da aliança com comunistas - transformar nossa Pátria em uma Cuba.?] 
 

Eu & Fim de Semana - Helena Celestino - Valor Econômico


 

domingo, 31 de maio de 2015

O fim de um porco e da pocilga (os suínos que perdoem comparação tão ofensiva.)

O fim de Carlos Lamarca e da VPR

Uma cuidadosa ação da Inteligência colocou fim à carreira do terrorista Carlos Lamarca (o porco), mas os homens que lutaram contra o terror comunista nunca foram reconhecidos pelos governantes de plantão. No dia 7 de dezembro de 1970, uma segunda-feira, um grupo de militantes da Vanguarda Popular Revolucionária, chefiado por Carlos Lamarca, seqüestrou Giovani Enrico Bucher, embaixador da Suíça no Brasil. 
 
O seqüestro ocorreu na rua Conde de Baependi, Catete, no Rio de Janeiro. O embaixador viajava em seu carro, um Buick, dirigido por seu motorista, Hercílio Geraldo e, como sempre, acompanhado do agente da Polícia Federal Helio Carvalho de Araújo, designado para prover sua segurança. 
 
Após o carro ter sido interceptado, Carlos Lamarca, utilizando o codinome de "Paulista", bateu no vidro da janela do agente de segurança, abriu a porta e desfechou-lhe dois tiros com um revólver calibre 38 à queima-roupa. O agente, conduzido para o Hospital Miguel Couto, faleceu 3 dias depois. 

Desse seqüestro, tomaram parte diretamente seis militantes, além de Carlos Lamarca: Adair Gonçalves Reis, Gerson Theodoro de Oliveira, Alex Polari de Alverga, Inês Etienne Romeu, Maurício Guilherme da Silveira e Herbert Eustáquio de Carvalho. José Roberto Gonçalves de Rezende e Alfredo Helio Sirkis participaram do transporte do embaixador para o "aparelho" da VPR na rua Paracatu, em Rocha Miranda. O militante Paulo Brandi de Barros Cachapuz, nesse mesmo dia - e nos dias seguintes - deu seguidos telefonemas desinformando a polícia sobre o paradeiro do embaixador. [a tal de Inês acima citada, no final de abril passado foi acertar contas com o diabo, pagando por crimes bárbaros tipo o acima citado e muitos outros.
Foi a terrorista Inês que sustentou por muito tempo a versão da existência da 'casa da morte' em Petrópolis, onde teria sido barbaramente torturada.
A intensidade das torturas de terrorista falecida no dia 27 de abril combina com as que a atual presidente Dilma diz ter sofrido quando esteve presa. Segundo a presimente foi torturada por 22 dias e fotos realizadas poucos dias após a torturada mostram uma  jovem gozando de ótima saúde e aparência física - não podemos dizer que mostre uma jovem bonita, já que neste aspecto Dilma foi (é e sempre será) geneticamente desfavorecida.]

Essa data – 7 de dezembro de 1970 – marcou o início do fim da VPR (a pocilga).
Naquele mesmo dia a VPR distribuiu aos meios de comunicação o "Comunicado nº 1", um "Manifesto ao Povo Brasileiro" e uma "Carta Aberta à embaixada suíça", bem como uma carta de próprio punho do embaixador. 

No dia 9 de dezembro, o Ministério da Justiça, através de uma nota oficial, afirmava que "o governo brasileiro, no empenho de preservar a vida e a liberdade do embaixador", aguardava a relação nominal dos terroristas a serem liberados. Nesse mesmo dia, a VPR expediu o "Comunicado nº 2", dizendo que somente divulgaria a lista dos 70 presos a serem liberados depois de cumpridas as exigências de divulgação do "Manifesto ao Povo Brasileiro" por dois dias consecutivos na primeira página dos jornais e em todas as rádios e TVs do país, às 6, 12, 18 e 20:30 horas, o que não foi feito. 

Quatro dias depois, a VPR cobrou do governo o cumprimento dessa exigência através do "Comunicado nº 3" e, no dia 16 de dezembro com o "Comunicado nº 4". 

No dia 17, o governo deu garantia de que libertaria os 70 presos e, no dia seguinte, a VPR enviou o "Comunicado nº 5", com a lista dos 70. 
Na segunda-feira, 21 de dezembro, o governo respondeu que aceitava libertar apenas 51 presos constantes da relação. Não concordava com os outros 19 por vários motivos: 6 haviam participado de seqüestros, 4 estavam condenados à prisão perpétua ou a penas elevadas, 3 haviam cometido homicídios, 1 não estava identificado, 1 não queria ser banido do país e 4 já estavam em liberdade. 

A partir desse documento teve início uma discussão dentro da VPR para ver se o embaixador seria morto ou não, sendo realizada uma votação a respeito com o resultado de 15 a 3 a favor do "justiçamento" do embaixador. Os 3 que votaram contra foram Carlos Lamarca, Alfredo Hélio Sirkis e José Roberto Gonçalves de Rezende que não vislumbravam dividendos políticos na morte do embaixador. Lamarca, como comandante-em-chefe da VPR, exerceu seu direito de veto e sustou o "justiçamento" enviando ao governo outra lista dos presos a serem liberados. 

No dia 28 de dezembro, o governo divulgou que, da nova lista, alguns não poderiam ser também libertados. No dia 30, a VPR enviou uma outra relação e, no dia 4 de janeiro, o governo divulgou a preterição de mais 9 presos, substituídos no dia seguinte, por uma nova lista enviada pela VPR. No dia 6 de janeiro, nova preterição de 4 nomes e, no dia seguinte, nova lista substituindo esses 4. 

Finalmente, no dia 11 de janeiro, uma nota oficial do Ministério da Justiça condicionou a liberação e embarque para o Chile dos 70 presos a um Comunicado da VPR comprometendo-se a liberar o embaixador. No dia seguinte, a VPR cumpriu essa exigência e, às 24 horas do dia 13 de janeiro de 1971, os 70 presos, escoltados por três agentes da Polícia Federal embarcaram no Galeão, em um Boeing da Varig e, às 4:15 horas de 14 de janeiro desembarcaram no aeroporto Puhaduel, em Santiago, sendo fotografados ao lado do avião com os punhos cerrados e saudados por dezenas de militantes, brasileiros e chilenos, postados nas varandas do aeroporto, entoando a Internacional Socialista. 

Dos 70 presos banidos do Brasil, 24 eram militantes da VPR e os demais 46 pertenciam a outras organizações. No dia 15 de janeiro de 1971, Lamarca abandonou o "aparelho" em que se encontrava e, no alvorecer do dia 16, o embaixador foi deixado próximo ao penhasco da igreja da Penha, em um Volks, por Alfredo Helio Sirkis e Gerson Teodoro de Oliveira. Pouco tempo depois, Gerson Teodoro de Oliveira, a bordo desse Volks, que estava registrado no nome frio por ele utilizado, foi morto pela polícia.
Após esse tremendo desgaste de ter que manter o embaixador confinado por 39 dias, de fazer e refazer relações de presos e de impedir o "justiçamento" do embaixador, conforme desejava a maioria da VPR, a liderança de Carlos Lamarca estava irremediavelmente desgastada. Acolhido em um "aparelho" do MR8, na região dos Lagos, juntamente com sua amante Iara Iavelberg, Lamarca, em 22 de março de 1971, enviou um Comunicado à VPR escrito de próprio punho. Abaixo, uma cópia literal desse documento: 

"Ao Comando da VPR. Assunto: Pedido de Desligamento. Caráter: Irrevogável.

Apresento, conforme normas internas da Org, o meu pedido de desligamento para apreciação no meu órgão de militância. Considero essa apreciação como necessária para a formalização de crítica e auto-crítica.

Dou caráter de irrevogabilidade à este pedido em virtude de:

1) divergir da linha política da VPR, conforme coloquei em diversos documentos internos;

2) ter constatado desvios ideológicos da VPR e a deformação que acarreta em muitos dos seus quadros;

3) não ter conseguido levar a luta interna que iniciei há um ano com a devida serenidade;

4) não conseguir romper com o culto ao sectarismo existente na VPR;

5) discordar do método de direção (apesar de ser Cmt-em-Chefe); a Org impede a liberação de potencial, não forma quadros, aliena militantes, deforma dirigentes, elimina a criatividade, impede a prática leninista – tudo como já coloquei em documentos internos.

Considero-me também deformado – na Org em que vou militar farei auto-crítica na prática. Coloco-me como deformado porque constatei, na prática, essa deformação. Na VPR não há lugar para uma auto-crítica revolucionária, em todas as vezes que fiz, foi politicamente capitalizada para a defesa de posições – persistir é aceitar a deformação.

Estarei sempre atento para responder questionamento da VPR sobre qualquer acontecimento na organização – de 24 de janeiro de 1969 até esta data 22 de março de 1971 – se me chegar por escrito. Aguardarei a análise crítica da VPR, solicitando o direito de resposta, assim como apuração de responsabilidade pessoal, em qualquer época, e no nível desejado pela VPR. Condicionarei a minha entrada em outra Organização a isto, para que fique clara a minha predisposição de assumir a responsabilidade dos meus atos na militância individual ou coletiva na VPR.

Sempre travei a luta interna e procurei a coesão sem conciliar – saio sem travar uma luta desagregadora – apesar de ter cometido uma violência ao escrever o documento CONTRA O CUPULISMO. Uma violência, mas uma deformação. A deformação é uma necessidade da VPR. Sem a violência as posições políticas não afloram – e, de deformação em deformação à degradação política.

À VPR só resta um caminho, o CONGRESSO – um longo processo de discussões e um profundo imobilismo – se tentar andar quebra.

Tenho contribuições a dar para a Revolução no Brasil, e aqui ficarei e, na Organização em que for militar farei um comunicado à esquerda apresentando os motivos do desligamento e do ingresso em outra Organização Revolucionária.

O que sei, e que possa afetar a segurança da VPR morre comigo.

OUSAR LUTAR
OUSAR VENCER
Claudio – 22 MAR 71"


O original do documento acima foi apreendido pelo CISA no "aparelho" de Alex Polari de Alverga, pertencente ao Comando Nacional da VPR, quando de sua prisão, em maio de 1971. Em 22 de junho de 1971, Carlos Lamarca e Iara Iavelberg, em frente a uma loja do Bob’s, na Avenida Brasil, Rio de Janeiro, embarcaram em uma Kombi que, precedida por um Volks, os levou a Salvador/BA. Nas proximidades de Salvador, ambos passaram para o Volks e a Kombi retornou ao Rio com seu motorista.

Investigações posteriores indicaram que a Kombi tinha placa de Belém/PA e pertencia a um paraense, estudante de Economia na Universidade Gama Filho, no Rio; e que o Volks, de cor branca, tinha placa de Petrópolis/RJ. O levantamento do proprietário do Volks foi fácil, pois, na época, só existiam  dois Volks de cor branca registrados no Detran de Petrópolis.
Com base nesses dois informes foram levantadas as identidades dos proprietários, dois colaboradores do MR-8. O Volks pertencia ao filho de um ex-Ministro do STF, cassado, e a Kombi pertencia, realmente, a um estudante paraense. Seus nomes serão preservados. Eles nunca foram presos. Passaram a ser monitorados, pois poderiam, no futuro, passar a colaborar e eram uma forma da Inteligência não perder contato com a Organização. 

Menos de três meses depois, em 17 de setembro de 1971, Carlos Lamarca era morto no sertão da Bahia e o MR-8, no Rio de Janeiro e na Bahia, desmantelado. Lamarca foi o último dos chamados grandes comandantes da guerrilha a ser eliminado. Os dois outros, Carlos Marighela, e seu sucessor, Joaquim Câmara Ferreira (“Toledo”), morreram em novembro de 1969 e dezembro de 1970.
Em 1971, o balanço geral dos militantes da VPR era de que as organizações da esquerda armada haviam sido derrotadas em razão da ação da chamada repressão que levou ao seu isolamento social e político. Os remanescentes da VPR no Brasil já haviam jogado a toalha com a divulgação, no dia 7 de agosto de 1971, de três documentos históricos:
O Comunicado nº 1 (Novo Comando) afirmava que em vista dos últimos acontecimentos, fica estabelecido um novo comando na organização”; que esse novo comando “assume a organização praticamente extinta e vai tentar salvar o que sobrou”;

O Comunicado nº 2 (Medidas Imediatas) assinalava que “atualmente o que existe é o final da derrota, alguns elementos que devem ser preservados para que se possa tirar do fracasso desta experiência as lições necessárias (...) e, para isto, determina de forma imediata: a) a organização está desmobilizada; b) está convocado o II Congresso Nacional (...) por desmobilização entendemos a suspensão das ações armadas (...)”;

O Comunicado nº 3 (Aos Companheiros no Exterior):A organização chegou agora ao esgotamento total. Estamos sem as mínimas condições de atuação e sem possibilidades por mais remotas de tirar uma definição conseqüente, que sirva de guia para uma prática revolucionária (...) A crise política da organização que se seguiu à ação do embaixador suíço levou a uma aguda crise no Comando em abril/maio deste ano, tendo como conseqüência o desligamento inusitado de dois dos companheiros do Comando Nacional. Um desses companheiros caiu a 3 de maio, outro pediu ingresso em outra organização (...) O companheiro do Comando, restante, estabeleceu uma assim chamada ‘Coordenação Provisória’ que teve vida curta. Sua finalidade era coordenar discussões na organização, mas já a 12 de maio caíam dois companheiros da Coordenação, restando dela um único. Na realidade, porém, a situação era muito pior: a Unidade de Combate da Guanabara perdeu de março até maio quase todos os seus quadros. Restaram alguns poucos, dos quais caíram dois entre maio e agosto. Em São Paulo já não existe Unidade de Combate, sendo alguns quadros recém recrutados, que não têm condições de, sozinhos, montar uma UC (...) Entre 1 e 5 de agosto caíram dois companheiros fundamentais no NE (...) A organização está desmobilizada (o que significa apenas reconhecer com palavras uma situação de fato que se estendia desde maio deste ano e buscar salvar o que sobrou). Convocamos o Congresso, mas para realizá-lo precisamos que os companheiros nos enviem dinheiro (...) Sem dinheiro certamente não sobrará um único remanescente no Brasil. Esperamos, com urgência, a colaboração dos companheiros”.

O ato final da VPR foi realizado no Chile, em julho de 1973, às vésperas da deposição do governo Allende: uma reunião de avaliação, da qual participaram os militantes que se encontravam foragidos ou banidos naquele país. Essa reunião formalizou a extinção da Vanguarda Popular Revolucionária e sua desmobilização por completo, pois voltar ao Brasil naquele momento para prosseguir na luta armada não fazia parte da agenda pessoal da quase totalidade dos militantes.

A VPR, constituída em março de 1968, por um grupo partidário da teoria do foco guerrilheiro” que havia deixado a organização Política Operária, mais conhecida como POLOP, e por diversos sargentos e marinheiros expulsos das Forças Armadas, muitos com treinamento em Cuba, remanescentes do falido Movimento Nacional Revolucionário de Brizola, durante os cinco anos em que atuou, seqüestrou embaixadores, matou, “justiçou”, assaltou bancos e carros-fortes, estabelecimentos comerciais. Os que sobraram, no entanto, foram anistiados e a maioria recompensada financeiramente por não terem conseguido transformar o Brasil em uma república popular democrática

Na realidade, apesar da audácia, da lenda e do mito, Lamarca foi um desertor e um traidor do Exército Brasileiro.

E é assim que deverá passar à História.
Entretanto, aquele pequeno grupo de militares e civis – alguns dos quais não mais estão entre nós - que erradicaram o terrorismo, os seqüestros, os assaltos, os justiçamentos e os assassinatos de cunho político, que sacrificaram suas vidas e a de seus familiares, não receberam o reconhecimento da Pátria ou de seus governantes.

Por: Carlos I.S. Azambuja é Historiador.

Publicado originalmente no Blog Alerta Total

General Nilton Cerqueira, quando era secretário de Segurança do Rio, em 1995
Atualmente está com 85 anos e ainda vive 

[O comandante da operação que matou o porco Lamarca foi o general Nilton Cerqueira, que além da honra de participar do abate de uma hiena tipo o traidor Lamarca, ocupou, após o término do Governo Militar o cargo de secretário da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio, durante o governo Marcelo Alencar, 1995 a 1998.]